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Desconsideração da personalidade jurídica e o liame entre a celeridade da tutela jurisdicional e as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa

André Jobim de Azevedo
Vitor Kaiser Jahn

 

  1. Aspectos Introdutórios

O homem é um ser de natureza eminentemente social, pelo que estabelece uma gama de relações com seus semelhantes; não por outra razão, o ato de associar-se é inerente à pessoa humana, seja por conveniência ou necessidade.

Silvio de Salvo Venosa já afirmava que “o ser humano, pessoa física ou natural, é dotado de capacidade jurídica. No entanto, isoladamente é pequeno demais para a realização de grandes empreendimentos”[1].

Efetivamente, desde os primórdios, a conjugação de esforços é a ferramenta que se mostra mais adequada para que o homem possa transcender as limitações individuais e alcançar objetivos comuns ao grupo envolvido[2].

Com o passar dos tempos, o resultado proveniente da união de esforços individuais para consecução de fins comuns foi reconhecido pelo direito como um ente individualizado, de tal maneira a atuar com personalidade própria, distinta de cada um de seus membros. Essa personificação do ente abstrato, segundo Caio Mário Pereira da Silva, destaca a vontade coletiva do grupo, de tal maneira que o seu querer é uma resultante, e não mera justaposição das manifestações volitivas isoladas[3].

Nesse sentido, previa o Código Civil de 1916 que: “as pessoas jurídicas têm existência distinta da dos seus membros”. Segundo Pontes de Miranda, esse dispositivo enuncia que as pessoas jurídicas são, propriamente, pessoas. Isso porque, para este autor, cujo brilhantismo é por todos reconhecido, “pessoa” é o conceito universal com o qual se alude à possibilidade de ser sujeito de direito, eis que, “quem põe a máscara para entrar no teatro do mundo jurídico está apto a desempenhar o papel de sujeito de direito[4].

De fato, uma vez reconhecido o querer do ente abstrato, este passa a gozar de autonomia para contrair direitos e obrigações em nome próprio, não mais se confundindo com as pessoas físicas que o compõem.

Giza-se que a concepção de autonomia patrimonial é fundamental para propiciar o desenvolvimento de atividades econômicas produtivas, pois assegura proteção ao patrimônio das pessoas físicas que estão dispostas a empreender através da iniciativa privada. Afinal, ao menos prima facie, os sócios não responderão pessoalmente pelo eventual insucesso do negócio.

Quanto ao ponto, vale ressaltar que o incentivo à iniciativa privada é fundamental para a criação de postos de trabalho de qualidade. Conforme aponta a Organização Internacional do Trabalho (OIT), em todos os países, a maior parte dos empregos é criada nas pequenas e médias empresas do setor privado[5], sendo certo que, quanto mais bem desenvolvida for a empresa, melhores serão as suas condições de estabelecer uma relação de qualidade com os seus empregados.

Porém, como ressalta Carlos Roberto Gonçalves, por vezes, “pessoas inescrupulosas têm-se aproveitado desse princípio (autonomia patrimonial), com a intenção de se locupletarem em detrimento de terceiros, utilizando a pessoa jurídica como uma espécie de ‘capa’ ou ‘véu’ para proteger os seus negócios escusos”[6].

Para coibir tais atos fraudulentos, o direito apresentou como resposta a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, segundo a qual o juiz, em certos casos, pode desconsiderar que as pessoas jurídicas possuem existência distinta de seus membros, rechaçando os efeitos dessa autonomia de tal maneira que os bens dos sócios respondam pelas dívidas da sociedade.

Sérgio Pinto Martins conceitua a desconsideração da personalidade jurídica como a doutrina que busca levantar o véu que encobre a corporação (to lift the corporate veil) para atingir os bens dos sócios[7].

Porém, é de se ressaltar que, conforme destaca Fábio Ulhoa Coelho, “a decisão judicial que desconsidera a personalidade jurídica não desfaz o seu ato constitutivo, não o invalida, nem importa a sua dissolução. Trata, apenas e rigorosamente, de suspensão episódica da eficácia deste ato”[8].

A doutrina de Rubens Requião[9] aponta que foi o caso Salomon vs. Salomon & Co. que impulsionou a jurisprudência a se manifestar pela primeira vez sobre a teoria da desconsideração da personalidade jurídica. No aludido processo, que tramitou perante a jurisdição Inglesa, o comerciante Aaron Salomon havia constituído uma companhia em conjunto com outros seis familiares, sendo que Aaron possuía vinte mil ações e seus familiares apenas uma ação cada. Tendo se revelado insolvável a sociedade, o liquidante sustentou que, na verdade, a atividade da companhia era a mesma atividade de Salomon, que usou de artifício para limitar sua responsabilidade. O juízo de primeira instância e a corte acolheram a pretensão, julgando que havia confusão patrimonial entre a company e o seu proprietário de fundo. A Casa dos Lordes, porém, reformou esse entendimento, julgando que a companhia tinha sido validamente constituída e, portanto, tratava-se de pessoa diversa das sete que a compunham, sendo irrelevante o número de ações por elas detidas.

Nessa conjuntura, embora tenha restado ao final reformada, a vanguardista decisão que reconheceu a desconsideração da personalidade jurídica teve grande repercussão, dando aso ao desenvolvimento da teoria. Há quem atribua a criação da Teoria  – Disregard of Legal Entity – ao também inglês Jeremy Benthan , no início do século XX.

 

  1. Do Direito Material

 

No ordenamento jurídico pátrio, o primeiro diploma a reger a desconsideração da personalidade jurídica foi o Código de Defesa do Consumidor de 1990 (L 8.078/90).

O CDC, no caput do seu artigo 28, assim dispõe: “o juiz poderá desconsiderar a personalidade jurídica da sociedade quando, em detrimento do consumidor, houver abuso de direito, excesso de poder, infração da lei, fato ou ato ilícito ou violação dos estatutos ou contrato social. A desconsideração também será efetivada quando houver falência, estado de insolvência, encerramento ou inatividade da pessoa jurídica provocados por má administração”. O parágrafo 5º do aludido dispositivo acrescenta que: ”também poderá ser desconsiderada a pessoa jurídica sempre que sua personalidade for, de alguma forma, obstáculo ao ressarcimento de prejuízos causados aos consumidores”.

Após, a Lei Antitruste (L 8.884/94, art. 18) e a Lei do Meio Ambiente (L 9.605/98, art. 4º) estabeleceram a desconsideração quando a pessoa jurídica fosse responsável pelo cometimento de infração à ordem econômica ou prejuízos ao meio ambiente.

A matéria até então reservada a tais relações especiais, passou a ter regramento geral no Código Civil de 2002, que, no seu artigo 50, estabeleceu como hipótese expressa de desconsideração da personalidade jurídica o desvio de finalidade e a confusão patrimonial do ente com seus sócios.

Vislumbra-se, portanto, que o Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor estabelecem pressupostos diversos para a desconsideração da personalidade jurídica. Enquanto o artigo 50 do CCB limita a desconsideração às hipóteses de confusão patrimonial e desvio de finalidade (teoria maior), o CDC prevê, expressamente, inúmeros outros motivos para que seja afastada a autonomia patrimonial (teoria menor).

Tesheiner, Milhoranza e Rodrigues sustentam que, no âmbito do processo do trabalho, a teoria da desconsideração da personalidade jurídica aplicada deve ser aquela prevista no CDC, pois tanto o consumidor quanto o trabalhador encontram-se em situação de hipossuficiência, e não em pé de igualdade com o fornecedor/empregador, o que é exigido para a aplicação do Diploma Civil[10].

Por outro lado, Sérgio Pinto Martins afirma que o Código de Defesa do Consumidor apenas se aplica às relações de consumo, as quais não se confundem com as trabalhistas[11]. Entendemos ser esta a melhor doutrina. Afinal, o artigo 1º do CDC deixa claro que: “o presente código estabelece normas de proteção e defesa do consumidor”, as quais, por consequência, não se estendem a outras relações jurídicas, como a trabalhista.

Por via de consequência, inexistindo previsão legal de hipóteses especiais para a desconsideração da personalidade jurídica nas relações de trabalho, não pode o Poder Judiciário fazer as vezes de legislador positivo e criar hipótese especial para o afastamento da autonomia patrimonial nas relações trabalhistas.

Portanto, para a desconsideração da personalidade jurídica na seara processual trabalhista, há de restar demonstrada a confusão patrimonial ou o desvio de finalidade, consoante disciplinado pelo Código Civil.

  1. Do Direito Processual

Antes da entrada em vigor da Lei 13.105/2015 em nosso ordenamento jurídico, a desconsideração da personalidade jurídica possuía assento exclusivamente material, não havendo qualquer regramento processual para a sua consecução.

Destarte, entre as festejadas inovações trazidas pelo Novo Código de Processo Civil, revela-se de essencial importância o regramento do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, previsto nos artigos 133-137 do novel Diploma Processual, in verbis:

Art. 133.  O incidente de desconsideração da personalidade jurídica será instaurado a pedido da parte ou do Ministério Público, quando lhe couber intervir no processo.

  • 1º O pedido de desconsideração da personalidade jurídica observará os pressupostos previstos em lei.
  • 2º Aplica-se o disposto neste Capítulo à hipótese de desconsideração inversa da personalidade jurídica.

Art. 134.  O incidente de desconsideração é cabível em todas as fases do processo de conhecimento, no cumprimento de sentença e na execução fundada em título executivo extrajudicial.

  • 1º A instauração do incidente será imediatamente comunicada ao distribuidor para as anotações devidas.
  • 2º Dispensa-se a instauração do incidente se a desconsideração da personalidade jurídica for requerida na petição inicial, hipótese em que será citado o sócio ou a pessoa jurídica.
  • 3º A instauração do incidente suspenderá o processo, salvo na hipótese do § 2o.
  • 4º O requerimento deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos legais específicos para desconsideração da personalidade jurídica.

Art. 135.  Instaurado o incidente, o sócio ou a pessoa jurídica será citado para manifestar-se e requerer as provas cabíveis no prazo de 15 (quinze) dias.

Art. 136.  Concluída a instrução, se necessária, o incidente será resolvido por decisão interlocutória.

Parágrafo único.  Se a decisão for proferida pelo relator, cabe agravo interno.

Art. 137.  Acolhido o pedido de desconsideração, a alienação ou a oneração de bens, havida em fraude de execução, será ineficaz em relação ao requerente.

A pertinência deste regramento é absoluta, haja vista que, embora a desconsideração da personalidade jurídica já houvesse sido inserida no ordenamento jurídico pátrio desde 1990, através do Código de Defesa do Consumidor, e recebido ainda maior destaque após a edição do Código Civil de 2002, a lei não previa nenhum procedimento específico para tanto.

No âmbito da Justiça Especializada do Trabalho, a desconsideração da personalidade jurídica tem sido aplicada nos casos em que os bens da empresa não são capazes de satisfazer a execução, sendo que, através de mero despacho, o sócio é incluído no polo passivo da demanda e apenas pode discutir sua responsabilidade através de embargos à execução. E tudo à revelia dos expressos requisitos ,cuja aplicação  ora se sustenta.

Ocorre que o artigo 884 da CLT exige para a oposição de embargos a penhora ou a garantia dos valores em execução. Ou seja, para poder apresentar defesa, o sócio, necessariamente, tem de se submeter à constrição patrimonial.

Tal circunstância se apresenta ainda mais gravosa nos casos em que o Juízo Trabalhista utiliza o Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional (CSS) para responsabilizar eventuais sócios ocultos mediante a análise daqueles que possuem poderes para movimentar os ativos financeiros da pessoa jurídica perante instituições bancárias. Não raras vezes, porém, administradores empregados que possuem tais poderes acabam sendo surpreendidos com a penhora de seus bens, sem qualquer contraditório prévio. Este é apenas um singelo exemplo das inúmeras injustiças que são diariamente praticadas na busca da satisfação de créditos trabalhistas.

Para remediar esta lamentável situação, afigura-se impositiva a aplicação do incidente previsto no Novo Código de Processo Civil, pois, uma vez observado, a pessoa física somente poderá ser responsabilizada após a sua oitiva, oportunizando-se, inclusive, dilação probatória.

Nesse sentido, a instrução normativa nº 39 do Tribunal Superior do Trabalho indica que o órgão está com seu posicionamento firmado no sentido de que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, nos termos em que regulado pelo novo diploma processual, é aplicável ao processo trabalhista.

Embora se reconheça a existência de posicionamentos em sentido contrário, como aquele sustentado por Bezerra Leite[12], entendemos que o incidente é uma grande vitória à constitucionalização do processo do trabalho, eis que enaltece as garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa da pessoa física, bem como resguarda o direito fundamental à propriedade desse indivíduo até que seja eventualmente comprovada a sua responsabilidade pelo custeio das verbas executadas. A relevância de tais valores constitucionalmente assegurados, por óbvio, se sobrepõe a meros princípios informativos, sendo impositiva a adoção do procedimento estabelecido no Novo Código de Processo Civil para a desconsideração da personalidade jurídica.

  1. Conclusão

 

Ante o até aqui exposto, vislumbra-se que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, previsão  no  Código Civil Brasileiro de 2015, disciplinado pelo Novo Código de Processo Civil, afigura-se como o remédio criado pelo legislador para superar as verdadeiras injustiças que vem sendo perpetradas em detrimento das pessoas físicas responsabilizadas por dívidas contraídas por pessoas jurídicas.

Nada dispondo a CLT sobre o procedimento afeito à desconsideração, e não sendo a idealizada “celeridade processual” capaz de se sobrepor às garantias constitucionais do contraditório e da ampla defesa, o procedimento previsto no artigo 133 e seguintes do NCPC é compatível com o processo do trabalho, dado o previsto no artigo 769 da lei trabalhista, bem como no artigo 15 do Código de Processo Civil de 2015.

  1. Referências Bibliográficas

BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica do Novo CPC e a sua (in)aplicabilidade no processo do trabalho. In O novo CPC e o processo do trabalho: estudos em homenagem ao ministro Walmir Oliveira da Costa. Sérgio Pinto Martins (Org). São Paulo: Atlas, 2016.

COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. v. 2. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. v. 1: parte geral. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual Do Trabalho. 38ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

OFICINA INTERNACIONAL DEL TRABAJO. La promoción del empleo decente por medio de la iniciativa empresarial. 289ª – reunión  Comisión de Empleo y Política Social. Ginebra: Oficina Internacional del Trabajo, 2004. Disponível em: <http://www.ilo.org/public/spanish/standards/relm/gb/docs/gb289/pdf/esp-1.pdf>. Acesso em: set. 2016.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. v. 1. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.

PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Tomo I. 3ª ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1970.

REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. Sâo Paulo: Saraiva, 1971.

TESHEINER, José Maria Rosa; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro; RODRIGUES, Ana Francisca. A aplicabilidade da desconsideração da personalidade jurídica da empresa ao processo do trabalho e o novo CPC. In O novo CPC e o processo do trabalho: estudos em homenagem ao ministro Walmir Oliveira da Costa. Sérgio Pinto Martins (Org). São Paulo: Atlas, 2016. p. 420.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. v.1. 14ª ed. Atlas: São Paulo, 2014. p. 239.

[1]    VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. v.1. 14ª ed. Atlas: São Paulo, 2014. p. 239.

[2]   GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. v. 1: parte geral. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 216.

[3]   PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. v. 1. 19ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 186.

[4]   PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de direito privado. Tomo I. 3ª ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1970. p. 161.

[5]   OFICINA INTERNACIONAL DEL TRABAJO. La promoción del empleo decente por medio de la iniciativa empresarial. 289ª – reunión  Comisión de Empleo y Política Social. Ginebra: Oficina Internacional del Trabajo, 2004. Disponível em: <http://www.ilo.org/public/spanish/standards/relm/gb/docs/gb289/pdf/esp-1.pdf>. Acesso em: jul. 2016.

[6]    GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. v. 1: parte geral. 11ª ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 249.

[7]    MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual Do Trabalho. 38ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016. p. 1000.

[8]   COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. v. 2. 5ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 43-44.

[9]   REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. Sâo Paulo: Saraiva, 1971. p. 174.

[10]   TESHEINER, José Maria Rosa; MILHORANZA, Mariângela Guerreiro; RODRIGUES, Ana Francisca. A aplicabilidade da desconsideração da personalidade jurídica da empresa ao processo do trabalho e o novo CPC. In O novo CPC e o processo do trabalho: estudos em homenagem ao ministro Walmir Oliveira da Costa. Sérgio Pinto Martins (Org). São Paulo: Atlas, 2016. p. 420.

[11]  MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual Do Trabalho. 38ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.

[12]  Carlos Henrique Bezerra Leite afirma que o incidente previsto nos artigos 133 e seguintes do NCPC trata de hipótese de intervenção de terceiros, o que não cabe no processo do trabalho pois incompatível com os princípios da informalidade, simplicidade e celeridade. (BEZERRA LEITE, Carlos Henrique. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica do Novo CPC e a sua (in)aplicabilidade no processo do trabalho. In O novo CPC e o processo do trabalho: estudos em homenagem ao ministro Walmir Oliveira da Costa. Sérgio Pinto Martins (Org). São Paulo: Atlas, 2016. p. 397).

Direito Processual do Trabalho no exercício da advocacia Alguns Aspectos de destaque processual

André Jobim de Azevedo

I Introdução

 A provocação dos colegas coordenadores da obra no que respeita a enfocarmos a reforma sob o ponto de vista da advocacia é interessantíssima. Para além dos titulares dos direitos materiais enormemente atualizados e alterados, a reforma trazida pela Lei13467/17 e sujeita ainda a nova mudança pela avaliação do incidente MP 808/17, mas ainda não apreciada pelo Congresso Nacional, atinge profundamente a advocacia.

Isto porque, e é por todos sabido, o direito processual, realizador e protetor do direito material contra ameaça e infração ao direito material, que tem no processo seu instrumento civilizado de cumprimento das normas contidas no ordenamento, é peça fundamental nas mudanças que hoje enfrentamos.

Igualmente no centro das discussões, os novos caminhos alterados para manejo de uma série de direitos praticados nos procedimentos judiciais – e ora noutros extrajudiciais – é capaz de asseverar os novos destinos das relações de trabalho.

Para tanto, vale-se do profissional do direito no particular do exercício da advocacia, que é quem representa o interessado em eventual conflito. Não sem realçar a norma do artigo 133 da Constituição Federal que assevera a sua indispensabilidade para a administração da Justiça, ainda, contudo, restando vozes isoladas que sustentem a sobrevivência do “jus postulandi”.

Assim é que buscar enfrentar as noveis alterações materiais e processuais, pela ótica do seu agente de cumprimento, o advogado – é fundamental. Aliás nunca deixou de estar no centro da discussão com papel relevante.

A advocacia se altera, e creio para melhor.  Desde a recente alteração do Código de Processo Civil, de aplicação subsidiária ao processo do trabalho por força na norma do artigo 769 da CLT, e agora com a extensa reforma trabalhista vigente, novo enfoque deve ser dado.

São outros os rumos de atuação na solução dos conflitos, iniciada por matrizes processuais civis, mas ora renovadas na Reforma Trabalhista. Busca-se afastar a noção adversarial, fala-se em cooperação em busca de efetiva solução para os conflitos. Para tanto exalta os Métodos Extrajudiciais de Solução de Conflitos, prestigiando a conciliação, a mediação e a arbitragem.                               

Pois tais mudanças, recentes, ainda estão sendo objeto não só de avaliação e interpretação, bem como de hesitante inicial jurisprudência, ainda não uniformes.

 Com o risco inerente às primeiras interpretações acerca de tão complexo texto legal, a discussão promete ser bastante acalorada.  São muitos- e distintos – os entendimentos sobre as novas normativas, para a qual se pretende alcançar elementos e argumentos capazes de melhor aplicá-las.

 A proposição articulada ora enfocada a advocacia -sem, contudo, esgotar o tema –   busca realizar abordagem relativa ao novel mundo do trabalho, do direito do trabalho e processual do trabalho, seu espaço constitucional e sua efetiva incidência em foros de realidade contemporânea, tudo no exercício diário da advocacia.

As alterações estão a exigir dos agentes advogados uma nova postura, ainda mais responsável com muitas consequências no futuro das relações do trabalho, sempre diretamente ligada aos processos judiciais que buscam resolver milhares de conflitos.

 

II A Reforma Trabalhista e o novo mundo do Trabalho. Reforma do Processo.

 

Admirável mundo novo nos cerca nesta segunda década do século XXI. É surpreendente o que, por vezes não percebemos, mas é a atual realidade. A evolução dos meios de transporte e de comunicação parecem ter-nos levado a este estado de coisas. Vivemos a era da tecnologia e da velocidade. Para tudo. Comunicamo-nos com inimaginável velocidade e somos capazes de atingir a qualquer localidade do globo em questão de horas. Assistimos fatos onde quer que eles aconteçam segundos ou minutos após sua efetivação, em vivas reproduções filmadas e sonorizadas, muitas vezes ao vivo. O mundo parece pequeno. As redes sociais estão aí para comprovar.

Essa condição que nos cerca nos faz partícipes desse cenário contemporâneo não como meros expectadores ou testemunhas, mas verdadeiros atores e protagonistas.

Ao mesmo tempo perderam-se as referências antes vigentes relativas às grandes nações, aos grandes líderes, às instituições, às tradições, às profissões, aos partidos políticos e às agremiações. O centro do mundo passa a ser o indivíduo, como auto referência, convivendo com a enorme diversidade e pluralidade evidentes. As noções de destaque social efêmeras e calcadas nas mais diversas situações e diluição ou fragilidade de lideranças capazes de bem estimular visões mais próprias da corrente atribulada vida contemporânea…

A vida realmente está diferente e o mundo em constante mutação. Decorrem daí significativas alterações no mundo econômico e nele o mundo do trabalho.

As relações de trabalho que compõe estas observações por certo também são bastante distintas daquelas que historicamente manejamos. Por igual os sujeitos sociais e sujeitos econômicos desse processo produtivo igualmente distinguem-se.

Atribuo à essa novel condição produtiva e mercadológica alterações patentes na sociedade e necessariamente em seus sujeitos econômicos e não econômicos, onde causa e efeito se confundem.                

As relações econômicas até a bem pouco tempo atrás eram restritas, limitadas e envolviam números muitíssimo menores de sujeitos. O mundo cresceu e ao mesmo tempo tornou-se menor.  O mundo do trabalho tem direto reflexo da nova realidade.

Recentemente o mundo produtivo buscava atender às necessidades vizinhas de bens produtos e serviços e a preocupação dos negócios estabelecia-se   partir de noção tímida, acanhada, de competição com conhecidos concorrentes, da rua, da cidade, do estado, do país, este último apenas para os grandes agentes da produção que conseguiam avançar para atuações nacionalmente ocorrentes.

A percepção, contudo, de que as distâncias encurtaram e que os horizontes produtivos elasteceram tornou-se um fato. Deixa-se apenas de focar a atuação produtiva e comercial em seu redor geográfico para perceber um entorno ilimitadamente existente e capaz de ameaçar a qualquer um e a todos, por conta de disputas que vão para muito além dos limites históricos e geográficos referidos. 

Ao mesmo tempo, a perspectiva de livre circulação do trabalhador pelo mundo recrudesce, limitando-se a situação internamente aos grandes mercados comuns, mas que convive com inúmeras atividades que passaram a desnecessitar a presença física dos trabalhadores no antes local de trabalho, com pouco ou nenhum prejuízo de sua ausência, e até com vantagens significativas. Os meios telemáticos de contribuição insuperável para isto, estão envolvidos com a vida acentuadamente urbana. Convivência essa centralizada nas cidades, que não mais comportam   tanto atropelo, resultando em enormes dificuldades de mobilidade urbana.

A facilidade de comunicação e transporte de bens, mercadorias e pessoas ensejou mudanças significativas na vida econômica do planeta e na atuação empresarial. Descobriu-se no oriente global, região do planeta de abundante mão de obra e condições de produção infinitamente melhores e mais econômicas do que aquelas existentes nos próprios locais originários de produção e consumo desta. Para lá foram transferidas unidades empresarias completas que se justificavam por essa vantagem econômica que a distância, antes intransponível, ora se supera pelo moderno transporte global. É imperiosa a alteração e transferência do resultado do trabalho, de sua produção aos destinos de uso e consumo em volumes gigantescos e cuja escala barateia novas linhas de distribuição.

Pontuando esta situação, toma-se seu principal exemplo a China, mas não o único, que encharca o mundo com todo o tipo e produtos lá produzidos que são entregues mundo a fora com preços FOB (“Free on Board”), em condições capazes de arrasar qualquer produção local. Condições absolutamente impróprias de competição e que demandam medidas difíceis de contenção desta situação.

Várias são as razões para estes resultados. Inicialmente refira-se que um país que tem mais de 1.3 bilhões de habitantes tem indiscutivelmente massa de trabalhadores disponíveis e capazes de compor mão de obra abundante com consequente redução no custo do trabalho.  Junte-se a isso a obediência e disciplina impostas pela força dos regimes políticos e pouco também por questões culturais históricas. Características estes presentes nesta região do globo e não apenas no país exemplificado.

A globalização da economia como norte competitivo impondo à produção cada vez maior especialização e qualificação, pena de quebra do negócio. Cinde-se o processo produtivo como forma dessa melhoria de atuação necessária. Entrega-se a terceiras partes não essências ou finalísticas do trabalho, àqueles que tenham estas atuações parciais como cerne da sua atividade, e, portanto, com condições de melhor fabricar, prestar serviços, compondo um todo de melhor resultado final. É a participação coletiva e seriada de várias empresas, cada uma com seu mister para atender às exigências de consumo, cada vez mais intensas.

A inafastável necessidade de aprimoramento da gestão e administração empresariais é questão de sobrevivência, não só da pessoa jurídica, mas especialmente para aqueles que de seu trabalho dependem.  A própria empresa precisa readequar-se às novas exigências de seus clientes, da sociedade, do mercado, sem os quais não tem qualquer possibilidade futura ou mesmo presente.

É assim uma realidade desafiadora, que ao lado dessas observações, maneja por igual, assento constitucional que não só evidencia a necessidade de proteção do ser humano em sua condição individual e de dignidade, e entre estes o trabalhador, mas também o adequado exercício da atividade produtiva e econômica com liberdade capaz de manter possível e viável aqueles que concedem o trabalho.

É neste cenário que foi promulgada a na Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, publicada no DOU de 14 de julho de 2017, já em vigor, e rapidamente Editada a Medida Provisória 808/17, com proposição de alterações e que no mundo da advocacia tem enorme repercussão.

A extensão e amplitude das alterações mudam o cenário trabalhista e processual trabalhista significativamente, e notadamente no que respeita à advocacia um passo importante em favor da responsabilidade.  De todos os que atuam e interferem no processo judicial e nas relações de trabalho. Empregados, Empregadores, advogados, Sindicatos, testemunhas, juízes, têm agora novas imposições que exigem destes posturas e modos de agir mais responsável ainda, no sentido da seriedade de sua participação. Muito há a avaliar e abordar nas alterações havidas, pelo que fazermos, como no presente texto, de parte dela é adequado. Trato de questões gerais das alterações e no capítulo seguinte sobre questões processuais relacionadas à advocacia, à inicial, defesa do réu e comparecimento das partes, dentre outros tantos aqui não tratados.

 

III Alguns Aspectos Gerais

 

A alteração legislativa é significativamente extensa e complexa abordando questões de direito material do trabalho, processual do trabalho e administrativo do trabalho, sendo que nada se observará acerca deste último, em nosso sentir, de menor relevância. O enfoque é de alguns aspectos do exercício da advocacia.

Isto porque são inúmeras estas alterações normativas que tratam de ajustes individuais (diretamente sobre os contratos de trabalho), de ajustes coletivos (por meio de acordos e convenções), das importantes questões da sucumbência, dos acordos extra-judicias, da arbitragem para empregados especiais, prescrição intercorrente, a nova regência na edição de súmulas, a desconsideração da personalidade jurídica, a sucessão trabalhista, o grupo econômico, o custeio da ação, a atualização monetária

Inafastável destacar o contexto em que tal se apresenta, no sentido de que se pode, sim, afirmar que se trata de verdadeira reação ao excessivo protecionismo praticado pelo Tribunais, notadamente pelo Tribunal Superior do Trabalho, deixando menor espaço adequado para partição de poderes do estado e agindo como verdadeiro legislador. Na área do direito do trabalho, percebe-se a criativa situação de uma nova “espécie” de sistema jurídico no mundo, híbrido, quem sabe, entre o sistema da Common Law e o da Civil Law (Romano-germanico). Teoricamente deveríamos no país ser conduzidos pela força normativa da lei e não pela casuística, jurisprudência ou direito costumeiro. Esta, contudo, não pode ser uma conclusão segura ou serena, uma vez que nossa CLT tem 922 artigos e no TST entre Súmulas, Enunciados, Precedentes, são mais de 1400 “normativas”!

Talvez o maior e mais evidente exemplo disto que se afirma seja o Enunciado 277, que trata da Ultratividade, quando se opõe à a regra legal expressa no sentido da vigência das normas coletivas o ser por prazo determinado! Outro exemplo impressionante é o da Súmula 244 do mesmo TST, que confere estabilidade à gestante, mesmo na típica hipótese de Contrato por Prazo Determinado, e após o vencimento do prazo neste previsto e contratado.

São apenas duas ululantes situações em que se extrapola a condição judiciária, para criar direitos afrontosamente “contra legem”, e que distorce e geram insegurança jurídica insuportável nas relações de trabalho.

Pois é neste ambiente que as históricas tentativas de atualização normativa, sempre denegadas por motivos diversos e que as regências vigentes identificavam-se dissociadas da realidade contemporânea, se apresentam as novas regras.

Quando se apresenta o espaço político que enseja reformar, ela vem sim com força e extensão. Neste cenário a discussão, por meio da advocacia, judicial das interpretações e postura profissional do procurador releva. 

São alterações no Direito Coletivo e Individual, quer material, quer processual. Todas, em princípio, protegendo o que chamamos de “núcleo duro” trabalhista da Constituição Federal, notadamente o artigo 7º. Resguardadas que foram as garantias constitucionais, o âmbito infraconstitucional domina as alterações e impõe significativas mudanças.

Aliás, importante registrar, que mal estamos interpretando a aplicação cruzada subsidiária do novo Código de Processo Civil (já nem tão novo assim), que ora conta com a novel norma de seu artigo 8º tratando da aplicação do mesmo ao processo do trabalho, e já temos outras relevantes questões a avaliar…

A importante possibilidade de distrato entre as partes e a realização de acordo extrajudicial, além do manejo da jurisdição voluntária. As dispensas individuais e coletivas. A possibilidade de utilização do importante método adequado de solução de conflitos que é a arbitragem para alguns trabalhadores (os que percebam salários superiores ao dobro do teto de benefício previdenciário), a sucessão, os grupos econômicos. A Correção dos enormes abusos praticados contra sócios retirantes definindo claramente sua responsabilidade.

No âmbito do processo a imposição de novas e importantes responsabilidades, ensejando maior seriedade ao litígio ao impor significativas mudanças nos requisitos da petição inicial. A regulação da sucumbência, da Assistência judiciária gratuita, momento da produção da defesa, as desistências, a contagem de prazos conforme já o fez o NCPC. A representação da empresa na audiência que pode indicar quem queira, pois, afinal por atos deste responderá. A presença das partes e as consequências de suas ausências, a revelia. Na audiência a questão da alteração do ônus de prova. A litigância de má fé e a penalização à testemunha mentirosa.

Em especial a simplificação da exceção de incompetência, afastando a ocorrência de malicioso ajuizamento longe da sede do local de trabalho impondo custos enormes e indevidos ao empregador que lá deveria defender-se, mas que acabava por forçar a realização de composição. A tormentosa questão do Dano extrapatrimonial, sua fixação e dimensionamento teto.

No que respeita aos recursos, o depósito recursal, o poder do relator no recurso, a transcendência do Recurso de Revista, tornaram mais técnico e de mais difícil trâmite.

A mudança relevante no procedimento de criação e alteração dos Tribunais para a formulação de súmulas, afastando a criação de direitos e obrigações não previstas em lei, estas de competência do poder legislativo. A impossibilidade geral de execução de ofício pelo julgador, garantida, contudo, nas hipóteses em que o autor não é representado por advogado. A atribuição firme de consequência ao executado com cadastramento em órgãos como SERASA e SPC, além do já vigente Cadastro Nacional de Devedores Trabalhistas, sendo que a execução, passa a ser possível de garantia por meio de seguro.  A prescrição intercorrente na execução.

Esta tentativa, por certo ineficiente e incompleta, de arrolamento da integralidade das mudanças é feita para que se tenha com clareza e certeza a nova dimensão das relações do trabalho e processo do trabalho, tudo sob a regência do advogado…

 

IV Advocacia no novo processo: Petição Inicial, A defesa e o Comparecimento das partes em audiência

 

A alteração do Título X, Capítulo II, Seção IV -A, Da Responsabilidade por Dano Processual, no artigo 793-A, B e C são a comprovação do recém afirmado, acerca da mudança de parâmetro dos litígios que ora se impõe. A firme penalização do litigante de má-fé aos titulares do litígio e interveniente é fundamental. Confesso que em mais de 30 anos de advocacia, me ressinto de haver enfrentado inúmeras, quiçá centenas de situações que como tal se configuram e que foram relativizadas, sem a devida punição correspondente.

A regência do artigo 793-A, B e C, espelham a norma processual civil dos artigos 79,80 e 81 no sentido de, com adaptação terminológica (reclamante e reclamado), trazer para o diploma que regra o Processo do Trabalho regra Processual Civil. Já compreendia a mesma como plenamente aplicada ao Âmbito trabalhista, mas que de maneira expressa se afirma. Resta aguardar firmeza na aplicação das mesmas, por quem de direito.

No que toca à fixação do valor nas causas de valor irrisório ou inestimável, contudo, diferentemente do CPC, o limite tem como parâmetro, duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, e não em 10 salários mínimos como no processo civil, abrandada, portanto, a regra importada.

A extensão expressa dessas punições à testemunha que intencionalmente alterar a verdade dos fatos ou omitir fatos essenciais ao julgamento da causa vem em boa hora. Absolutamente comum na tramitação dos feitos a ocorrência de testemunhos diametralmente opostos, o que, por óbvio evidencia que há falta de verdade nas declarações, pelo menos por das partes. Responderão civil e, quem sabe criminalmente, por falso testemunho. Tudo ensejador de celeridade, por execução nos mesmos autos (parágrafo único, do artigo 793, D.).

O alterado artigo 800 da CLT, acerca da Exceção de Incompetência em razão do lugar (territorial – “Racione loci”) traz importantíssima e simplificadora alteração nesta arguição. Em muitas vezes, irresponsavelmente distribuída a ação em foro impróprio, obrigava o deslocamento do reclamado, com as despesas correspondentes, ao foro da audiência inaugural, sem que a este devesse corresponder o processamento da ação. Funcionava como medida de indevida pressão, para indução à uma conciliação.

A apresentação prévia à realização da audiência inaugural – ato de cartório, secretaria da vara – e a adequação do procedimento pelos parágrafos que o disciplinam vem em favor da simplificação e correção do direito de ajuizar. A suspensão do processo e a garantia de nova oportunidade para a apresentação de defesa de mérito é da maior importância e assegura a aplicação da mesma.   

O artigo 840, traz alteração no mesmo sentido de responsabilização antes invocado. A alteração é da correção dos destinatários, não mais “Presidente de Junta”, nem explicitando o juiz de direito, mas agora ao juízo, ampliando ainda de reclamante e reclamado, para partes.

A significativa alteração, contudo, foi a de adjetivar e delimitar que o pedido agora deve ser “certo, determinado e com indicação de seu valor”. Obrigação inafastável que poderá determinar a extinção sem julgamento de mérito (parágrafo 3º), se descumprida. Faz mais séria e pontual a formulação da peça vestibular, imprimindo maior seriedade e segurança à peça vestibular. Deve ser apresentada em valor líquido. É sim fundamental que quem vem a juízo assim proceda, bem avaliada a pretensão e dimensionada concretamente, de modo a possibilitar a adequada formulação de defesa e exercício do contraditório. A preocupação do legislador em deixar a petição inicial mais livre, por assim dizer, é de outro tempo em que se praticavam reclamações verbais, sem a participação dos profissionais do direito. Por conta do parágrafo segundo, mantida a reclamação verbal, perdeu-se a oportunidade de afastamento dessa vetusta e quase extinta hipótese. E com razão. Os que eventualmente se aventuravam nesta auto iniciativa, eram resistidos avassaladoramente pelos adversários que invariavelmente se faziam acompanhar para atuação do profissional do direito, o advogado.

Impõe ainda avaliar a alteração no que respeita ao procedimento sumaríssimo, mantido no artigo 852 e suas alíneas (de A a I) e parágrafos. A exigência no tocante ao procedimento sumaríssimo tem como consequência a extinção sem julgamento de mérito e arquivamento do feito, com condenação ao pagamento de custas. No procedimento ordinário comum (sumário), extingue-se o/os pedido(s), também sem julgamento de mérito, prosseguindo o feito relativamente aos demais pedidos. Crê-se que há aqui o espaço para determinação de correção da inicial em despacho de caráter saneador, oportunizando correção e assegurando o devido acesso ao Poder Judiciário, constitucionalmente assegurado. As determinações ora estabelecidas são sim de natureza cogente.

A novel introdução do parágrafo 3º ao artigo 841 consolidado é norma de adequação e equilíbrio entre as partes, explicitando a limitação da desistência da ação, quando ciente e conhecidos os argumentos da defesa. Tal se apresenta como óbvia adequação.

Outra importantíssima mudança é a regra do 843, que introduz o parágrafo 3º, em assimilação à demanda civil. Contrariando entendimento jurisprudencial – a meu ver absolutamente equivocado – bem afasta a obrigatoriedade de que o preposto seja empregado do réu. Além disso, equipara a liberdade de representação ao previsto pelo parágrafo anterior, em favor do reclamante.

Nesse sentido também, a alteração ao 844 da CLT, redisciplinando o comparecimento das partes a juízo. Segue protegendo o motivo relevante, antes no parágrafo único da regra. Agrava no seu novel parágrafo 2º, no entanto, a ausência do reclamante que doravante poderá ser onerado com sua injustificada ausência. Diz-se assim porque, cautelosamente, enseja a justificação legal à ausência que é capaz sim de afastar qualquer penalidade. O não cumprimento da mesma, expressamente prevista pelo parágrafo 3º, inviabiliza nova propositura, tratado como condição da ação.

Já o novo parágrafo 4º e seus incisos, maneja a decretação do estado de revelia de forma a aludir quando não produz os efeitos da aplicação da penalidade de confissão ficta, invertendo a lógica do antes caput do 844. Os incisos I a IV explicitam as hipóteses em que há defesa por outro reclamado (I), aproveitando ao ausente, a impossibilidade dessa situação quando o litígio versar sobre direitos indisponíveis (II), vício insuperável da petição inicial (III) e incorreção de alegação inverossímil ou contrária à prova dos autos(IV).

A alteração quanto à apresentação da defesa é matéria que historicamente invoquei, no sentido de que a clara evidência de interesse em se defender pela presença do advogado munido de defesa e seus documentos, haveriam de afastar a decretação da revelia. Agora é regra, como disposto no parágrafo 5º, parágrafos antecedentes.

O artigo 847, explicita a possibilidade de apresentação da defesa escrita até a audiência, o que agora sim altera a, esta sim, regra legal, antes atropelada pela Resolução 136 do CSJT, artigo 29. Antes da alteração da CLT ora em comento, a contestação sempre foi ato de audiência, pelo que nela poderia e deveria ser produzido o ato defesa , independentemente do processo eletrônico. Sem contar com a possibilidade de defesa oral ser produzida no ato da audiência, conforme artigos 844 e 847, de duvidosa remanescência.

A alteração faz com que a defesa possa ser apresentada a qualquer momento antes da audiência, podendo ainda ser mantida sob sigilo, até seu desbloqueio pelo julgador em audiência, caso presentes as partes e desenvolvimento regular do feito. 

É de se registrar ainda que todas estas considerações estão, dentre outras, sendo postas `aprova e avalição nos litígios vigentes, e ainda claramente indefinidas.  Os próprios Tribunais não tem  esta clareza de aplicação, apesar das tentativas de uniformização , como o fez o TRT da 4ª Região ao Realizar a  I Jornada sobre a Reforma Trabalhista e que traz conclusões interpretativas – ressalte-se que nenhuma editada à unanimidade – desde  10 de novembro de 2017, daí destacando-se a Comissão 01 acerca de direito intertemporal, repercussões no Direito Material e no Direito Processual, prescrição trabalhista e  intercorrente e a comissão , sobre Acesso à justiça e justiça gratuita , honorários advocatícios e periciais, litigância de má fé e dano processual. Da mesma forma o Tribunal Superior do Trabalho agendou para fevereiro de 2018 a revisão de Súmulas e outros, com a finalidade de adequação às novas regras.

Efetivamente das questões mais tormentosas da Reforma, percebo a aplicação da lei no tempo. Incidem a todos os processos em curso? Somente aplicável aos novos? Segue-se a regra geral que alterações processuais aplicam-se a processos em curso?  em quais situações e quais os limites?  A matéria é complexa e merece artigo específico, indicando, contudo, que parece que a melhor forma de manejo seja a invocação da “teoria do isolamento dos atos”, que refere a proteção ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito com seus fundamentos.

Teremos sim ainda alguns anos de instabilidade até que se consagram as interpretações dos novos textos normativos. A avaliação da MP 808/17 pelo Congresso Nacional pode ainda trazer inúmeras alterações.

 

CONCLUSÃO

 

No presente artigo estão comentários gerais da reforma – excetuados os de direito administrativo do trabalho-  acrescentados ou modificados da CLT que estão mais diretamente vinculados à advocacia e aos noveis requisitos da petição inicial, à defesa e ao comparecimento das partes em juízo.

 É factível afirmar, portanto, que a parte processual da chamada Reforma Trabalhista, instituída pela Lei 13.467/2017 altera diversos dispositivos da CLT sem se despreocupar com a efetividade do direito fundamental de acesso à Justiça do Trabalho e os princípios fundamentais da cidadania, da dignidade da pessoa humana, do valor social do trabalho e do valor social da livre iniciativa, o que nos autoriza concluir, nesses breves comentários, que a nova lei aponta no sentido da desconstitucionalização do direito processual do trabalho.

Nesse sentido, alertamos aos que manejam e aplicam o processo- notadamente os advogados, juízes e tribunais trabalhistas para que estejam atentos para a adequada interpretação e aplicação dos novos dispositivos da CLT e não lhes pode faltar coragem e determinação para adotarem as técnicas da hermenêutica constitucional concretizadora dos direitos e garantias fundamentais, especialmente dos cidadãos trabalhadores hoje nem tão vulneráveis e hipossuficientes econômicos como no passado, mas ainda destinatários de proteção, os quais têm na Justiça do Trabalho a última trincheira para reivindicarem ou resgatarem os seus direitos lesados ou ameaçados de lesão. É necessário que nos tomemos de espírito inovador de modo a corrigir incorreções e desvirtuamentos que se apresentaram ao longo das últimas décadas.

 

VI Referências Bibliograficas

 

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  23. SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.

Grupo Econômico

André Jobim de Azevedo

 

A  matéria relativamente à consideração dos chamados Grupos Econômicos, comerciais, industriais ou de qualquer outra atividade econômica está positivada na CLT, originalmente no parágrafo segundo   do artigo segundo . Formulado assim, impunha, para os efeitos da relação de emprego, responsabilidade  solidária para a  empresa principal  e cada uma das subordinadas, mesmo tendo prestado o trabalho apenas para uma delas. Tal se justifica na real condição de controladora que empresas exercem sobre outras e consequentemente efetiva condição de decisão sobre os desígnios daquelas controladas, dirigidas ou administradas, mesmo que dotadas, cada uma delas de personalidades jurídicas próprias. É a responsabilidade passiva solidária.

A obrigação solidária institui  a possibilidade de eleição da controladora como principal responsável e portanto capaz de figurar  de pronto e em primeiro momento como  ré de eventual ação judicial de responsabilização sobre  direitos trabalhistas descumpridos. Isto fortalece a condição de cumprimento dos deveres, já que a controladora detém o controle do capital social das controladas e como tal, possuidora de condição  de saúde financeira superior àquelas. Isto reforça a efetividade  do direito buscado judicialmente que nela encontrará  suporte financeiro capaz de realizar o que sua controlada poderia não fazer. O direito de exigir da controladora , de uma,  alguma ou das  outras integrantes do grupos se dá independentemente de escolha da propositura em face de um ou outro dos devedores. Bastava a comprovação desta relação societária majoritária, que gera a referida coordenação superior , para a a efetivação da solidariedade.  

Diferentemente da subsidiariedade, a controladora pode figurar inicialmente no polo passivo de ação trabalhista e responder pela promoção judicial.

Não é de esquecer, contudo, que toda a realidade do contrato praticado pelo autor da ação e sua empregadora (que assina sua CTPS) tem sua documentação( e comprovação de cumprimento)  ancorada nesta e não na controladora. Significa dizer que acionada a controladora isoladamente  buscará trazer ao processo a devedora principal- a real empregadora –  ainda que  seja ela quem responderá  objetivamente por eventual condenação. E tal se justifica como forma de garantia dos direitos constitucionais de ampla defesa, contraditório e devido processo legal, amparados pelo artigo 5º da Carta Magna. Assim deve ser avaliada a melhor estratégia de ajuizamento ponderando as questões da celeridade nas escolhas feitas.

A mesma situação se aplica ao empregador rural, que tem lei  própria, Lei. Nº 5889/73, artigo 3º § 2º, de mesmos moldes, acrescendo a expressão “grupo financeiro rural”.

Para esse desiderato era  suficiente apenas a demonstração do liame societário controlador.

Com o advento da Reforma Trabalhista, a mais importante e profunda alteração na CLT desde a sua promulgação, a Lei 13.467/17, no entanto, a mesma alterou no particular a regra do trabalho urbano, reescrevendo o referido parágrafo segundo e acrescentando um terceiro. No parágrafo segundo concentrou  os tipos de conglomerados fazendo referência apenas a “grupo econômico”, que pretende açambarcar todas as atividades, quer comerciais, industriais. Substituiu também a referência a “personalidade jurídica própria”, por  guardar cada uma sua “autonomia’,  e que  integrem grupo econômico.

 Foi o parágrafo 3º que trouxe a alteração relevante, estabelecendo novos critérios para a consideração do  referido grupo econômico . E o fez por assertiva negativa, dizendo o que não se caracteriza como um  grupo econômico. Para tanto não basta mais simplesmente  a identidade de sócios, como vinha   reconhecendo a doutrina e jurisprudência. Agora a redação impõe “para a configuração do grupo, a demonstração do  interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e  a atuação conjunta das empresas dele integrantes”. Tratam-se de expressões abertas e que , de fato , nada esclarecem. Foi no viés liberal reformista que se pretendeu reduzir o âmbito de aplicação da norma de responsabilidade solidária à situações restritas e   que limitem esse agir e responder. O que significa interesse integrado ?  O que significa efetiva comunhão de interesses? O terceiro  acréscimo, “atuação conjunta das empresas dele integrantes” talvez possa ser o de menor insegurança, já que atos  públicos assim a demonstrariam. Não creio, contudo, que tal possa desgarrar das observações e parâmetros da redação anterior e que fundamentavam as decisões judiciais orientadas pela doutrina. Como se tratam, como dito , de conceitos amplos e abertos haverá de se aguardar a sedimentação da interpretação às alterações legislativas havidas e que inicialmente  cedem às interessadas  considerações, para se poder avançar em  avaliação mais própria das mudanças da reforma.

FGTS , Constituição Federal

André Jobim de Azevedo

 

I Introdução

 

                                    A lembrança e iniciativa dos Confrades José Cláudio Monteiro de Brito, Sandro Nahmias, e Sônia Mascaro Nascimento, bem como do colega Ney  Maranhão, coordenadores da obra em homenagem ao  querido Confrade Georgenor de Sousa Franco Filho revela  sensibilidade comum no sentido de   que nosso irmão  GEO tem reconhecimento geral. Sua inteligência, sabedoria, capacidade, trajetória pessoal e profissional são atributos de pública e notória ciência e fazem justíssima esta lembrança.

  

                                    O direito do trabalho em mudança e em voga assim impõe. Já se  passaram 30 anos da promulgação da Constituição Federal a qual constituiu-se em importante verticalização da regência trabalhista.

                                    Muitas foram as importantes normas que nela se encontram, e que antes mesmo de abordagem do tema escolhido,  destaco o papel atribuído aos sindicatos , no sentido de  permitir regulação distinta da norma legal, pela via do acordo ou convenção coletiva. Um indicativo futuro de regência das relações de emprego pelas normas coletivas.

                                    É o que costumo chamar de “flexibilização sob tutela coletiva” ou “flexibilização  sob tutela normativa”, espaço de poder e adequação normativa na formulação de regras aos contratos de trabalho. Estes e o próprio trabalho em nosso país tão diverso e distinto não tem a melhor regulação na rigidez da lei e aplicação generalizada a toda e qualquer contrato de trabalho, senão pela pontual formulação coletiva.

                                    Nesse sentido inclusive as profundas alterações havidas na CLT, por força da Lei 13.467/17, a chamada Lei da Reforma, e que prestigiam espaço normativo  não pela via legal ampla e genérica, mas normativa coletiva e individual (também obviamente legais). Em tese, com o  respeito às normas do artigo 7º da CF , mas cujo assentamento jurisprudencial e doutrinário ainda tomará algum tempo e dependerá de algumas definições  acerca dessa constitucionalidade pelo  Supremo Tribunal Federal.

                                    Para além dos titulares dos direitos materiais enormemente atualizados e alterados, a reforma trazida pela Lei 13.467/17, coloca igualmente no centro das discussões, os novos caminhos alterados para manejo de uma série de direitos praticados nos procedimentos judiciais – e ora  noutros extrajudiciais – é capaz de asseverar os novos rumos das relações de trabalho.

                                    Pois tais mudanças, recentes, ainda estão sendo objeto não só de avaliação e interpretação, bem como de hesitante inicial jurisprudência, ainda não uniformes.

                                     O que releva, nestas breves observações, é a avaliação da profunda mudança havida na proteção ao tempo de serviço e seus consectários indenizatórios quando a Constituição Federal instituiu o  regime jurídico único do FGTS a todos os empregados do país.

                                    De onde se origina, como  a CLT tratava, como a CF alterou , como leis posteriores assim referem é o que se pretende aqui abordar.

 

II  A lei  Eloy Chaves, A Estabilidade decenal,  e a CLT

 

                                    Admirável mundo novo nos cerca nesta segunda década do século XXI. É surpreendente o que, por vezes não percebemos, mas é a atual realidade. A evolução dos meios de transporte e de comunicação parecem ter-nos levado a este estado de coisas. Vivemos a era da tecnologia e da velocidade. Para tudo. Comunicamo-nos com inimaginável rapidez e somos capazes de atingir a qualquer localidade do globo em questão de horas. Assistimos fatos, onde quer que eles aconteçam, segundos ou minutos após sua efetivação, em vivas reproduções filmadas e sonorizadas, muitas vezes ao vivo. O mundo parece pequeno. As redes sociais estão aí para comprovar.

                                    Essa condição que nos cerca nos faz partícipes desse cenário contemporâneo não como meros expectadores ou testemunhas, mas verdadeiros atores e protagonistas.

                                    Ao mesmo tempo perderam-se as referências antes vigentes relativas às grandes nações, aos grandes líderes, às instituições, às tradições, às profissões, aos partidos políticos, às agremiações. O centro do mundo passa a ser o indivíduo, como auto-referência, convivendo com a enorme diversidade e pluralidade evidentes no mundo contemporâneo. As noções de destaque social efêmeras e calcadas nas mais diversas superficiais situações e diluição ou fragilidade de lideranças capazes de bem estimular visões mais próprias da corrente atribulada vida atual.

           

                                    A vida realmente está diferente e o mundo em constante mutação. Decorrem daí significativas alterações no cenário econômico e nele o mundo do trabalho.

                                    As relações de trabalho que compõe estas observações por certo também são bastante distintas daquelas que historicamente manejamos. Por igual os sujeitos sociais e sujeitos econômicos desse processo produtivo igualmente distinguem-se.

                                    Atribuo à essa novel condição produtiva e mercadológica alterações patentes na sociedade e necessariamente em seus sujeitos – incluídos os  não econômicos, onde causa e efeito se confundem.              

           

                                    As relações econômicas até a bem pouco tempo atrás eram restritas, limitadas e envolviam números muitíssimo menores de sujeitos. O mundo cresceu e ao mesmo tempo tornou-se menor.  O mundo do trabalho tem direto reflexo da nova realidade.

                                    A extensão e amplitude das alterações mudam o cenário trabalhista significativamente e vêm iniciadas desde a promulgação  da carta constitucional.

                                    A  temática da Estabilidade decenal é , no entanto , bastante antiga e diretamente ligada ao FGTS instituído pela CF/88 como um direto de todos.

                                   

                                    A importante Lei Eloy Chaves, publicada em 24 de janeiro de 1923, foi inovadora. Consolidou a base do sistema previdenciário brasileiro, com a criação e unificação das Caixas de Aposentadorias e Pensões para os empregados das empresas ferroviárias. Após a promulgação desta lei, outras empresas foram beneficiadas e seus empregados também passaram a ser segurados da Previdência Social.

                                    O que releva no particular, contudo é que a mesma institui em favor dos ferroviários a “estabilidade decenal”, e que  posteriormente estendida a outras categorias, proteção ao tempo de serviço proibindo a despedida imotivada para aqueles que houvessem prestado serviços ao mesmo empregador por  dez anos .

                                    Um conquista significativa para a categoria ( ferrovias já foram sim fundamentais em nosso enorme país) que pôde obter proteção contra a despedida sem justa causa e que foi acolhida  pela CLT, ampliada, pois a todos os empregados do país, compondo o capítulo  VII, artigos 492 /500 , além dos artigos indenizatórios correspondentes , quando a despedida pudesse acontecer aos não estabilitários.

                                    Instituto controvertido e muitíssimo discutido, tinha observações antagônicas a seu respeito. Trabalhadores o saudavam e viam o momento da aquisição deste direito como   importantíssimo para a continuação serena do contrato de trabalho, já que retirava de suas cabeças a “espada de Dâmocles”, da ruptura imotivada do pacto laboral. A partir de então poderia  trabalhar com mais tranquilidade e segurança. Empregadores não aceitavam a restrição ao seu poder de comando, com a proibição legal de despedida potestativa, limitação ao seu poder-dever de administrar a força humana de sua atividade, com perda de produtividade e engessamento da  administração do contrato de trabalho.

                                    Versões opostas, que enfrentavam a desconstrução real do instituto, na medida em que frustrada a sua aplicação por conta da despedida em momento imediatamente antecedente ao alcance do decênio  da estabilidade. Os empregados eram despedidos na expectativa temporal de adquirir este direito, às vésperas de sua incidência e eram indenizados na forma da CLT…

                                    Em meados da década de 60, o Brasil deu-se conta de que não tinha ainda autossuficiência econômica e estrutural capaz de organizar o desenvolvimento e estruturação de um gigante país com enorme território nacional.

                                    À necessidade de estabelecimento de situações básicas de infra–estrutura e moradia social faltava capital capaz de assim alavancar o país. E o  capital estrangeiro seria a solução para tanto, mas que resistia a aqui investir diante da limitação administrativa do manejo dos trabalhadores por conta da estabilidade decenal, maneio empresarial que  desagradava e desestimulava.

                                    Como então compor nossa necessidade pátria de suporte para o desenvolvimento e ao mesmo tempo ser atrativo ao Capital estrangeiro que  a financiaria, mas que , repita-se, não admitia a limitação estabilitária no manejo da mão de obra?

                                    Não seria possível a simples revogação de tais regras, por conta, justamente de sua importante consideração histórica de conquista dos trabalhadores e que se constituiria em revés a todo um sistema de proteção laboral ancorado na CLT.

                                    Não se perca de vista que, talvez a maior crítica à regra celetista, seria facilmente frustrável pelo empregador, bastando  tomar a iniciativa  rescisória imotivada antes da chegada dos 10 anos….

                                    Pois é neste ambiente que é editada a Lei 5.107/66, a lei básica do FGTS ( e que a ela se agregaram algumas outras leis esparsas relativas ao  mesmo  objeto) uma regência alternativa ao sistema protetivo da CLT ( estabilidade + indenização).

                                    O FGTS nasce como uma alternativa, um sistema opcional, àqueles que assim o desejassem , com proteção ao tempo de serviço  pela via da acumulação de contribuições obrigatórias do empregador à conta do  Fundo dos empregados que houvessem feito a escolha (conta vinculada). Além da constituição de uma poupança compulsória para os tempos de aposentadoria, da titularidade do trabalhador – hoje inclusive impenhorável por lei -previa imposição de multa rescisórias na hipótese de rescisão imotivada. Além de outras possibilidades de movimentação conforme previsse a Lei.

                                    Esta opção pelo então novo sistema, tinha o significado de renúncia à proteção celetista no particular, pelo que a lei impunha manifestação  formal no sentido (diferentemente da regra legal do contrato de trabalho), sem o que não atingiria eficácia  qualquer adesão ao FGTS.

                                    Tratou-se de sistema bastante interessante que  ao mesmo tempo que abria possibilidade de um novo modo  de proteção ao tempo de serviço, mantinha – por garantia constitucional – o direito daqueles que o haviam adquirido, da proteção celetista , inclusive a própria estabilidade.

                                    A realidade evidenciou que essa opção passou a ser a regra esvaziando – mas mantendo a proteção ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito –  significativamente o instituto da estabilidade decenal, indenizações previstos pela CLT.

                       

III  A Estabilidade decenal – Pequeno  Histórico – Alteração Constitucional- FGTS direito de Todos

                                    Passam os anos e o período  da ditadura militar, e o país  passa a respirar ares de democracia, recebe de volta exilados políticos e convoca uma assembleia nacional Constituinte.

                                    A retomada de um país livre, organizado e democrático tem a realização de uma nova Constituição como um pressuposto e assim foi feito.

                                    Em outubro de 1988 foi promulgada a chamada “Constituição -Cidadã”, com alterações significativas na ordem jurídica e também no direito do trabalho, notadamente concentradas – no âmbito do direito individual do trabalho – no artigo 7º.

                                    Foram duros embates doutrinários, ideológicos entre forças sociais distintas e opostas, que impuseram enorme âmbito de negociação até atingir-se a forma e definição do artigo 7º da CRFB.

                                    A alteração normativa foi significativamente extensa e complexa abordando questões variadas.

                                    Não sem antes algumas pequenas e importantes referências históricas.

                                    Citado em várias de suas obras ( razão pela qual não se refere obra específica) o Sérgio Pinto Martins refere que já em 1934 os constituintes previam um fundo de  reserva de trabalho, uma certa garantia de  salário n a hipótese de desaparecimento da empresa empregadora, conforme Projeto de Constituição encaminhado para a Assembleia Constituinte, em seu artigo 124,§ 5º. Foi criado ainda um fundo de indenizações trabalhistas, pela Lei 3.470/58, impondo cota inicial de 3% sobre toda a remuneração mensal bruta do empregado.

                                    A Constituição de 1967, em seu artigo 158 previa, além de outros direitos, no inciso XIII, estabilidade com indenização ao empregado despedido, ou fundo de garantia equivalente.

                                    A Emenda constitucional 1 de 1969, no artigo 165, inciso XIII, manteve a previsão.

                                    Criado pela Lei 5.107/66 o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, veio com o um sistema opcional, em tese equivalente  ao regime de estabilidade com  indenização por tempo de serviço, equivalência essa jurídica e não econômica, conforme cristalizou a Súmula 98 do TST, inciso I.

                                    Alei previa ainda prazo para a opção pelo FGTS, que deveria dar-se  em 365 dias a partir de sua vigência para os contratos em curso e quando da admissão par aos novos empregados contratados a partir de então. Possibilitava ainda por ele optar, a qualquer tempo mediante homologação da Justiça do Trabalho.

                                    Tratava-se de manifestação de vontade formal que deveria ser exercida por escrito e notada em sua CTPS e ficha registro.

                                    Na busca de equivalência econômica, estabeleceu multa prevista no artigo 6º quando,  ocorrendo rescisão do contrato de trabalho, por parte da empresa, sem justa causa, ficará esta obrigada a depositar, na data da dispensa, a favor do empregado, importância igual a 10% dos valores dos  depósitos, da correção monetária e dos juros capitalizados na sua conta vinculada bancária, do período em que trabalhou na empresa.               

                                    Obrigou as empresas a depósitos, até o dia 20 de cada mês, na referida conta vinculada bancária  importância correspondente a 8% da remuneração parta no mês anterior a cada empregado optante ou não. Estas contas eram abertas para os empregado optantes em seu nome, ou em nome da empresa, mas individualizada cm relação ao empregado não optante. A lei assegurava este direitos aos empregados do período posterior à opção pelo novo sistema.

                                    O período anterior, para aqueles empregados que já tinham à época contratos em andamento, e que tivessem rescindidos seus contratos imotivadamente, de acordo com as regras da CLT, previstas no Capítulo V, do Título IV. Para os que contassem com  dez anos ou mais de serviço, na forma prevista pelo  artigo 497 da  mesma CLT. O valor dessa indenização do tempo anterior à opção deveria ser  depositado  complementarmente pela empresa na conta vinculada do empregado, conforme artigo 16º em seu parágrafo 1º.

                                    Era o  parágrafo segundo que dava a possibilidade de a empresa a qualquer tempo desobrigar-se  da responsabilidade de indenização relativa ao período anterior depositando o valor correspondente .

                                    Da obrigação igual de depósitos mensais ao empregado não optante, tratou o artigo 17 da redação original da Lei 5.107. Se houvesse  indenização a ser paga , a empresa poderia utilizar o valor do depósito, até o montante da indenização por tempo de serviço. Se não houvesse indenização a ser paga         ou se estivesse prescritos os direitos,  poderia levantar em seu favor os saldo da respectiva conta individualizada – não vinculada – .

                                    Este mesmo artigo previa que a conta não vinculada – do não optante, individualizada e dispensado  sem justa causa antes de  completar um ano de serviço , reverteria em seu favor. Se despedido por justa causa, reverteria em favor do FGTS.

                                   

                                    Alterações posteriores houve, pelo Decreto-lei 20 de setembro de 1966, constando , dentre outras,  a impossibilidade de retratação à opção se houvesse transacionado o período anterior, retratação esta prevista como possível anteriormente. Alterou também o prazo para realização dos depósitos, para o dia 30 de cada mês.

                                    A lei 5.958 de 1973 dispôs sobre a possibilidade de opção retroativa, assegurando aos empregados que não tinha feito a opção, de realizar esta  retroagindo a  1º de janeiro de 196 ou à data da admissão se posterior àquela, subordinada À concordância do empregador. Para os que contassem com dez anos de serviço ou mais, limitava-se à data em que completou o decênio na empresa.

                                    A   Lei 6.858 de novembro de 1980 tratou do pagamento do FGTS aos dependentes do empregado falecido.

                                    Aos diretores não empregados, facultou-se igualmente o  sistema do FGTS pela Lei  6.919 de junho de 1981.        

                                    Com a Constituição Federal de 1988 o FGTS passou a ser previsto como direito dos trabalhadores  urbanos e agora aos Rurais.

                                    A lei 7.839 de outubro de 1989, regulou o FGTS , mas foi rapidamente reforçada pela  atual Lei  8.036 de maio de 1990, a qual , entre outros  e em alguma medida operando a transição dos sistemas, asseverou o  direito adquirido aos já estabilitários, bem com  a aplicação da CLT  aos não ainda estabilitários, a possibilidade de desobrigação da indenização do tempo desserviço anterior mediante depósito do valor correspondente à  essa mesma indenização, a possibilidade de transação limitada a 60% da indenização prevista, bem como à opção retroativa ( matéria esta final tratada pela OJ Transitória 39 da SBDI-I do TST).

                                    Foi o Decreto 99.684/90 que regulamentou a referida Lei 8.036/90.

                       

                                    No que respeita ao FGTS, instituído com o um direito de todos pela Constituição Federal de 1988, em seu inciso III  previsto, foi e é de  de enorme significado.

                                    Foi assim conceituado pelo  artigo 2º da Lei 8.036/90: “ o FGTS é constituído pelo saldos  das contas vinculadas a que se refere esta Lei e outros recursos a ela incorporados, devendo ser aplicados com atualização monetária e juros, de modo  a assegurar a cobertura de suas obrigações.”

                                               Sergio Pinto Martins assim o conceituou ( in  Martins, Sergio Pinto. Manual do FGTS. São Paulo: Malheiros, 1997.p.46) : … um depósito  bancário vinculado, pecuniário, , compulsório, realizado pelo empregador em favor do trabalhador, visando a formar uma espécie de poupança para este, que poderá ser sacada nas hipóteses previstas em lei, além de  se destinar ao financiamento para aquisição de moradia pelo Sistema de Financiamento da Habitação”, evidenciando não somente a finalidade de proteção ao tempo de serviço do empregado, como também sua finalidade social à moradia popular.

                                    Essa nova condição do FGTS como o direito constitucional único na proteção ao tempo desserviço, terminou por dar o golpe fatal na estabilidade decenal. Como a partir de então o FGTS  passa a ser a regra da proteção ao tempo de serviço, deixa de existir a antiga opção pelo mesmo, bem como a própria estabilidade. Novamente mantida a tradição constitucional de respeito ao ato jurídico perfeito e ao direito adquirido.

                                    Mas como ora em 1988 foi possível a eliminação daquele histórico e geral direito à estabilidade, tão duramente conquistado e apenas relativizado em 1966 com a lei básica do Fundo?

                                    Pois esta significativa mudança  deu-se mediante negociação de outros direitos correlatos  já constitucionalmente previstos e  outros prometidamente  a serem  concedidos. Discussões essa duras entre interesses diversos promovidos por empregados e empregadores e suas entidades sindicais representativa, recomendando-se  e remetendo-se ao leitor aos Anais da Constituição Federal, onde encontram-se  documentados.

                                    O Caput do artigo 7º assevera os direitos lá elencados, “além de outros que visem à melhoria de sua condição social”.

                                    De pronto a instituição do FGTS como regime legal, fez incluir novel e importante direito relativo à rescisão contratual, qual seja, o direito ao seguro desemprego, que foi rapidamente regulamentado e hoje compõe direito trabalhista contemporâneo inafastável.

                                    Mas já no inciso I, dispôs que haveria proteção à relação de emprego contra a despedida arbitrária ou sem justa causa. Proteção essa definida como de caráter econômico – “que preverá indenização compensatória” , nunca proibindo o ato potestativo do empregador. Previu ainda “outros  direitos”, tudo a ser estabelecido por meio de Lei Complementar.

                                    Por óbvio  de fato pouco avanço e alguma perspectiva, mas que assim não seria possível tamanha mudança, se não houvesse sido estabelecidas disposições constitucionais transitórias. Aí justamente o artigo 10º dos  ADCT que estatuiu, que  “até que  seja promulgada a Lei Complementar a que se refere o artigo 7º , inciso  I da Constituição”, I “fica  limitada a proteção nele referida ao aumento para quatro vezes, da porcentagem  prevista na no artigo 6º caput  e§ 1º da Lei nº 5107, de 13 de setembro de 1966 “.

                                    Como previsto  a proteção  foi econômica, encarecendo sobremaneira o a despedida imotivada, mas sepultando de vez a estabilidade decenal.

                                    O FGTS constitui-se na maior conta de valores em um único título do país e que deveria adequadamente, além de proteger o trabalhador, ser o suporte para as tão necessárias  questões de infraestrutura, saneamento básico e moradia que nele se financiam, mas que  ainda assim não atingem seu desiderato.

                                    Generalizando, pode-se  afirmar que a  superveniência da Lei 8036/90 ( e posteriores) veio no sentido de modernização do Sistema fundiário, por exemplo passando por um conselho curador, informatização do sistema, entre outros avanços.

 

IV Desdobramento infra constitucional

 

                                    À  alteração constitucional, contudo não havia sido- até recentemente – editada a prometida Lei Complementar        , do artigo 7º, inciso I da CF.

                                    Valendo-se do espaço constitucional  acima referido foi Editada a LC 110/2001. Dela se esperava que regulamentando a disposição constitucional que previsse “indenização compensatória dentre outros direitos”. Não foi este, no entanto, o objeto da  Edição Legislativa Complementar.

                                    A nova lei  incrementou a obrigação do empregador, relativamente às contribuições mensais e ao percentual rescisório , sem  que qualquer centavo fosse diretamente alcançado ao trabalhador…

                                   

                                    Instituiu esdrúxulas contribuições sociais, autorizando  créditos de complementos de atualização monetária em  contas vinculadas do FGTS, cuja finalidade, insisto, não beneficiou diretamente o trabalhador.

                                    

                                Foi instituída contribuição social devida pelos empregadores em caso de despedida de empregado sem justa causa, à alíquota de dez por cento sobre o montante de todos os depósitos devidos, referentes ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS, durante a vigência do contrato de trabalho, acrescido das remunerações aplicáveis às contas vinculadas, isentados os empregadores domésticos.

                                    Ainda instituiu contribuição social devida pelos empregadores, à alíquota de cinco décimos por cento sobre a remuneração devida, no mês anterior, a cada trabalhador.

                                    Traduzindo, passou o empregador a depositar mensalmente alíquota de FGTS de 8,5% e multa rescisória de 50%, mas com finalidade distinta daquela de atribuir direitos sociais.

                                    Pois tal decorreu de solução de forma de cumprir decisões do Supremo Tribunal Federal, que determinavam a recomposição dos valores do FGTS, os quais, por dois desastrados planos econômicos  da década de 90,  deixaram de atualizar adequadamente  as enormes quantias lá depositadas,  tendo sido o prejuízo reconhecido nas decisões supremas.

                                    Quem arcaria com a recomposição dos depósitos existente nas contas do FGTS? Empregados não tinham qualquer responsabilidade neste aspecto. Empregadores arguiam que ao tempo da exigência das obrigações (depósitos mensais e multa rescisória) atenderam à regra legal vigente quanto aos percentuais de depósitos mensais e multa e, portanto, nenhuma obrigação econômica remanescia.

                                    Assim é que a criativa solução veio através da previsão legal constitucional da LC, mas desvirtuando a finalidade prevista pelo legislador constituinte.

                                    Aumentaram as obrigações dos empregadores para  reparar erro governamental que historicamente deixou de adequadamente corrigir os depósitos do FGTS, sem atingir, entretanto o desiderato do comando constitucional.

                                    Assim foi sendo feito, até que, passados alguns anos, e sem as devidas informações acerca de que montantes haviam sido recompostos ao FGTS e o que  faltaria para cumprir as decisões do Supremo, se é que que algo faltava,  até uma certa percepção de que  já atendidas, dever-se-ia retornar aos  percentuais  anteriores de cumprimento das obrigações fundiárias… 

                                    Às tentativas administrativas de identificar valores suplementarmente depositados e saber do atendimento  final das determinação es da LC, não se obteve qualquer dado ou informação segura, levando inúmeras entidades de representação nacional a promover ações no STF para suspender os efeitos da  LC.

                                    Duas delas remanescem: A Medida Cautelar na ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5051- Distrito Federal, e o Recurso Extraordinário RE 878313, o qual teve o reconhecimento de repercussão geral à questão constitucional suscitada, nos seguintes termos de ementa:

“ CONTRIBUIÇÃO SOCIAL – ARTIGO 1º DA LEI COMPLEMENTAR  Nº110/2001- FINALIDADE EXAURIDA- ARTIGOS 149 E 154, INCISO i DA CARTA DE 1988 – ARGUIÇAO DE  INCONSTITUCIONALIDADE SUPERVENIENTE- RECURSO  EXTRAORDINÁRIO  – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA: Possui repercussão geral a controvérsia relativa a saber se , constatado o exaurimento do objetivo – custeio de expurgos inflacionários das contas vinculadas ao Fundo de Garantia do Tempo de  Serviço- em razão do qual foi instituída  a contribuição social versada no artigo 1º da Lei Complementar 110, de  29 de junho de 2001, deve ser assentada a extinção do tributo ou admitida a perpetuação da cobrança ainda que o produto da arrecadação seja destinado a fim diverso do original.”

                        Em consulta processual do mês de outubro de 2018, mantém-se em igual  andamento os procedimentos referidos.   

                        Resulta, pois que, por força dessa determinação do STF, vigente, retornamos hoje aos percentuais pós  Carta de 1988, de depósitos mensais de 8,0% e multa rescisória de 40%.

 

CONCLUSÃO

 

            No presente artigo estão comentários acerca do importante direito ao FGTS a todos atribuído por força da norma do artigo 7º , II da  Constituição Federal.

                        A sua incorporação aos direitos sociais constitucionais, com a consequente eliminação da estabilidade decenal.

            Tal resultou possível, por conta da atribuição na Carta Magna de outros direitos e promessas de fazê-lo (e a LC 110/01 não o fez). Foram eles o seguro desemprego, devidamente regulamentado por lei, o  quadruplicar da multa rescisória sobreo FGTS ( Art. 10 ADCT, I, CF).

            Após  distorcida edição de  LC, na forma prevista pelo artigo 7º I, da CF, recompostos os valores do FGTS, como determinou o STF, estamos  no aguardo do julgamento de mérito das ações, mas protegidos por conta do vigente  reconhecimento de repercussão geral à discussão sobre a constitucionalidade da mesma, cumprida que está, passados mais de 15 anos de sua edição.      

                        Renovo o prazer em homenagear o Confrade Georgenor de Sousa Franco Filho, figura humana e profissional impar e querida que mora em nossos corações!

 

DIREITO DO TRABALHO, CONSTITUIÇÃO E EFETIVIDADE

Me. André Jobim de Azevedo
Guilherme Luiz Thofehrn Osório

 

INTRODUÇÃO

O tema em exame é de ímpar atualidade e importância, porque, quando se comemora o 20º aniversário da Constituição Federal do Brasil se nos impõe uma reflexão sobre sua regulação e influência nas relações de trabalho. Trata-se de verdadeiro desafio avaliar as mudanças com ela havidas, e as condições de sua regência sobre a matéria, como também o processo do trabalho à luz da efetividade dos direitos judicialmente buscados.

Vivemos em período de muitas reformas, entre elas, a trabalhista, a previdenciária, já praticamente encerrada, a tributária, ainda  não concluída e sujeita à alterações, a política, a sindical, a judiciária etc.

A mudança, no momento histórico de que somos testemunhas e ao mesmo tempo atores, é inegável, ainda que muitas vezes disso não nos apercebamos por estarmos nele diretamente envolvidos.

O país atravessa situações políticas, econômicas e institucionais delicadas, mais recentemente tratadas por verdadeira reorganização nacional, que seja capaz de rever a insuportável condição de pobreza em que vive a esmagadora maioria da nossos cidadãos, trazendo à socialização um enorme contingente de marginalizados.

Com essas reformas, pretende-se colocar o país nos trilhos da produção, da melhoria das condições de vida das classes menos favorecidas, do fortalecimento das instituições nacionais e da sua inserção em um novo ambiente e expectativa na ordem internacional.

O mundo mudou. Há muito não é mais o mundo da época da Revolução Industrial e dos mesmos problemas sociais que deram azo ao surgimento do Direito do Trabalho, período no qual o mundo se rendeu à necessidade de uma especialização jurídica própria ao atendimento de questões relativas ao trabalho e que não mais se afeiçoavam ao Direito Civil e Direito Comercial, fundamentalmente, exigindo uma nova visão jurídica capaz de compreender e regular essas relações nascentes. Não era mais possível a visão liberal clássica, consagrada pelos ideais defendidos pela Revolução Francesa, de liberdade plena para o ser humano, e que para o mundo do trabalho significaram um verdadeiro desastre.

Assim, surgiu o Direito do Trabalho, buscando a regulamentação do trabalho à luz das necessidades  e das dificuldades da época, cujas condições e fatos se alteraram profundamente.

Somos a sociedade que assiste a guerras e a atentados terroristas ao vivo, na tela da televisão. As distâncias não mais separam os povos. Os meios de transporte cada vez mais eficientes redimensionam o ir e vir. A informação tornou-se um dos mais preciosos bens  de nossa época.

As relações entre os países soberanos da chamada Comunidade Internacional são cada vez mais intensas e, na área econômica, decisivas.

O encurtamento da distâncias é evidente. Tudo isso levou ao que se costuma chamar de Internacionalização ou Globalização dos meios de produção e da mão-de-obra. As formas de produzir se alteraram: são as autônomas linhas de produção, com volume de maquinário elevado e baixo capital humano; a robótica e as máquinas em geral a substituir a mão-de-obra humana.

O Direito do Trabalho guarda íntima relação com todas essas atuais e inacabadas ocorrências, aqui apenas exemplificativamente expressas.

A verdade é que, na ordem internacional, procura-se o país onde se possa produzir a menor custo, de modo a fabricar em qualquer localidade do globo um produto para ser vendido em todos os cantos do mundo.

Com isso, buscam-se mercados onde o custo de mão-de-obra, dentre outros aspectos, seja capaz de formar preço competitivo em nível internacional. No caso pátrio, estamos  inseridos nessa inegável realidade e é nela que precisamos atuar.

 

DA INTERVENÇÃO ESTATAL NAS RELAÇÕES DE TRABALHO

 

No Brasil, ainda se faz necessária a intervenção do Estado nas relações de trabalho, de vez que fortemente  marcadas pelo histórico desequilíbrio de forças que fez surgir o Direito do Trabalho, ainda contemplando o hipossuficiente nessa relação que precisa contar com o apoio do Estado.

Nesse sentido, historicamente,  desenvolveu-se a nossa especialização laboral, sendo marcada por forte intervenção Estatal, ao ponto de considerá-la presentemente demasiada e insuportável.

A CLT, como base representativa dessa indevida e condenada – por sua intensidade – intervenção no contrato privado de emprego tem sido o alvo desse descontentamento. Cumpre lembrar que a Consolidação teve forte influência do Sistema Corporativista Italiano, de forte acento fascista, e que, editado em 1943, vem sendo, desde então, fortemente torpedeado.

Posta, ainda que brevemente, a cena atual em nosso Direito, e estando a sociedade ansiosa por mudanças, está o ponto central de nossa abordagem: a  Reforma Trabalhista.

Duas são as induvidosas necessidades de reforma: a redução da intervenção legislativa do Estado e, por outro lado, o fato de que deve garantir a efetividade das normas existentes e aplicáveis, sejam elas legais ou convencionais.

O Estado deve reduzir sua intervenção legalista no Contrato de Trabalho, mas por outro lado é fundamental que o Estado exerça com mais intensidade sua atribuição essencial, qual seja, a garantia da efetividade daquilo que está regrado, na lei ou no contrato, a fim de que haja segurança jurídica e paz entre a comunidade.

Quanto à liberdade de avenças laborais, fundamental é a garantia de efetividade do direito estabelecido entre as partes. Assim, antes de pensarmos em desregulamentação do Direito, especialmente do Direito do Trabalho, é preciso ter-se certeza de que o direito aplicável será executado pelo Estado, que só exerce seu papel quando garante a segurança jurídica.

A matéria relativa ao  processo do trabalho positiva-se na CLT, que trata do processo do mesmo com bastante detalhe, mas que, em  adequado e devido direcionamento, explicita, no artigo 769[1], o Direito Processual Comum como fonte subsidiária ao Direito Processual do Trabalho.

O processo do trabalho, fruto do exercício jurisdicional da especializada matéria trabalhista, tem matizes próprias, mas que se fundamentam no antigo direito processual civil, ou, como chamado pela CLT, direito processual comum.

Não é, pois, possível qualquer abordagem  adequada sem que se façam previamente algumas considerações introdutórias sobre o mesmo. 

A solução das controvérsias originariamente em tempos de auto-composição dos conflitos entre os homens se dava pela Lei de Talião, a aplicação do “olho por olho, dente por dente[2]. A supremacia do império da força, no entanto, foi  incapaz de manter a paz social.

A intervenção do Estado – substitutiva ao particular na solução conflitos – avançou na tentativa de melhor responder às necessidades de relacionamento e proteção dos cidadãos.

 

DA INTERVENÇÃO PELO PROCESSO

 

Proibida a reação privada imediata como regra, a jurisdição se apresentou como melhor forma de definir o direito  (juris et dictio).

Monopólio do Estado na solução dos conflitos, essa evolui para além da  simples atribuição do Direito a quem o tenha, para alcançar coercitividade de execução no cumprimento de suas decisões.

 A jurisdição se afirma como necessidade de fazer valer na prática o regramento prévio e teórico instituído pelo direito em determinado sistema jurídico. É a aplicação  in concreto das normas jurídicas. Dizer e fazer – julgar e realizar a solução das controvérsias. Atuar no sentido do conhecimento das demandas e execução das decisões e julgamentos.

O caminho socialmente evoluído, civilizado e aceitável é o processo, já que por vias próprias não mais é possível a implementação de soluções.

O processo judicial tem missão nobre e assim deve ser adequadamente disposto e regrado como forma de proteção à cidadania, afastando a barbárie da convivência social, pois esse instrumento de realização do direito material é a via própria para manter a convivência social harmonizada, também em sede de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho.

Não parece, no entanto, que o mesmo se tenha  perfectibilizado por completo à vista da ausência de efetividade escancarada e que não se limita ao ambiente pátrio.    

É célebre a notável as lições do processualista italiano Chiovenda no sentido de que o processo deve dar a quem tem um direito tudo aquilo e precisamente aquilo que tem o direito de obter.

Assim, deve ser  direito de todos a  utilização do processo (instrumento da jurisdição) na busca, no dizer de Carnelutti, “da justa composição da lide[3]. A solução da controvérsia, na melhor condição possível.

O Direito Processual, como ciência autônoma, se fortalece e ao mesmo tempo necessita de proteção. Ação do Estado para que cumpra seu mister relativamente a todo aquele que dele necessitar, garantindo essa possibilidade como um direito amplo que a todos beneficie.

Cercado de complexos estudos científicos, o Direito Processual Civil é servido por normatização positivada de toda a ordem, bem como de firme principiologia que o instrui e fundamenta.

Nesse sentido, finalizando estabilizar e bem orientar a solução das controvérsias, a codificação é caminho importante, mas nem sempre estável o suficiente.

O direito material do trabalho, matéria especializada cujo surgimento decorre das significativas mudanças na forma de prestar o trabalho a partir da revolução industrial, fez com que, para solucionar as controvérsias, também fosse criada justiça Especializada do Trabalho.

Importantes experiências nacionais contribuíram para a sua factibilização, podendo-se referir aos Tribunais Rurais em São Paulo, no ano de 1922, às  Comissões Mistas de Conciliação no ano de 1932.

Foi a Constituição Federal de 1934 que, pela primeira vez no pais,  previu um órgão administrativo de solução de controvérsias laborais, o qual, naqueles moldes, se constituía em órgão administrativo, integrante, pois, do Poder Executivo da República.

Já a Constituição Federal de 1937, renovando a referência constitucional anterior, ainda em moldes administrativos, instituiu a Justiça do Trabalho, ensejando que o Decreto 1237, de 1939, a constituísse. Foi, no entanto, apenas no ano de 1941 que a mesma foi instalada.

Coube à  Constituição Federal de 1946 – destacada pelo realce de matéria trabalhista, que incluiu em sua páginas  – qualificá-la, tornando-a órgão integrante do Poder Judiciário, com os consectários próprios ora de um órgão judicial, com feição de Poder. A CLT apresenta a regência da ação reclamatória trabalhista, mas ainda e sempre com possibilidade de suporte por parte do Direito Processual Civil.

Inúmeras foram as tentativas de criação de um Código próprio, de um Código Processual do Trabalho e que nunca foram realmente dotadas de interesse político em sua criação.

Exemplificativamente, em 1992, tivemos oportunidade de relatar o estudo sobre o Anteprojeto de Código de Processo do Trabalho do Colendo Tribunal Superior do Trabalho elaborado pela Comissão do Fórum em defesa da Justiça do Trabalho, que inclusive foi publicado por editora trabalhista (Anteprojeto de Código Processual do Trabalho / André Jobim de Azevedo, Relator, Dirson Solano Dornelles, Ricardo Carvalho Fraga – São Paulo : LTR, 1992), e que  examinava os  projetos elaborados pelos Ministros  Carlos Alberto Barata  Silva e José Luiz Vasconcellos. Seis longos meses de Trabalho e que não levaram a lugar algum.

Sempre se considerou, não sem razão, que a regência da  CLT não era completa e, portanto, em inúmeras ocorrências, incapaz de regrar uniformemente os processos judiciais de sua competência, ensejando a que cada Juiz do Trabalho  desse sua interpretação  e aplicação quando levantadas certas questões no curso da ação. A insegurança jurídica e processual, especificamente pela ausência de orientação uniforme e segura, é mal que prejudica ao processo trabalhista.

Importante caminho o da legislação ordinária, que, entretanto, por si só, não é capaz de realizar tão majestosos objetivos, especialmente em sistemas e regimes jurídicos e políticos menos estáveis. Ocorre que o procedimento de produção legislativa pela via ordinária é notoriamente instável, no sentido de que basta edição de outra norma ordinária para que a matéria tenha seu rumo alterado, gerando insegurança e instabilidade, quer quanto ao próprio direito processual, quer quanto à proteção da qual se incumbe o Estado e à qual se obriga.

Nesse sentido, a existência e a aplicação de princípios retaguardam a correta condução do processo e de alguma maneira dão ao sistema maior confiabilidade.

 

DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DE DIREITOS

 

Por conta dessa inegável realidade, o sistema brasileiro acabou  estendendo ao processo civil uma estratégica utilizada em outros ramos do Direito, como o Direito do Trabalho, qual seja,  a constitucionalização.

Em nosso sentir, não significa apenas, e quem sabe, um desvirtuamento da finalidade e formato constitucional, mas acima de tudo uma saída, um clamor em alta voz  a uma condição mais segura. Um apelo a uma sedimentação e estabilidade maior desses direitos verticalizados, que é própria das Constituições Federais.

Em um país como o Brasil, onde por mais de 20 anos existiram regimes autoritários e ditatoriais, alguma tolerância deve ter-se dessa, por nós chamada, atecnia constitucional. A hesitação e mutação legislativa, ao sabor dos interesses, causou trauma, ensejando, na primeira oportunidade de redemocratização do país e formulação de Carta Constitucional, a construção quase ordinária desse diploma orientador maior que é a Constituição Federal.

Prova maior disso são os direitos trabalhistas inseridos na Constituição, notadamente aqueles previstos pelo artigo 7º da Carta, que, em muito, repetem normatização infraconstitucional[4].

Aqui se concentra a crítica ao excessivo detalhismo e particularização da Carta que a torna inaceitavelmente distante daqueles aos quais se destina, os cidadãos da nação. Uma carta constitucional que ainda adolescente (1988) já conta surpreendentemente com mais de 55 emendas. Compare-se a estruturação e a organização trazidas pelas centenárias Constituições francesa e norte-americana que, com um rol restrito de orientações estruturais e definições políticas, foram capazes de atravessar os anos e continuam a ser instrumento de orientação dos povos aos quais se destina aplicar e nortear. Em especial, a bicentenária norte-americana, contando ainda hoje com pouco mais de 20 emendas. São regências de conhecimento e convicção da população, diferentemente do que se passa em terra nacional, onde, nem mesmo sequer os profissionais do Direito têm a devida intimidade, o que se dirá da pobre e inculta população deste país, para dizer o menos.

Se, no entanto, foram ácidas as críticas a essa situação, é de se reconhecer que  se prestaram a uma maior estabilidade nos anos recentes. É que – como contraponto à anterior ponderação – não estivessem tais direitos protegidos constitucionalmente, já teríamos sofrido inúmeras e recalcitrantes reformas. Não que não se deva refletir e aplicar reformas.

O que se percebe é que, frente aos distintos focos políticos dos governos pós-constituição, o Direito do Trabalho teria sido alvo de irrefletidas alterações dos “governantes de plantão” de acordo com suas  tendências políticas. Teríamos, por leis ordinárias, alterado e re-alterado o Direito do Trabalho, em insuportável hesitação e – repita-se – insegurança.

A sua inclusão no texto constitucional teve efeito de estabilidade e que exige maior esforço e adequação, nas pretendidas e necessárias mudanças, pelo simples fato de somente poderem  realizar-se por  reforma constitucional.

Falar-se em efetividade do Processo do Trabalho, quer em fase de conhecimento, quer em fase de execução, impõe trazer à discussão a condição de acesso ao Poder Judiciário.

No Brasil, desde a Constituição  Federal de 1946, pretende-se garantir o acesso amplo da cidadania ao Poder Judiciário. A vigente Carta Constitucional de 1988 é pródiga em detalhes, em geral, em seus 250 artigos e mais 83 artigos de atos de disposições constitucionais transitórias, o que a faz rapidamente desatualizada e enseja formulação de emendas.

Assim, é perfeitamente aceitável  a existência de tensão constitucional entre normas que protegem interesses diversos e que podem ser postas em situação de antagonismo. Importante remédio é a compatibilização, para convivência simultânea dos princípios fundamentais envolvidos. O sistema jurídico deve ser compreendido como um todo aberto, permeável, lacunoso, e antinômico (com contradições). É com o Princípio da Proporcionalidade que se  dá o adequado manejo  dessas ocorrências. 

Especificamente, no caso do processo, já se fala em “processo civil constitucional”, ante a evidente inclusão no Diploma Maior de normas dessa natureza, especialmente quanto aos princípios processuais nela incluídos.

O acesso ao Poder Judiciário é GARANTIA CONSTITUCIONAL PÉTREA, conforme artigo 5º, XXXV[5], da Carta Magna, sendo que as normas dessas disposições não podem ser alteradas por emenda constitucional, senão por constituinte exclusiva com finalidade de formulação constitucional. Essa a previsão constitucional  do artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV.

Assim, está constitucionalmente positivado que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito” (conforme nota precedente nº 7).

Norteadores da compreensão do fenômeno jurídico como instrumento de referência de um problema jurídico qualquer, os princípios são fundamentais para higidez do sistema. Não princípios físicos, inafastáveis, a que os fenômenos da natureza se submetem inexoravelmente, como, por exemplo, a gravitação.

Como proposições básicas, fundamentais, que embasam, servem de assento à estrutura de determinada ciência. Preparam a organização e desenvolvimento da mesma. Ponto de partida  para o desenvolvimento de qualquer sistema de conhecimento e que a este conferem validade, tidos por verdades fundamentais.

São considerados como verdades ou juízos fundamentais. São pilares jurídicos de maior grandeza, “holofotes” que iluminam com grande intensidade qualquer entendimento amparado na legislação positivada.

São norteadores para a edificação  das normas jurídicas e para a aplicação do direito processual in concreto.

Garantem a hegemonia e a unidade do sistema jurídico, determinando que as normas de hierarquia inferior guardem respeito e observância aos mesmos, em termos hierárquicos.

Orientam a  criação do direito infraconstitucional, com sua previsão in abstrato, e que deve ser erigido em consonância com os mesmos.

Princípios Processuais não têm sentido absolutamente autônomo e limites rígidos. Interpenetram-se em zona “gris” de relação entre os mesmos, e até eventualmente se confundem.

Reitere-se que o artigo 5º. da Constituição Federal brasileira, incluído no Título II – Dos Direitos e Garantias  Fundamentais, e no capítulo I – Dos Deveres e Garantias Individuais e Coletivos –  consagra  Cláusula Pétreas (artigo 60, § 4º, inciso 4º da Constituição Federal)[6], NÃO passíveis de alteração ou supressão, nem por emenda constitucional (tal como a Forma Federativa do Estado, o Voto Direto Secreto, Universal e Periódico, a Separação dos Poderes). Constitui núcleo intangível da Constituição Federal.

Entende-se que entre os princípios fundamentais (devido a processo legal, contraditório, ampla defesa) se coloca como pressuposto garantir o acesso ao Poder Judiciário, ao processo como meio de solução de controvérsia.

Deve ser lembrado que não basta assegurar acesso, senão acesso eficiente. É condição inafastável da sociedade democrática o controle jurisdicional do acesso ao Poder  Judiciário, a sua indeclinabilidade na solução das controvérsias, o que envolve a questão da efetividade. Esta não constitui problema nacional, mas mundial, no sentido de que vários  países desenvolvidos do mundo o enfrentam, sendo certo que a demora da conclusão do processo a todos atormenta.

Pergunta-se: o processo trabalhista tem sido capaz de atender à necessidade dos trabalhadores na solução das controvérsias a ele submetidas?

A resposta é hesitante e tende mais à negativa, em face da longa duração dos feitos laborais e que, postergando o atendimento judicial dos direitos em demasia, tem o significado de verdadeira denegação de Justiça, com infração à norma constitucional em exame.

Vários são os princípios processuais informados pelo princípio do Acesso ao Poder Judiciário, ligados com a ação e a defesa, como o princípio  Da Demanda, Dispositivo, Ampla Defesa, Defesa Global, Contraditório, Eventualidade.

A Garantia de Acesso ao Poder Judiciário constitui garantia prévia ao processo, supraconstitucional, que informa outros tantos ligados aos direitos das partes no processo.

Já a Declaração Universal dos  Direitos do Homem e do Cidadão, ONU, 1948, artigo 10, a Convenção de Roma de 1950 – Convenção Européia para Salvaguarda  dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, artigo  6º, o  Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, artigo 14,1, e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos da Costa Rica, 1969, artigo 8º,1, assim asseveraram.

Lembrado, na doutrina nacional, Mauro Cappelletti se posicionou sobre o movimento de acesso à Justiça nos Estados contemporâneos[7], tendo constatado 3 ondas: 1) pobreza como obstáculo de acesso ao Judiciário e a Representação legal do pobre; 2) proteção aos interesses difusos, fenômenos da sociedade de massa; coletivização do Direito; 3) risco de burocratização do Judiciário.

Também referido como direito à ação, direito de ação e direito de petição, com sutis diferenças de enfoques que aqui não merecem relevo, temo-lo como o direito de dirigir-se a juiz ou tribunal competente para que  lhe aprecie lesão ou ameaça de direito: direito de peticionar aos órgãos do Poder Judiciário.

É o direito de todo o homem de ser ouvido por Tribunal independente e imparcial, previamente instituído por lei e a este submeter todo e qualquer direito subjetivo, individual, coletivo, transindividual, difuso e individual homogêneo.

A tanto não basta formalmente garantir acesso aos Tribunais, mas sim adequada tutela jurisdicional, efetiva e tempestiva, em prazo razoável, sem dilações indevidas, proporcional à complexidade da discussão. Nesse sentido, deve por igual se observar e para tal contribuir o comportamento de  juízes e procuradores das partes, assim como todos aqueles que no processo intervêm.

Muito se fala, e acertadamente, na crise do processo, questionando a sua não utilidade, morosidade, o que constitui verdadeiramente Justiça inacessível.

É o devido direito AO processo e NO processo (Regularidade processual). A busca da prestação de jurisdição em breve espaço de tempo, o tempo justo para a consecução do escopo.

Não se pode, nesta ótica, deixar de observar a significância da diferença de capacidade econômica das partes, como definidores de capacidade de  resistência e espera  na solução final da contenda, aspecto esse de maior relevo em se tratando de Direito do Trabalho, cujo pressuposto é justamente a desigualdade entre as parte, considerando a hipossuficiência do trabalhador.

Assim é que, parte disso tudo  é garantir o acesso ao Poder Judiciário e ao processo aos jurisdicionados que não disponham de condições, o que se pode viabilizar pelo princípio da Assistência Judiciária Gratuita. Trata-se também de cláusula pétrea, prevista pelo artigo 5º, inciso LXXIV da  Constituição Federal, e que se rege basicamente pela  Lei 1.060/50. É norma legal de aplicação diuturna na Justiça Especializada do Trabalho e que, neste particular, autoriza e facilita o acesso ao Poder Judiciário, mas não é tudo.     

Kazuo Watanabe, ilustre processualista brasileiro, é preciso ao se manifestar sobre o tema asseverando que “o direto de acesso à Justiça é, fundamentalmente, direito de acesso à ordem jurídica justa. A problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites de acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim, viabilizar o acesso à ordem jurídica justa[8].

 A Justiça do Trabalho, órgão especializado do Poder Judiciário, em face da demasiada demora na solução dos conflitos que lhe são postos e sua final efetivação, não pode ser tido como adequado neste particular. São anos de espera e mesmo assim sem a certeza da efetivação do direito, já que muitas das execuções são frustradas e descumpridas.

Em momento do passado recente, ergueram-se rumores no sentido de que a Justiça do Trabalho não  constituía  órgão necessário, e cujo custo estatal poderia levar à consideração de sua dispensabilidade, falando-se em extinção do Tribunal Superior do Trabalho e até da própria Justiça do Trabalho.

Como que em movimento diametralmente oposto foi editada alteração constitucional que ora se aborda.

 

DAS REFORMAS PROCESSUAIS E DA BUSCA DE EFETIVIDADE E CELERIDADE

 

Recentemente, em dezembro de 2004, mais uma emenda constitucional foi editada, a de número 45, com incidência direta sobre a Justiça do Trabalho,  com fim expresso de reformar o Poder Judiciário, mas que veladamente buscava instituir controle externo ao Judiciário.

Declarou-se a agilização e  efetividade do processo como objetivo. Apenas para referir, pois se trata de outro tema, foram criados vários órgãos de controle externo como o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público e o Conselho Superior de Justiça do Trabalho, pois essa Emenda Constitucional, além de alterar a competência  da Justiça do Trabalho, inseriu mais um inciso no artigo 5º, da Constituição Federal , o inciso LXXVII (78) que dispõe que “a todos são assegurados razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Não se vê aí uma novidade, pois tal leitura de efetividade já era feita antes desse inciso, quanto aos dispositivos existentes na própria Carta e artigo 5º, LIV – devido processo legal, LV – ampla defesa, XXX – acesso ao Poder Judiciário – “a lei não excluirá da apreciação (…)”. Estes já se interpretavam no sentido de  que a prestação jurisdicional devesse ser efetiva proteção, célere, justa, com condição real de  atuação no mundo dos fatos.

Ocorre que a novel norma constitucional, em verdade, nada significa. O que é “razoável duração”? Quanto tempo significa efetividade na prestação jurisdicional aos efeitos da razoável duração? Quais os meios disponíveis para assegurar a celeridade de tramitação?

É importante perceber que se trata de norma programática, não autoaplicável, que traz  conceito aberto e subjetivo. Obviamente depende de formulação legislativa ordinária complementar, e que até agora não sobreveio.

Algumas alterações no sentido da efetivação e qualificação da prestação jurisdicional foram determinadas pela EC nº 45, como a do artigo 93, II – c) promoção dos juízes por critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição. Ainda, freqüência e aperfeiçoamento em cursos. Oficiais e reconhecidos de aperfeiçoamento, e) não promoção se houver injustificada retenção autos além do prazo. Determinou no inciso VI – Aperfeiçoamento por cursos, no inciso XII – Atividade Jurisdicional Ininterrupta. (vedado férias coletivas, dias sem expediente: plantão permanente.), inciso XIII – número de juízes proporcional à demanda, o inciso XV – Distribuição Imediata  de processos e em várias situações a possibilidade de justiça itinerante e funcionamento descentralizado, câmaras regionais, assim como o artigo 126 prevendo a organização Varas especializadas – exemplificativamente para conflitos fundiários.

É de se referir que nessa tentativa de Garantir o Acesso ao Poder Judiciário – um acesso amplo e qualificado – se instituíram, por igual, dois tipos de Súmulas a serem promulgadas pelos Tribunais Superiores, e de enorme  controvérsia.   

A Súmula Impeditiva, ainda não vigente, pendente, ao que se sabe  de aprovação na Câmara dos Deputados. Em verdade, nem se constitui em novidade normativa, já que o artigo 896 da CLT, no que tange ao Recurso de Revista, contempla essa situação.

A Emenda em questão trouxe também a Súmula vinculante[9] (artigo 103-A, da Constituição Federal[10]), que obriga ao julgador à sua aplicação, matéria essa relevante e que não será objeto desta manifestação, antecipando-se, contudo, que tem o significado de cerceamento de liberdade no julgamento do magistrado, engessamento da Jurisprudência, mas que encontra em seu favor alguns outros importantes argumentos.

As poucas Súmulas vinculantes editadas de modo geral não tratam de Matéria Trabalhista, mas há a novel Súmula Vinculante nº 4[11], que trata da base de cálculo para o adicional de insalubridade.

A alteração de competência trazida com a Emenda Constitucional 45, sem que se pretenda adentrar no mérito da mesma, determinou a ampliação da competência transferindo à Justiça do Trabalho outras matérias, além das relações de emprego, pequenas empreitadas e trabalho dos avulsos. O espectro de “relações de trabalho”, ora expressamente ao encargo da Especializada, é  significativamente maior do que antes objeto dessa jurisdição.

Qual o efeito dessa mudança?

Duas são as hipóteses de reflexos. A primeira refere a fortalecimento da Justiça do Trabalho à vista da destinação de outras tantas ações ao seu encargo, pressupondo a capacidade de absorção dessa nova competência e a especialização capaz de bem resolver conflitos relacionados  à matéria. A segunda, em sentido oposto, pode ser vista como uma fragilização material  dessa Especializada. A uma, porque se hoje já não tem efetiva prestação em face de  demasiada demora no tempo, menor seria essa condição de  atuação com milhares de outras ações para ela transferidas ou  que nela serão iniciadas. A outra,  porque com a abertura do espectro de atuação, sustentam alguns, recalcitrantemente, que tal levaria à perda da Especialização e, portanto, desnecessidade de  particularização  jurisdicional. Uma possibilidade de nova versão de extinção da Justiça do Trabalho.

Nesse passo, é importante ressaltar que a discussão é frágil, de vez que existindo a relação de direito material, a relação de trabalho, sempre haverá controvérsia, demanda e necessidade de solução por meio da jurisdição estatal, para  a busca da paz social.

Teoricamente, poder-se-ia referir que,  na Justiça do Trabalho ou  mesmo na Justiça Comum, a existência de lide obrigará o Estado a prestar assistência e interveniência, disponibilizando meios judiciais de solução dos conflitos.

Não parece, por igual, razoável que sequer se pense em  mudança formal com evidente perda de qualidade de atuação do processo frente ao  natural e compreensível despreparo da magistratura civil para lidar com as questões trabalhistas, e não se argumente com a competência residual destes, nas localidades onde há Varas do Trabalho, uma vez que já em fase recursal retoma apreciação especializada pelo Tribunal Regional do Trabalho.

Passado breve tempo da alteração constitucional, é possível perceber que, apesar de alguns “solavancos”, a mudança vem sendo absorvida com adequação pela Justiça do Trabalho.

Por óbvio que tem enorme significado no dia-a-dia das Varas do Trabalho. Aos julgadores laborais agora se submetem outras tantas e distintas questões, antes fora de seu universo jurisdicional e que demandam requalificação e esforço  superior, como toda e qualquer novidade. Nesse sentido, os Tribunais do Trabalho, com as recentemente criadas Escolas Judiciais, estão   buscando esse resultado a fim de manter o padrão de suas decisões.

Pode ser percebida também alguma ansiedade, quer nos julgadores, quer nos operadores do Direito em geral, como também nos jurisdicionados, o que não pode surpreender  pela significativa alteração levada a cabo.

O que parece certo é que caminha para a estabilidade ou normalidade  a prestação jurisdicional da Justiça do Trabalho, que demanda maior volume de investimentos estruturais, quer físicos, quer humanos, mas que se planejam sobrevir.

 

CONCLUSÃO

 

Se ao início deste texto já se  questionou a efetividade do Processo do Trabalho, sem essa nova carga material, o que se dirá com sua ocorrência?

Realmente,  por observação lógica, essa situação se agrava, o que, no entanto, tem soluções e conduções possíveis  de  fazer com que o processo seja mais efetivo. As referidas da alterações Emenda e antes citadas são capazes de  preparar e tornar mais efetiva a prestação jurisdicional , que tende a ser mais qualificada e mais eficiente.

É de se lembrar também que a introdução do processo sumário e a conciliação prévia são caminhos que seguem nesta positiva direção.

Além disso, o  instrumento de execução da “penhora on line[12], fruto do convênio do Banco Central com o Poder Judiciário, tem se mostrado importantíssimo na  efetivação das decisões da Justiça do Trabalho, e que migraram também para o processo civil. Não se pode reconhecer ainda que o mesmo já esteja devidamente em uso geral, pois ainda encontra resistências, justamente pelo fato de sua  inegável firmeza contra o devedor.

Quanto mais praticado, mais eficientes serão as execuções. Não se deve esquecer de que a ordem  legal do CPC de busca de  suporte à execução prevista pelo artigo 655 do CPC  elege o dinheiro com prioritário, sendo a “penhora on line” apenas o caminho para a sua aplicação.

O certo também é que o processo do trabalho não pode estagnar, nem os operadores do Direito se conformarem com a demora na tramitação dos feitos, de vez que devem sempre buscar o aperfeiçoamento para melhor atender ao jurisdicionado.

Por fim, reconhece-se firme utilidade da constitucionalização de princípios processuais, dos direitos individuais e notadamente da garantia de acesso ao poder judiciário, sem o qual se  torna formal e ocioso o direito material que a todos rege e orienta.

Conclui-se que a melhor técnica legal e de política de Estado dirige-se à constitucionalização de garantias de acesso do Poder Judiciário e conseqüente execução das obrigações envolvidas, como sendo o único meio de efetivação do direito, seja qual for, entre as partes.          

De nada adianta a mera inclusão de direitos em rígida previsão constitucional, se estes não se revestem da devida efetividade.

A discussão permanente das possibilidades de aprimoramento  do Direito do Trabalho e do processo trabalhista é o  que garante a sua evolução, dos  institutos referentes, do instrumento processual e  das relações de trabalho, fazendo com que cada vez mais possa ser dadas necessárias respostas sociais na tutela das relações de trabalho.

 

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[1] Art. 769 – Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

[2] Esta expressão está registrada no Código de Hamurabi (1792-1750 a.C.), com 282 artigos. Hamurabi instituiu a vingança como preceito jurídico no Império Babilônico.

Baseia-se na Lei de Talião, que está presente na Bíblia Sagrada e prescreve ao transgressor a pena equivalente ao crime que praticou. Esse princípio ainda é utilizado em muitos países do Oriente.

[3] CARNELUTTI, Francesco. Estudios de Derecho Procesal. vol. II, trad. esp. de Santiago Sentís Melendo, Buenos Aires: EJEA, 1952, p. 5.

[4] Tal como o direito do trabalho doméstico, adicionais de horas extras etc.

[5] Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(…)

XXXV  – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;

(…)

[6] Art. 60 – A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

(…)

  • 4º – Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

(…)

IV – os direitos e garantias individuais.

[7] CAPPELLETTI e GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Tradução de Ellen Gracie

Northfleet. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002.

[8] WATANABE, Kazuo. Acesso à Justiça e sociedade moderna. In: GRINOVER, Ada Pellegrini Cândido Rangel Dinamarco e Kazuo Watanabe. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1988, p. 128/129.

[9]  Regulamentada pela Lei nº 11.417 de 19/12/2006.

[10] Art. 103-A –  O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Vide Lei nº 11.417, de 2006).

  • 1º A súmula terá por objetivo a validade, a interpretação e a eficácia de normas determinadas, acerca das quais haja controvérsia atual entre órgãos judiciários ou entre esses e a administração pública que acarrete grave insegurança jurídica e relevante multiplicação de processos sobre questão idêntica.
  • 2º Sem prejuízo do que vier a ser estabelecido em lei, a aprovação, revisão ou cancelamento de súmula poderá ser provocada por aqueles que podem propor a ação direta de inconstitucionalidade.
  • 3º Do ato administrativo ou decisão judicial que contrariar a súmula aplicável ou que indevidamente a aplicar, caberá reclamação ao Supremo Tribunal Federal que, julgando-a procedente, anulará o ato administrativo ou cassará a decisão judicial reclamada, e determinará que outra seja proferida com ou sem a aplicação da súmula, conforme o caso.”

[11] Súmula Vinculante nº 4 – Salvo nos casos previstos na Constituição, o salário mínimo não pode ser

usado como indexador de base de cálculo de vantagem de servidor público ou

de empregado, nem ser substituído por decisão judicial. Data de Aprovação: Sessão Plenária de 30/04/2008 Fonte de Publicação: DJe nº 83/2008, p. 1, em 9/5/2008, DO de 9/5/2008, p. 1. Referência Legislativa: Constituição Federal de 1988, art. 7, IV e XXIII, art. 39, § 1º e § 3º, art. 42, § 1º, art. 142, § 3º, X.

[12] Ainda que se possa referir o ato do juízo como “penhora on line”, trata-se de denominação atécnica, porquanto o juiz inicialmente solicita ao Banco Central do Brasil a indisponibilidade dos valores, o que significará bloqueio dos valores encontrados (até que bastem para saciar a execução) e não tecnicamente uma penhora.

O SISTEMA BACEN-JUD E A REALIDADE PROCESSUAL BRASILEIRA

André Jobim de Azevedo
  1. Considerações iniciais de contextualização

O que tem se chamado de penhora online é, na verdade, um sistema pelo qual é possível por um juiz de direito a solicitação de informações bancárias de uma parte executada ao Banco Central do Brasil. Busca-se, pela via eletrônica, informações para a localização de contas bancárias e/ou investimentos e conseqüente bloqueio dos valores em tempo real capazes de suportar a execução.

Ao requisitar tais informações, por meio de ofícios eletrônicos, o juiz de direito informa ao Banco Central do Brasil, os valores a serem constritos, aos quais limitará o bloqueio.

Esta não é uma nova espécie de penhora, mas a legalmente prevista penhora sobre dinheiro, aliás, preferencial no sistema de execução brasileiro, com previsão expressa no art. 655, I, do CPC. A utilização do sistema é facultada ao magistrado, que pode, ou não, fazer uso da via eletrônica online.

É novo sistema, eficiente, mas que deve ser utilizado com cautela pelo julgador. O elemento surpresa, que pode garantir a celeridade e efetividade da execução, deve ser sopesado a fim de que não se cometam abusos que por vezes são verificados na prática.

Entre estes abusos estão o desrespeito à determinação legal de que a execução deve se dar da forma menos gravosa ao executado (art. 620, do CPC), o excesso de penhora, demora para o desbloqueio de valores impenhoráveis e o bloqueio de valores não pertencentes ao executado.

Cumpre esclarecer que o rol da impenhorabilidade, expresso no art. 649, do CPC, ganhou por conta das inovações de meio no processo de execução um novo item. É que o legislador brasileiro, por força da Lei nº 11.382/2006, restringiu a penhora da caderneta de poupança somente à valores superiores a quarenta salários mínimos, para que assim resguarde a instituição familiar, o pequeno poupador.

Com algumas das inovações de meio sofridas no processo, tal como o Sistema BACEN-JUD, tornando-o indiscutivelmente mais célere, se fez necessária a proteção ao poupador popular, isto porque crê-se que as pequenas economias também possuem caráter alimentar, muitas vezes fazendo-se uso desta para despesas emergenciais.

  1. Do Convênio de Cooperação Técnico-Institucional

                   Foi a Justiça do Trabalho quem iniciou este novo sistema de penhora no Brasil, em 2002, pela assinatura de convênio entre o TST (Tribunal Superior do Trabalho) e o BACEN (Banco Central do Brasil), daí o nome Sistema BACEN-JUD, como oficialmente foi conhecido o convênio.

                   Desde então, os diversos Tribunais da Justiça Estadual comum celebraram convênios com o BACEN, possibilitando aos juízes de direito a utilização deste mecanismo nas esferas da justiça estadual.

Oportuno lembrar que por tratar-se o Brasil de uma República, por razões históricas que aqui não se justificam aprofundar, foram conferidos aos Estados federados a competência para processamento e julgamento das demandas cíveis e criminais ordinárias, enquanto a competência da Justiça do Trabalho é federal.

Com a vigência da Lei nº 11.382/06, a penhora online passou a constar de forma expressa no Código de Processo Civil brasileiro, em seu art. 655-A, como parte de um novo processo de atualização do processo judicial brasileiro.

Segundo Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart:

“A Lei 11.382/2006 eliminou tal problema ao instituir o art. 655-A nos seguintes termos Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exeqüente, requisitará à autoridade supervisora  do sistema bancário, preferencialmente pelo meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução”.

Cumpre referir que o Código de Processo Civil brasileiro de 1973, vem sofrendo micro reformas desde a década de 90, por meio de alterações setoriais

As constantes reformas legislativas, ainda que imbuídas de bom espírito, causam desconfiança por representar alteração do status quo. Não fosse isto, o atual CPC já nasceu sob o signo do revisionismo. Logo no ato de promulgação da lei, o Ministro da Justiça, Prof. Alfredo Buzaid, autor do anteprojeto do código, anunciava no período de vacatio legis a intenção de ajustar o texto aprovado pelo Congresso Nacional ao sistema do CPC, mediante alteração de vários dos seus dispositivos. Assim, ao entrar em vigor, em 1º de janeiro de 1974, o novo Código de Processo Civil já estava reformado.

Desde então, modificações setoriais alteraram o texto legal, até que se levaram a efeito reformas mais consistentes e sistêmicas, nos anos de 1994/1995 e 2001/2002, no afã de adaptar o CPC às exigências da sociedade brasileira, que hoje mais do que nunca, reclama por uma justiça célere e por um processo mais eficaz.

  1. Da utilização do sistema

De início, questionou-se a possibilidade ou não da aplicação do instituto da penhora online como primeira medida de cumprimento da execução e conseqüente satisfação do crédito exeqüendo.

Seria este novo e eficaz sistema uma medida para se fazer cumprir a lei (merecendo por esta razão ser a primeira medida a ser tomada pelo juiz) ou por tratar-se de medida potencialmente gravosa dever-se-ia buscar primeiro os meios tradicionais de penhora já conhecidos pela doutrina e jurisprudência?

Expressa o art. 655-A do CPC: “Para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira (…)”, isto é, a própria lei afirma ser a penhora online ali prevista a antiga penhora de dinheiro prevista no art. 655 do CPC. Em sendo o dinheiro, em espécie ou em aplicação, o objeto preferencial nas execuções por quantia certa, por conta de sua liquidez, tem-se que a adoção do meio eletrônico como primeira medida de bloqueio e indisponibilidade de bens dos executado é até mesmo legalmente expressa.

  1. O sistema e a legislação processual

Ainda que se possa referir o ato do juízo como penhora online, trata-se de denominação atécnica, porquanto o juiz inicialmente solicita ao Banco Central do Brasil a indisponibilidade dos valores, o que significará bloqueio dos valores encontrados (até que bastem para saciar a execução).

Com as informações sobre este bloqueio, o escrivão (responsável pela coordenação e supervisão dos serviços de cartório e acompanhamento e execução de serviços inerentes aos processos judiciais), providencia a lavratura de um termo de penhora, a fim de caracterizá-la e constituí-la. Só depois de procedidos estes atos é que se consolida verdadeira penhora, sendo de tal ato intimada a parte executada, na forma do art. 652, § 1º, do CPC.

No código processual brasileiro há um elenco de bens prioritários para a realização de penhora, estando este bens contidos nos incisos do art. 655, do CPC. O inciso primeiro, e por isso, o primeiro na ordem é o bem dinheiro.

No entanto, pela redação do art. 654, do CPC, é possível a depreensão de que tais bens somente poderiam ser indicados pelo devedor, o que constituiria a penhora online uma medida gravosa à parte executada que não espera o bloqueio. Como exemplo de prejuízo quanto ao bloqueio inesperado em contas correntes e aplicações tenha-se os compromissos com pagamentos futuros, imprescindíveis ao desenvolvimento empresarial, tais como pagamento de empregados, pagamento de fornecedores, entre outros tantos possíveis e reais compromissos e obrigações do devedor.

Com estas considerações em mente, há quem sustente que a adoção da penhora online como primeira opção do julgador afrontaria o princípio da menor onerosidade da execução, expresso no art. 620 do CPC.

Nesse sentido, há quem entenda que a execução deveria enfrentar todos os meios tradicionais e, inequivocamente, menos gravosos de localizar bens passíveis de penhora, como oficiamento a órgãos públicos responsáveis por registros de informação, além de buscas particulares por conta do credor de bens e créditos que possam atender à obrigação.

Bem sustenta Alexandre Freitas Câmara, que o opção pelo menor sacrifício do executado, exsurge da evolução do direito moderno, “(…) trata-se de princípio decorrente da própria evolução histórica da execução. No início, a atividade executiva recaía sobre o próprio corpo do devedor (que podia ser preso, reduzido à condição de escravo ou até mesmo morto em razão de suas dívidas)”, o que hoje seria inaceitável. Assim, a evolução histórica do processo junto ao reconhecimento da dignidade da pessoa humana impôs a limitação ao pagamento de dívida por patrimônio.

Assim, o já consagrado princípio da responsabilidade patrimonial, com previsão expressa no art. 391 do Código Civil de 2002, impõe a responsabilização de eventuais créditos exclusivamente pelo patrimônio do devedor, o que traz o significado de que a identificação de bens (patrimônio) do devedor representará o sucesso, ou não, do procedimento executório.

No entanto, a interpretação legal não pode ser restritiva a ponto de prevalecer um princípio do processo de execução sobre o direito material cujo cumprimento é buscado e já se encontra em fase de atendimento. É que toda execução pressupõe um direito material que necessita ser cumprido, executado.

A dita penhora online seria assim, um importante meio de localização de patrimônio, o qual pelas graves implicações decorrentes deve estar às mãos do juiz competente pela execução. Trata-se de um grande avanço quanto a celeridade e a economia processual pela responsabilização patrimonial a fim de satisfazer direito material até então descumprido pelo devedor.

Entende-se que entre os princípios fundamentais  se coloca como pressuposto garantir o acesso ao Poder Judiciário, ao processo como meio efetivo de solução de controvérsia.

Lembre-se que não basta assegurar acesso, senão acesso eficiente e efetivo. É condição inafastável da sociedade democrática o controle jurisdicional do acesso ao Poder  Judiciário, a sua indeclinabilidade na solução das controvérsias, o que envolve a questão da efetividade. Esta não se constitui em problema nacional, mas mundial, no sentido de que vários  países desenvolvidos do mundo o enfrentam, sendo certo que a demora da conclusão do processo a todos atormenta.

Assim, se o Estado pode efetivar um direito por meio de um sistema eletrônico de informação como o BACEN-JUDI, deve fazê-lo a fim de garantir a efetividade do direito que declarou.

Importante levantar-se a questão à luz da nova realidade Constitucional brasileira, que por meio da Emenda Constitucional nº 45/2004 elegeu à princípio constitucional o princípio processual da celeridade.

Pois essa Emenda Constitucional, inseriu mais um inciso no artigo 5º, da Constituição Federal , o inciso LXXVII (78º) que dispõe que – “a todos são assegurados razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

A celeridade pressupõe racionalidade na condução do processo, e, se o Estado detém meio de abreviá-lo sem a ofensa de outros direito tem o dever constitucional de fazê-lo, cumprindo a disposição constitucional em questão, a qual tem o status de direito fundamental, pela inclusão do inciso LXXVIII no art. 5º da Constituição Federal de 1988. Lembre-se que o artigo 60 § 4º, IV da Constituição Federal atribui a condição de cláusula pétrea ao referido dispositivo, significando a impossibilidade de sua alteração por emenda constitucional.

A proporcionalidade de princípios se impõe ao intérprete do direito, de um lado a tentativa de tornar a execução menos onerosa ao executado e de outro lado a busca da efetivação do direito material de forma célere e econômica.

Ainda que específico à execução, o princípio da menor gravidade da execução tem previsão infra-constitucional, enquanto  os princípios da efetividade e da celeridade processual têm previsão constitucional e por tal devem prevalecer ante qualquer confronto pela antinomia de suas disposições.

Não é razoável a imposição de ônus ao credor no sentido de ter de buscar por sinuosos meios os bens do credor passíveis de penhora, enquanto há possibilidade de sistema eletrônico que atenda à preferência expressa no art. 655, do CPC. Não se pode proteger o inadimplemento do direito que fora declarado.

Quanto a importância da efetividade, Darci Guimarães Ribeiro, questiona:

A efetividade se nos apresenta como um princípio, sobreprincípio ou postulado? Para que a pergunta possa ser corretamente respondida é fundamental destacar a importância da efetividade dentro dos pressupostos constitucionais do Estado Democrático de Direito. De acordo com nosso entendimento, ela, a efetividade, compõe um dos elementos integrantes desta concepção de Estado, na medida em que contribui para a construção de uma sociedade mais justa (art. 3º, inc. I, da CF), baseada na dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III, da CF), pois de acordo com Rui Barbosa a justiça prestada de forma tardia equivale a injustiça qualificada”.

O autor vai além, afirmando que “Neste diapasão, podemos seguramente afirmar que existe o dever constitucional de promover a efetividade do direito (…)”.

Para Ribeiro, mais que princípio, a efetividade no direito processual brasileiro é um postulado, considerada “a real importância da efetividade na construção do Estado Democrático de Direito”.

Ampara-se nos fundamentos Humberto Ávila, para o qual os postulados normativos “são normas imediatamente metódicas, que estruturam a interpretação e aplicação de princípios e regras mediante a exigência, mais ou menos específica, de relações entre elementos com base em critérios”.

Para Ávila, os postulados, como a efetividade, são meta normas situadas num plano distinto e estabelecem a estrutura de aplicação de outras normas, princípios e regras.

Logo, a efetividade e a celeridade seriam um modo de raciocínio sobre o processo, que estrutura a aplicação do processo civil, pelo que concluímos pela inequívoca possibilidade de adoção da penhora online como primeiro meio para a efetivação do direito, mas precisamente do art. 655, do CPC.

Scarpinella Bueno, por sua vez, sustenta que:

A ‘preferência’ pelo meio eletrônico é mais que justificável em função do tempo necessário para levantar as informações requeridas e do tempo necessário para realizar o bloqueio das quantias eventualmente encontradas que tende a ser maior que o tempo necessário para que o executado levante os valores desta ou daquela instituição financeira”.

Trata-se assim, de meio moderno, capaz de evitar possíveis fraudes à execução e frustração do credor do direito.

À toda prova, a efetividade e a celeridade não podem ser obstadas pelas disposições do art. 620, do CPC.

Isto porque caso assim não fosse, estar-se-ia a reconhecer a prevalência de uma restrição sobre um direito induvidosamente reconhecido pelo próprio Poder Judiciário. A menor restrição possível seria observada pela prévia oportunização de manifestação e indicação de bens à penhora pelo devedor, o que se pode depreender do art. 652 e seguintes do CPC.

Assim, tem-se que o mecanismo de busca eletrônica por meio de sistema que interligar o Poder Judiciário, o Banco Central do Brasil e as instituições financeiras vinculadas constitui um avanço em absoluta harmonia com o direito e com a contemporaneidade, o que se busca é dar o direito a quem faz jus.

  1. Dos problemas e implicações jurídicas

 

Em que pese toda a contribuição para a efetividade da justiça em sede de execução, o Sistema BACEN-JUD não está livre de críticas, algumas das quais aqui se analisará por representarem dificuldades reais a serem enfrentadas pela prática forense diária e pelo aperfeiçoamento das possibilidades do sistema.

05.1 Do bloqueio de valores impenhoráveis

O Código de Processo Civil brasileiro protege por seu inciso IV, do art. 649, “os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadorias, pecúlios e montepios”, enfim, busca proteger quaisquer quantias recebidas pelo devedor cuja destinação seja a sua sobrevivência.

A penhora eletrônica pode, também, vir a recair sobre valores destinados ao pagamento de salário dos empregados de uma empresa executada. Esta situação causaria, não apenas danos à possível empresa executada, mas também a terceiros, que no exemplo ficariam sem o pagamento de seus salários. Isto sem conta que percentual do faturamento da empresa executada é impenhorável, conforme dispõe a regra do art. 655, VII, do CPC.

Assim, de pronto depara-se com um problema quando os valores localizados pelo sistema BACEN-JUD correspondem aos salários recebidos pelo executado e para o sustento seu e de sua família estariam destinados.

Tal situação de aparente conflito foi remediada pelo próprio art. 655-A, do CPC, em seu § 2º que dispõe: “Compete ao executado comprovar que as quantias depositadas em conta corrente referem-se à hipótese do inciso IV de caput do art. 649 desta Lei ou que estão revestidos de outra forma de impenhorabilidade”.

A questão foi resolvida pelo legislador de forma clara, atribuindo ao executado o ônus de alegar e demonstrar que os valores bloqueados pelo sistema em questão tenham natureza que lhe confira a impenhorabilidade.

Assim que “Efetuada a penhora eletrônica sobre importâncias revestidas de impenhorabilidade, de acordo com o inciso IV do caput do art. 649 do Código de Processo Civil ou por outra forma, caberá ao executado arquir a questão em embargos à execução (Cód. Cit., arts. 736 e 745, II) ou, caso decorrido o prazo de embargos (Cód. cit., art. 738), por petição simples, tendo em vista que vícios na penhora constituem matéria de ordem pública, passíveis de alegação a qualquer momento e conhecidas de ofício”, conforme preleciona Moacyr Amaral Santos.

Na verdade, dessa resolução legal exsurge novo problema, o tempo para a liberação dos valores já bloqueados. Note-se que o tema é de fundamental importância, considerando que os valores indisponibilizados podem ser os únicos que o executado detinha para o sustento seu e de sua família.

05.2 Da demora para desbloqueio de valores indevidos

Ainda que extremamente ágil na no localização e bloqueio de valores, por conta da informatização deste procedimento, o caminho reverso não é assim.

Para entendermos a situação mister faz-se um aclaramento de como ocorre o bloqueio na prática. Guilherme Goldschmidt explica que:

Atualmente, as solicitações de bloqueio de contas são enviadas pelos juízes ao Banco Central, via BACEN-JUD, de forma rápida e eficaz. Vale notar que, quando os magistrados utilizam os sistema BACEN-JUD de penhora on line, ao digitaram o CNPJ da empresa, a ordem dada atinge todas as contas do devedor, de forma simultânea

 

Entretanto, as respostas dos bancos aos juízes solicitantes demoram pelo menos dois dias úteis, prazo que começa a fluir da ordem eletrônica de bloqueio, devidamente protocolada, e expira somente após a consulta do magistrado ao sistema BACEN-JUD. Assim, confirmando o bloqueio junto à instituição financeira, o juiz determinará a transferência para o Banco do Estado, o qual automaticamente, gerará depósito judicial, com envio de e-mail ao magistrado informando os dados do depósito”.

Constata-se tratar de sistema cuja rapidez está direcionada à localização de valores ao bloqueio destes.

Eventuais bloqueios sobre valores impenhoráveis, excessos de penhoras ou quaisquer outros equívocos necessitaram da interveniência física do juízo, dos servidores da justiça e das instituições financeiras. A situação é delicada e sabe-se que a indisponibilidade de capital por poucos dias já é capaz de gerar grandes prejuízos à uma empresa ou pessoa jurídica, por vezes irreparáveis.

Ademais, conforme evidenciou-se do procedimento supra citado, a ordem de bloqueio dirige-se a quaisquer contas mantidas pelo executado podendo-se bloquear mais de uma conta corrente a qual já seria suficientes para satisfazer o crédito executado.

Neste sentido, Goldschmidt afirma que “em vários casos o magistrado não libera imediatamente as outras contas bloqueadas, aguardando a transferências do valor do débito para a conta em nome do juízo”, situação fática constatada que parece configurar abuso na execução.

A questão pode ser resolvida, ainda que em parte, pela cautela do julgador. Isto porque conforme ressalta Amaral Santos, “Pode o juiz aguardar as informações, pela via eletrônica, para determinar a ordem de penhora, ou ao expedir a requisição de consulta já ordenar que a resposta positiva implica a imediata indisponibilidade do valor encontrado até o montante correspondente a execução”.

O aguardo do retorno da solicitação de informação, da qual nada saberá o executado, pode garantir o bloqueio certo e eficaz, considerado até mesmo os valores constantes nas contas a serem bloqueadas.

Esclareça-se que esta a informação limitar-se-á à existência ou não de depósito ou aplicação até o valor indicado na execução, conforme expressa o § 1º do art. 655-A, do CPC. Este parágrafo legal busca atender às críticas que fazia parte da doutrina, antes da promulgação da Lei nº 11.382/2006, à possível quebra do sigilo bancário do executado.

05.3 Do bloqueio múltiplo

Conforme se viu acima, por conta de uma solicitação, havendo multiplicidade de contas correntes do executado, poderá haver o chamado bloqueio múltiplo.

Este ocorre quando uma conta/agência/instituição não é especificada na solicitação do juiz. Assim, a ordem será encaminhada para a todas as instituições, as quais cumprirão a decisão judicial de forma independente umas das outras, podendo-se, assim, ultrapassar o valor determinado pelo magistrado.

Ainda que tal ocorrência seja possível, haja vista um banco não possuir informações sobre os correntistas dos demais bancos, o magistrado pode direcionar a sua ordem para determinada instituição e, ainda, especificar uma agência e mais ainda uma conta.

Trata-se de medida de cautela que deve pode ser tomada pelo juiz a fim de evitar-se este prejuízo, mas  de cujas informações em regra não dispõe o magistrado.

O sistema permite também a possibilidade de cadastramento, junto aos Tribunais Superiores, de uma conta única para eventual hipótese de bloqueio.

As soluções ao problema apresentam-se insuficientes a fim de que se realize o bloqueio de forma exata e inequívoca, o que ao nosso entender não reduz a importância e a validade do sistema que já encontra-se em sua versão 2.0 e vem sendo aperfeiçoado.

Denota-se que a utilização do mecanismo para a penhora online pode produzir, efeitos ou conseqüências que vão além da determinação pretendida o que certamente impõe cuidados com o sistema.

  1. Conclusão e considerações finais

Considerados alguns dos aspectos positivos, outros negativos do Sistema BACEN-JUD, é importante relevarmos que o mesmo busca efetivar a prestação jurisdicional, dando a quem tem o direito material aquilo que lhe é devido.

Bem salientou o mestre Piero Calamandrei, citado por Grinover: “vãs seriam as liberdades do indivíduo, se não pudessem ser reivindicadas e defendidas em juízo: porque os direitos fundamentais, abstratamente formulados pela constituição, só podem ser afirmados, positivados e concretizados pelos tribunais”. Tratando-se a celeridade e a efetividade direitos constitucionais pétreos (art. 5º, XXXV e LXXVIII, da Constituição Federal de 1988)

O problema da execução no Brasil é grave, quer pela dificuldade de localização de bens, quer pelo elevado número de impenhorabilidades elegidas pela Lei processual.

Relativamente à execução de títulos judiciais (sentenças), a falta de efetividade e celeridade na execução do direito potencializa um novo conflito entre as partes, já que até então nada se encontra resolvido no mundo dos fatos, bem como repercute na credibilidade do já assoberbado Poder Judiciário, o qual necessita afirmar seu papel somente pela efetiva aplicação do direito que diz.

Ademais, o momento processual no qual surge e institui-se o bloqueio online é fundamental para demonstrar-se a sua pertinência.

Expressa o art. 652 do CPC, que o “executado será citado para, no prazo de 3 (três) dias, para efetuar o pagamento da dívida”. Admitir-se-á, assim, somente o bloqueio online quando citado o executado não pagar a dívida.

Logo, a despeito das possíveis críticas lançadas contra a penhora online, denota-se que os resultados da utilização do sistema buscam a efetivação do direito e não da manutenção de seu descumprimento, razão pela qual a adoção do mesmo evidencia-se benéfica.

Por fim, o postulado da eficácia da prestação jurisdicional impõe que adote-se a medidas possíveis para a satisfação do direito.

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­El SISTEMA BACEN-JUD Y LA REALIDAD PROCESAL BRASILEÑA

 

  1. Consideraciones iniciales de contextualización

 

Lo que se ha llamado embargo online es, en verdad, un sistema por el cual es posible que un juez de derecho solicite informaciones bancarias de una parte ejecutada en juicio al Banco Central de Brasil. Se busca, por vía electrónica, informaciones para la localización de cuentas bancarias y/o inversiones y consecuente bloqueo de los valores en tiempo real capaces de soportar la ejecución.

Al requerir tales informaciones, por medio de oficios electrónicos, el juez de derecho informa al Banco Central de Brasil, los valores a ser restringidos, a los cuales limitará el bloqueo.

Esta no es una nueva especie de embargo, pero el legalmente previsto embargo sobre dinero, no obstante, preferencial en el sistema de ejecución brasileño, con previsión expresa en el Art. 655, I, del CPC (Código de Processo Civil). La utilización del sistema está facultada al magistrado, que puede, o no, hacer uso de la vía electrónica online.

Es un nuevo sistema, eficiente, pero que debe utilizar con cautela el juzgador. El elemento sorpresa, que puede garantizar la celeridad y efectividad de la ejecución, debe ser sopesado a fin de que no se cometan abusos que a veces son verificados en la práctica.

Entre estos abusos están el incumplimiento a la determinación legal de que la ejecución se debe dar en forma menos gravosa al ejecutado (Art. 620, del CPC), el exceso de embargo, demora para el desbloqueo de valores no embargables y el bloqueo de valores no pertenecientes al ejecutado.

Cumple aclarar que el rol de la inembargabilidad, expresado en el Art. 649, del CPC, ganó por cuenta de las innovaciones de medio en el proceso de ejecución un nuevo ítem. Es que el legislador brasileño, por fuerza de la Ley nº 11.382/2006, restringió el embargo de la libreta de ahorros solamente a los valores superiores a cuarenta sueldos mínimos, para que así resguarde la institución familiar y el pequeño ahorrista.

Con algunas de las innovaciones de medio sufridas en el proceso, tal como el Sistema BACEN-JUD, haciéndose indiscutiblemente más rápido, se hace necesaria la protección al ahorrador popular, esto porque se cree que las pequeñas economías también tienen carácter alimentario, muchas veces haciendo uso de esta para gastos de emergencia.

 

  1. Del Convenio de Cooperación Técnico Institucional

 

Fue la Justicia del Trabajo quien inició este nuevo sistema de embargo en Brasil, en 2002, por la firma de convenio entre el TST (Tribunal Superior del Trabajo) y el BACEN (Banco Central de Brasil), de ahí el nombre Sistema BACEN-JUD, como oficialmente fue conocido el convenio.

Desde entonces, los diversos Tribunales da Justicia Estaduales (provinciales) común celebraron convenios con el BACEN, posibilitando a los jueces el derecho a utilización de este mecanismo en las esferas de la justicia estatal.

Es oportuno recordar que por tratarse el Brasil de ser una República, por razones históricas que aquí no se justifican profundizar, les fueron conferidos a los Estados federados (provincias) la competencia para el procesamiento y juzgamiento de las demandas civiles y criminales ordinarios, en cuanto a la competencia de la Justicia del Trabajo es federal.

Con la vigencia de la Ley nº 11.382/06, el embargo online pasó a constar de forma expresa en el Código de Proceso Civil brasileño, en su Art. 655-A, como parte de un nuevo proceso de actualización del proceso judicial brasileño.

Según Luiz Guilherme Marinoni y Sérgio Cruz Arenhart:

 

La Ley 11.382/2006 eliminó tal problema al establecer en el Art. 655-A los siguientes términos. Para posibilitar el embargo de dinero en depósito o aplicación financiera, el juez, a requerimiento del promotor, requerirá a la autoridad supervisora  del sistema bancario, preferentemente por el medio electrónico, informaciones sobre la existencia de activos a nombre del ejecutado, pudiendo en el mismo acto determinar su no disponibilidad, hasta el valor indicado en la ejecución”.

     

Cumple referir que el Código de Proceso Civil brasileño (codigo procesal civil) de 1973, viene sufriendo microrreformas desde la década de los años 1990, por medio de alteraciones sectoriales.

Las constantes reformas legislativas, aunque imbuidas de buen espíritu, causan desconfianza por representar alteración del status quo. Si no fuese esto, el actual CPC ya nació bajo el signo del revisionismo. Luego en el acto de promulgación de la Ley, el Ministro de Justicia, Prof. Alfredo Buzaid, autor del anteproyecto del código, anunciaba en el período de vacatio legis la intención de ajustar el texto aprobado por el Congreso Nacional al sistema del CPC, mediante alteración de varios de sus dispositivos. Así, al entrar en vigor, el 1º de enero de 1974, el nuevo Código de Proceso Civil ya estaba reformado.

Desde entonces, modificaciones sectoriales alteraron el texto legal, hasta que se llevaron a efecto reformas más consistentes y sistémicas, en los años de 1994/1995 y 2001/2002, en el afán de adaptar el CPC a las exigencias de la sociedad brasileña, que hoy más que nunca, reclama por una justicia veloz y por un proceso más eficaz.

 

  1. De la utilización del sistema

 

De inicio, se cuestionó la posibilidad o no de la aplicación del instituto del embargo online como primera medida de cumplimiento de la ejecución y consecuente satisfacción del crédito en ejecución.

¿Sería este nuevo y eficaz sistema una medida para hacer cumplir la Ley (mereciendo por esta razón ser la primera medida a ser tomada por el juez) o por tratarse de una medida potencialmente gravosa se debería buscar primero los medios tradicionales de embargo ya conocidos por la doctrina y jurisprudencia?

Expresa el Art. 655-A del CPC: “Para posibilitar el embargo de dinero en depósito o aplicación financiera (…)”, esto es, la propia Ley afirma ser el embargo online allí previsto el antiguo embargo de dinero prevista en el Art. 655 del CPC. Y siendo el dinero, en especie o en aplicación, es objeto preferencial en las ejecuciones por cantidad exacta, por cuenta de su liquidez. Así se tiene que la adopción del medio electrónico como primera medida de bloqueo y no disponibilidad de bienes de los ejecutados es incluso legalmente expresa.

 

  1. El sistema y la legislación procesal

 

Aunque se pueda referir al acto del juicio como embargo online, se trata de denominación no técnica, por cuanto el juez inicialmente solicita al Banco Central do Brasil la no disponibilidad de los valores, lo que significará bloqueo de los valores encontrados (hasta que basten para saciar la ejecución).

Con las informaciones sobre este bloqueo, el escribano (responsable por la coordinación y supervisión de los servicios de notaría y acompañamiento y ejecución de servicios inherentes a los procesos judiciales), providencia la escritura de un término de embargo, a fin de caracterizarla y constituirla. Sólo después de haber procedido con estos actos es que se consolida verdadero el embargo, siendo de tal acto intimada la parte ejecutada, en la forma del Art. 652, § 1º, del CPC.

En el código procesal brasileño hay un elenco de bienes prioritarios para la realización de embargo, estando estos bienes contenidos en los incisos del Art. 655, del CPC. El inciso primero, y por esto, el primer en el orden es el bien dinero.

Por tanto, por la redacción del Art. 654, del CPC, es posible la comprensión de que tales bienes solamente podrían ser indicados por el deudor, lo que constituiría el embargo online una medida gravosa a la parte ejecutada que no espera el bloqueo. Como ejemplo de perjuicio cuanto al bloqueo inesperado en cuentas corrientes y aplicaciones que se tengam en los compromisos con pagos futuros, imprescindibles al desarrollo empresarial, tales como pago de empleados, pago de proveedores, entre otros tantos posibles y reales compromisos y obligaciones del deudor.

Con estas consideraciones en mente, hay quien sustente que la adopción del embargo online como primera opción que el juzgador afrontaría el principio de la menor onerosidad de la ejecución, expresado en el Art. 620 del CPC.

En este sentido, la ejecución debería enfrentar todos los medios tradicionales e, inequívocamente, menos gravosos de localizar bienes pasibles de embargo, como oficiar a órganos públicos responsables por registros de información, además de búsquedas particulares por cuenta del acreedor de bienes y créditos que puedan atender la obligación.

Bien sustenta Alexandre Freitas Câmara, que la opción por el menor sacrificio del ejecutado, se yergue de la evolución del derecho moderno, “(…) se trata de principio consecuente de la propia evolución histórica de la ejecución. En el inicio, la actividad ejecutiva recaía sobre el propio cuerpo del deudor (que podía ser detenido, reducido a la condición de esclavo o hasta incluso muerto en razón de sus deudas)”, lo que hoy seria inaceptable. Así, la evolución histórica del proceso junto al reconocimiento de la dignidad de la persona humana impone la limitación al pago de deuda por patrimonio.

Así, el ya consagrado principio da responsabilidad patrimonial, con previsión expresa en el Art. 391 del Código Civil de 2002, impone la responsabilización de eventuales créditos exclusivamente por el patrimonio del deudor, lo que trae el significado de que la identificación de bienes (patrimonio) del deudor representará el éxito, o no, del procedimiento ejecutorio.

Por lo tanto, la interpretación legal no puede ser restrictiva a punto de prevalecer un principio del proceso de ejecución sobre el derecho material cuyo cumplimiento se busca y ya se encuentra en fase de cumplimiento. Es que toda ejecución presupone un derecho material que necesita ser cumplido, ejecutado.

Dicho embargo online seria así, un importante medio de localización de patrimonio, lo cual por las graves implicaciones que se origina debe estar en las manos del juez competente por la ejecución. Se trata de un gran avance en cuanto a la celeridad y la economía procesal por la responsabilización patrimonial a fin de satisfacer el derecho material hasta entonces incumplido por el deudor.

Se entiende que entre los principios fundamentales  se coloca como presupuesto garantizar el acceso al Poder Judicial, al proceso como medio efectivo de solución de controversia.

Recuérdese que no basta asegurar acceso, si no acceso eficiente y efectivo. Es condición inseparable  de la sociedad democrática el control jurisdiccional del acceso al Poder  Judicial, a su obligatoriedad en la solución de las controversias, lo que involucra la cuestión de la efectividad. Esta no se constituye en problema nacional, pero mundial, en el sentido de que varios  países desarrollados del mundo lo enfrentan, siendo cierto que la demora de la conclusión del proceso a todos atormenta.

Así, si el Estado puede efectivizar un derecho por medio de un sistema electrónico de información como el BACEN-JUDI, debe hacerlo a fin de garantizar la efectividad del derecho que declaró.

Es importante sacar a la luz la cuestión de la nueva realidad Constitucional brasileña, que por medio de la Enmienda Constitucional nº 45/2004 eligió al principio constitucional como el principio procesal de la celeridad.

Pues esta Enmienda Constitucional, insertó un inciso más en el artículo 5º, de la Constitución Federal, el inciso LXXVIII (78º) que dispone que – “todos son asegurados de  la razonable duración del proceso y los medios que garanticen la celeridad de su tramitación”.

La celeridad presupone racionalidad en la conducción del proceso, y, si el Estado tiene medio de abreviarlo sin la ofensa de otros derechos tiene el deber constitucional de hacerlo, cumpliendo la disposición constitucional en cuestión, la cual tiene el status de derecho fundamental, por la inclusión del inciso LXXVIII en el Art. 5º de la Constitución Federal de 1988. Recuérdese que el artículo 60 § 4º, IV de la Constitución Federal atribuye la condición de cláusula tenaz al referido dispositivo, significando la imposibilidad de su alteración por enmienda constitucional.

La proporcionalidad de principios se impone al intérprete del derecho, por un lado la tentativa de realizar la ejecución menos onerosa al ejecutado y por el otro lado a busca la efectividad del derecho material de forma rápida y económica.

Además que específico a la ejecución, el principio de la menor gravedad de la ejecución tiene previsión infraconstitucional, en cuanto a los principios de la efectividad y de la celeridad procesal tiene previsión constitucional y por tal deben prevalecer ante cualquier enfrentamiento por  la antinomia de sus disposiciones.

No es razonable la imposición de gravamen al acreedor en el sentido de tener que buscar por sinuosos medios los bienes del acreedor pasibles de embargo, en tanto haya la posibilidad del sistema electrónico que atienda a la preferencia expresada en el Art. 655, del CPC. No se puede proteger el incumplimiento del derecho que fuera declarado.

En cuanto a la importancia de la efectividad, Darci Guimarães Ribeiro, pregunta:

 

“¿La efectividad se nos presenta como un principio, sobre principio o postulado? Para que la pregunta pueda ser correctamente respondida es fundamental destacar la importancia de la efectividad dentro de los presupuestos constitucionales del Estado Democrático de Derecho. De acuerdo con nuestro entendimiento, ella, la efectividad, compone uno de los elementos integrantes de esta concepción de Estado, en la medida en que contribuye a la construcción de una sociedad más justa (Art. 3º, inc. I, de la CF), basada en la dignidad de la persona humana (Art. 1º, inc. III, de la CF), pues de acuerdo con Rui Barbosa la justicia prestada de forma tardía equivale a injusticia calificada”.

 

El autor va además, afirmando que “En esta inflexión, podemos seguramente afirmar que existe el deber constitucional de promover la efectividad del derecho (…)”.

Para Ribeiro, más que principio, la efectividad en el derecho procesal brasileño es un postulado, considerado “la real importancia de la efectividad en la construcción del Estado Democrático de Derecho”.

Se ampara en los fundamentos Humberto Ávila, para el cual los postulados normativos “son normas inmediatamente metódicas, que estructuran la interpretación y aplicación de principios y reglas mediante la exigencia, más o menos específica, de relaciones entre elementos con base en criterios”.

Para Ávila, los postulados, como la efectividad, son meta normas situadas en un plan distinto y establecen la estructura de aplicación de otras normas, principios y reglas.

Luego, la efectividad y la celeridad serían un modo de raciocinio sobre el proceso, que estructura la aplicación del proceso civil, por lo que concluimos por la inequívoca posibilidad de adopción del embargo online como primer medio para la efectivizar el derecho, precisamente del Art. 655, del CPC.

Scarpinella Bueno, a su vez, sostiene que:

 

La ´preferencia’ por el medio electrónico es más que justificable en función del tiempo necesario para levantar las informaciones requeridas y del tiempo necesario para realizar el bloqueo de las cantidades eventualmente encontradas que tiende a ser mayor que el tiempo necesario para que el ejecutado levante los valores de esta o aquella institución financiera”.

 

Se trata así, de un medio moderno, capaz de evitar posibles fraudes a la ejecución y frustración del acreedor del derecho.

A toda prueba, la efectividad y la celeridad no pueden ser obstaculizadas por las disposiciones del art. 620, del CPC.

Esto porque en el caso que así no fuese, se estaría reconociendo la prevalencia de una restricción sobre un derecho indudablemente reconocido por el propio Poder Judicial. La menor restricción posible seria observada por la previa oportunización de manifestación e indicación de bienes al embargo por el deudor, lo que se puede desprender del art. 652 y siguientes del CPC.

Así, se tiene que el mecanismo de búsqueda electrónica por medio de sistema que interconectan el Poder Judicial, el Banco Central del Brasil y las instituciones financieras vinculadas constituyen un avance en absoluta armonía con el derecho y con la contemporaneidad, lo que se busca es dar el derecho a quien hace justicia.

 

  1. Dos problemas e implicaciones jurídicas

 

En que pese a toda la contribución para la efectividad de la justicia para la ejecución, el Sistema BACEN-JUD no está libre de críticas, algunas de las cuales aquí se analizará por presentar dificultades reales a ser enfrentadas por la práctica forense diaria y por el perfeccionamiento de las posibilidades del sistema.

 

05.1 Del bloqueo de valores inembargables

 

El Código de Proceso Civil brasileño protege por su inciso IV, del art. 649, “los vencimientos, subsidios, sueldos, salarios, remuneraciones, rendimientos de jubilaciones, peculios y montepíos”, en fin, que busca proteger cualquier cantidad recibida por el deudor cuyo destino sea su sobrevivencia.

El embargo electrónico puede, también, venir a recaer sobre valores destinados al pago de salario de los empleados de una empresa ejecutada. Esta situación causaría, no solo daños a la posible empresa ejecutada, si no también a terceros, que en el ejemplo quedarían sin el pago de sus salarios. Esto sin tener en cuenta que el porcentaje de la facturación de la empresa ejecutada es inembargable, conforme dispone la regla del Art. 655, VII, del CPC.

Así, de pronto se depara con un problema cuando los valores localizados por el sistema BACEN-JUD corresponden a los salarios recibidos por el ejecutado, estarían destinados  para su sustento  y de su familia.

Tal situación de aparente conflicto fue remediada por el propio Art. 655-A, del CPC, en su § 2º que dispone: “Compete al ejecutado comprobar que las cantidades depositadas en cuenta corriente se refieren a la hipótesis del inciso IV de caput del Art. 649 de esta Ley o que están revestidos de otra forma de inembargabilidad”.

La cuestión fue resuelta por el legislador de forma clara, atribuyendo al ejecutado la obligación de alegar y demostrar que los valores bloqueados por el sistema en cuestión tengan naturaleza que le confieren la inembargabilidad.

Así que “Efectuado el embargo electrónico sobre importes revestidos de inembargabilidad, de acuerdo con el inciso IV del final del Art. 649 del Código de Proceso Civil o por otra forma, corresponderá al ejecutado llevantar la cuestión en embargos a la ejecución (Cód. Cit., Arts. 736 e 745, II) o, caso transcurrido el plazo de embargos (Cód. cit., Art. 738), por petición simple, teniendo en cuenta que vicios en el embargo constituyen materia de orden público, pasibles de alegato en cualquier momento y conocidas de oficio”, conforme enseña Moacyr Amaral Santos.

En verdad, de esta resolución legal surge un nuevo problema: el tiempo para la liberación de los valores bloqueados. Nótese que el tema es de fundamental importancia, considerando que los valores no disponibles pueden ser los únicos que el ejecutado tenía para el sustento suyo y de su familia.

 

05.2 De la demora para desbloquear valores indebidos

 

Aunque extremamente ágil en la no localización y bloqueo de valores, por cuenta de la informatización de este procedimiento, el camino al revés no es así.

Para entender la situación el abogado hace una aclaración de como ocurre el bloqueo en la práctica. Guilherme Goldschmidt explica que:

 

Actualmente, las solicitudes de bloqueo de cuentas son enviadas por los jueces al Banco Central, vía BACEN-JUD, de forma rápida y eficaz. Vale notar que, cuando los magistrados utilizan el sistema BACEN-JUD de embargo online, al digitar el CNPJ de la empresa, la orden dada alcanza a todas las cuentas del deudor, de manera simultánea

Entretanto, las respuestas de los bancos a los jueces solicitantes demoran por lo menos dos días útiles, plazo que comienza a fluir de la orden electrónica de bloqueo, debidamente protocolizada, y expira solamente después de la consulta del magistrado al sistema BACEN-JUD. Así, confirmando el bloqueo junto a la institución financiera, el juez determinará la transferencia al Banco del Estado, lo cual automáticamente, generará depósito judicial, con envío de correo electrónico al magistrado informando los datos del depósito”.

 

Se constata tratarse de un sistema cuya rapidez está dirigida a la localización de valores al bloqueo de estos.

Eventuales bloqueos sobre valores no embargables, excesos de embargos o cualquier otra equivocación necesitaran de la intervención física del juez, de los servidores de la justicia y de las instituciones financieras. La situación es delicada y se sabe que la no disponibilidad de capital por pocos días es capaz de generar grandes perjuicios a una empresa o persona jurídica, a veces irreparables.

Además, conforme se evidenció del procedimiento arriba coitado, la orden de bloqueo se dirige a cualquier cuenta que mantenga el ejecutado pudiendo bloquear más de una cuenta corriente la cual ya sería suficiente para satisfacer el crédito ejecutado.

En este sentido, Goldschmidt afirma que “en varios casos el magistrado no libera inmediatamente las otras cuentas bloqueadas, aguardando la transferencia del valor del débito a la cuenta a nombre del juicio”, situación de hecho constatada que parece configurar abuso en la ejecución.

La cuestión puede ser resuelta, aunque en parte, por la cautela del juzgador. Esto porque conforme resalta Amaral Santos, “El juez puede aguardar las informaciones, por vía electrónica, para determinar el orden de embargo, o al expedir la solicitud de consulta ya ordenar que la respuesta positiva implica la inmediata indisponibilidad del valor encontrado hasta el monto correspondiente a la ejecución”.

La espera del retorno de la solicitud de información, de la cual nada sabrá el ejecutado, puede garantizar el bloqueo cierto y eficaz, considerando hasta los valores que constan en las cuentas a ser bloqueadas.

Se aclara que esta información se limita a la  existencia o no de depósito o aplicación hasta el valor indicado en la ejecución, conforme expresa el § 1º del Art. 655-A, del CPC. Este parágrafo legal busca atender las críticas que eran parte de la doctrina, antes de la promulgación de la Ley nº 11.382/2006, a la posible quiebra del sigilo bancario del ejecutado.

 

05.3 Del bloqueo múltiple

 

Conforme se vio arriba, por cuenta de una solicitud, habiendo multiplicidad de cuentas corrientes del ejecutado, se podrá dar el llamado bloqueo múltiple.

Esto ocurre cuando una cuenta/agencia/institución no se especifica en la solicitud del juez. Así, la orden será encaminada a todas las instituciones, las cuales cumplirán la decisión judicial de forma independiente unas de otras, pudiendo así, sobrepasar el valor determinado por el magistrado.

Aunque tal caso pueda ocurrir, haya en vista que un banco no tenga informaciones sobre los cuentacorrentistas de los demás bancos, el magistrado puede dirigir a su orden para determinada institución y, también, especificar una agencia y más aún una cuenta.

Se trata de una medida de cautela que debe y puede ser tomada por el juez a fin de evitarse este perjuicio, pero de cuyas informaciones en regla no dispone el magistrado.

El sistema permite también la posibilidad de registro, junto a los Tribunales Superiores, de una cuenta única para eventual hipótesis de bloqueo.

Las soluciones al problema se presentan insuficientes a fin de que se realice el bloqueo de forma exacta e inequívoca, lo que a nuestro entender no reduce la importancia y la validez del sistema que ya se encuentra en su versión 2.0 y viene siendo perfeccionado.

Se nota que la utilización del mecanismo para el embargo online puede producir, efectos o consecuencias que van más allá de la determinación pretendida, lo que ciertamente impone cuidados con el sistema.

 

  1. Conclusión y consideraciones finales

 

Considerados algunos de los aspectos positivos, otros negativos del Sistema BACEN-JUD, es importante relevar que el mismo busca efectivizar la prestación jurisdiccional, dando a quien tiene el derecho material de aquello que se le debe.

Bien resaltó el maestro Piero Calamandrei, citado por Grinover: “vanas serían las libertades del individuo, si no pudieran ser reivindicadas y defendidas en juicio: porque los derechos fundamentales, abstractamente formulados por la constitución, sólo pueden ser afirmados, positivos y concretados por los tribunales”. Tratándose de la celeridad y la efectividad de derechos constitucionales claros (Art. 5º, XXXV y LXXVIII, de la Constitución Federal de 1988).

 

El problema de la ejecución en el Brasil es grave, sea por la dificultad de localización de bienes, sea por el elevado número de inembargabilidad  elegida por la Ley procesal.

Relativamente a la ejecución de títulos judiciales (sentencias), la falta de efectividad y celeridad en la ejecución del derecho potencia un nuevo conflicto entre las partes, ya que hasta entonces nada se encuentra resuelto en el mundo de los hechos, así como repercute en la credibilidad del ya arrogante Poder Judicial, el cual necesita afirmar su papel solamente por la efectiva aplicación del derecho que dice.

Además, el momento procesal en el cual surge y se instituye el bloqueo online es fundamental para demostrar su pertinencia.

Expresa el Art. 652 del CPC, que el “ejecutado será citado para, en el plazo de 3 (tres) días, para efectuar el pago de la deuda”. Se admitirá así, solamente el bloqueo online cuando el citado y ejecutado no pague la deuda.

Luego, a despecho de las posibles críticas lanzadas contra el embargo online, se denota que los resultados de la utilización del sistema buscan hacer efectivo el derecho y no del mantenimiento de su incumplimiento, razón por la cual la adopción del mismo se evidencia benéfica.

Finalmente, el postulado de la eficacia de la prestación jurisdiccional impone que se adopten las medidas posibles para la satisfacción del derecho.

 

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Abstract:

Este artículo trata de la posibilidad legal del empeño electrónico en el sistema procesal brasileño. Se hace el examen bajo la óptica de la efectividad en la ejecución judicial y de la contribución que un nuevo y eficiente sistema de búsqueda de dinero en cuentas corrientes y aplicaciones pueda traer a la constricción de valores del deudor desconocido por el acreedor. El sistema, proveniente de la alianza entre el Poder Judicial y el Banco Central de Brasil, también trajo consigo algunos problemas prácticos, que vienen siendo enfrentados y vencidos por el cotidiano forense. Se hace un cotejo entre el deseo de celeridad y efectividad procesal y la aplicación del sistema BACEN-JUD, que no superan la necesidad de imposición del derecho material.

 

Palabras clave:

proceso civil, ejecución judicial, efectividad, medios electrónicos de ejecución, sistema bacen-jud

 

Abstract

 

This article discusses the legal possibility of electronic attachment in the Brazilian procedural system. The issue is examined regarding its effectiveness in judicial execution and the contribution a new and efficient system that seeks money in checking and investment accounts may bring to the constriction of amounts owed by the debtor and of which the creditor is unaware. The system derives from collaboration between the Judiciary Power and the Brazilian Central Bank, but has brought along a few practical problems that law operators have been facing and overcoming in their daily practice. It compares the desire for procedural speed and effectiveness against the application of the BACEN-JUD system, which do not supersede the need to impose material law.

 

Key words: civil proceedings, judicial execution, effectiveness, electronic means of execution, bacen-jud system

 

 

PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DO CONTROLE JURIS-DICIONAL, OUTROS E CONSTITUIÇÃO FEDERAL

André Jobim de Azevedo
Guilherme Luiz Thofehrn Osório

 

INTRODUÇÃO

        

Originariamente em tempos de auto composição dos conflitos entre os homens pela Lei de Talião, a aplicação do “olho por olho, dente por dente”  era a  solução. A supremacia do império da força, no entanto, foi  incapaz de manter a paz social.

A Intervenção do Estado – substitutiva ao particular na solução conflitos – avançou na tentativa de melhor responder às necessidades de relacionamento e proteção dos cidadãos.  

Proibida a reação privada imediata como regra, a jurisdição se apresentou como melhor forma de definir o direito  (“juris et dictio”).

Monopólio do Estado na solução dos conflitos, essa evolui para  além da  simples atribuição do Direito a quem o tenha, para alcançar coercitividade de execução.

A jurisdição se afirma como necessidade de fazer valer na prática o regramento prévio e teórico instituído pelo direito em determinado sistema jurídico. É a aplicação  “in concreto” das normas jurídicas. Dizer e fazer – julgar e realizar as controvérsias. Atuar no sentido do conhecimento das demandas e execução das decisões e julgamentos.

O caminho socialmente evoluído, civilizado e aceitável é o processo, já que por vias próprias não mais é possível a implementação de soluções.

O processo judicial tem missão nobre e assim deve ser adequadamente disposto e regrado como forma de proteção à cidadania, afastando a barbárie da convivência social.

Pois este instrumento de realização do direito material é a via própria para manter a convivência social harmonizada.

Não parece, no entanto que o mesmo tenha se perfectibilizado por completo à vista da ausência de efetividade escancarada e que não se limita ao ambiente pátrio.

É célebre a notável  afirmação do processualista italiano Chiovenda de que o processo deve dar a quem tem um direito tudo aquilo e precisamente aquilo que ela tem o direito de obter.

Assim, deve ser  direito de todos, a  utilização do processo (instrumento da jurisdição) na busca, no dizer de Carnelutti, “da justa composição da lide”. A solução da controvérsia, na melhor condição possível.

O Direito Processual  como ciência autônoma se fortalece e ao mesmo tempo necessita de proteção. Ação do Estado para que cumpra seu mister relativamente à todo aquele que dele necessitar e garanta essa possibilidade como um direito amplo que a todos beneficie.

Hoje cercado de complexos estudos científicos o Direito Processual Civil é servido por normatização positivada de toda a ordem, bem como de firme principiologia que o instrui e fundamenta.

 

Constituição Federal

 

Nesse sentido e finalizando estabilizar e bem orientar a solução das controvérsias a codificação é caminho importante, mas nem sempre estável o suficiente.

As regras atinentes à judicialização das quizílias são capazes de colocar em pé de igualdade aqueles que se apresentam para busca de definição.

Importante caminho o da legislação ordinária, o qual, entretanto por si só é incapaz de realizar tão majestosos objetivos, especialmente em sistemas e regimes jurídicos e políticos menos estáveis.       

Nesse sentido a existência e aplicação de princípios, retaguarda a correta condução do processo e de alguma maneira dá ao sistema maior confiabilidade.

Ocorre que o procedimento de produção legislativa pela via ordinária é notoriamente instável, no sentido de que basta edição de outra norma ordinária, para que a matéria tenha seu rumo alterado, gerando insegurança, quer quanto ao próprio direito processual, quer quanto à proteção da qual se incumbe o Estado e à qual se obriga.

Por conta dessa inegável realidade, o sistema brasileiro acabou  estendendo ao processo civil uma estratégica utilizada em outros ramos do direito, a constitucionalização.

Em nosso sentir não significando apenas, e quem sabe, um desvirtuamento da finalidade e formato constitucional, mas acima de tudo uma saída, um clamor em alta voz  à uma condição mais segura. Um apelo à uma sedimentação e estabilidade maior que é própria das Constituições Federais.

Em um país como o Brasil, onde por mais de 20 anos suportaram-se regime autoritários e ditatoriais, alguma compreensão deve ter-se  dessa, por nós chamada, atecnia constitucional. A hesitação e mutação legislativa, ao sabor dos interesses, causou trauma, ensejando, na primeira oportunidade de redemocratização do país e formulação de Carta Constitucional, a construção quase ordinária desse diploma orientador maior que é a Constituição Federal.

E aqui se concentra a crítica ao excessivo detalhismo e particularização da Carta que a torna inaceitavelmente distante daqueles aos quais se destina, os cidadãos da nação. Uma carta constitucional que ainda adolescente (1988) já conta surpreendentemente com mais de 50 emendas. Compare-se a estruturação e organização trazida pelas centenárias Constituições Francesa e Norte Americana que com um rol restrito de orientações estruturais e definições políticas foram capazes de atravessar os anos e continuam a ser instrumento de orientação dos povos aos quais se destina. Em especial, a duocentenária norte-americana, contando ainda hoje com pouco mais de 20 emendas. São regências de conhecimento e convicção da população, diferentemente do que se passa em terra nacional, onde, nem mesmo sequer os profissionais do direito têm a devida intimidade com a mesma, o que se dirá da pobre e inculta população deste país, para dizer o menos.

No Brasil, desde a Constituição  Federal de 1946 se pretende garantir o acesso amplo da cidadania ao Poder Judiciário. A vigente Carta Constitucional de 1988 é pródiga em detalhes em geral em seus 250 artigos e mais 83 artigos de atos de disposições constitucionais transitórias, o que a faz rapidamente desatualizada e enseja formulação de emendas…

Assim é de alguma ocorrência a existência de tensão constitucional entre normas que protegem interesses diversos e que podem ser postas em situação de antagonismo. Importante remédio é a compatibilização, para convivência simultânea dos princípios fundamentais envolvidos. O sistema jurídico deve ser compreendido como um todo aberto permeável, lacunoso, e antinômico (com contradições). É com o Princípio da Proporcionalidade que se  dá o adequado manejo à estas ocorrências.    

Especificamente no caso do processo, já se fala em “processo civil constitucional”, ante a evidente inclusão no Diploma Maior de normas dessa natureza, especialmente quanto aos princípios processuais, nela incluídos.

O acesso ao Poder Judiciário é GARANTIA CONSTITUCIONAL PÉTREA, conforme artigo 5º, XXXV da Carta Magna, sendo que as normas destas disposições não podem ser alteradas por emenda constitucional, senão por constituinte exclusiva com finalidade de formulação constitucional. Essa a previsão constitucional  do artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV.

Assim está constitucionalmente positivado que  “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito“.

 

PRINCÍPIOS

 

Norteadores da compreensão do fenômeno jurídico como instrumento de referência de um problema jurídico qualquer, os princípios são fundamentais para higidez do sistema. Não princípios físicos, inafastáveis a que os fenômenos da natureza se submetem inexoravelmente, como por exemplo a gravitação.

Como proposições básicas, fundamentais que embasam, servem de assento à estrutura de determinada ciência. Preparam a organização e desenvolvimento da mesma. Ponto de partida  para o desenvolvimento de qualquer sistema de conhecimento e que a este conferem validade, tidos por verdades fundamentais.

Também no Processo Civil, onde são considerados como verdades ou juízos fundamentais. São pilares jurídicos de maior grandeza, “holofotes”, os quais iluminam com grande intensidade qualquer entendimento amparado na legislação positivada.

São norteadores para a edificação  das normas jurídicas e para a aplicação do direito processual “in concreto”.

Alguns constitucionalizados, constituindo-se em  normas jurídicas qualificadas, da mais alta hierarquia normativa.

Garantem a hegemonia e a unidade do sistema jurídico, determinando que as normas de hierarquia inferior guardem respeito e observância aos mesmos, em termos hierárquicos.

Orientam a  criação do direito infraconstitucional, com sua previsão “in abstrato”, e que deve ser erigido em consonância com os mesmos.

Princípios Processuais não tem sentido absolutamente autônomos e limites rígidos. Se interpenetram em zona “gris” de relação entre os mesmos, e até eventualmente se confundem.

                                         

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E PROCESSUAIS–

                  

Não se poderia tratar dos princípios processuais sem algumas breves  observações sobre aqueles GERAIS e FUNDAMENTAIS.

O  artigo 5º da Constituição Federal brasileira, incluído no Título II – Dos Direitos e Garantias  Fundamentais, e no capítulo I – Dos Deveres e Garantias Individuais e Coletivos – contém as consagradas Cláusula Pétreas (artigo 60, § 4º, inciso 4º da Constituição Federal), NÃO passíveis de alteração ou supressão, nem por emenda constitucional (tal como a Forma Federativa do Estado, o Voto Direto Secreto, Universal e Periódico, a Separação dos Poderes). Constitui-se em núcleo intangível da Constituição Federal.

 

Este artigo 5º da  Constituição Federal, em seu caput assegura à todos os cidadãos igualdade de tratamento, inclusive, conseqüentemente, às partes no processo, o que vem reiterado no artigo  125, inciso I Código de Processo Civil.

O verdadeiro princípio da igualdade é o da igualdade substancial: a lei dá tratamento igual às partes iguais e desigual às partes desiguais, como única forma de atingir verdadeira igualdade, o que deve ser feito fundamentadamente.

Como exemplo de adequada vazão do mesmo, a previsão legal de prazo de defesa em dobro para a Defensoria Pública e prerrogativa de intimação pessoal (artigo 5º, §5º Lei 1060/50, 44 inciso I, 89 inciso I, 128 inciso I, Lei Complementar 80/94), como necessária proteção à defensoria pública alcançada a todo o cidadão, comparativamente aos Escritórios de advocacia, em face das distintas condições de  infra estrutura, volume de atendimentos, etc, pelo que  justificável a previsão legal da exceção. Verdadeira aplicação do princípio da igualdade.

 Esse princípio deve ser examinado conjunta e harmonicamente com o Princípio da Legalidade, do inciso II, do mesmo artigo constitucional 5º, que reza que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude da lei”.

Legalidade esta de há muito consagrada pela  Declaração Universal dos Direitos do Homem 1948,  artigo XXIX , bem como no asseverar de que a “Liberdade é o direito de fazer  tudo aquilo que as  leis  permitem” na indispensável clássica obra de Montesquieu, “De l’esprit des  lois”,  Livro XI capítulo III.

À lei é, pois, possível determinar proteções diversas buscando a real efetivação do princípio da igualdade, com regências particulares assim dirigidas. Pode e ampara proteção à mulher (100, I Código de Processo Civil instituindo foro privilegiado na ação de alimentos), ao consumidor (artigo  5º XXXII, Constituição Federal), praticando tratamento diverso devidamente FUNDADO, como  compensação à certas desigualdades.

Desses princípios mais que fundamentais, que poderiam ser chamados de supra princípios, decorrem o Princípio do Devido Processo Legal, da Ampla Defesa,  do Contraditório, os quais  estão diretamente ligados ao processo.

Assim é que aos princípios fundamentais se coloca como pressuposto garantir o acesso ao Poder Judiciário, ao processo como meio de solução de controvérsia.

Lembre-se que não basta assegurar acesso, senão acesso eficiente. É condição inafastável da sociedade democrática o controle jurisdicional do acesso ao Poder  Judiciário, da sua indeclinabilidade na solução das controvérsias, o que envolve a questão da efetividade. Esta não se constitui em problema nacional, mas mundial, no sentido de que vários  países desenvolvidos do mundo o enfrentam, sendo certo que a demora da conclusão do processo a todos atormenta.

Vários são os princípios processuais informados pelo princípio do Acesso ao Poder Judiciário, ligados com a  ação e a defesa, como o princípio  Da Demanda, Da autonomia da Ação, Dispositivo, Ampla Defesa, Defesa Global, Contraditório, Eventualidade.

A Garantia de Acesso ao Poder Judiciário constitui-se em garantia prévia ao processo, supra constitucional, que informa outros tantos ligados aos direitos das partes no processo.

Já a Declaração Universal dos  Direitos do Homem e do Cidadão, ONU 1948, artigo  10º, a Convenção de Roma de 1950- Convenção Européia para Salvaguarda  dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais artigo  6º, o  Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, artigo 14,1 e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos da Costa Rica, 1969, artigo 8º,1, assim asseveraram.

Em sede de Código de Processo Civil, nem mesmo na hipótese de lacuna ou obscuridade da  lei afasta a jurisdição (artigo 126), sendo nestas circunstâncias permitido ao julgador recorrer à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.

Lembrado na  doutrina nacional, Mauro Capelletti se posicionou sobre o movimento de acesso à Justiça nos Estados contemporâneos, tendo constatado 3 ondas : 1)pobreza como obstáculo de acesso ao Judiciário e a Representação legal do pobre;          2) proteção aos interesses difusos, fenômenos da sociedade de massa; coletivização do Direito; 3) risco de burocratização do Judiciário.

Também referido como Direito à ação, direito de ação e direito de petição, com sutis diferenças de enfoques que aqui não merecem relevo, tem-se-o como o Direito de dirigir-se a juiz ou tribunal competente para que  lhe aprecie lesão ou ameaça de direito. Direito de peticionar aos órgãos do Poder Judiciário.

No caso  pátrio, após a Constituição Federal de 1988, restou esclarecida a desnecessidade de prévio esgotamento das vias administrativas, antes da busca do Poder Judiciário, afastada  a “instância administrativa de curso forçado” e a “jurisdição condicionada”.

É o Direito de todo o homem de ser ouvido por Tribunal independente e imparcial, previamente instituído por lei. À este submeter todo e qualquer direito subjetivo, individual, coletivo, transindividual, difuso e individual homogêneo.

E a tanto não basta formalmente garantir acesso aos Tribunais, mas sim adequada tutela jurisdicional, efetiva e tempestiva, em prazo razoável, sem dilações indevidas, proporcional à complexidade da discussão. Nesse sentido deve por igual se observar e para tal contribuir, o comportamento de  juízes e procuradores das partes, assim como todos aqueles que no processo intervém.

Muito se fala, e acertadamente, na crise do processo, questionando a sua  não utilidade, morosidade, o que  se constitui verdadeiramente em  Justiça inacessível.

É o devido Direito AO processo e NO processo (Regularidade processual). A busca da prestação de jurisdição em breve espaço de tempo, o  tempo justo para a consecução do escopo.

Não se pode, nesta ótica, deixar de observar a significância da diferença de capacidade econômica das partes, como definidores de capacidade de  resistência e espera na demora na solução final da contenda.

Assim é que, parte disso tudo  é garantir o acesso ao Poder Judiciário e ao processo aos jurisdicionados que não disponham de condições, o que se pode viabilizar pelo princípio da Assistência Judiciária Gratuita. Trata-se também de cláusula pétrea, prevista pelo artigo 5º, inciso LXXIV da  Constituição Federal e que se rege basicamente pela  Lei 1060/50. Além desse, o artigo constitucional 134 (que institui a Defensoria Pública).        

Na seara do acesso à Justiça, no Brasil muito se resistiu à  utilização da via da arbitragem como meio de solução de controvérsia, o que se sustentava infringente à norma constitucional. Recentemente a arbitragem se positiva e têm previsão na Lei 9307/96.

A despeito da formalização legal, demorou até que o Supremo Tribunal Federal definisse e  decidisse pela constitucionalidade, no sentido de que a manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória no momento da celebração do contrato  e a permissão dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar o termo de compromisso não ofende ao artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal. Forçoso reconhecer, no entanto, que essa  interessante e necessária via da arbitragem ainda se reveste de resistência cultural que sabe-se lá quando será vencida…

Kazuo Watanabe, ilustre processualista brasileiro é preciso ao se manifestar sobre o tema asseverando que  “o direto de acesso à Justiça é, fundamentalmente, direito de acesso à ordem jurídica justa. A problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites de acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim, viabilizar o acesso à ordem jurídica justa”

Recentemente mais uma emenda constitucional foi editada, a de número 45,  com fim expresso de reformar o Poder Judiciário, mas que veladamente buscava instituir controle externo ao Judiciário. Declarou-se a agilização e  efetividade do processo como objetivo. Apenas para referir, pois se trata de outro tema, efetivamente foram criados vários órgão de controle externo como o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público, o Conselho Superior de Justiça do Trabalho.

Pois essa Emenda Constitucional inseriu mais um inciso no artigo 5º, da Constituição Federal , o inciso LXXVII (78º) que fala que – “a todos são assegurados razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Não se vê aí uma novidade, já tal leitura de efetividade já era feita antes desse inciso, quanto aos dispositivos existentes na própria Carta e artigo 5º, LIV – devido processo legal, LV – ampla defesa, XXX – acesso ao Poder Judiciário. “a lei não excluirá da apreciação…”.Estes já se interpretavam no sentido de  que a prestação jurisdicional devesse ser efetiva proteção, célere, justa, com condição real de  atuação no mundo dos fatos.

Ocorre que a novel norma constitucional, em verdade nada significa. O que é “razoável duração”? Quanto tempo significa efetividade na prestação jurisdicional aos efeitos da razoável duração? Quais os meios disponíveis para assegurar a celeridade de tramitação?

É importante perceber que se trata de norma programática, não auto-aplicável, que traz  conceitos abertos e subjetivos. Obviamente dependem de formulação legislativa ordinária, e que até agora não sobreveio.

Algumas alterações no sentido da efetivação e qualificação da prestação jurisdicionalforam determinadas pela EC 45, como a do artigo 93, II –c) promoção dos juízes por critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição. Ainda, freqüência e aperfeiçoamento em cursos. Oficiais e reconhecidos de aperfeiçoamento, e) não promoção se houver injustificada retenção autos além do prazo. Determinou no inciso VI – Aperfeiçoamento por cursos, no inciso XII – Atividade Jurisdicional Ininterrupta. (vedado férias coletivas, dias sem expediente: plantão permanente.), inciso XIII – número de juízes proporcional à demanda, o inciso XV – Distribuição Imediata  de processos e em várias situações a possibilidade de justiça itinerante e funcionamento descentralizado, câmaras regionais, assim como o artigo 126 prevendo a organização  Varas especializadas – exemplificativamente para conflitos fundiários.

É de se referir ao final que nessa tentativa de Garantir o Acesso ao Poder Judiciário – um acesso amplo e qualificado – se instituíram, por igual, dois tipos de Súmulas a serem promulgadas pelos Tribunais Superiores, e de enorme  controvérsia.   

A Emenda trouxe também a Súmula vinculante (artigo 103, A da Constituição Federal), que obriga ao julgador a sua aplicação, matéria essa relevante e que será objeto de texto diverso, antecipando-se, contudo, que tem o significado de cerceamento de liberdade no julgamento do magistrado, engessamento da Jurisprudência, mas que encontra em seu favor alguns outros importantes argumentos.

Assim, e para concluir, é que se reconhece firme utilidade da constitucionalização de princípios processuais, notadamente da garantia de acesso ao poder judiciário, sem o qual  torna-se formal e ocioso o direito material que a todos rege e orienta.   

 

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INTRODUCCIÓN

        

Originariamente en tiempos de la autocomposición de los conflictos entre hombres por la Ley de Talión, y la aplicación del “ojo por ojo, diente por diente”  era la solución. La supremacía del imperio de la fuerza, sin embargo, fue incapaz de mantener la paz social.

La Intervención del Estado – sustitutiva a la acción de la persona en la solución de conflictos – avanzó en la tentativa de responder mejor a las necesidades de relación y protección de los ciudadanos.

Prohibida la reacción privada inmediata como regla, la jurisdicción se presentó como la mejor forma de definir el derecho  (juris et dictio).

Monopolio del Estado en la solución de los conflictos, esta evolucionó, para más allá de la simple atribución del Derecho a quien lo tenga, para alcanzar coercitividad de ejecución.

La jurisdicción se afirma como necesidad de hacer valer en la práctica el reglamento previo y teórico instituido por el derecho en determinado sistema jurídico. Es la aplicación in concreto de las normas jurídicas. Decir y hacer – juzgar y realizar las controversias. Actuar en sentido del conocimiento de las demandas y ejecución de las decisiones y juzgamientos.

El camino socialmente evolucionado, civilizado y aceptable es el proceso judicial, ya que por vías privadas no es más posible la implementación de soluciones.

El proceso judicial tiene misión noble y así debe ser adecuadamente dispuesto y pautado como forma de protección a la ciudadanía, apartando la barbarie de la convivencia social.

Este instrumento de realización del derecho material es la vía propia para mantener la convivencia social armonizada.

No parece, sin embargo que el mismo se haya perfeccionado por completo a la vista de la ausencia de efectividad abierta y que no se limita al ambiente patrio.

Es celebre la notable afirmación del procesalista italiano Chiovenda de que el proceso debe dar a quien tiene un derecho todo aquello y precisamente aquello que tiene derecho a obtener.

Así debe ser derecho de todos, la utilización del proceso (instrumento de la jurisdicción) en la búsqueda, en el decir de Carnelutti, “de la justa composición de la lid”. La solución de la controversia, en la mejor condición posible.

El Derecho Procesal como ciencia autónoma se fortalece y al mismo tiempo necesita de protección. Acción del Estado para que cumpla su deber relativamente a todo aquel que de él necesite, y garantice esta posibilidad como un derecho amplio que a todos beneficie.

Hoy cercado de complejos estudios científicos el Derecho Procesal Civil es servido por normativización positiva de toda orden, así como de firme principiología que instruye y fundamenta.

Constitución Federal

En este sentido y finalizando estabilizar y orientar bien la solución de las controversias la codificación es camino importante, pero no siempre estable lo suficiente.

Las reglas atinentes a la judicialización de las antipatías son capaces de colocar de pie la igualdad de aquellos que se presentan para buscar definición.

Importante camino es el de la legislación ordinaria, la cual, sin embargo por sí sola es incapaz de realizar tan majestuosos objetivos, especialmente en sistemas y regimenes jurídicos y políticos menos estables.

En ese sentido la existencia y aplicación de principios, cubren la correcta conducción del proceso y de alguna manera da al sistema mayor confiabilidad.

Ocurre que el procedimiento de producción legislativa por la vía ordinaria es notoriamente inestable, en el sentido de que basta la edición de otra norma ordinaria, para que la materia tenga su rumbo alterado, generando inseguridad, sea al propio derecho procesal, ya sea a la protección de la cual se incumbe el Estado y a la cual se obliga.

Por cuenta de esta innegable realidad, el sistema brasileño acabó extendiendo al proceso civil una estrategia utilizada en otros ramos del derecho,  la constitucionalización.

En nuestro sentir no significa sólo, y quién sabe, una desvirtualización de la finalidad y formato constitucional, pero por sobre todo una salida, un clamor en voz  alta a una condición más segura. Una apelación a una sedimentación y estabilidad mayor que es propia de las Constituciones Federales.

En un país como Brasil, donde por más de 20 años se soportaron regimenes autoritarios y dictatoriales, alguna comprensión se debe tener de esa, por nosotros llamada, mala técnica constitucional. La hesitación y mutación legislativa, al sabor de los intereses, causó trauma, proporcionando, en la primera oportunidad de redemocratización del país y formulación de la Carta Constitucional, la construcción casi ordinaria de este título orientador mayor que es la Constitución Federal.

Y aquí se concentra la crítica al excesivo detallismo y particularización de la Carta que la torna inaceptablemente distante de aquellos a los cuales se destina: los ciudadanos de la nación. Una carta constitucional que aún adolescente (1988) ya cuenta sorprendentemente con más de 50 enmiendas. Si se comparan la estructuración y organización contenidas por las centenarias Constituciones Francesa y Norteamericana que con un rol estricto de orientaciones estructurales y definiciones políticas, fueron capaces de atravesar los años y continúan siendo instrumento de orientación de los pueblos a los cuales se destina. En especial, la bicentenaria norteamericana, contando hoy con poco más de 20 enmiendas. Son regencias de conocimiento y convicción de la población, diferente de lo que pasa en tierra nacional, donde, ni siquiera los profesionales del derecho tienen la debida intimidad con la misma, qué se dirá de la pobre e inculta población de este país, para decir lo menos.

En Brasil, desde la Constitución Federal de 1946 se pretende garantizar el acceso amplio de la ciudadanía al Poder Judicial. La vigente Carta Constitucional de 1988 es pródiga en detalles, en sus 250 artículos y otros 83 artículos de actos y disposiciones constitucionales transitorias, lo que la hace rápidamente desactualizada y proporciona la formulación de enmiendas…

Así es de algún caso la existencia de tensión constitucional entre normas que protegen intereses diversos y que pueden ser puestas en situaciones de antagonismo. Importante remedio es compatibilizarla, para la convivencia simultánea de los principios fundamentales involucrados. El sistema jurídico debe ser comprendido como un todo abierto, permeable, lagunoso, y antinómico (con contradicciones). Es con el Principio de la proporcionalidad que se da el adecuado manejo a estos casos.      

Específicamente en el caso del proceso, ya se habla de “proceso civil constitucional”, ante la evidente inclusión en el Diploma Mayor de normas de esta naturaleza, especialmente en cuanto a los principios procesales, en ella incluidos.

El acceso al Poder Judicial es GARANTÍA CONSTITUCIONAL PÉTREA, conforme el artículo 5º, XXXV de la Carta Magna, donde las normas de estas disposiciones no pueden ser alteradas por enmienda constitucional, sino por constituyente exclusiva con la finalidad de formulación constitucional. Esta es la previsión constitucional del artículo 60, parágrafo 4º, IV.

Así está constitucionalmente establecido que: “la ley no excluirá de la apreciación del Poder Judicial lesión o amenaza de derecho“.

 

PRINCIPIOS

Orientadores de la comprensión del fenómeno jurídico como instrumento de referencia de un problema jurídico cualquiera, los principios son fundamentales para la rigidez del sistema. No principios físicos, que no se apartan a que los fenómenos de la naturaleza se sometan inexorablemente, como por ejemplo la gravitación.

Como proposiciones básicas, fundamentales que basan, sirven de asiento a la estructura de determinada ciencia. Preparan la organización y el desarrollo de la misma. Punto de partida para el desarrollo de cualquier sistema de conocimiento y que a este confieren validez, tenidos por verdades fundamentales.

También en el Proceso Civil, donde se consideran como verdades o juicios fundamentales. Son pilares jurídicos de mayor grandeza, “reflectores”, los cuales iluminan con gran intensidad cualquier entendimiento amparado en la legislación positivada.

Son orientadoras para la edificación de las normas jurídicas y para la aplicación del derecho procesal in concreto.

Algunos constitucionalizados, constituyéndose en normas jurídicas calificadas, de la más alta jerarquía normativa.

Garantizan la hegemonía y la unidad del sistema jurídico, determinando que las normas de jerarquía inferior guarden respeto y observancia a los mismos, en términos jerárquicos.

Orientan la creación del derecho infraconstitucional, con su previsión in abstracto, y que debe ser erigido en consonancia con los mismos.

Principios Procesales no tienen sentido absolutamente autónomos y tampoco  límites rígidos. Se interpenetran en zona “gris” de relación entre los mismos, y hasta eventualmente se confunden.                        

                  

PRINCIPIOS FUNDAMENTALES Y PROCESALES

                  

No se podría tratar de los principios procesales sin algunas breves observaciones sobre aquellos GENERALES y FUNDAMENTALES.

El artículo 5º de la Constitución Federal brasileña, incluido en el Título II – De los Derechos y Garantías  Fundamentales, y en el capítulo I – De los Deberes y Garantías Individuales y Colectivos – contiene las consagradas “Cláusulas Pétreas” (artículo 60, § 4º, inciso 4º de la Constitución Federal), NO pasibles de alteración o supresión, ni siquiera por enmienda constitucional (tal como la Forma Federativa del Estado, o Voto Directo Secreto, Universal y Periódico, la Separación de los Poderes). Se constituye en núcleo intangible de la Constitución Federal.

Este artículo 5º de la  Constitución Federal, en su caput asegura a todos los ciudadanos igualdad de tratamiento, inclusive, consecuentemente, a las partes en el proceso, lo que viene reiterado en el artículo 125,  I del “Código de Proceso Civil”.

El verdadero principio de la igualdad es el de la igualdad substancial: la ley da tratamiento igual a las partes iguales y desigual a las partes desiguales, como única forma de alcanzar verdadera igualdad, lo que se debe hacer fundamentadamente.

Como ejemplo de adecuado aplicación del mismo, la previsión legal del plazo de defensa doble para la Defensoría Pública y prerrogativa de intimación personal (artículo 5º, §5º Ley 1060/50, 44 inciso I, 89, I, 128 I, Ley Complementaria 80/94), como necesaria protección a la defensoría pública alcanzada a todo ciudadano, comparativamente a los Bufetes, frente a las distintas condiciones de infraestructura, volumen de atención etc., por lo que se justifica la previsión legal de la excepción. Verdadera aplicación del principio de la igualdad.

Este principio debe ser examinado conjunta y armónicamente con el Principio de la Legalidad, del  II, del mismo artículo constitucional 5º, que reza que “nadie será obligado a hacer o dejar de hacer algo sino en virtud de la ley”.

Legalidad está desde hace mucho consagrada por la Declaración Universal de los Derechos del Hombre 1948,  artículo XXIX , así como en el aseverar que la “Libertad es el derecho de hacer  todo aquello que las leyes permiten” en la indispensable clásica obra de Montesquieu, “De l’esprit des lois”, Libro XI capítulo III.

A la ley es, pues, posible determinar protecciones diversas buscando la real efectivización del principio de la igualdad, con regencias particulares así dirigidas. Puede y ampara protección a la mujer (100, I Código del Proceso Civil instituyendo foro privilegiado en la acción de alimentos), al consumidor (artículo  5º, XXXII, Constitución Federal), practicando tratamiento diverso debidamente FUNDADO, como compensación a ciertas desigualdades.

De estos principios más que fundamentales, que podrían ser llamados de supra principios, resultan el Principio del Debido Proceso Legal, de la Amplia Defensa, de lo Contradictorio, los cuales están directamente ligados al proceso.

Así es que a los principios fundamentales se coloca como presupuesto garantizar el acceso al Poder Judicial, al proceso como medio de solución de controversia.

Recuérdese que no basta asegurar acceso, sino acceso eficiente. Es condición inapartable de la sociedad democrática el control jurisdiccional del acceso al Poder  Judicial, de su indeclinabilidad en la solución de las controversias, lo que involucra la cuestión de la efectividad. Esta no se constituye en problema nacional, sino mundial, en el sentido de que varios países desarrollados del mundo lo enfrentan, siendo cierto que la demora de la conclusión del proceso a todos atormenta.

Varios son los principios procesales informados por el principio del Acceso al Poder Judicial, ligados con la  acción y la defensa, como el principio De la Demanda, De la autonomía de Acción, Dispositivo, Amplia Defensa, Defensa Global, Contradictorio, Eventualidad.

La Garantía de Acceso al Poder Judicial se constituye en garantía previa al proceso, supra constitucional, que informa a otros tantos ligados a los derechos de las partes en el proceso.

Ya la Declaración Universal de los Derechos del Hombre y del Ciudadano, ONU 1948, artículo 10º, la Convención de Roma de 1950- Convención Europea para Salvaguarda de los Derechos del Hombre y de las Libertades Fundamentales artículo 6º, el Pacto Internacional de los Derechos Civiles y Políticos de 1966, artículo 14,1 y la Convención Americana sobre Derechos Humanos de Costa Rica, 1969, artículo 8º,1, así lo aseveraron.

En base al Código de Proceso Civil, ni siquiera en la hipótesis de laguna u oscuridad de la ley aparta la jurisdicción (artículo 126 CPC), en estas circunstancias se le permite, al juzgador, recurrir a la analogía, a las costumbres y a los principios generales de derecho.

Recordado por la doctrina nacional, Mauro Capelletti se posicionó sobre el movimiento de acceso a la Justicia en los Estados contemporáneos, habiendo constatado 3 ondas : 1)pobreza como obstáculo de acceso a la Justicia y la Representación legal del pobre; 2) protección a los intereses difusos, fenómenos de la sociedad de masas; colectivización del Derecho; 3) riesgo de burocratización de la justicia.

También referido como Derecho a la acción, derecho de acción y derecho de petición, con sutiles diferencias de enfoque que aquí no merecen relevancia, se tiene como el Derecho el de dirigirse al juez o tribunal competente para que le aprecie lesión o amenaza de derecho. Derecho de pedir a los órganos del Poder Judicial.

En el caso patrio, después de la Constitución Federal de 1988, quedó aclarada la innecesaria de previo agotamiento de las vías administrativas, antes de la búsqueda del Poder Judicial, apartada  la “instancia administrativa de curso forzado” y la “jurisdicción condicionada”.

Es el Derecho de todo hombre ser oído por Tribunal independiente e imparcial, previamente instituido por ley. A este se debe someter todo derecho subjetivo, individual, colectivo, transindividual, difuso e individual homogéneo.

Y para tanto no basta formalmente garantizar acceso a los Tribunales, sin adecuada tutela jurisdiccional, efectiva y tempestiva, en plazo razonable, sin dilaciones indebidas, proporcional a la complejidad de la discusión. En este sentido se debe por igual observar y para tal contribuir, el comportamiento de jueces y apoderados de las partes, así como todos aquellos que en el proceso intervienen.

Mucho se habla, y acertadamente de la crisis del proceso, cuestionando su no utilidad, morosidad, lo que se constituye verdaderamente en Justicia inaccesible.

Es el debido Derecho AL proceso y EN EL proceso (Regularidad procesal). La búsqueda de la prestación de jurisdicción en breve espacio de tiempo, el tiempo justo para la consecución del objetivo.

No se puede, bajo esta óptica, dejar de observar la significación de la diferencia de capacidad económica de las partes, como definidores de capacidad de resistencia y espera en la demora en la solución final de la contienda.

Así es que, parte de todo esto es garantizar el acceso al Poder Judicial y al proceso a los jurisdiccionados que no dispongan de condiciones, o que se puede viabilizar por el principio de la Asistencia Judicial Gratuita. Se trata también de “cláusula pétrea”,  prevista por el artículo 5º,  LXXIV de la Constitución Federal y que se rige básicamente por la Ley 1060/50. Además de este, el artículo constitucional 134 (que instituye la Defensoría Pública).

En el campo del acceso a la Justicia, en Brasil mucho se resistió la utilización de la vía del arbitraje como medio de solución de controversia, lo que se sustentaba infringente a la norma constitucional. Recientemente el arbitraje se afirma y tiene previsión en la Ley 9307/96.

Además de la formalización legal, demoró hasta que el Supremo Tribunal Federal definiera y decidiera la constitucionalidad, en el sentido de que la manifestación de voluntad de la parte en la cláusula de compromiso en el momento de la celebración del contrato y el permiso dado al juez para que sustituya la voluntad de la parte recalcitrante en firmar el término de compromiso no ofende al artículo 5º, XXXV de la Constitución Federal. Forzoso reconocer, sin embargo, que esta interesante y necesaria vía de arbitraje, además se reviste de resistencia cultural que no se sabe cuándo será vencida…

Kazuo Watanabe, ilustre procesalista brasileño es preciso al manifestarse sobre el tema aseverando que  “el derecho de acceso a la Justicia es, fundamentalmente, el derecho de acceso al orden jurídico justo. La problemática del acceso a la Justicia no puede ser estudiada en los estrechos límites de acceso a la Justicia en cuanto institución estatal, y sí, viabilizar el acceso al orden jurídico justo”

Recientemente una enmienda constitucional fue editada, la número 45, con el fin expreso de reformar el Poder Judicial, pero que veladamente buscaba instituir control externo al Judicial. Se declaró la agilización y efectividad del proceso como objetivo. Sólo para referir, pues se trata de otro tema, efectivamente se crearon varios órganos de control externo como el Consejo Nacional de Justicia, el Consejo Nacional del Ministerio Público, el Consejo Superior de Justicia del Trabajo.

Pues esta Enmienda Constitucional insertó otro reglamento más en el artículo 5º, de la Constitución Federal, el  LXXVII (78º) que dice que – “a todos se les asegura razonable duración del proceso y los medios que garanticen la celeridad de su tramitación”.

No se ve ahí una novedad, ya que tal lectura de efectividad ya se hacía antes de ese reglamento, en cuanto a los dispositivos existentes en la propia Carta y artículo 5º, LIV – debido proceso legal, LV – amplia defensa, XXX – acceso al Poder Judicial. “la ley no excluirá de la apreciación…”.Estos ya se interpretaban en el sentido de que la prestación jurisdiccional debiera ser efectiva protección, rápida, justa, con condición real de actuación en el mundo de los hechos.

Ocurre que la novel norma constitucional, de echo nada significa. ¿Qué es “razonable duración”?, ¿Cuánto tiempo significa efectividad en la prestación jurisdiccional a los efectos de la “razonable duración”?, ¿Cuáles son los medios disponibles para asegurar la celeridad del tramite?

Es importante percibir que se trata de una norma programática, no autoaplicable, que trae conceptos abiertos y subjetivos. Obviamente dependen de formulación legislativa ordinaria, y que hasta ahora no sobrevino.

Algunas alteraciones en el sentido de la efectivización y calificación de la prestación jurisdiccional fueron determinadas por la EC 45, como la del artículo 93, II –c) promoción de los jueces por criterios objetivos de productividad y presteza en el ejercicio de la jurisdicción. Además, frecuencia y perfeccionamiento en cursos. Oficiales y reconocidos de perfeccionamiento, y no promoción si hubiera injustificada retención del proceso más allá del plazo. Determinó en el VI – Perfeccionamiento por cursos, en el  XII – Actividad Jurisdiccional Ininterrumpida. (prohibido vacaciones colectivas, días sin expediente: turno permanente.), XIII – número de jueces proporcional a la demanda, el XV – Distribución Inmediata de procesos y en varias situaciones la posibilidad de justicia itinerante y funcionamiento descentralizado, cámaras regionales, así como el artículo 126 previendo la organización de Juzgados especializados – como ejemplo, para conflictos de tierra.

Es de referirse al final que en esta tentativa de Garantizar el Acceso al Poder Judicial – un acceso amplio y calificado – se instituirán, por igual, dos tipos de “Súmulas” a ser promulgadas por los Tribunales Superiores, y de enorme controversia.   

La Enmienda trajo también lA Súmula vinculante (artículo 103, A de la Constitución Federal), que obliga al juzgador a su aplicación, materia esta relevante y que será objeto de texto diverso, anticipándose, sin embargo, que tiene el significado de cercenamiento de libertad en el juzgamiento del magistrado, restricción de la Jurisprudencia, pero que encuentra a su favor algunos otros importantes argumentos.

Así, y para concluir, es que se reconoce la firme utilidad de la constitucionalización de principios procesales, notoriamente de la garantía de acceso al poder judicial, sin lo cual se vuelve formal y ocioso el derecho material que a todos rige y orienta. 

  

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WATANABE, Kazuo . Controle jurisdicional (principio da inafastabilidade do controle jurisdicional no sistema jurídico de segurança contra atos judiciais) e mandado. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1980.

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45 – DEZEMBRO DE 2004 observações

André Jobim de Azevedo

 

O presente artigo busca apreciar a Emenda  Constitucional 45, de dezembro de 2004 sob dois enfoques básicos. O primeiro de análise ampla e geral da nova Emenda com exame de finalidade e instrumentos e o segundo, mais pontual, especificamente sobre o trato da matéria trabalhista ante a alteração do artigo 114 da Carta Constitucional.

À guisa de introdução é de se manifestar perplexidade acerca de mais uma nova Emenda Constitucional.

É que em termos técnica e socialmente ideais, a Constituição de um país deve se constituir em um instrumento normativo estrutural  e de organização do Estado e da Sociedade capaz de nortear os cidadãos na  formação e desenvolvimento de suas vidas, o mesmo valendo para as  Instituições do país, através dos tempos.

Deve ter condições de conduzir os destinos de uma nação por um longo futuro, orientando a organização social e empresarial para bem alicerçar suas ações. Deve ensejar regramento amplo, para, a partir dele, adequadamente  balizar o sistema jurídico infraconstitucional .

É próprio dessa missão, o caráter de estabilidade típico da magnitude de sua condição e propósito, para que o desenvolvimento nacional seja com ela conforme. Recomendável assim, formatação enxuta, que seus ditames não sejam daqueles que rapidamente se alterem ou superem, que sejam capazes de estar acima das ocorrentes e dinâmicas alterações diuturnas da vida.  Só dessa maneira é que passam os tempos e a Carta Constitucional segue com sua observância e vigência reconhecida e preservada. Desse modo também pode ser acolhida e compreendida pelos cidadãos.

Pois já aí se pode produzir alguma crítica à chamada Constituinte cidadã de 1988, a qual prima pelo detalhismo e até casuísmo, neste enfoque impróprios para o instrumento em questão, a qual já se encontra, sob muitos aspectos superada e ultrapassada pelo tempo, a despeito de sua recém adolescência. Perde assim na necessária condição de proximidade com seus destinatários, pelos quais não tem o devido conhecimento.

Por óbvio que tal – sem se atribuir simples  incorreção de formatação –  tem pelo menos alguma justificativa de caráter político especial, que foi o momento da sua ocorrência. Primeiro espaço de reorganização institucional  do país depois de anos  de ditadura militar, de regime autoritário e opressivo, vê-se o país com um oportunidade de rever sua organização constitucional e, por conta de anos de autoritarismo estatal e até legal, tratar de buscar proteção na Carta Maior.

Na Carta de 1988 tratou-se  de incluir um sem número de questões tipicamente de caráter infraconstitucional, como forma de tentar assegurar a manutenção dessas regências. Isso porque é sabida a necessária  maior dificuldade de alteração dessas normas constitucionais, que não se dão por simples edição de outra regência em sentido contrário ou diversa, como se dá com a lei ordinária. A alteração constitucional exige  quorum qualificado , envolvimento congressual, partidário e social muito mais sério e, portanto, gerando uma condição de maior perenidade quanto aos temas  inscritos na Constituição Federal.        

Mas essa é a Constituição que temos e sobre a mesma devemos deitar nossos estudos, sem que se deixe de fazer essa necessária crítica, em especial se fizermos rápida digressão comparativa.

Pois em moldes ideais a Constituição deve ser capaz de manter-se firme com o passar dos tempos, mantendo a orientação norteadora e atual, o que não é uma das grandes virtudes da nacional.

Veja-se, a título de exemplo, as saudadas  Grandes Constituições do Mundo, as centenárias Francesa e Norte Americana, bastante concisas e genéricas Esta última, de formulação no longínquo 1789, com mais de 200 anos de vida, sofreu apenas 27 emendas ( isso sem distinção das 10 normas “Bill of Rights”, de mesma data). São normas de conhecimento e validação popular, tradicionais e verdadeiramente pilares sociais.

No caso pátrio, já estamos até na 46ª emenda para uma Constituição Federal de menos de 18 anos de vida. A velocidade e intensidade das alterações à Carta são prova cabal do que acima se sustenta, restando evidente o  indesejado distanciamento da Carta relativamente àqueles que pretende atingir.

Visto isto, é de se iniciar a análise da Emenda Constitucional n° 45, propriamente dita, o que se faz pela manifestação de compreensão da sua origem, da sua motivação.

Formalmente tratada como a emenda que traz a Reforma do Poder Judiciário, buscando a perfectibilização do Poder e a agilização da prestação jurisdicional,  agrega, contudo, um ingrediente velado, mas também importante, que é  a tentativa de instituição de um controle externo ao  próprio Poder Judiciário, de algum comando sobre o mesmo, o que efetivamente se realizou.

Com esses objetivos foram por igual encaminhadas ao Congresso Nacional no mesmo mês de dezembro de 2004 vários outros projetos de lei que buscam alterar o Código de Processo Civil, o Processo do Trabalho e o Processo Penal.

Na emenda sob análise, aos efeitos de maior controle social e político sobre os órgãos de jurisdição, foram criados o Conselho Nacional do Ministério Público, Conselho Superior da Justiça do Trabalho e o Conselho Nacional de Justiça, teoricamente sem o condão de intervir na aplicação do direito, mas apenas nas questões referentes à administração dos órgãos judiciais.

No que respeita à finalidade maior de agilização da prestação jurisdicional, a expressa inclusão de um 78º inciso (LXXVIII) ao artigo 5° da Constituição,  é clara ao asseverar que “  são assegurados razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. É norma que pretende garantir efetividade ao procedimento da jurisdição.

Tal leitura de efetividade já era feita antes da inclusão desse inciso, quanto aos dispositivos existentes no mesmo artigo 5° que referiam no inciso XXXV o acesso ao Poder Judiciário para a apreciação de lesão ou ameaça do direito. Somente poderia se entender atendida a determinação constitucional se a jurisdição fosse prestada em tempo hábil e capaz de realmente atender ao jurisdicionado com condições de atuação no mundo real dos fatos.

Trata-se de antigo conflito entre efetividade e segurança jurídica, esta asseverada também em nível constitucional no mesmo artigo 5ª e revelada nos incisos LIV e LV que asseguram, respectivamente, o devido processo legal, o contraditório  e a ampla defesa.

Mas qual o real efeito sobre a efetividade do processo com a edição da norma em análise? Praticamente nenhum, senão psicológico. Trata-se de norma que explicita discussão anterior sobre o tema, mas que é programática, não auto-aplicável. Traz conceitos abertos, amplos e subjetivos, incapazes de acelerar em 1 segundo sequer a prestação jurisdicional. Evidente a dependência de desdobramento legislativo ordinário capaz de alcançar-lhe algum sentido prático.

Mas a mesma Emenda 45 traz  outras regências no sentido e que são capazes de efetivamente aprimorar a prestação jurisdicional. Vejamos algumas alterações no sentido, quer da efetividade, como também da qualidade da atuação:

 

ART 93 – II – c) promoção dos juízes por critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição. Ainda, freqüência e aperfeiçoamento em cursos oficiais e reconhecidos de aperfeiçoamento.

e) não promoção dos juízes, se incorrer em  injustificada retenção autos em carga além do prazo legal. Não basta a simples devolução dos autos ao cartório, face à previsão de que o magistrado somente pode devolver os autos  com o devido despacho e decisão.

VI – Aperfeiçoamento por cursos.

XII – Atividade Jurisdicional Ininterrupta. (vedados férias coletivas e dias sem expediente: plantão permanente.)

XIII – número de juízes proporcional à demanda

XV – Distribuição Imediata dos processos em grau de recurso. A título de ilustração e homenagem registre-se que o TRT 4ª Região, bem como da 10ª Região, especificamente Brasília, de há algum tempo atuam nestes moldes. Extremamente ágil de modo geral também o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (apenas para registrar o Tribunal local) e inaceitavelmente morosa a distribuição de apelações no  Tribunal de Justiça de São Paulo onde os feitos aguardam em torno de 2 anos para serem  distribuídos ao relator….

ART. 107 Tribunal Regional Federal  – § 2º– instalação de justiça itinerante.§3º funcionamento descentralizado, câmaras regionais;

ART. 115 TribunaL Regional do Trabalho -§ 1º- instalação de justiça itinerante,  § 2º funcionamento descentralizado, câmaras regionais;

ART. 125 Tribunal de Justiça – § 6º funcionamento descentralizado  e §7º instalação de justiça itinerante.       

ART. 126  Criação de Varas especializadas com competência exclusiva para conflitos fundiários ( questões agrárias).

 

Quanto à justiça itinerante, é de  lembrar que há aproximadamente 20 anos, assim se fazia no Rio Grande do Sul, quando para audiências de ações realizadas na cidade interiorana do Alegrete, lá comparecia uma então Junta de Conciliação e Julgamento, em deslocamento, que vinha da cidade da fronteira de Uruguaiana em uma camionete Rural Willys com o Juiz Presidente, os juízes vogais,  o assistente judiciário, máquina de escrever, papéis timbrados próprios, e  assim se instruía o feito, com o que razoável associar à justiça itinerante…

Também possível de aqui se incluir as normas dos artigos 93,  I, e 129 § 3º, que determinam a prática de três anos de atividade jurídica do bacharel em direito, regra essa, entretanto, de contornos não muito claros. Nesse sentido,  a moralizadora imposição do artigo 95, V, de proibir aos juízes o  exercício  da advocacia no juízo ou tribunal do qual  se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração” , que algum limite impõe à essa inaceitável “concorrência desleal”.

É de realçar, no entanto, que quer na seara do controle social e jurisdicional, quer na seara da efetividade, a mais significativa alteração se deu através das Súmulas Vinculante e Impeditiva.

Quanto à esta última, ainda não vigente nos moldes propostos, uma vez que pende de reapreciação na Câmara dos Deputados e da própria aprovação, por força do processo de alteração constitucional por emenda.

Na prática, já existente quando o relator do Agravo de Instrumento Cível, pode negar  seguimento ao mesmo, por decisão monocrática, quando manifestamente inadmissível ou contrário à Súmula (art. 557, parágrafo 1° A do CPC) . Da mesma forma, o artigo Celetista, 896, parágrafo 5° pode o relator do Recurso de Revista negar o seguimento ao mesmo se a decisão agravada estiver em consonância com enunciado da Súmula da Jurisprudência do TST.

No que respeita à Súmula Vinculante, críticas importantes quanto à sua implantação  sofreu, na medida em que verdadeiramente se constitui em instrumento de limitação da atuação jurisdicional, tolhendo o poder criativo do juizado de primeira e  segunda instâncias, que fica impossibilitado de manejar livremente o direito e sua interpretação, ficando vinculado ao entendimento manifesto em Súmula ditada por Tribunal Superior. Há um evidente engessamento da dinâmica jurisprudencial, com escassos caminhos de alteração do instrumento pelo jurisdicionado.

 De outra parte, e para fazer contraponto, é importante que se diga injustificável a repetição mecânica de processos, petições, sentenças, manifestações recursais e julgamentos idênticos, a impor volume inaceitável de questões cujo resultado final desde o início se  conhece e que contribuem decisivamente para a morosidade judicial,  ferindo gravemente a efetividade da jurisdição. Exemplo disso são as milhares de ações que abarrotam a Justiça Federal e que tem o poder público federal como parte, onde se discutem por anos matérias absolutamente idênticas em  insuportável e onerosa repetição formal de teses

Por óbvio essa rápida observação não tem o condão de esgotar matéria tão importante quanto profunda, mas apenas noticiar  ao leitor sua ocorrência, sem se chegar a uma conclusão definitiva acerca do acerto do remédio proposto e ora insculpido na Carta Maior .

Incluída que foi na reforma pela edição do Art. 103A da CF, deve ser examinada. Trata-se de norma de aplicação imediata que autoriza o Supremo Tribunal Federal à edição das mesmas, quando se tratar reiteradas decisões sobre matéria constitucional, por deliberação de 2/3 dos membros da Corte. A referência final do artigo introduzido quanto à necessidade  de estabelecimento em lei posterior, deve ser interpretada como aplicável à revisão ou cancelamento. Há diversa interpretação de que tal se aplique à própria aprovação.

Aspecto interessante é o fato de que a Súmula vincula o Poder Judiciário e a Administração Pública direta e indireta, pelo que pode significar o estancamento de procedimentos administrativos geradores desse repetitivo volume de proposições judiciais.

Os três parágrafos que seguem à norma detalham algumas questões, sendo de realçar a possibilidade de reclamação ao Supremo Tribunal Federal quando dúvida restar quanto à correta aplicação ou não aplicação da Súmula editada.

Outra alteração, artigo 102, parágrafo terceiro, é a previsão de que o Recurso  Extraordinário possa ser manejado quando se configurar o que refere “repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei”. Tal traz à lembrança a antiga questão de relevância, ensejadora do processamento do apelo. Nesse sentido, também, veja-se norma celetista do artigo 896-A que previu, na alteração havida pela MP 2226 de 09/2001, situação comparável, que foi a da “transcendência” do Recurso de Revista, até hoje não regulamentada..   Haverá de contar com passo posterior por parte do legislador ordinário.

Neste ponto, crendo haver apresentado uma superficial visão dos temas acima, resta adentrar especificamente na análise da alteração havida no artigo 114 da Constituição Federal, essa de profunda significância para o Judiciário Trabalhista.

De início, convém registrar que a  exclusão no Caput da norma, da expressão de competência para “conciliar”, não tem o significado por alguns exageradamente interpretado, de que não mais teria essa competência, de vez que  resta pressuposta pela função jurisdicional como função do juiz, na forma prevista pelo artigo 125, inciso IV do CPC e do artigo 652 da CLT.

No inciso I, a alteração da competência centra-se na dicção anterior  de competir o processamento e julgamento de controvérsias entre “trabalhadores e empregadores”, para ora  processar e julgar as controvérsias decorrentes da “relação de trabalho”. Aí é que o exame se nos impõe maior atenção e resta de maior relevância. Antes relação de emprego, “entre trabalhadores e empregadores…e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como..” e ora “ações oriundas da relação de trabalho….

O objeto da proteção do Direito do Trabalho sempre se centrou na proteção do seu exercente, aquele que pessoalmente  dispende energia em favor de outrem. O foco é a pessoa humana.

A competência anterior, no entanto, era restrita à ocorrência dessa situação nos moldes de subordinação e caracterizadora de relação de emprego, e alguma outra excepcional.

A comparação entre relação de emprego e de trabalho sempre foi a relação de espécie e gênero. O gênero  é a relação de trabalho, maior e mais ampla e que inclui a forma especial de prestar trabalho que é a prestada nos moldes  de contrato de trabalho, ao qual corresponde a relação de emprego, sua espécie. Lembre-se também que a própria CLT, no artigo 442, determina essa correspondência.  

Sob este prisma, não resta qualquer dúvida de que a presente alteração constitucional promoveu uma significativa alteração da competência da Justiça do Trabalho, no sentido de sua  ampliação e passar a seu encargo também outras formas de trabalho pessoal, além do contrato de trabalho.

Entende-se assim, que são ora da nova competência  as relações de trabalho como prestação de  serviços, o mandato, o contrato de transporte, a corretagem a representação comercial, o trabalho voluntário (Lei nº 9.608/98), o contrato de estágio, o trabalho do avulso (ora mais amplo do que a relação do artigo 643 e do   inciso V do artigo 652 da CLT) e seus tomadores, os empreiteiros de qualquer porte, o labor em parceria, o trabalho cooperativado.

A figuração nas ações judiciais pode ser como Autor ou  Réu, independentemente  de capacidade econômica.

A questão da redação  dada ao novo caput, saliente-se, é objeto de dúvida revelada por Ação direta de Inconstitucionalidade movida pela Associação dos Juízes Federais (AJUFE – nº 3995/2005), a qual sustenta a inconstitucionalidade formal da norma, e que tem em seu favor a concessão de liminar.

Sustenta–se que o Senado Federal incluiu acréscimo não apreciado pela Câmara, e que, portanto, como alteração constitucional, dependeria de nova manifestação da Câmara, ora com a alteração incluída.

Essa aprovação havida em turno único no Senado Federal ( aí o suporte da alegação de inconstitucionalidade formal) diz respeito à exceção por ele  instituída, no sentido de que a competência lá determinada é da Justiça do Trabalho, “exceto os servidores ocupantes de  cargos criados por lei, de provimento efetivo ou em comissão, incluídas as autarquias e fundações públicas dos  referidos entes da Federação”.   

A liminar deferida é no sentido de que foi dada interpretação conforme o inciso I, do artigo 114 da CF, na redação da EC 45/2004. “Suspendendo ‘ad referendum’, toda e qualquer interpretação dada … que inclua na competência da Justiça do Trabalho a apreciação … de causas que sejam instauradas entre o poder Público  e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de  ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo”.

Resta pois liminarmente excluída a apreciação de relação de trabalho decorrente de relação estatutária do funcionário público. Esteiou-se ainda a liminar em anterior entendimento do Supremo, no sentido dessa exclusão, a despeito da redação anterior não ser expressa. É referência a  ADI 492, que decretou a inconstitucionalidade  de dispositivo da Lei nº 8.112/90 que lá interpretava a “relação de trabalho”.

 Essa ação autorizou inclusive alguns intérpretes a, mesmo sem a atual ADIN, sustentarem que já estariam excluídos os estatutários, e que continuaria alheia a Justiça do Trabalho a relação estatutária do servidor público. Outros sustentam que em não se tratando de decisão do Tribunal, mas de relator, nem mesmo de decisão de mérito e sim liminar, estaria imprópria para gerar efeitos  vinculantes ou afastar novas ações. Certo, contudo, é que  se trata de uma decisão do Tribunal, que tende a se manter, e portanto tem sim evitado interpretação diversa. 

Outra dúvida que tem sido discutida, diz respeito à incidência do código do consumidor e sua regência nas relações de trabalho. Não nos parece razoável a hesitação, na medida em que mesmo se tratando de relação de consumo, a novel norma constitucional nada   excepciona, pelo que o código correspondente não tem o poder de fazê-lo. É obrigação da norma infraconstitucional, no caso o Código de Defesa do Consumidor, adaptar-se à normativa constitucional, por hierarquia inafastável. Se a Emenda Constitucional não excluiu nem excepcionou, não pode a lei fazê-lo.

Algum receio tem por igual se manifestado quanto às normas que incidirão sobre as matérias ora objeto da apreciação no foro trabalhista, mas que não se justificam. É que a alteração havida é de caráter processual, de competência e não material, restando inalteradas as proteções legais de direito material. Dizendo de outra forma, essas relações que serão julgadas pela Justiça do Trabalho seguem com suas regras de Direito Material próprio (exemplo: representante comercial autônomo, lei  nº 4.886/65) ora sob análise de outro juizado. Outro exemplo importante é relativo às normas prescricionais, que seguem mantidas, consideradas que são de direito material. 

O inciso II, do artigo 114, determina que à Justiça do Trabalho compete a apreciação  das ações que envolvam o exercício do direito de greve. Está a tratar aí, de todas as questões relativas  ao movimento paredista e que antes estavam descoladas da Justiça do Trabalho,  para a apreciação pela Justiça Comum. São situações como a responsabilidade civil da greve, prejuízo causados a terceiros e à coletividade por conta da paralisação, as ações possessórias, as ações movidas por e contra sindicalistas no exercício dessa resistência.

A essa leitura deve agregar os parágrafos que tratam especificamente sobre a greve. Mantido inalterado o parágrafo 1º, resta preservada a possibilidade de arbitragem, como forma de solução do conflito.

Quanto ao parágrafo 2º, trata-se de norma com diversas interpretações. A mais radical delas, no sentido de que esta redação teria acabado com o poder normativo da Justiça do Trabalho, de vez que não se tem a amplitude dada na redação original e que expressamente o autorizava. A redação é evidentemente mais restritiva.

A inclusão no parágrafo da expressão “de comum acordo” ao referir o ajuizamento de dissídio coletivo, é causadora de grande estranheza. Como será possível o ajuizamento de comum acordo? E se a parte, notadamente a empresarial, negar-se ao ajuizamento de comum acordo? Se não é próprio da propositura de uma ação justamente a resistência à pretensão, impondo atuação e iniciativa individual da parte autora contra a ré neste sentido?

Sem constituir o direito coletivo do trabalho em matéria própria destas observações, quer-se crer que a expressão  se interpretada em sua literalidade geraria a inviabilização de qualquer propositura no sentido, pelo que não é razoável. Assim deve ser tida por superada a expressão se houver negativa na propositura, de vez que não se pode inviabilizar o acesso ao Poder Judiciário, ferindo o direito de ação. Há notícias de que Confederação Nacional de Trabalhadores já haja ajuizado ADIN, quanto à essa restrição do parágrafo 2º, sustentando sua inconstitucionalidade, mas sem deferimento de liminar. Também se tem notícia de que inúmeros dissídios têm sido ajuizados e seguem tramitando mesmo sem o cumprimento da determinação contida, por concordância presumidamente tácita. Tais, contudo, poderão ser tidos por inexistentes se não atendido o “comum acordo”, podendo ser considerado como pressuposto processual desatendido. Resta aguardar.

O inciso II da alteração do artigo 114 da Carta Constitucional, determina a competência da Justiça do Trabalho relativamente às ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores. A regência ampla do inciso permite a inclusão de uma gama de situações de induvidosa competência. Antes restrita a competência quando resultasse de cumprimento de acordo ou convenção coletiva (Lei nº8984/95).

Exemplifica-se: cobrança ou recebimento da contribuição sindical, taxa assistencial ou negocial ou mesmo mensalidade dos sócios; a discussões que quaisquer temas relativos às eleições sindicais, validade de assembléias, capacidade de concorrer etc; a discussão sobre  base de abrangência de determinada entidade sindical, a definição de representatividade, disputa entre sindicatos constituídos e novos, fusões entre sindicatos, novas categorias etc. Parece próprio que essas controvérsias sejam resolvidas pela Justiça do Trabalho, especializada, não se justificando processamento em foro diverso.

Conseqüência imediata é a o afastamento total da Orientação Jurisprudencial nº 04 da Seção de Dissídios Coletivos, do TST, que afastava a competência da Justiça do Trabalho na discussão intersindical sobre a representatividade de certa categoria.

Da mesma forma, a OJ nº 290 da SDI, que decretou a incompetência do foro trabalhista quando discutiam sindicato patronal e a respectiva categoria econômica, acerca de contribuição assistencial.

O inciso IV expressamente determina a competência trabalhista quanto aos mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando  o ato questionado envolver  matéria sujeita à sua jurisdição.

De pronto, questiona-se se houve esquecimento do legislador ao não incluir o mandado de injunção. Certamente não, mas apenas rendeu-se à anterior interpretação do STF e que sepultou a medida, no sentido de que o remédio servia apenas para constatar a mora do poder legislativo, sem a amplitude que outrora se entendeu teria, com o condão de editar normas ante a inércia do Poder.

Todas as matérias da Justiça do Trabalho que ensejarem discussão quanto a direito líquido e certo e restrição de liberdade, são de sua competência. Exemplifica-se: tentativa de prisão de depositário infiel; qualquer declaração de prisão relacionada com atos do juiz, delegado do trabalho, fiscal do trabalho; o desacato e a desobediência à ordem judicial. Não se crê ter passado à competência da Justiça do Trabalho o julgamento de qualquer crime, de vez que não se promoveu qualquer alteração constitucional no sentido, mantendo-se com a Justiça Federal.   

Evidencia-se nova ampliação quanto ao Mandado de Segurança, de vez que antes passível quando questionados apenas atos de administração ou propriamente jurisdição da Justiça do Trabalho. Comum era a sua utilização também quanto às determinações de realização ou negativa de procedimento de garantia do juízo pela chamada “penhora on line”, determinações de reintegração ao emprego ou sua negativa, abordagem sobre Antecipação de Tutela, liminares em processos cautelares, determinações de ações civis públicas, imposições administrativas de órgãos da fiscalização, imposição de depósitos de multas  para interposição de recurso administrativo.

Quanto à competência de processamento, ora  do juiz de 1ª instância, e com a recursal para o Tribunal é perfeitamente de acordo com a norma, sempre adstrito aos seus parâmetros de direito líquido e certo , preventivamente ou  reativamente, contra ato de autoridade pública,  e observado o rito próprio, ainda que processado na Especializada, como se verá adiante.

Prevê o inciso V que os conflitos de competência entre órgãos de jurisdição trabalhista sejam pela Justiça do Trabalho dirimidos, ressalvada a disposição do art. 102, I (competência do STF), o que, de algum modo, também tem tratamento próprio no artigo 808 da CLT.  Lembre-se que o Juiz de Direito eventualmente investido da jurisdição trabalhista, titula jurisdição trabalhista, ainda que eventual, pelo que somente será considerado conflito entre Tribunais, quando no exercício da Jurisdição Civil.

A orientação é própria e busca a necessária unidade e alinhamento de decisões.

Nesse sentido, por igual, importante a regra do artigo constitucional 105, I, “d”, que trata da competência do Superior Tribunal de Justiça. Agregue-se à compreensão do tema a Súmula nº 236 do Superior Tribunal de Justiça que afasta a sua competência para  “dirimir conflitos de competência entre juízes trabalhistas vinculados  a Tribunais do Trabalho diversos”.

Grande ponto de discussão e preocupação diz respeito à norma do artigo 114, inciso VI que determina a competência  para as ações “de indenização por dano moral ou material, decorrentes da relação de trabalho”. Estabelecido estava que, em face da dependência de definição previdenciária acerca de existência ou não de acidente do trabalho e de sua caracterização como tal pela Justiça Comum, à essa era atribuída a competência, a qual estava organizada inclusive internamente em Varas Especializadas de Acidente do Trabalho (VAT).

Tão logo editada a Emenda, a interpretação doutrinária que se revelou a mais corrente talvez tenha sido a de que, no particular, não havia sofrido alteração a competência da Justiça do Trabalho. O fundamento era de que o artigo 109, I da mesma Carta não sofrera qualquer alteração. A hesitação Jurisprudencial também causou bastante preocupação. As turmas, seções do TST e do STJ não eram uniformes em suas manifestações, e orientavam um senso de correção nesse entendimento, um paradigmático julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal, no mês de março de 2005, que em sede de liminar, é verdade, mas que mantinha com a Justiça Comum essa competência, acenando com uma posição da Corte Suprema.

Transcorrido algum tempo, muito discutida a questão, amainadas as ansiedades, deu-se nova leitura ao referido artigo 109, no sentido de que ali se excepcionavam apenas ações em que a União, entidade autárquica, ou empresa pública federal fossem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, e não a quaisquer partes em geral.

Recente julgamento do STF, do final do mês de junho de 2005 acerca do Conflito de Competência nº 7.204, no entanto, apresenta interpretação diversa, no sentido de que ante a nova redação da matéria, não há como adequadamente manter os conflitos indenizatórios, quer morais quer patrimoniais, no âmbito da Justiça Comum quando decorrentes de acidente do trabalho. Trata-se de conflito negativo de competência entre Tribunal de Alçada (?) e TRT de Minas Gerais.Ao que se sabe também, ter-se-ia dado efeitos “ex nunc” à decisão, ressalvados os atos praticados.

Resta, pois aguardar a publicação do acórdão para certificação dessas referências, prometida pelo órgão jurisdicional para os primeiros dias de agosto, quando do retorno do recesso do Supremo. Parece que deve se ter a interpretação nestes moldes norteadores, seguindo a decisão do Supremo, entendo-se como transferida a competência para a Justiça do Trabalho.

A hipótese prevista pelo artigo 114, inciso VII refere às “ações relativas às penalidade administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho”.

A disposição atrai para a Justiça do Trabalho a competência para o trato de todas as penalidades administrativas decorrentes de atos administrativos, notadamente a fiscalização do trabalho exercida pelas Delegacias Regionais do Trabalho.

Da mesma forma, essa nova competência atinge  a atos dessas autoridades administrativas que deveriam ser tomados, melhor dizendo, ante sua inércia. Explica-se como  exemplo da  inércia do órgão em manifestar-se sobre requerimento de autorização administrativa para a  prorrogação de jornada, ou  para a redução intervalar, cuja exigência alguns entendem ainda persistir.  São ações antes atinentes à Justiça Federal, com  as ações  envolvendo nulidades de tais atos, relativas à multas, ou mesmo simplesmente declaratórias.  Algumas vozes discutem estar ou não incluída na alteração a competência para a execução dos julgados, matéria também polêmica, de vez que retornou à Câmara dos Deputados o tema de execução de multas administrativas por infração à legislação.

O inciso VIII, refere à “execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art.195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;” Tal não se constitui, em verdade, em  novidade, à medida em que a Emenda Constitucional nº 20/1998, já tratara da execução na Justiça do Trabalho das contribuições sociais, constando a regra no anterior parágrafo 3º, do próprio artigo 114, sem qualquer significativa alteração. Elas incidem sobre  a ocorrência de descontos previdenciários e fiscais em geral, sempre vinculados às decisões que proferir, sem a limitação literal constante do texto (sentenças), abrangendo julgamentos em geral (acórdãos).

Finalmente, o inciso IX prevê a competência para “outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei”. Tem-se a dúvida de que a manutenção desse inciso decorra de anterior opção de utilização no inciso I, da expressão “relação de emprego”, substituída pela ampla “relação de trabalho”, quando então se justificaria. A utilização ao final do gênero e não da espécie, amplia a incidência a ponto de não se enxergar necessidade, senão ociosidade, deste inciso. Mas como não se crê tenha a lei, quanto menos a Constituição Federal, palavras inúteis, em esforço de interpretação pode se buscar espaço para tutelar também questões relativas à previdência privada complementar.

Quanto à estrutura da Justiça do Trabalho, em especial do Tribunal Superior do Trabalho, artigo 111-A, em termos de número de Ministros não tem maior significado, quer porque sua atual atuação tem se dado com mais juízes convocados, quer porque significa recomposição em moldes  anteriores existentes ao tempo dos juízes classistas .

Para concluir, faz-se necessário que se traga algumas observações  relativas a aplicação  da norma no tempo e especificamente sobre o processo.

Deve ser observado que a referida Emenda Constitucional nº 45 não ofereceu qualquer previsão de “vacatio legis” que ensejasse um maior tranqüilidade e interpretação acerca de sua abrangência, contribuindo para a ocorrência de uma certa instabilidade.

Em se tratando de norma definidora de competência material absoluta, não se afirma aqui o princípio da “perpetuatio jurisditionis”, tendo, ao contrário, aplicação imediata também sobre os processos em curso. Execuções pendentes, da mesma forma hão de ser atendidas na Especializada.

Algumas dúvidas significativas tentou-se afastar pelo TST por meio d edição da Instrução Normativa nº 27, autorizada pela Resolução nº 126/2005.

Como consta do parágrafo 1º da IN 27/05, os procedimentos dos feitos que  passam à nova competência da Justiça do Trabalho devem estar conformes com a regra do artigo  763, da CLT, independentemente do objeto em discussão. Tal não causa qualquer surpresa. Veja-se que antes da edição, um pequeno empreiteiro ou artífice discutia seu direito civil, na Justiça do Trabalho por meio de reclamatória trabalhista, quer pelo rito ordinário quer pelo rito sumaríssimo. Está assim posto: “as ações ajuizadas na Justiça do Trabalho tramitarão pelo rito ordinário ou sumaríssimo, conforme previsto na Consolidação das Leis do Trabalho, excepcionando-se apenas, as que, por disciplina legal expressa, estejam sujeitas a rito especial, tais como o Mandado de Segurança, Habeas Corpus, Habeas Data, Ação Rescisória, Ação Cautelar e Ação de Consignação em Pagamento.”

Ações especiais, as quais detém caminho próprio, o mesmo deve ser mantido como regência processual, afeiçoando-se ao novo foro.

Deixam de existir, por ausente no processo do trabalho, recursos, como do Agravo de Instrumento Retido, estranho ao foro especializado, de vez que irrecorríveis as decisões interlocutórias, não terminativas do feito, artigo 893, parágrafo 1º CLT.

O “jus postulandi” de novo feitio após a edição constitucional original, tem também trato na referida Normativa, que em seu artigo 5º, dispõe que “Exceto nas lides decorrentes da relação de emprego, os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência”.  Um registro quanto aos escritórios de advocacia, cujo exercício de mandato se dá por meio do profissional do Direito e não por Sociedade ou Escritório, nos moldes do Estatuto da Advocacia.

Concluindo, é de se realçar a evidência de um risco “político institucional”. É que a Justiça Especializada do Trabalho, em passado recente, foi objeto de discussão acerca de sua competência, com transferência de feitos para a Justiça Federal, o que a tornaria desnecessária. Também teve sustentado por alguns a extinção não apenas do Tribunal Superior do Trabalho, mas da própria Justiça do Trabalho.

Ora, com tão abrangente ampliação não é absurdo o receio de movimento idêntico, mas desta feita, por fundamento diverso. É que sua abrangência teria sido tão ampliada que teria perdido a sua especialização, que justificava organização em moldes específicos. Além disso, sem querer intensificar a preocupação, que esse “volume” de novas competências poderia agravar essa tentativa, na medida em que restaria inviabilizada a Justiça do Trabalho. Isso porque, ainda que eficiente, hoje funciona verdadeiramente muito próximo de sua capacidade estrutural, a qual não sofreu qualquer alteração coma Emenda.

De qualquer sorte, há que se ter tranqüilidade, uma vez que a instabilidade, a dúvida e a ansiedade são sentimentos próprios das situações de mudança, e as definições somente com o tempo virão.

Registre-se ao final, ser sempre temerária a formulação de interpretação de temas polêmicos decorrentes de edições legislativas “lato sensu” que trazem modificações e novidades ao ordenamento jurídico. Trata-se, contudo, de risco necessário ao intérprete do direito que deve compreender como parte de seu papel social, na busca de melhor compreensão da dinâmica do direito, essa exposição de idéias, ensejadora de críticas construtivas ou não quanto às conclusões, mas nunca quanto ao fundamental papel investigativo e prospectivo do Direito.

NACIONALIZAÇÃO DO TRABALHO

André Jobim de Azevedo

 

Proteção histórica – Trato Constitucional

 

A matéria em foco constitui-se em situação historicamente tutelada pelo direito brasileiro e que mereceu trato constitucional.

Originariamente a tutela era aplicada nos países em que se identificava  a ocorrência significativa de imigração  e de necessária especial proteção ao trabalhador nacional relativamente ao trabalhador estrangeiro. Outros sistemas jurídicos também trilharam a proteção do trabalhador pátrio, notadamente na América Latina.

Tratava-se de assegurar ao trabalhador nacional espaço adequado no mercado de trabalho, em detrimento daqueles que provinham de outros países, os quais, na grande maioria das vezes, detinham maiores condições técnicas e profissionais, o que os faria competir com os locais em condições de desigualdade.

No caso brasileiro, a adoção dessa proteção não significava rechaçar o imigrante ou negar a sua importante contribuição para o desenvolvimento nacional, mas sim a adoção de regulamentação do trabalho estrangeiro, como de fato foi levado a efeito.

A Constituição Federal de 1946, no seu artigo 157, inciso XI,  asseverava a fixação de percentagens de  empregados brasileiros no serviço público concedidos e em estabelecimentos de trabalho de  certos ramos da atividade econômica, especificamente o comércio e a indústria

Essa regência constitucional, no entanto, não se repetiu nas posteriores cartas constitucionais, pelo que, devem ser analisadas as regências correlatas que passaram a constar do ordenamento, não só das constituições, mas como também e necessariamente do ordenamento infra constitucional.

A Constituição Federal de 1967, no seu artigo 150 parágrafo 1º, e a Emenda Constitucional nº 1 de 1969, no seu artigo 153, parágrafo 1º, traziam orientações no sentido da vazão do Princípio da Não Discriminação, estatuindo que  não haveria distinção decorrente de sexo , raça, trabalho, credo religioso e convicção de natureza política .

Na Carta de 1967, o artigo 158, inciso III, genericamente vedava a diferença de salários e critérios de admissão por motivo de sexo, cor e estado civil.

A vigente Carta de 1988, tratando de maneira  um pouco diversa, em seu artigo 5º, caput, orienta que todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza. E no inciso XIII do mesmo artigo  assevera que é livre o exercício de qualquer  trabalho ofício ou profissão.

Em sede de orientação Internacional, a Convenção da Organização Internacional do Trabalho nº111 de 1958 foi aprovada pelo Decreto Legislativo nº 104 de 1964, promulgado pelo  Decreto nº 62.150 de 1968 e estabeleceu em seu artigo 1º que a nacionalidade não deve alterar a igualdade de oportunidade para a obtenção de emprego ou ocupação, bem como o tratamento a  ser dispensado nessa ocorrência.

Lembre-se que para que o estrangeiro possa firmar contrato de trabalho no Brasil é  inafastável a sua permanência legal no país, nos moldes previstos pelo Direito Internacional Privado.

 

Constituição Federal 1988 X  Consolidação das  Leis do Trabalho –  Vigência ?

 

A consolidação das Leis do Trabalho no artigo 349, assim reza:

 

O número de químicos estrangeiros a serviço de particulares, empresas ou companhias não poderá exceder de um terço aos dos profissionais brasileiros compreendidos nos respectivos quadros.

 

No Capítulo II, intitulado “Da nacionalização do trabalho”, em sua seção I, o artigo trata da proporcionalização de empregados brasileiros, obrigando ao empresário que contratar “três ou mais trabalhadores”, sejam pelo menos 2/3 de trabalhadores nacionais, com a seguinte redação:

 

artigo 352:

As empresas, individuais ou coletivas, que explorem serviços públicos dados em concessão, ou que exerçam atividades industriais ou comerciais, são obrigadas a manter, no quadro do seu pessoal, quando composto de três ou mais empregados, uma proporção de brasileiros não inferior à estabelecida no presente Capítulo.

 

  • 1º Sob a denominação geral de atividades indústrias e comercias como pretendem, além de outros que venham a ser determinadas em portaria do Ministro do trabalho, as exercidas:

 

  1. a) nos estabelecimentos indústrias em geral;
  2. b) nos serviços de comunicações, de transportes terrestres, marítimos, fluviais, lacustre e aéreos;
  3. c) nas garagens, oficinas de reparos e postos de abastecimento de automóveis e nas cachoeiras;
  4. d) na indústria da pesca;
  5. e) nos estabelecimentos comercias em geral;
  6. f) nos escritórios comercias em geral;
  7. g) nos estabelecimentos bancários, ou de economia coletiva, nas empresas de seguros e nas de capitalização;
  8. h) nos estabelecimentos jornalísticos, de publicidade e de radiodifusão;
  9. i) nos estabelecimentos de ensino remunerado, excluídos os que neles trabalhem por força de voto religioso;
  10. j) nas drogarias e farmácias;
  11. k) nos salões de barbeiros ou cabeleireiros e de beleza;
  12. l) nos estabelecimentos de diversões públicas, excluídos os elencos teatrais, e nos clubes esportivos;
  13. m) nos hotéis, restaurantes, base e estabelecimento congêneres;
  14. n) nos estabelecimentos hospitalares e fisioterápicos cujos serviços sejam remunerados, excluídos os que neles trabalham por força de voto religioso;
  15. o) nas empresas de mineração.
  16. p) nas autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, por empregados sujeitos ao regime da CLT.
  • 2º Não se acham sujeitas às obrigações da proporcionalidade as indústrias rurais, as que, em zona agrícola, se destinem ao estabelecimento ou ransformação de produtos da região e as atividades industriais de natureza extrativa, salvo a mineração.

 

Tratou assim a Consolidação de estabelecer verdadeiramente uma proteção ao trabalhador nacional nos moldes acima transcritos e que serão adiante detalhados.

Pois bem, a questão que daí exsurge é de difícil solução e encontra respeitáveis doutrinadores em posições antagônicas. Tal diz respeito ao conflito, pelo menos aparentemente, identificado na coexistência entre as regras Celetistas e Constitucionais.

Defendem uns a vigência das normas celetistas protetivas ao trabalhador nacional, e outros, a sua revogação por estarem em desacordo coma constituição vigente. A maioria da doutrina, no entanto, se omite e em nosso sentir estes seriam em menor número.Esses últimos sustentam que a vigente Carta Maior não repetiu o permissivo de diferenciação de tratamento havido na CF de 1946, ao contrário, as normas acima mencionadas, reorientariam a matéria, ora sob o primado da igualdade de tratamento e da não discriminação. Também sustentam que a posterior ratificação da Convenção nº 111 da OIT teria o efeito de, por igual, face à sua posterior edição, revogando os artigos 352 a 362 da CLT, bem como a do artigo 349. Não poderia assim se sustentar distinção de tratamento por incompatibilidade com a norma constitucionalVeja-se no aresto abaixo que em julgamento bem posterior à promulgação da atual Constituição a 4ª Turma do TST, faz a referência à norma do artigo 358 da CLT, evidenciando a consideração de vigência por esta Turma do Tribunal Superior do Trabalho.PROC. Nº TST-RR-528.389/99.0A C Ó R D Ã O – 4ª Turma MF/RM/cgEQUIPARAÇÃO SALARIAL – IDENTIDADE DE FUNÇÕES   ART. 461 DA CLT .Diferentemente da regra contida no artigo 358 da CLT, que exige apenas que reclamante e paradigma exerçam funções meramente análogas, o artigo 461 da CLT tem, na identidade de funções, um dos requisitos indispensáveis à configuração do direito à equiparação salarial. Não basta, portanto, que sejam as funções simplesmente análogas ou equivalentes. Urge que os dois empregados confrontados desempenhem as mesmas tarefas, pouco importando a nomenclatura conferida pela empresa ao cargo por eles ocupado. Violação do art. 461 da CLT não configurada.  Recurso de revista não conhecido.

Cremos, no entanto, não ser clara a sustentada revogação, na medida em que a proteção celetista não fere diretamente qualquer norma Constitucional, e portanto apta à proteção determinada. Não fora isso, a crescente qualificação e preparo do trabalhador nacional têm na raiz do fato, senão eliminado a discussão, reduzido muitíssimo a sua necessidade. O que releva, no entanto, é que se trata de questão em aberto, sem que se possa emitir juízo conclusivo sobre o tema.  Tal situação nos leva à necessidade de exame próprio das disposições celetistas.

 

Destinatários

 

A proteção prevista na CLT tem destino certo. Inobstante a imprecisão vocabular do artigo 7º, caput da Carta Federal de 1988, as regras e situações em discussão atingem apenas trabalhadores (gênero) com vínculo de emprego, ou seja, os empregados (espécie). Lembre-se, a título de elucidação, que todo o empregado é trabalhador, mas nem todo o trabalhador é empregado, na medida em que há inúmeras outras formas de prestar trabalho que não sob a égide do contrato de trabalho.

A regra do artigo 349 da Consolidação, tem, por igual, mais específicos destinatários, quais sejam os trabalhadores com função de químico, por força da expressa  destinação da regra.

Além desses, a norma do artigo 352 da CLT que determina a proporção entre nacionais e não nacionais, enumera outros tantos que poderiam ser agrupados  em dois blocos. Aqueles  de empresas individuais ou coletivas  que  explorem serviço público dado em concessão e aqueles que  exerçam atividades industriais ou comerciais nas atividades já discriminadas  nas alíneas do artigo, ou em outras que possam vir a  ser determinada em Portaria do Ministério do Trabalho.

Assim é que a referida proporcionalidade, se aplicando especificamente às atividades arroladas, deixaria de ser exigível em importantes outras atividades como atividades rurais, sociedades civis ou profissionais liberais.

Quanto aos rurais, a despeito da pretendida equiparação constitucional aos trabalhadores urbanos, cremos não ser possível o integral atendimento da norma constitucional (Caput do artigo 5ª da Constituição Federal) de vez que distinto do trabalho urbano, bem como pela existência de normas constantes de leis próprias, não inteiramente afastadas da regência.

Também são excetuadas as hipóteses do parágrafo 2º, claramente postas, ainda que industriais. Assim, nestas situações não se prenderia o empregador às proporções determinadas na lei.

Ressalte-se que da especiosa redação do 2º parágrafo, resta claro que mesmo tendo sido incluída a atividade de mineração como exceção, a mesma se sujeita à proporcionalidade instituída.

 

 Positivação infraconstitucional

 

A matéria “sub examen” tem como regramento direto as normas da CLT do artigo 349, dirigida aos químicos, e do artigo 352 a 358 no Capítulo que trata  da “Nacionalização do Trabalho”. Além desses há o artigo 369 de aplicação restrita a Marinha Mercante.

Iniciando por esse último e deixando apenas para depois o Capítulo referido – uma vez que os químicos foram antes abordados – é de se reconhecer a importância da exceção, de vez que envolve relevantes questões de soberania e segurança nacional. Realce-se a lembrança do professor de todos nós, o insigne Ministro Mozart Victor Russomano, que dá conta de que redação anterior no sentido de que a totalidade da tripulação deveria ser constituída de brasileiros.

Art. 369 e parágrafo:

A tripulação de navio ou embarcação nacional será constituída, pelo menos, de 2/3 (dois terços) de brasileiros natos.

Parágrafo único:

O disposto neste artigo não se aplica aos navios nacionais de pesca, sujeito à legislação específica. 

Realça o Eminente jurista que “sobreveio a Lei nº 5.683, de 21 de julho de 1971 que derrogou aquele dispositivo, determinando que também em relação às  tripulações de navios mercantes se obedeça a proporcionalidade entre nacionais e estrangeiros à razão de dois terços. Uma revivescência do direito anterior ficou, porém, no art.369, caput: dois terços  devem ser constituídos de brasileiros natos”, requisito não exigido na hipótese dos artigos 352 e 354 e que não  mais pode ser admitido em face do art. 12, parágrafo 2º, da Constituição  Federal.” (grifo original)

A regra em estudo tem o seu parágrafo excepcionando dessa proporcionalidade os navios nacionais de pesca, “sujeita à legislação específica”. Dessa forma em navios nacionais de pesca pode-se contar com todos os tripulantes estrangeiros. A título ilustrativo há o artigo 368, que assegura o Comando do navio a brasileiro nato, cuja vigência é discutível, face às disposições constitucionais que tratam dessas definições de nacionalidade. É a norma do artigo 12, parágrafo segundo da Constituição Federal que proíbe diferença de tratamento entre brasileiros natos e naturalizados, a não ser as previstas na própria Constituição.

Art.368:

O comando do navio mercante nacional somente poderá ser  exercido por brasileiro nato.

Trata-se de determinação aplicável à qualquer navegação fluvial ou lacustre, como em barragens , barras, lagos , canais , etc, em toda a marinha mercante nacional.

O artigo 354 prevê a possibilidade de redução dessa proporcionalidade por ato do Poder Executivo, em face de circunstâncias especiais de atividade e região e segundo o artigo 357, há a possibilidade que o Poder Executivo, por meio da autoridade administrativa, em situações de falta de mão de obra nacional, exclua da proporcionalidade “funções técnicas especializadas”:

Artigo 354:

A proporcionalidade será de 2/3 (dois terços) de empregados brasileiros, podendo, entretanto, ser fixada proporcionalidade inferior, em atenção às circunstâncias especiais de cada atividade, mediante ato do Poder Executivo, e depois de devidamente apurada pelo Departamento Nacional do Trabalho e pelo Serviço de Estatística da Previdência do Trabalho a insuficiência do número de brasileiros na atividade de que se tratar.

Parágrafo único. A proporcionalidade é obrigatória não só em relação à totalidade do quadro de empregados, com exceções desta Lei, como ainda em relação à correspondente folha de salários.

Artigo 357:

Não se compreendem na proporcionalidade os empregados que exercem funções técnicas especializadas, desde que, a juízo do Ministério do trabalho, haja falta de trabalhadores nacionais.

 

Equiparação salarial e despedimento

 

Segundo os ditames constitucionais, não são permitidas distinções entre trabalhadores nacionais e estrangeiros quanto à salário, sendo de nos interessar no momento, o risco de que o estrangeiro receba em condições análogas salários superiores. As exceções são postas nas alíneas da referida normatização.

Nesse sentido a norma do artigo 358 da CLT é expressa:

  1. a) quando, nos estabelecimentos que não tenham quadros de empregados organizados em carreiras, o brasileiro contar menos de dois anos de serviço e o estrangeiro mais de dois anos;
  2. b) quando mediante aprovação do trabalho, houver quadro em carreira em que seja garantido o acaso por antiguidade;
  3. c) quando o brasileiro for aprendiz, ajudante ou servente, e não o for o estrangeiro;
  4. d) quando a remuneração resultar de maior produção, para os que trabalham à comissão ou por tarefa.

 

 

No tocante à diferença salarial a regra prevê as situações legítimas ou não dessa ocorrência, sendo certo que o trabalhador nacional pode  deduzir pretensão judicial equiparatória. Essa pretensão à equiparação salarial, que tem previsão geral expressa no artigo 461 da CLT, por este não se norteia, à vista da regra específica e diversa que rege a comparação entre nacional e estrangeiro, como exceção.

Suficiente dessa maneira a ocorrência de função análoga, assim definida administrativamente pela Fiscalização do Trabalho, por óbvio, sempre sujeita ao crivo do poder judiciário para efeitos de avaliação da conclusão administrativa.

Ficam, assim excluídos da vantagem, os trabalhadores com situação previstas  nas alíneas.

Convém ressaltar, particularmente a distinção de tratamento entre as duas regras, de vez que a presente, mais branda, fala em “função análoga”, ao passo que o artigo 461 em “funções idênticas”, portanto esse muito mais restrito:

 

Artigo 461:

Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.

  • Trabalho de igual valor, para os fins deste Capítulo, será o que for feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de serviço não for superior a 2 (dois) anos.
  • Os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o empregador tiver pessoal organizados em quadro de carreira, hipótese em que as promoções deverão obedecer aos critérios de antiguidade e merecimento.
  • No caso do parágrafo anterior, as promoções deverão ser feitas alternadamente por merecimento e por antiguidade, dentro de cada categoria profissional.
  • O trabalhador readaptado em nova função por motivo de deficiência física ou mental atestado pelo órgão competente da Previdência Social, não servirá de paradigma para fins de equiparação salarial.

 

Relativamente ainda à equiparação, de incidência a regra do artigo 353 da CLT:

 

Art. 353. Equiparam-se aos brasileiros para os fins deste Capítulo e ressalvado o exercício de profissões reservadas aos brasileiros natos ou aos brasileiros em geral, os estrangeiros que residindo no País há mais de dez anos, tenha, cônjuge ou filho brasileiro, e os portugueses.

 

Assim é que excepciona a regra geral, apenas para efeitos de nacionalização, a situação de estrangeiros residentes há mais de 10 anos que tenham cônjuge ou filho brasileiro, ou , ainda, sejam  portugueses (Lei nº 6.651/79). 

Finalmente de realçar a proteção especial em termos de despedida, prevista pelo parágrafo único do artigo 358 da CLT, que quando na empresa ocorrer falta de serviço ou cessação da atividade econômica do empregador, necessitando dispensar os trabalhadores em parte ou sucessivamente, o sejam antes dos brasileiros, os estrangeiros. Essa ocorrência se subordina à condição de exercício de condições análogas.

Parágrafo único

Nos casos de falta ou cessação de serviço, a dispensa do empregado estrangeiro deve preceder à de brasileiros que exerçam função análoga.

 

Relação de empregados e Registro de empregados

 

Para finalizar, com requisitos formais, os artigos 359 e 360 da CLT tratam de requisitos administrativos para a contratação de empregados estrangeiros, bem como forma documental de preservar essas situações:

 

Artigo 359:

Nenhuma empresa poderá admitir a seu serviço empregado estrangeiro sem que este exiba a carteira de identidade de estrangeiros devidamente anotada.

Parágrafo único. A empresa é obrigada a assentar no registro de empregados os dados referentes à nacionalidade de qualquer empregado estrangeiro e o número da respectiva carteira de identidade.

Artigo 360 :

Toda empresa compreendida na enumeração do Art. 352, § 1º, deste Capítulo, qualquer que seja o número de seus empregados, deve apresentar anualmente às repartições competentes do Ministério do Trabalho, de 2 de maio a 30 de junho, uma relação, em 3(três) vias, de todos os seus empregados, segundo o modelo que for expedido.

  • As relações terão, na primeira via, o selo de três cruzeiros pela folha inicial e dois cruzeiros por folha excedente, além do selo do Fundo de Educação, e nelas será assinalada, em tinta vermelha, a modificação havida com referência à última relação apresentada. Se se tratar de nova empresa, a relação, encimada pelos dizeres – Primeira Relação – deverá ser feita dentro de 30(trinta) dias de seu registro no Departamento Nacional da Indústria e Comércio ou repartições competentes.
  • A entrega das relações far-se-á diretamente às repartições competentes do Ministério do Trabalho, ou, onde não as houver, às do Departamento da Receita Federal do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, que as remeterão desde logo àquelas repartições. A entrega operar-se-á contra recibo especial, cuja exibição é obrigatória, em caso de fiscalização, enquanto não for devolvida ao empregador a via autenticada da declaração.
  • Quando não houver empregado far-se-á declaração negativa.

 

Conhecida como a “relação dos dois terços”, as mesmas devem ser apresentadas por quem de direito aos órgãos do trabalho e entregues, mediante recibo, por segurança.

Os moldes determinados no artigo 360, por óbvio devem sofrer interpretação atual em vários aspectos, em época de moedas distintas e da utilização da computação .

Assim apresentamos essas breves considerações acerca do tema como intuito de contribuir  à compreensão da matéria.

 

BILIOGRAFIA

 

  • CAMINO, Carmen. Direito Individual do trabalho. 2ª ed. Porto Alegre: Síntese, 1999. 360p.
  • GOMES, Orlando Gottschalk Elson,  Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed : Editora Forense; 
  • MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários à CLT. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. 1138p.
  • MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967 – Tomo IV, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1967. 713p.
  • MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967 – Tomo V, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1967. 661p.
  • NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 28ª ed. São Paulo: LTR, 2002. 702p.
  • OLIVEIRA, Francisco Antônio de. Comentários aos enunciados do TST. 5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. 932p.
  • RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito do Trabalho. 4ª ed. Curitiba: Juruá, 1991. 466p.
  • SAAD, Eduardo Gabriel. CLT comentada. 37ª ed. atua. e rev. Por José Eduardo Saad, Ana Maria Castello Branco. São Paulo: LTR, 2004. 917p.
  • SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. 455p.

NOTAS AO PROCESSO DE REFORMA TRABALHISTA

André Jobim de Azevedo

 

As  notas  aqui manifestadas, buscam colaborar no debate que há e que se acentuará no ano vindouro acerca da Reforma Trabalhista, uma vez que  nele está projetada a sua ocorrência.

Estamos em período de reformas. São elas a do Poder Judiciário, a Trabalhista, dentro dela a Sindical,  a do Direito Civil ,  a Previdenciária e a Tributária – essas três últimas já praticamente concluídas – a Reforma Política do Estado, a Eleitoral.

O significativo  momento  histórico,  de que somos testemunhas e ao mesmo tempo atores, é inegável, ainda que muitas vezes disso não nos apercebamos  por estarmos nele diretamente envolvidos.

O país  atravessa  situações políticas, econômicas e institucionais delicadas, mais recentemente vistas e tratadas como verdadeira reorganização nacional, que seja capaz de rever a insuportável condição de pobreza em que vive a esmagadora maioria da nossa sociedade, buscando incorporar à sociedade um enorme contingente de marginalizados.

Com essas reformas  se pretende colocar o país, nos trilhos da produção, no sentido da melhoria das condições de vida das classes pobres, do fortalecimento das instituições nacionais e da sua inserção em um ambiente mais condigno e conforme com as expectativas de ordem internacional.

O mundo mudou. Não é mais  o mundo  da época da Revolução Industrial, da  “Questão Social”, que deu azo ao surgimento do Direito do Trabalho. Período este em que o mundo se rendeu à necessidade de uma especialização jurídica própria ao atendimento de questões relativas ao trabalho e que não mais se afeiçoavam ao Direito Civil e Comercial, fundamentalmente, exigindo uma nova visão jurídica capaz de compreender e regular essas relações nascentes. Não era mais possível no tema a visão liberal, consagrada pelos ideais defendidos pela Revolução Francesa,  de liberdade plena para o ser humano, autonomia da vontade e dos contratos, o que para o mundo do trabalho significava um verdadeiro desastre.

Assim surgiu o Direito do Trabalho, buscando a regulamentação do trabalho à luz das necessidades  e dificuldades da época, cujas condições e fatos se alteraram profundamente.

Hoje a vida mudou. Somos a Sociedade que assiste a  guerras e atentados terroristas ao vivo na tela da televisão e dos computadores. As distâncias não mais separam os povos. Os meios de transporte cada vez mais eficientes redimensionam o Ir e o Vir. A informação tornou-se num dos mais preciosos bens e valores de nossa época.O encurtamento da distâncias é evidente. Tudo isso levou ao que se costuma chamar de Internacionalização ou Globalização.

A visão da humanidade se avantaja, passando a ter seus olhos voltados para a Comunidade Internacional.As relações entre os países soberanos, da chamada Comunidade Internacional, são cada vez mais intensas e na área econômica decisivas.

As formas de produzir se alteraram e seguem em mudança. São as autônomas linhas de produção, com volume de maquinário elevado e baixo capital humano, a robótica e a automação em geral a substituir a mão-de-obra humana.O Direito do Trabalho  guarda íntima relação com todas essas atuais e inacabadas ocorrências, aqui apenas exemplificativamente enunciadas.

Procura-se o país onde se possa produzir a menor custo, de modo a fabricar em qualquer localidade do globo um produto para ser vendido em todos os cantos do mundo.Com isto busca-se mercados onde o custo de mão-de-obra, dentre outros aspectos, seja capaz de formar preço competitivo em nível internacional.

No caso pátrio, estamos, sim, inseridos nessa inegável realidade e é nela que precisamos atuar. No Brasil  ainda se faz necessária a intervenção do Estado nas relações de trabalho, de vez que fortemente  marcadas pelo histórico desequilíbrio de forças que fez surgir o Direito do Trabalho, ainda contemplando o hipossuficiente nesta relação que precisa contar com o apoio do Estado .

Nesse sentido, historicamente se desenvolveu a nossa especialização laboral, sendo marcada por forte intervenção Estatal, a ponto de ser considerada presentemente demasiada e insuportável.

A CLT como base representativa dessa indevida e condenada – por sua intensidade-  intervenção no contrato privado de emprego, tem sido  alvo desse descontentamento. Não estamos aqui a discutir a tormentosa questão teórica da taxinomia do Direito do Trabalho, para determinar se é  ramo do Direito  Público, Privado ou outros.Nosso Diploma básico, editado em 1943, vem sendo fortemente torpedeado. Segundo alguns, teve forte influência do Sistema Corporativista Italiano, forte acento facista.

Posta, ainda que brevemente, a  cena atual em nosso Direito, e sociedade, ansiosa por mudanças, está o ponto central de nossa abordagem , que é a  Reforma Trabalhista.

 Para tratar do tema  gostaria de trabalhar por duas linhas básicas de raciocínio,  a saber, a Temporal e Estrutural.Na Temporal, lançar a análise para o passado recente,  para atualidade e prospecção de futuro. Na linha  Estrutural, tendo em vista a situação da Estrutura do Poder Judiciário e do arcabouço legislativo que envolve a questão.

Em primeiro lugar, é de se afastar a corrente afirmação de que a CLT  é  a responsável  pelo mau resultado econômico do país, “instrumento antigo e autoritário, que rege as relações trabalhistas ”, o que evidencia um total  desconhecimento da matéria.

Óbvia a data de nascimento da sexagenária Consolidação e o seu  aspecto  intervencionista exacerbado, que merece, sim , crítica, mas não na forma com vem sendo feita.Isso porque desconhece a existência de enorme volume de regulamentação fora de suas páginas e que se agregam ao ordenamento jurídico trabalhista, composto de leis complementares e ordinárias, decretos, regulamentos, portarias e todo o tipo possível de regramento que adere à mesma Lei e foi formulado ao longo desses últimos 60 anos.   Essa “velha senhora”, como é referida, em verdade está irreconhecível, pelas inúmeras alterações sofridas em seu texto ao longo dos anos, e especialmente nos últimos tempos.

Podemos genericamente, e a título de exemplo, referir as alterações relativas às cooperativas, ao cargo de confiança, à alteração nos dispositivos relativos à jornada de trabalho e intervalos, dentre outras tantas já tratadas  e absorvidas  pelos especialistas  e profissionais atuantes da disciplina.

Assim é que a voz corrente dessas críticas não pode ser tida por acertada.Também ao Direito do Trabalho, alguns, mais desavisados, imputam o engessamento econômico a que estamos submetidos, mas  o fazem incorretamente.Outros dizem que está esclerosada a matéria, tendo parado no tempo. Mas estas observações não são senão fruto de desconhecimento.

Isso porque, sem prejuízo de necessitar alterações, que realmente  devem ser feitas, a  grande flexibilização ou Reforma Trabalhista já ocorreu com o advento da Constituição Federal de1988.

A Constituição vigente sofre crítica, segundo a qual inclui em seu texto normas tipicamente de caráter infraconstitucional, de legislação ordinária, de  detalhismo impróprio ao regramento Constitucional  .

As grandes constituições do Mundo são aquelas capazes de atravessar os anos e até os séculos, mantendo a sua capacidade de nortear a vida de uma Nação, dando as estruturas básicas de organização e regência, a partir das quais se  constitui uma determinada ordem jurídica. São as linhas mestras de organização do Estado, cabendo à legislação infra-constitucional o papel da regência das questões corriqueiras e diuturnas

Tais características não são as de nossa Carta Maior, pois a mesma é rica em  detalhes e mesmo de repetição de normas já existentes e vigentes no sistema. Puro desconhecimento do Legislador constitucional?  Por certo que não.  

A compreensão que temos dessa dúvida e das características da má técnica constitucional que elegemos explica-se politicamente. Tendo sido 1988 a primeira oportunidade de afirmação política depois de anos de Ditadura Militar, é compreensível que se tenha pretendido  elevar uma séria de normas à condição de norma Constitucional. Com essa mudança de patamar, se qualifica a proteção desses mesmos direitos.

Em estando tratados por legislação infraconstitucional, os mesmos são de fácil alteração ou supressão, bastando a simples edição de norma ordinária posterior que regre o tema de forma diversa, para que se altere a regência  do ordenamento. Basta, muitas vezes, até um acordo de lideranças, manejado no Congresso Nacional, para que se criem ou suprimam direitos. Já as normas constitucionais demandam amplo debate, envolvimento parlamentar mais profundo e quorum qualificado. O efeito dessa situação é que as alterações constitucionais são mais difíceis de acontecer e portanto exigem fundamentação,  aprofundamento  e esclarecimento popular.

Assim é que como primeira oportunidade de reorganização do sistema constitucional e  verdadeiramente a reorganização de um país  livre, se entende como coerente a formatação Constitucional com o momento político da promulgação da vigente Lei Maior. Detalhista, por receio do passado e buscando garantir as normas então em discussão.

Se  já fomos mais ácidos na atecnia invocada, hoje devemos reconhecer a sua eficiência e resultado justamente no sentido de dar estabilidade A essas normas. Veja-se que dois moldes políticos tivemos no governo de nosso país, ambos falando em reforma do Direito do Trabalho, e que se tais normas não tivessem sido constitucionalizadas, já teríamos passado por duas reformas de vieses opostos, uma mais à esquerda, outra mais liberal.

Agora quando se fala no tema, o aprofundamento da discussão se impõe, de vez que haverá de se processar por meio de reforma constitucional, e, portanto, com  discussão composição das mais variadas forças políticas do país.

Com isto não estamos a sustentar que  a reforma, que há de vir, deva ser capaz de revelar a verdadeira vontade e necessidade da nação em rever e atualizar questões tão significativas  que dizem respeito à vida dos cidadãos e das empresas que compõe o mundo da atividade econômica  e que podem ser capazes de levar ao desenvolvimento econômico e social o país .

A Constituição vigente, como dissemos, alcançou aos Sindicatos  poder incomensurável, na medida que os colocou em  maior evidência nas relações de trabalho condicionando uma série de direitos à sua intervenção: por exemplo, redução salarial, jornada compensatória, regramento de turnos  ininterruptos de revezamento…Na área coletiva, a liberdade sindical, a unicidade sindical, entre outras tantas.

Dir-se-á que os Sindicatos não são representativos e que se prestam aos interesses patronais. Situação que, se existente não pode retirar dos mesmos sua efetiva função social e capacidade de bem representar os trabalhadores. Cada um tem que assumir seu papel em um país que está sendo passado a limpo e os sindicatos também. Se fomos capazes  de destronar em plena vigência do mandato até um Presidente da República que se portou mal,  não podemos recear comportamento sindical indevido, pois pode sofrer reação de mesmo tipo. Lembremos o óbvio: os dirigentes sindicais são escolhidos pelas bases.

Em nosso sentir, no entanto, esse direcionamento para o reforço da representação  coletiva em maior espaço é mais proveitoso do que efetivamente perigoso. Há grande vantagem na utilização de modelo diverso daquele que tem  na lei a normatização da relação de trabalho. A rigidez da lei, no particular,  desserve, uma vez que em país como o nosso, de dimensões continentais, a multiplicidade de características regionais cria situações de difícil solução. Exemplifica-se com o salário mínimo, que é impagável em dezenas de regiões do agreste nordestino e na cidade de São Paulo não tem significado  maior,  onde  poucos são os que laboram em troca apenas do mínimo. A regência  por norma coletiva permite adequação às capacidades e possibilidades setoriais, bem como à condição econômica de cada grupo de empregadores ou mesmo de um deles.

Bem aplicada a intervenção sindical cremos significar enorme avanço na proteção trabalhista, sem interferência direta do Estado. Então não se diga que o Direito do Trabalho não fez e não faz a sua parte afastando-se afirmações eleitoreiras e que bem  ecoam em platéia leiga .

Mas se isto é uma verdade, outra é a de que não foi ainda suficiente e urge sejam feitas novas reformas.Compreendemos que deva se avançar, mas com pressupostos diversos.O Estado deve, sim, reduzir sua intervenção legislativa no Contrato de Trabalho. Mas a maior intervenção nociva que realiza é de outra natureza. É de caráter tributário (amplamente falando), e que sangra produção em nosso país.

Deve, sim, e é mais urgente, o Estado liberar a produção da carga tributária insustentável, que verdadeiramente pune a atividade laboral e impede a criação de novos postos de trabalho, bem como também dificulta o desenvolvimento da economia.

A outra vertente de raciocínio é a que chamei de  Estrutural e tem  enfoques que merecem ser tratados e que são genericamente  as alterações havidas e em curso na área do Judiciário Trabalhista e que com ela se confunde, relativa às propostas de alteração legislativas em discussão.

Durante esse ano estivemos envolvidos com o Conselho Nacional de Desenvolvimento, Fórum Nacional do Trabalho, Conferência Estadual do Trabalho, já tendo sido entregue ao Poder executivo documento final em que os agentes sociais envolvidos, empregados e empregadores após ampla discussão apresentaram sugestões, e que se espera sejam transformadas em propostas legislativas.

Receamos, contudo que esse trabalho possa ter sido em vão, se mirarmos a questão Tributária. Nesta muito se falou. A sociedade civil apresentou inúmeras propostas de mudança do sistema como um todo, e o que se viu foi uma desconsideração total às mesmas. O Executivo apresentou projeto próprio e diverso daquele sugerido, mas o que é pior, de dimensões desprezíveis e incapaz de propiciar à produção qualquer desoneração…

                                   

Cremos que  a Reforma deve ser vista e tratada como processo permanente, sem soluções mirabolantes . A manutenção de alguns direitos mínimos para os trabalhadores, sem o rigor de forma imposto pelas leis, pode ser um bom começo. Exemplifica-se: manter-se a obrigação de 13º salário facultando-se ao empregador a eleição da melhor forma de cumprí-lo, por exemplo em período do ano em que tem maiores  vendas ou resultados. Ratificar o direito a férias de 30 dias, mas que possam ser fracionadas de forma diferente daquela prevista na CLT. E assim em outros tantos.

Resta-nos pois, a esperança de que as discussões havidas ao longo do ano possam nortear a reforma, já se identificando, no entanto, um primeiro equívoco, que é a separação desta da reforma sindical e sua anterioridade à reforma do Direito Material em geral, quando entendemos devessem se processar conjuntamente ou até primeiro a do Direito do Trabalho “lato sensu”.