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Nacionalização do Trabalho

NACIONALIZAÇÃO DO TRABALHO

 

Professor ME André Jobim de Azevedo – Advogado

Direito do Trabalho, Direito Processual Civil PUC/RS

  1. Proteção histórica – Trato Constitucional
  2. Constituição Federal 1988 x Consolidação das Leis do Trabalho – Vigência ?
  3. Destinatários
  4. Positivação infraconstitucional
  5. Equiparação salarial e despedimento
  6. Relação de empregados e Registro de empregados

 

  1. Proteção histórica – Trato Constitucional

A matéria em foco constitui-se em situação historicamente tutelada pelo direito brasileiro e que mereceu trato constitucional.

Originariamente a tutela era aplicada nos países em que se identificava a ocorrência significativa de imigração e de necessária especial proteção ao trabalhador nacional relativamente ao trabalhador estrangeiro. Outros sistemas jurídicos também trilharam a proteção do trabalhador pátrio, notadamente na América Latina.

Tratava-se de assegurar ao trabalhador nacional espaço adequado no mercado de trabalho, em detrimento daqueles que provinham de outros países, os quais, na grande maioria das vezes, detinham maiores condições técnicas e profissionais, o que os faria competir com os locais em condições de desigualdade.

No caso brasileiro, a adoção dessa proteção não significava rechaçar o imigrante ou negar a sua importante contribuição para o desenvolvimento nacional, mas sim a adoção de regulamentação do trabalho estrangeiro, como de fato foi levado a efeito.

A Constituição Federal de 1946, no seu artigo 157, inciso XI, asseverava a fixação de percentagens de empregados brasileiros no serviço público concedidos e em estabelecimentos de trabalho de certos ramos da atividade econômica, especificamente o comércio e a indústria

Essa regência constitucional, no entanto, não se repetiu nas posteriores cartas constitucionais, pelo que, devem ser analisadas as regências correlatas que passaram a constar do ordenamento, não só das constituições, mas como também e necessariamente do ordenamento infra constitucional.

A Constituição Federal de 1967, no seu artigo 150 parágrafo 1º, e a Emenda Constitucional nº 1 de 1969, no seu artigo 153, parágrafo 1º, traziam orientações no sentido da vazão do Princípio da Não Discriminação, estatuindo que não haveria distinção decorrente de sexo , raça, trabalho, credo religioso e convicção de natureza política .

Na Carta de 1967, o artigo 158, inciso III, genericamente vedava a diferença de salários e critérios de admissão por motivo de sexo, cor e estado civil.

A vigente Carta de 1988, tratando de maneira um pouco diversa, em seu artigo 5º, caput, orienta que todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza. E no inciso XIII do mesmo artigo assevera que é livre o exercício de qualquer trabalho ofício ou profissão.

Em sede de orientação Internacional, a Convenção da Organização Internacional do Trabalho nº111 de 1958 foi aprovada pelo Decreto Legislativo nº 104 de 1964, promulgado pelo Decreto nº 62.150 de 1968 e estabeleceu em seu artigo 1º que a nacionalidade não deve alterar a igualdade de oportunidade para a obtenção de emprego ou ocupação, bem como o tratamento a ser dispensado nessa ocorrência.

Lembre-se que para que o estrangeiro possa firmar contrato de trabalho no Brasil é inafastável a sua permanência legal no país, nos moldes previstos pelo Direito Internacional Privado.

     2. Constituição Federal 1988 X Consolidação das Leis do Trabalho – Vigência ?

 

A consolidação das Leis do Trabalho no artigo 349, assim reza:

O número de químicos estrangeiros a serviço de particulares, empresas ou companhias não poderá exceder de um terço aos dos profissionais brasileiros compreendidos nos respectivos quadros.

No Capítulo II, intitulado “Da nacionalização do trabalho”, em sua seção I, o artigo trata da proporcionalização de empregados brasileiros, obrigando ao empresário que contratar “três ou mais trabalhadores”, sejam pelo menos 2/3 de trabalhadores nacionais, com a seguinte redação:

artigo 352:

As empresas, individuais ou coletivas, que explorem serviços públicos dados em concessão, ou que exerçam atividades industriais ou comerciais, são obrigadas a manter, no quadro do seu pessoal, quando composto de três ou mais empregados, uma proporção de brasileiros não inferior à estabelecida no presente Capítulo.

§ 1º Sob a denominação geral de atividades indústrias e comercias como pretendem, além de outros que venham a ser determinadas em portaria do Ministro do trabalho, as exercidas:

a) nos estabelecimentos indústrias em geral;

b) nos serviços de comunicações, de transportes terrestres, marítimos, fluviais, lacustre e aéreos;

c) nas garagens, oficinas de reparos e postos de abastecimento de automóveis e nas cachoeiras;

d) na indústria da pesca;

e) nos estabelecimentos comercias em geral;

f) nos escritórios comercias em geral;

g) nos estabelecimentos bancários, ou de economia coletiva, nas empresas de seguros e nas de capitalização;

h) nos estabelecimentos jornalísticos, de publicidade e de radiodifusão;

i) nos estabelecimentos de ensino remunerado, excluídos os que neles trabalhem por força de voto religioso;

j) nas drogarias e farmácias;

k) nos salões de barbeiros ou cabeleireiros e de beleza;

l) nos estabelecimentos de diversões públicas, excluídos os elencos teatrais, e nos clubes esportivos;

m) nos hotéis, restaurantes, base e estabelecimento congêneres;

n) nos estabelecimentos hospitalares e fisioterápicos cujos serviços sejam remunerados, excluídos os que neles trabalham por força de voto religioso;

o) nas empresas de mineração.

p) nas autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e demais órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, por empregados sujeitos ao regime da CLT.

§ 2º Não se acham sujeitas às obrigações da proporcionalidade as indústrias rurais, as que, em zona agrícola, se destinem ao estabelecimento ou ransformação de produtos da região e as atividades industriais de natureza extrativa, salvo a mineração.

Tratou assim a Consolidação de estabelecer verdadeiramente uma proteção ao trabalhador nacional nos moldes acima transcritos e que serão adiante detalhados.

Pois bem, a questão que daí exsurge é de difícil solução e encontra respeitáveis doutrinadores em posições antagônicas. Tal diz respeito ao conflito, pelo menos aparentemente, identificado na coexistência entre as regras Celetistas e Constitucionais.

Defendem uns a vigência das normas celetistas protetivas ao trabalhador nacional, e outros, a sua revogação por estarem em desacordo coma constituição vigente. A maioria da doutrina, no entanto, se omite e em nosso sentir estes seriam em menor número.

Esses últimos sustentam que a vigente Carta Maior não repetiu o permissivo de diferenciação de tratamento havido na CF de 1946, ao contrário, as normas acima mencionadas, reorientariam a matéria, ora sob o primado da igualdade de tratamento e da não discriminação. Também sustentam que a posterior ratificação da Convenção nº 111 da OIT teria o efeito de, por igual, face à sua posterior edição, revogando os artigos 352 a 362 da CLT, bem como a do artigo 349. Não poderia assim se sustentar distinção de tratamento por incompatibilidade com a norma constitucional

Veja-se no aresto abaixo que em julgamento bem posterior à promulgação da atual Constituição a 4ª Turma do TST, faz a referência à norma do artigo 358 da CLT, evidenciando a consideração de vigência por esta Turma do Tribunal Superior do Trabalho.

PROC. Nº TST-RR-528.389/99.0

A C Ó R D Ã O – 4ª Turma MF/RM/cg

EQUIPARAÇÃO SALARIAL – IDENTIDADE DE FUNÇÕES ART. 461 DA CLT .

Diferentemente da regra contida no artigo 358 da CLT, que exige apenas que reclamante e paradigma exerçam funções meramente análogas, o artigo 461 da CLT tem, na identidade de funções, um dos requisitos indispensáveis à configuração do direito à equiparação salarial. Não basta, portanto, que sejam as funções simplesmente análogas ou equivalentes. Urge que os dois empregados confrontados desempenhem as mesmas tarefas, pouco importando a nomenclatura conferida pela empresa ao cargo por eles ocupado. Violação do art. 461 da CLT não configurada. Recurso de revista não conhecido.

Cremos, no entanto, não ser clara a sustentada revogação, na medida em que a proteção celetista não fere diretamente qualquer norma Constitucional, e portanto apta à proteção determinada. Não fora isso, a crescente qualificação e preparo do trabalhador nacional têm na raiz do fato, senão eliminado a discussão, reduzido muitíssimo a sua necessidade. O que releva, no entanto, é que se trata de questão em aberto, sem que se possa emitir juízo conclusivo sobre o tema. Tal situação nos leva à necessidade de exame próprio das disposições celetistas.

 c) Destinatários

A proteção prevista na CLT tem destino certo. Inobstante a imprecisão vocabular do artigo 7º, caput da Carta Federal de 1988, as regras e situações em discussão atingem apenas trabalhadores (gênero) com vínculo de emprego, ou seja, os empregados (espécie). Lembre-se, a título de elucidação, que todo o empregado é trabalhador, mas nem todo o trabalhador é empregado, na medida em que há inúmeras outras formas de prestar trabalho que não sob a égide do contrato de trabalho.

A regra do artigo 349 da Consolidação, tem, por igual, mais específicos destinatários, quais sejam os trabalhadores com função de químico, por força da expressa destinação da regra.

Além desses, a norma do artigo 352 da CLT que determina a proporção entre nacionais e não nacionais, enumera outros tantos que poderiam ser agrupados em dois blocos. Aqueles de empresas individuais ou coletivas que explorem serviço público dado em concessão e aqueles que exerçam atividades industriais ou comerciais nas atividades já discriminadas nas alíneas do artigo, ou em outras que possam vir a ser determinada em Portaria do Ministério do Trabalho.Assim é que a referida proporcionalidade, se aplicando especificamente às atividades arroladas, deixaria de ser exigível em importantes outras atividades como atividades rurais, sociedades civis ou profissionais liberais.

Quanto aos rurais, a despeito da pretendida equiparação constitucional aos trabalhadores urbanos, cremos não ser possível o integral atendimento da norma constitucional (Caput do artigo 5ª da Constituição Federal) de vez que distinto do trabalho urbano, bem como pela existência de normas constantes de leis próprias, não inteiramente afastadas da regência.

Também são excetuadas as hipóteses do parágrafo 2º, claramente postas, ainda que industriais. Assim, nestas situações não se prenderia o empregador às proporções determinadas na lei.

Ressalte-se que da especiosa redação do 2º parágrafo, resta claro que mesmo tendo sido incluída a atividade de mineração como exceção, a mesma se sujeita à proporcionalidade instituída.

d) Positivação infraconstitucional

A matéria “sub examen” tem como regramento direto as normas da CLT do artigo 349, dirigida aos químicos, e do artigo 352 a 358 no Capítulo que trata da “Nacionalização do Trabalho”. Além desses há o artigo 369 de aplicação restrita a Marinha Mercante.

Iniciando por esse último e deixando apenas para depois o Capítulo referido – uma vez que os químicos foram antes abordados – é de se reconhecer a importância da exceção, de vez que envolve relevantes questões de soberania e segurança nacional. Realce-se a lembrança do professor de todos nós, o insigne Ministro Mozart Victor Russomano, que dá conta de que redação anterior no sentido de que a totalidade da tripulação deveria ser constituída de brasileiros.

Art. 369 e parágrafo:

A tripulação de navio ou embarcação nacional será constituída, pelo menos, de 2/3 (dois terços) de brasileiros natos.

Parágrafo único:

O disposto neste artigo não se aplica aos navios nacionais de pesca, sujeito à legislação específica.

Realça o Eminente jurista que “sobreveio a Lei nº 5.683, de 21 de julho de 1971 que derrogou aquele dispositivo, determinando que também em relação às tripulações de navios mercantes se obedeça a proporcionalidade entre nacionais e estrangeiros à razão de dois terços. Uma revivescência do direito anterior ficou, porém, no art.369, caput: dois terços devem ser constituídos de brasileiros natos”, requisito não exigido na hipótese dos artigos 352 e 354 e que não mais pode ser admitido em face do art. 12, parágrafo 2º, da Constituição Federal.” (grifo original)

A regra em estudo tem o seu parágrafo excepcionando dessa proporcionalidade os navios nacionais de pesca, “sujeita à legislação específica”. Dessa forma em navios nacionais de pesca pode-se contar com todos os tripulantes estrangeiros. A título ilustrativo há o artigo 368, que assegura o Comando do navio a brasileiro nato, cuja vigência é discutível, face às disposições constitucionais que tratam dessas definições de nacionalidade. É a norma do artigo 12, parágrafo segundo da Constituição Federal que proíbe diferença de tratamento entre brasileiros natos e naturalizados, a não ser as previstas na própria Constituição.

Art.368:

O comando do navio mercante nacional somente poderá ser exercido por brasileiro nato.

Trata-se de determinação aplicável à qualquer navegação fluvial ou lacustre, como em barragens , barras, lagos , canais , etc, em toda a marinha mercante nacional.

O artigo 354 prevê a possibilidade de redução dessa proporcionalidade por ato do Poder Executivo, em face de circunstâncias especiais de atividade e região e segundo o artigo 357, há a possibilidade que o Poder Executivo, por meio da autoridade administrativa, em situações de falta de mão de obra nacional, exclua da proporcionalidade “funções técnicas especializadas”:

Artigo 354:

A proporcionalidade será de 2/3 (dois terços) de empregados brasileiros, podendo, entretanto, ser fixada proporcionalidade inferior, em atenção às circunstâncias especiais de cada atividade, mediante ato do Poder Executivo, e depois de devidamente apurada pelo Departamento Nacional do Trabalho e pelo Serviço de Estatística da Previdência do Trabalho a insuficiência do número de brasileiros na atividade de que se tratar.

Parágrafo único. A proporcionalidade é obrigatória não só em relação à totalidade do quadro de empregados, com exceções desta Lei, como ainda em relação à correspondente folha de salários.

Artigo 357:

Não se compreendem na proporcionalidade os empregados que exercem funções técnicas especializadas, desde que, a juízo do Ministério do trabalho, haja falta de trabalhadores nacionais.

 a) Equiparação salarial e despedimento

Segundo os ditames constitucionais, não são permitidas distinções entre trabalhadores nacionais e estrangeiros quanto à salário, sendo de nos interessar no momento, o risco de que o estrangeiro receba em condições análogas salários superiores. As exceções são postas nas alíneas da referida normatização.

Nesse sentido a norma do artigo 358 da CLT é expressa:

a) quando, nos estabelecimentos que não tenham quadros de empregados organizados em carreiras, o brasileiro contar menos de dois anos de serviço e o estrangeiro mais de dois anos;

b) quando mediante aprovação do trabalho, houver quadro em carreira em que seja garantido o acaso por antiguidade;

c) quando o brasileiro for aprendiz, ajudante ou servente, e não o for o estrangeiro;

d) quando a remuneração resultar de maior produção, para os que trabalham à comissão ou por tarefa.

No tocante à diferença salarial a regra prevê as situações legítimas ou não dessa ocorrência, sendo certo que o trabalhador nacional pode deduzir pretensão judicial equiparatória. Essa pretensão à equiparação salarial, que tem previsão geral expressa no artigo 461 da CLT, por este não se norteia, à vista da regra específica e diversa que rege a comparação entre nacional e estrangeiro, como exceção.

Suficiente dessa maneira a ocorrência de função análoga, assim definida administrativamente pela Fiscalização do Trabalho, por óbvio, sempre sujeita ao crivo do poder judiciário para efeitos de avaliação da conclusão administrativa.

Ficam, assim excluídos da vantagem, os trabalhadores com situação previstas nas alíneas.

Convém ressaltar, particularmente a distinção de tratamento entre as duas regras, de vez que a presente, mais branda, fala em “função análoga”, ao passo que o artigo 461 em “funções idênticas”, portanto esse muito mais restrito:

Artigo 461:

Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo empregador, na mesma localidade, corresponderá igual salário, sem distinção de sexo, nacionalidade ou idade.

§ 1º Trabalho de igual valor, para os fins deste Capítulo, será o que for feito com igual produtividade e com a mesma perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de serviço não for superior a 2 (dois) anos.

§ Os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o empregador tiver pessoal organizados em quadro de carreira, hipótese em que as promoções deverão obedecer aos critérios de antiguidade e merecimento.

§ 3º No caso do parágrafo anterior, as promoções deverão ser feitas alternadamente por merecimento e por antiguidade, dentro de cada categoria profissional.

§ 4º O trabalhador readaptado em nova função por motivo de deficiência física ou mental atestado pelo órgão competente da Previdência Social, não servirá de paradigma para fins de equiparação salarial.

Relativamente ainda à equiparação, de incidência a regra do artigo 353 da CLT:

Art. 353. Equiparam-se aos brasileiros para os fins deste Capítulo e ressalvado o exercício de profissões reservadas aos brasileiros natos ou aos brasileiros em geral, os estrangeiros que residindo no País há mais de dez anos, tenha, cônjuge ou filho brasileiro, e os portugueses.

Assim é que excepciona a regra geral, apenas para efeitos de nacionalização, a situação de estrangeiros residentes há mais de 10 anos que tenham cônjuge ou filho brasileiro, ou , ainda, sejam portugueses (Lei nº 6.651/79).

Finalmente de realçar a proteção especial em termos de despedida, prevista pelo parágrafo único do artigo 358 da CLT, que quando na empresa ocorrer falta de serviço ou cessação da atividade econômica do empregador, necessitando dispensar os trabalhadores em parte ou sucessivamente, o sejam antes dos brasileiros, os estrangeiros. Essa ocorrência se subordina à condição de exercício de condições análogas.

Parágrafo único

Nos casos de falta ou cessação de serviço, a dispensa do empregado estrangeiro deve preceder à de brasileiros que exerçam função análoga.

 b) Relação de empregados e Registro de empregados

Para finalizar, com requisitos formais, os artigos 359 e 360 da CLT tratam de requisitos administrativos para a contratação de empregados estrangeiros, bem como forma documental de preservar essas situações:

Artigo 359:

Nenhuma empresa poderá admitir a seu serviço empregado estrangeiro sem que este exiba a carteira de identidade de estrangeiros devidamente anotada.

Parágrafo único. A empresa é obrigada a assentar no registro de empregados os dados referentes à nacionalidade de qualquer empregado estrangeiro e o número da respectiva carteira de identidade.

Artigo 360 :

Toda empresa compreendida na enumeração do Art. 352, § 1º, deste Capítulo, qualquer que seja o número de seus empregados, deve apresentar anualmente às repartições competentes do Ministério do Trabalho, de 2 de maio a 30 de junho, uma relação, em 3(três) vias, de todos os seus empregados, segundo o modelo que for expedido.

§ 1º As relações terão, na primeira via, o selo de três cruzeiros pela folha inicial e dois cruzeiros por folha excedente, além do selo do Fundo de Educação, e nelas será assinalada, em tinta vermelha, a modificação havida com referência à última relação apresentada. Se se tratar de nova empresa, a relação, encimada pelos dizeres – Primeira Relação – deverá ser feita dentro de 30(trinta) dias de seu registro no Departamento Nacional da Indústria e Comércio ou repartições competentes.

§ 2º A entrega das relações far-se-á diretamente às repartições competentes do Ministério do Trabalho, ou, onde não as houver, às do Departamento da Receita Federal do Ministério da Economia, Fazenda e Planejamento, que as remeterão desde logo àquelas repartições. A entrega operar-se-á contra recibo especial, cuja exibição é obrigatória, em caso de fiscalização, enquanto não for devolvida ao empregador a via autenticada da declaração.

§ 3º Quando não houver empregado far-se-á declaração negativa.

Conhecida como a “relação dos dois terços”, as mesmas devem ser apresentadas por quem de direito aos órgãos do trabalho e entregues, mediante recibo, por segurança.

Os moldes determinados no artigo 360, por óbvio devem sofrer interpretação atual em vários aspectos, em época de moedas distintas e da utilização da computação .

Assim apresentamos essas breves considerações acerca do tema como intuito de contribuir à compreensão da matéria.

Bibliografia

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  • GOMES, Orlando Gottschalk Elson, Curso de Direito do Trabalho. 14ª ed : Editora Forense; 1997.

  • MARTINS, Sérgio Pinto. Comentários à CLT. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. 1138p.

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  • MIRANDA, Pontes de. Comentários à Constituição de 1967 – Tomo V, São Paulo: Revista dos Tribunais, 1967. 661p.

  • NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 28ª ed. São Paulo: LTR, 2002. 702p.

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  • RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de Direito do Trabalho. 4ª ed. Curitiba: Juruá, 1991. 466p.

  • SAAD, Eduardo Gabriel. CLT comentada. 37ª ed. atua. e rev. Por José Eduardo Saad, Ana Maria Castello Branco. São Paulo: LTR, 2004. 917p.

  • SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. 455p.

Conhecimento e Execução – Efetividade da Jurisdição Trabalhista

* Artigo publicado no livro ANAIS – Congresso Internacional de Direito do Trabalho e Processual do Trabalho. Porto Alegre: Editora Juruá

Conhecimento e Execução – Efetividade da Jurisdição Trabalhista

Me. André Jobim de Azevedo

Advogado, Professor Universitário, Especialista em Direito Processual Civil, Mestre em Direito

O tema em exame é de ímpar atualidade e importância. Trata-se de verdadeiro desafio ao processo do trabalho dar efetividade aos direitos judicialmente buscados.

A matéria do processo do trabalho positiva-se na CLT, que trata do processo do trabalho com bastante detalhe, mas que em adequado e devido direcionamento, explicita no artigo 769, o Direito Processual Comum como fonte subsidiária ao Direito Processual do Trabalho.

O processo do trabalho, fruto do exercício jurisdicional da especializada matéria trabalhista, tem matizes próprias, mas que se fundamentam no antigo direito processual civil, ou, como chamado pela CLT, direito processual comum.

Não é pois, possível, qualquer abordagem adequada sem que se façam previamente algumas considerações introdutórias sobre o mesmo.

A solução das controvérsias originariamente em tempos de auto composição dos conflitos entre os homens se dava pela Lei de Talião, a aplicação do “olho por olho, dente por dente”. A supremacia do império da força, no entanto, foi incapaz de manter a paz social.

A Intervenção do Estado – substitutiva ao particular na solução conflitos – avançou na tentativa de melhor responder às necessidades de relacionamento e proteção dos cidadãos.

Proibida a reação privada imediata como regra, a jurisdição se apresentou como melhor forma de definir o direito (“juris et dictio”).

Monopólio do Estado na solução dos conflitos, essa evolui para além da simples atribuição do Direito a quem o tenha, para alcançar coercitividade de execução no cumprimento de suas decisões.

A jurisdição se afirma como necessidade de fazer valer na prática o regramento prévio e teórico instituído pelo direito em determinado sistema jurídico. É a aplicação “in concreto” das normas jurídicas. Dizer e fazer – julgar e realizar a solução das controvérsias. Atuar no sentido do conhecimento das demandas e execução das decisões e julgamentos.

O caminho socialmente evoluído, civilizado e aceitável é o processo, já que por vias próprias não mais é possível a implementação de soluções.

O processo judicial tem missão nobre e assim deve ser adequadamente disposto e regrado como forma de proteção à cidadania, afastando a barbárie da convivência social.

Pois este instrumento de realização do direito material é a via própria para manter a convivência social harmonizada, também em sede de Direito do Trabalho.

Não parece, no entanto que o mesmo tenha se perfectibilizado por completo à vista da ausência de efetividade escancarada e que não se limita ao ambiente pátrio.

É célebre a notável afirmação do processualistaitaliano Chiovenda de que o processo deve dar a quem tem um direito tudo aquilo e precisamente aquilo que ela tem o direito de obter.

Assim, deve ser direito de todos, a utilização do processo (instrumento da jurisdição) na busca, no dizer de Carnelutti, “da justa composição da lide”. A solução da controvérsia, na melhor condição possível.

O DireitoProcessual como ciência autônoma se fortalece e ao mesmo tempo necessita de proteção. Ação do Estado para que cumpra seu mister relativamente à todo aquele que dele necessitar, garantindo essa possibilidade como um direito amplo que a todos beneficie.

Hoje cercado de complexos estudos científicos o Direito Processual Civil é servido por normatização positivada de toda a ordem, bem como de firme principiologia que o instrui e fundamenta.

Nesse sentido, finalizando estabilizar e bem orientar a solução das controvérsias a codificação é caminho importante, mas nem sempre estável o suficiente.

O direito material do trabalho, matéria especializada cujo surgimento decorre das significativas mudanças na forma de prestar o trabalho a partir da revolução industrial, fez com que, para solucionar as controvérsias, também fosse criada justiça Especializada do Trabalho.

Importantes experiências nacionais contribuíram para a sua factibilização, podendo-se referir aos Tribunais Rurais em São Paulo no ano de 1922, às Comissões Mistas de Conciliação no ano de 1932.

Foi a Constituição Federal de 1934, que, pela primeira vez no pais, previu um órgão administrativo de solução de controvérsias laborais, o qual, naqueles moldes, se constituía em órgão administrativo, integrante, pois do Poder Executivo da República .

Já a Constituição Federal de 1937, renovando a referência constitucional anterior, ainda em moldes administrativos, institui a Justiça do Trabalho, ensejando que o Decreto 1237, de 1939, a constituísse. Foi, no entanto, apenas no ano de 1941 que a mesma foi instalada.

Coube à Constituição Federal de 1946 – destacada pelo realce de matéria trabalhista que incluiu em sua páginas – que a qualificou, tornando-a órgão integrante do Poder Judiciário, com os consectários próprios ora de um órgão judicial, com feição de Poder.

A CLT apresenta a regência da ação reclamatória trabalhista, mas ainda e sempre com possibilidade de suporte por parte do Direito Processual Civil.

Inúmeras foram as tentativas de criação de um Código próprio, de um Código Processual do Trabalho e que nunca foram realmente dotadas de interesse político em sua criação.

Exemplificativamente, em 1992, tivemos oportunidade de relatar o estudo sobre o Anteprojeto de Código de Processo do Trabalho do Colendo Tribunal Superior do Trabalho elaborado pela Comissão do Fórum em defesa da Justiça do Trabalho, que inclusive foi publicado por Editora trabalhista ( Anteprojeto de Código Processual do Trabalho / André Jobim de Azevedo, Relator, Dirson Solano Dornelles, Ricardo Carvalho Fraga – São Paulo : LTR, 1992), e que examinava os projetos elaborados pelos Ministros Carlos Alberto Barata Silva e José Luiz Vasconcellos. Seis longos meses de Trabalho e que não levaram a lado algum…

Sempre se considerou, não sem razão, que a regência da CLT não era completa e portanto em inúmeras ocorrências incapaz de regrar uniformemente os processos judiciais de sua competência, ensejando a que cada Juiz do Trabalho desse sua interpretação e aplicação quando levantadas certas questões no curso da ação. A insegurança jurídica e processual especificamente pela ausência de orientação uniforme segura é mal que prejudica ao processo trabalhista.

Importante caminho o da legislação ordinária, o qual, entretanto, por si só, não é capaz de realizar tão majestosos objetivos, especialmente em sistemas e regimes jurídicos e políticos menos estáveis.

Ocorre que o procedimento de produção legislativa pela via ordinária é notoriamente instável, no sentido de que basta edição de outra norma ordinária, para que a matéria tenha seu rumo alterado, gerando insegurança e instabilidade, quer quanto ao próprio direito processual, quer quanto à proteção da qual se incumbe o Estado e à qual se obriga.

Nesse sentido, a existência e aplicação de princípios, retaguarda a correta condução do processo e de alguma maneira dá ao sistema maior confiabilidade.

Por conta dessa inegável realidade, o sistema brasileiro acabou estendendo ao processo civil uma estratégica utilizada em outros ramos do direito, como o Direito do Trabalho, qual seja, a constitucionalização.

Em nosso sentir não significando apenas, e quem sabe, um desvirtuamento da finalidade e formato constitucional, mas acima de tudo uma saída, um clamoremaltavoz à uma condição mais segura. Um apelo à uma sedimentação e estabilidade maior desses direitos verticalizados, que é própria das Constituições Federais.

Em um país como o Brasil, onde por mais de 20 anos suportaram-se regime autoritários e ditatoriais, alguma tolerância deve ter-se dessa, por nós chamada, atecnia constitucional. A hesitação e mutação legislativa, ao sabor dos interesses, causou trauma, ensejando, na primeira oportunidade de redemocratização do país e formulação de Carta Constitucional, a construção quase ordinária desse diploma orientador maior que é a Constituição Federal.

E prova maior disso são os direitos trabalhistas inseridos na Constituição, notadamente aqueles previstos pelo artigo 7º da Carta, que em muito repetem normatização infraconstitucional.

E aqui se concentra a crítica ao excessivo detalhismo e particularização da Carta que a torna inaceitavelmente distante daqueles aos quais se destina, os cidadãos da nação. Uma carta constitucional que ainda adolescente (1988) já conta surpreendentemente com mais de 55 emendas. Compare-se a estruturação e organização trazida pelas centenárias Constituições Francesa e Norte Americana que com um rol restrito de orientações estruturais e definições políticas foram capazes de atravessar os anos e continuam a ser instrumento de orientação dos povos aos quais se destina aplicar e nortear. Em especial, a duocentenária norte-americana, contando ainda hoje com pouco mais de 20 emendas. São regências de conhecimento e convicção da população, diferentemente do que se passa em terra nacional, onde, nem mesmo sequer os profissionais do direito têm a devida intimidade com a mesma, o que se dirá da pobre e inculta população deste país, para dizer o menos.

Falar-se em efetividade do Processo do Trabalho, quer em fase de conhecimento, quer em fase de execução impõe trazer à discussão a condição de acesso ao Poder Judiciário.

No Brasil, desde a Constituição Federal de 1946 se pretende garantir o acesso amplo da cidadania ao Poder Judiciário. A vigente Carta Constitucional de 1988 é pródiga em detalhes em geral em seus 250 artigos e mais 83 artigos de atos de disposições constitucionais transitórias, o que a faz rapidamente desatualizada e enseja formulação de emendas…

Assim, é de alguma ocorrência a existência de tensão constitucional entre normas que protegem interesses diversos e que podem ser postas em situação de antagonismo. Importante remédio é a compatibilização, para convivência simultânea dos princípios fundamentais envolvidos. O sistema jurídico deve ser compreendido como um todo aberto, permeável, lacunoso, e antinômico (com contradições). É com o Princípio da Proporcionalidade que se dá o adequado manejo destas ocorrências.

Especificamente no caso do processo, já se fala em “processo civil constitucional”, ante a evidente inclusão no Diploma Maior de normas dessa natureza, especialmente quanto aos princípios processuais, nela incluídos.

O acesso ao Poder Judiciário é GARANTIA CONSTITUCIONAL PÉTREA, conforme artigo 5º, XXXV da Carta Magna, sendo que as normas destas disposições não podem ser alteradas por emenda constitucional, senão por constituinte exclusiva com finalidade de formulação constitucional. Essa a previsão constitucional do artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV.

Assim, está constitucionalmente positivado que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito“.

Norteadores da compreensão do fenômeno jurídico como instrumento de referência de um problema jurídico qualquer, os princípios são fundamentais para higidez do sistema. Não princípios físicos, inafastáveis a que os fenômenos da natureza se submetem inexoravelmente, como, por exemplo, a gravitação.

Como proposições básicas, fundamentais que embasam, servem de assento à estrutura de determinada ciência. Preparam a organização e desenvolvimento da mesma. Ponto de partida para o desenvolvimento de qualquer sistema de conhecimento e que a este conferem validade, tidos por verdades fundamentais.

São considerados como verdades ou juízos fundamentais. São pilares jurídicos de maior grandeza, “holofotes” que iluminam com grande intensidade qualquer entendimento amparado na legislação positivada.

São norteadores para a edificação das normas jurídicas e para a aplicação do direito processual “in concreto”.

Alguns constitucionalizados, constituindo-se em normas jurídicas qualificadas, da mais alta hierarquia normativa.

Garantem a hegemonia e a unidade do sistema jurídico, determinando que as normas de hierarquia inferior guardem respeito e observância aos mesmos, em termos hierárquicos.

Orientam a criação do direito infraconstitucional, com sua previsão “in abstrato”, e que deve ser erigido em consonância com os mesmos.

Princípios Processuais não tem sentido absolutamente autônomo e limites rígidos. Interpenetram-se em zona “gris” de relação entre os mesmos, e até eventualmente se confundem.

Reitere-se que o artigo 5º da Constituição Federal brasileira, incluído no Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, e no capítulo I – Dos Deveres e Garantias Individuais e Coletivos – consagra Cláusula Pétreas (artigo 60, § 4º, inciso 4º da Constituição Federal), NÃO passíveis de alteração ou supressão, nem por emenda constitucional (tal como a Forma Federativa do Estado, o Voto Direto Secreto, Universal e Periódico, a Separação dos Poderes). Constitui-se em núcleo intangível da Constituição Federal.

Entende-se que entre os princípios fundamentais (devido processo legal, contraditório, ampla defesa) se coloca como pressuposto garantir o acesso ao Poder Judiciário, ao processo como meio de solução de controvérsia.

Lembre-se que não basta assegurar acesso, senão acesso eficiente. É condição inafastável da sociedade democrática o controle jurisdicional do acesso ao Poder Judiciário, a sua indeclinabilidade na solução das controvérsias, o que envolve a questão da efetividade. Esta não se constitui em problema nacional, mas mundial, no sentido de que vários países desenvolvidos do mundo o enfrentam, sendo certo que a demora da conclusão do processo a todos atormenta.

Pergunta-se: o processo trabalhista tem sido capaz de atender à necessidade dos trabalhadores na solução das controvérsias a ele submetidas. ?

A resposta é hesitante e tende mais à negativa, em face da longa duração dos feitos laborais e que, postergando o atendimento judicial dos direitos em demasia, tem o significado de verdadeira denegação de Justiça, com infração à norma constitucional em exame.

Vários são os princípios processuais informados pelo princípio do Acesso ao Poder Judiciário, ligados com a ação e a defesa, como o princípio Da Demanda, Dispositivo, Ampla Defesa, Defesa Global, Contraditório, Eventualidade.

A Garantia de Acesso ao Poder Judiciário constitui-se em garantia prévia ao processo, supra constitucional, que informa outros tantos ligados aos direitos das partes no processo.

Já a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, ONU 1948, artigo 10º, a Convenção de Roma de 1950- Convenção Européia para Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais artigo 6º, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, artigo 14,1 e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos da Costa Rica, 1969, artigo 8º,1, assim asseveraram.

Lembrado na doutrina nacional, Mauro Capelletti se posicionou sobre o movimento de acesso à Justiça nos Estados contemporâneos, tendo constatado 3 ondas : 1)pobreza como obstáculo de acesso ao Judiciário e a Representação legal do pobre; 2) proteção aos interesses difusos, fenômenos da sociedade de massa; coletivização do Direito; 3) risco de burocratização do Judiciário.

Também referido como Direito à ação, direito de ação e direito de petição, com sutis diferenças de enfoques que aqui não merecem relevo, tem-se-o como o Direito de dirigir-se a juiz ou tribunal competente para que lhe aprecie lesão ou ameaça de direito. Direito de peticionar aos órgãos do Poder Judiciário.

É o Direito de todo o homem de ser ouvido por Tribunal independente e imparcial, previamente instituído por lei. A este submeter todo e qualquer direito subjetivo, individual, coletivo, transindividual, difuso e individual homogêneo.

E a tanto não basta formalmente garantir acesso aos Tribunais, mas sim adequada tutela jurisdicional, efetiva e tempestiva, em prazo razoável, sem dilações indevidas, proporcional à complexidade da discussão. Nesse sentido, deve por igual se observar e para tal contribuir, o comportamento de juízes e procuradores das partes, assim como todos aqueles que no processo intervém.

Muito se fala, e acertadamente, na crise do processo, questionando a sua não utilidade, morosidade, o que se constitui verdadeiramente em Justiça inacessível.

É o devido Direito AO processo e NO processo (Regularidade processual). A busca da prestação de jurisdição em breve espaço de tempo, o tempo justo para a consecução do escopo.

Não se pode, nesta ótica, deixar de observar a significância da diferença de capacidade econômica das partes, como definidores de capacidade de resistência e espera na demora na solução final da contenda, aspecto esse de maior relevo em se tratando de Direito do Trabalho, cujo pressuposto é justamente a desigualdade entre as parte, considerando a hipossuficiência do trabalhador.

Assim é que, parte disso tudo, é garantir o acesso ao Poder Judiciário e ao processo aos jurisdicionados que não disponham de condições, o que se pode viabilizar pelo princípio da Assistência Judiciária Gratuita. Trata-se também de cláusula pétrea, prevista pelo artigo 5º, incisoLXXIV da Constituição Federal e que se rege basicamente pela Lei 1060/50. É norma legal de aplicação diuturna na Justiça Especializada do Trabalho e que, neste particular, autoriza e facilita o acesso ao Poder Judiciário, mas não é tudo. 

Kazuo Watanabe, ilustre processualista brasileiro é preciso ao se manifestar sobre o tema asseverando que “o direto de acesso à Justiça é, fundamentalmente, direito de acesso à ordem jurídica justa. A problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites de acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim, viabilizar o acesso à ordem jurídica justa”

A Justiça do Trabalho, órgão especializado do Poder Judiciário em face da demasiada demora na solução dos conflitos que lhe são postos e sua final efetivação, não pode ser tido como adequado neste particular. São anos de espera e mesmo assim sem a certeza da efetivação do direito, já que muitas das execuções são frustradas e incumpridas.

Em momento do passado recente ergueram-se rumores no sentido de que a Justiça do Trabalho não se constituía em órgão necessário e cujo custo estatal poderia levar à consideração de sua dispensabilidade, falando-se em extinção do Tribunal Superior do Trabalho e até da própria Justiça do Trabalho.

Como que em movimento diametralmente oposto foi editada alteração constitucional que ora se aborda .

Recentemente, em dezembro de 2004, mais uma emenda constitucional foi editada, a de número 45, com incidência direta sobre a Justiça do Trabalho, com fim expresso de reformar o Poder Judiciário, mas que veladamente buscava instituir controle externo ao Judiciário.

Declarou-se a agilização e efetividade do processo como objetivo. Apenas para referir, pois se trata de outro tema, efetivamente foram criados vários órgãos de controle externo como o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público, o Conselho Superior de Justiça do Trabalho.

Pois essa Emenda Constitucional, além de alterar a competência da Justiça do Trabalho inseriu mais um inciso no artigo 5º, da Constituição Federal , o inciso LXXVII (78º) que dispõe que – “a todos são assegurados razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

o se vê aí uma novidade, já que tal leitura de efetividade já era feita antes desse inciso, quanto aos dispositivos existentes na própria Carta e artigo 5º, LIV – devido processo legal, LV – ampla defesa, XXX – acesso ao Poder Judiciário. “a lei não excluirá da apreciação…”.Estes já se interpretavam no sentido de que a prestação jurisdicional devesse ser efetiva proteção, célere, justa, com condição real de atuação no mundo dos fatos.

Ocorre que a novel norma constitucional, em verdade nada significa. O que é “razoável duração”? Quanto tempo significa efetividade na prestação jurisdicional aos efeitos da razoável duração? Quais os meios disponíveis para assegurar a celeridade de tramitação?

É importante perceber que se trata de norma programática, não auto-aplicável, que traz conceito aberto e subjetivo. Obviamente depende de formulação legislativa ordinária complementar, e que até agora não sobreveio.

Algumas alterações no sentido da efetivação e qualificação da prestação jurisdicional foram determinadas pela EC 45, como a do artigo 93, II –c) promoção dos juízes por critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição. Ainda, freqüência e aperfeiçoamento em cursos. Oficiais e reconhecidos de aperfeiçoamento, e) não promoção se houver injustificada retenção autos além do prazo. Determinou no inciso VI – Aperfeiçoamento por cursos, no inciso XII – Atividade Jurisdicional Ininterrupta. (vedado férias coletivas, dias sem expediente: plantão permanente.), inciso XIII – número de juízes proporcional à demanda, o inciso XV – Distribuição Imediata de processos e em várias situações a possibilidade de justiça itinerante e funcionamento descentralizado, câmaras regionais, assim como o artigo 126 prevendo a organização Varas especializadas – exemplificativamente para conflitos fundiários.

É de se referir que nessa tentativa de Garantir o Acesso ao Poder Judiciário – um acesso amplo e qualificado – se instituíram, por igual, dois tipos de Súmulas a serem promulgadas pelos Tribunais Superiores, e de enorme controvérsia.

A Súmula Impeditiva, ainda não vigente, pendente, ao que se sabe de aprovação na Câmara. Dos Deputados. Em verdade, tal nem se constitui em novidade normativa, já que o artigo 896 da CLT no que tange ao Recurso de Revista, contempla essa situação.

A Emenda trouxe também a Súmula vinculante (artigo 103, A da Constituição Federal), que obriga ao julgador à sua aplicação, matéria essa relevante e que não será objeto desta manifestação, antecipando-se, contudo, que tem o significado de cerceamento de liberdade no julgamento do magistrado, engessamento da Jurisprudência, mas que encontra em seu favor alguns outros importantes argumentos.

As poucas Súmulas vinculantes editadas (menos do que seis)não tratam ainda de Matéria Trabalhista, mas há expectativa de que venham a ser editadas, por igual, na seara especializada.

A alteração de competência trazida com a Emenda Constitucional 45, sem que se pretenda adentrar no mérito da mesma, determinou a ampliação da competência transferindo à Justiça do Trabalho outras matérias, além das relações de emprego, pequenas empreitadas e trabalho dos avulsos. O espectro de “relações de trabalho” ora expressamente ao encargo da Especializada, é significativamente maior do que antes objeto dessa jurisdição.

Qual o efeito dessa mudança ?

Duas são as hipóteses de reflexos. A primeira refere à fortalecimento da Justiça do Trabalho em face da destinação de outras tantas ações ao seu encargo, pressupondo a capacidade de absorção dessa nova competência e a especialização capaz de bem resolver conflitos relacionados à matéria.

A segunda, em sentido oposto, pode ser vista como uma fragilização material desta Especializada. A uma porque se hoje já não têm efetiva prestação em face de demasiada demora no tempo, menor seria essa condição de atuação com milhares de outras ações para ela transferidas ou que nela serão iniciadas. A duas porque com a abertura do espectro de atuação, sustentam alguns, recalcitrantemente, que tal levaria à perda da Especialização e, portanto, desnecessidade de particularização jurisdicional. Uma possibilidade de nova versão de extinção da Justiça do Trabalho.

Nesse passo é importante ressaltar que a discussão é frágil, de vez que existindo a relação de direito material, a relação de trabalho, sempre haverá controvérsia, demanda e necessidade de solução por meio da jurisdição Estatal, para a busca da paz social.

Teoricamente se poderia referir que na Justiça do Trabalho ou mesmo na Justiça Comum a existência de lide obrigará o Estado a prestar assistência e interveniência, disponibilizando meios judiciais de solução dos conflitos.

Não parece, por igual, razoável que sequer se pense em mudança formal com evidente perda de qualidade de atuação do processo frente ao natural e compreensível despreparo da magistratura civil para lidar com as questões trabalhistas. E não se argumente com a competência residual destes nas localidades onde há Varas do Trabalho, uma vez que já em fase recursal retoma apreciação especializada pelo Tribunal Regional do Trabalho.

Passado breve biênio da alteração constitucional, é possível perceber que, apesar de alguns “solavancos”, a mudança vem sendo absorvida com adequação pela Justiça do Trabalho.

Por óbvio que têm enorme significado no dia a dia das Varas do Trabalho. Aos julgadores laborais agora se submetem outras tantas e distintas questões, antes fora de seu universo jurisdicional e que demandam requalificação e esforço superior, como toda a novidade. Nesse sentido os Tribunais do Trabalho, com as recentemente criadas Escolas Judicial, estão buscando esse resultado a fim de manter o padrão de suas decisões.

Pode ser percebida também alguma ansiedade, quer nos julgadores, quer nos operadores do Direito em geral, quer nos jurisdicionados, o que não pode surpreender em face da significativa alteração levada à cabo.

O que parece certo é que caminha para a estabilidade ou normalidade a prestação jurisdicional da Justiça do Trabalho, que demanda sim maior volume de investimentos estruturais, quer físicos quer humanos, mas que se planeja sobrevir.

Mas se ao início deste texto já se questionou a efetividade do Processo do Trabalho, sem essa nova carga material, o que se dirá com sua ocorrência ?

Realmente por observação lógica, essa situação se agrava, o que, no entanto, tem soluções e conduções possíveis de fazer com que o processo seja mais efetivo.

As referidas alterações da Emenda e antes citadas são capazes de preparar e tornar mais efetiva a prestação jurisdicional , que tende a ser mais qualifica e mais eficiente.

É de se lembrar também nesse sentido, que a introdução do processo sumário, a conciliação prévia são caminhos que seguem nesta positiva direção.

Além disso, o instrumento de execução da “penhora on line” , fruto do convênio do Banco Central com o Poder Judiciário tem se mostrado importantíssimo na efetivação das decisões da Justiça do Trabalho, e que migraram também para o processo civil. Não se pode reconhecer ainda que o mesmo já esteja devidamente em uso geral, pois ainda encontra resistências, justamente pelo fato de sua inegável firmeza contra o devedor.

Quanto mais praticado, mais eficientes serão as execuções. Não se esqueça que a ordem legal do CPC de busca de suporte à execução prevista pelo artigo 655 do CPC elege o dinheiro com prioritário, sendo a “penhora on line” apenas o caminho para a sua aplicação.

O certo também é que o processo do trabalho não pode estagnar, nem os operadores do direito conformarem-se com a demora na tramitação dos feitos, de vez que devem sempre buscar o aperfeiçoamento do mesmo para melhor atender ao jurisdicionado.

Por fim, se reconhece firme utilidade da constitucionalização de princípios processuais, notadamente da garantia de acesso ao poder judiciário, sem o qual torna-se formal e ocioso o direito material que a todos rege e orienta.

A discussão permanente das possibilidades de aprimoramento do processo trabalhista é o que garante a evolução do instituto , do instrumento processual e das relações de trabalho, fazendo com que cada vez mais possa dar necessárias respostas sociais na tutela das relações de trabalho.

 

Trabalho insalubre, perigoso e penoso – Fiscalização arts. 161/2 da CLT.

* Artigo publicado no livro Questões Controvertidas de Direito do Trabalho e Outros Estudos. Editora Livraria do Advogado, Porto Alegre, p. 33-44, 2006.

TRABALHO INSALUBRE PERIGOSO E PENOSO

 

Noções Introdutórias

O inaugurar da preocupação com o ambiente de trabalho data aproximadamente a segunda metade do século XVIII.

Como é sabido, com o advento da Revolução Industrial, modificaram-se substancialmente as condições de trabalho, por conta da urbanização, adoção do trabalho livre, assalariado e subordinado em massa, industrialização, utilização de máquinas na produção, sistematização dos processos produtivos, surgimento das fábricas, linhas de produção, introdução das “meias forças” (mulheres e crianças) no ambiente de trabalho.

A respeito das máquinas é de se lembrar a significativa mudança gerada especificamente por uma delas: a máquina a vapor. Criada em 1712 por Thomas New Comen, com importantes alterações em 1750 por James Watt, a qual serviu às outras máquinas anteriormente existentes. Até então movidas por força animal, humana e das águas, com o introdução da máquina a vapor houve a substituição da matriz energética. O vapor passou a movê-las tornando menos necessária a participação humana na sua movimentação, verdadeiramente substituindo essa mão-de-obra. Essa substituição, dada a desnecessidade do vigor físico masculino, deu-se pelo trabalho feminino e infantil.

Exemplo disso foi a utilização da máquina a vapor para o bombeamento das águas nas minas inglesas, ou mesmo nos grotescos teares da época. Não se deixe de referir também a utilização da mesma nos transportes ferroviários em largo desenvolvimento nos meios de transporte.

A vigorosa e crescente produção industrial e comercial acarretou, entretanto, sérios problemas para a população trabalhadora no que respeita ao ambiente de trabalho. Identificava-se a substituição cada vez mais intensa do trabalho escravo pelo subordinado assalariado em larga escala. A manufatura cede lugar à fábrica que ensejaria posteriormente o surgimento das próprias linhas de produção.

É que vigia à época o Estado Liberal, onde cada um deveria ser o tutor de seus interesses, e capaz de orientar sua vida de acordo com os mesmos. Assim é que interessava apenas a cada um os contratos que avençasse. O indivíduo detinha total liberdade para tanto. Ao Estado não era dado o direito de intervir em relações entre particulares, como as de trabalho.

Inexistia qualquer regulamentação acerca do trabalho, suas condições, seu ambiente. Era o que se pode chamar de liberalismo jurídico, no qual a liberdade de contratação era plena e sem limites.

Teoricamente razoável, mas na prática, lastimável. É que pelo volume de pessoas interessadas nos postos de trabalho, muitas fugidas do campo e dos feudos, havia um evidente desequilíbrio entre oferta e procura, o que naturalmente deixava os tomadores do trabalho em condições infinitamente superiores para imporem suas condições para o trabalho em suas máquinas e fábricas, essas verdadeiramente abusivas, quer quanto à salários, jornadas e ambiente de trabalho. A hipossuficiência dos trabalhadores era evidente.

Decorrência disso, é que o interesse capitalista era apenas nos resultados lucrativos, sem qualquer proteção àqueles que realizavam e davam condições de lucros, ou ao ambiente onde essas atividades eram desenvolvidas.

Tão nefasto foi o resultado sobre a classe trabalhadora, que resultou em período reconhecido pela doutrina como de piores condições de trabalho livre da história da humanidade e de maior miséria dos trabalhadores.

A conseqüência disto foi justamente, a seu tempo, o surgimento do direito do trabalho, por pressão dos interessados e agentes externos ao trabalho (escritores progressistas – Villermè, Von Brentano, Leon Burgeois –, solidaristas, humanitaristas, correntes e doutrinas socialistas – Escola Alemã Socialismo de Estado – e até posteriormente da Igreja – doutrina social da Igreja) que impôs ao estado a necessidade de intervenção nessa relação e atividade, o que o levou à edição de regras e imposição de limites às relações de trabalho. Era o Estado intervindo na atividade privada por questão de asseguramento de poder.

Especificamente quanto ao ambiente de trabalho, o mesmo era absolutamente impróprio, de vez que incapaz de assegurar a integridade física e psicológica, e, porque não dizer, moral do trabalhador.

Eram absolutamente desumanos, gerando malefícios enormes aos trabalhadores. Os locais de trabalho eram imundos e com condições de ampla proliferação de doenças. As doenças profissionais disseminavam-se pela ausência de qualquer norma de higiene ou segurança, submetendo a todos – lembrem-se das mulheres e crianças, essas de até 6 anos de idade – a situações inaceitáveis. Veja-se, também exemplifcativamente, as moléstias advindas da aspiração de pó de carvão, nas mesmas antes referidas minas inglesas.

Quando o trabalhador adoecia, cessava a contraprestação salarial e extinguia-se o contrato, pelo que novos trabalhadores, dentre os inúmeros interessados, eram então recrutados para a prestação.

Refira-se, ao final, que justamente a inadequação do meio ambiente do trabalho foi um dos importantes motivos havidos para a intervenção do Estado e surgimento do Direito do Trabalho.

a) Positivação Constitucional e Legal

A matéria que envolve a presente abordagem tem íntima ligação com o tema do Meio Ambiente do Trabalho. É que a lei determina e conceitua o que seja ambiente de trabalho insalubre ou perigoso, a partir de previsão constitucional.

Historicamente como já estudado, a preocupação e em seguida o regramento trabalhista nasceu a partir da Revolução Industrial. Nesta época os ambientes de trabalho não detinham condições razoáveis capazes de proteger a higidez física e mental dos trabalhadores. Ao contrário, inseguros e sem mínimas condições de higiene, causaram inúmeras moléstias ao então denominado proletário e oportunizaram a ocorrência volumosa de acidentes do trabalho.

Essa situação, dentre outras ocorrências, como dito, fez surgir o Direito do Trabalho, disciplina dedicada à tutela do trabalhador através de medidas impositivas aos empregadores e regramento geral da relação.

No tocante à saúde e integridade dos operários o ambiente de trabalho e as condições que o mesmo apresentava sempre foram alvo de preocupação, de modo a fazer do trabalho subordinado atividade saudável e sem reflexos danosos sobre aqueles que o executam.

Se de início, a proteção era mais dedicada aos acidentes do trabalho, vale lembrar que, em seguida, aos mesmos foram equiparadas as doenças profissionais.

Com o Tratado de Versailles em 1919, tratado internacional que buscou devolver a paz à Europa, foi criada a Organização Internacional do Trabalho (OIT) a qual, entre suas competências se encontrava a proteção ao acidente do trabalho e à doença profissional. A imprescindível atividade da OIT se desenvolvia, e se desenvolve até os dias de hoje, no sentido de internacionalmente normatizar a proteção ao trabalho e os locais onde o mesmo se realiza, de maneira geral, criando normas internacionais que sejam internamente aplicadas aos variados países membros.

Especificamente relativa ao tema, convém mencionar a Convenção nº155 de 1981, que abordou a segurança e saúde dos trabalhadores e meio ambiente do trabalho, determinando a definição de políticas nacionais coerentes em matéria de segurança e saúde dos trabalhadores e do meio ambiente do trabalho, bem como promovendo a sua execução. Outra Convenção da OIT que é de se referir é a de nº 161 de 1985 que tratou da instituição de serviços de saúde. Outras até anteriores houve no sentido da proteção a situações específicas, como, por exemplo, contra radiações, maquinaria, minas etc, mas essa foi a mais genérica e sistemática sobre o tema.

A regra geral é a adequação dos ambientes de trabalho, no sentido de que os mesmos não sejam maléficos à saúde daqueles que nele labutam, nem os exponha a condições de risco. Busca-se assim a eliminação, neutralização ou redução dos riscos e das doenças profissionais, por meio de medidas apropriadas, quer de caráter médico, quer de caráter de engenharia de segurança.

No entanto, há inúmeras ocorrências em que a situação ideal não é possível, pelo que se trata de impor medidas que tenham por objetivo indenizar ou compensar o trabalhador a tanto sujeito.

Em nosso país, é a Constituição Federal que em seu artigo 7º dá importante norte ao sistema jurídico ao dispor que é direito dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social, a “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança” (inciso XXII).

Não se trata de norma inédita em termos constitucionais, mas com redação distinta das genéricas proteções constitucionais antes existentes.

Traga-se à baila, por oportuna, a proibição do trabalho insalubre ao menor, nos moldes estatuídos pelo mesmo artigo 7º, inciso XXXIII:

XXXIII – proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos;

É o comando constitucional a orientar a formação do sistema jurídico infraconstitucional para a finalidade posta, elegendo inclusive o instrumento, qual seja, a formulação de normas correspondentes, dando as diretrizes para atendimento pela lei.

O inciso XXIII do artigo 7º, por sua vez, determina o pagamento de adicionais de remuneração para as atividades desenvolvidas em condições impróprias na forma da lei.

De pronto é de se esclarecer que no tocante à penosidade de atividade e conseqüente adicional de remuneração, inexistiu e inexiste previsão em nossa legislação infraconstitucional.

Talvez se possa imaginar, como estímulo ao legislador, o alinhamento de condição penosa ao lado de condição insalubre ou perigosa. Talvez se possa imaginar pretender proteger algumas atividades que se possam apresentar como capazes de causar extrema fadiga ao trabalhador, como atividade em minas e subsolo, em usina ou forjarias, ou ainda a céu aberto em regiões tropicais, mas a realidade é que não se tem parâmetro anterior ou atual para tanto.

Trata-se sim de norma não auto-aplicável, também dita programática e que depende de desdobramento legislativo capaz de dar-lhe vida, sem o que não tem qualquer exigibilidade, constituindo-se em norma vazia. Até o presente momento inexistiu qualquer movimento legislativo no sentido de identificar tais situações ou mesmo de instituir o referido adicional.

O capítulo celetista V, que foi introduzido pela Lei nº 6.514 de 1977 se coaduna com essa realidade e é intitulado Segurança e Medicina do Trabalho, estando a reger sobre o ponto, os seus artigos 189 a 195.

A CLT atribui ao Ministério do Trabalho a criação de normas particulares e específicas para a aplicação das regras gerais nela constantes, atribuindo ainda a supervisão e fiscalização de todas as atividades relacionadas com medicina e segurança do trabalho, com delegação autorizada para interdição, autuação e notificação.

b) eliminação das condições impróprias e pagamento de adicionais

Sempre que o trabalhador estiver exposto a agentes nocivos à sua saúde, estará caracterizada a condição insalubre. Essa condição vem especificada pela Portaria nº 3.214/78, que detalha em sua NR 15 os agentes químicos, físicos ou biológicos e com relação ao trabalho rural a NR 5 da Portaria nº 3.067/88 apontando agentes e condições de insalubridade.

Nelas estão previstas as condições capazes de considerar determinada atividade insalubre ou não de vez que estabelece limites de tolerância, abaixo dos quais se considera adequada a atividade, incapaz de gerar qualquer obrigação acessória ao empregador ou mesmo penalização administrativa. Nessa seara, deixe-se claro que a eventual sujeição do trabalhador a agentes insalubres não é capaz de determinar obrigação de pagamento de adicional, não sendo como tal considerada essa exposição.

É, pois da autoridade administrativa o poder da definição do Quadro de Atividades e Operações Insalubres levando em consideração os limites de tolerância aos agentes agressivos, os meios de proteção e o tempo máximo de exposição a esses agentes, quando não se tratar de agente insalubre quantitativo. Assim, se qualquer agente nocivo nele não estiver previsto, não se fale em insalubridade.

Nesse sentido as duas Súmulas de Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, bem evidenciam o sustentado:

Enunciado da Súmula 194 do STF:

É COMPETENTE O MINISTRO DO TRABALHO PARA A ESPECIFICAÇÃO DAS ATIVIDADES INSALUBRES.”

Enunciado da Súmula 460 do STF:

PARA EFEITO DO ADICIONAL DE INSALUBRIDADE, A PERICIA JUDICIAL, EM RECLAMAÇÃO TRABALHISTA, NÃO DISPENSA O ENQUADRAMENTO DA ATIVIDADE ENTRE AS INSALUBRES, QUE E ATO DA COMPETENCIA DO MINISTRO DO TRABALHO E PREVIDENCIA SOCIAL.”

Também a corroborar, está a Orientação Jurisprudencial nº 4 da Seção de Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (OJ-4 – SDI TST):

Adicional de insalubridade. Necessidade de classificação da atividade insalubre na relação oficial elaborada pelo Ministério do Trabalho, não bastando a constatação por laudo pericial. CLT, art. 190. Aplicável.”

Nesse sentido é de se registrar que inexistem condições de deficiência de iluminamento que sejam capazes de gerar condições de insalubridade, uma vez que o Anexo 4 da referida Portaria deixou de assim considerar, por conta da sua revogação havida pela Portaria nº 3.751/90 do MTE.

A eliminação ou neutralização da insalubridade é expressamente prevista pelo artigo 191 da CLT quando a empresa controla os agentes dentro dos limites legais de tolerância e quando faz utilizar Equipamentos de Proteção Individual que sejam capazes de diminuir a intensidade do agente agressivo aos limites de tolerância.

O EPI, assim considerado é aquele equipamento capaz de neutralizar ou eliminar a insalubridade (não a causa, mas os efeitos insalubres), afastando a obrigação ao pagamento do adicional.

À questão não se tragam as noções de direito adquirido, porque aqui não servem. Se o Ministério do Trabalho deixa de considerar determinada atividade ou agente insalubre não é mais devido anterior adicional de insalubridade. É soberana a caracterização pela autoridade administrativa.

É justamente o que acima se referiu relativamente às condições previstas no revogado Anexo 4 da Portaria nº 3.214/78.

Tão tranqüila é esta posição que traduzida em Enunciado de Súmula do TST, sob nº 248:

Adicional de insalubridade. Direito adquirido.

A reclassificação ou a descaracterização da insalubridade, por ato da autoridade competente, repercute na satisfação do respectivo adicional, sem ofensa a direito adquirido ou ao princípio da irredutibilidade salarial.

(Res. 17/1985, DJ 13.01.1986)”

Outra fundamental abordagem acerca da eliminação do pagamento de adicional de insalubridade é que mesmo ainda estando previstas tais condições pela autoridade administrativa, se o empregador regularizar o ambiente de trabalho, deixando, por conseguinte o trabalhador não mais sujeito às indevidas condições, poderá ser retirado o pagamento do adicional.

É matéria pacifica nos tribunais o fato de que somente é devido o adicional na ocorrência de condições insalubres e enquanto a estas estiver sujeito o trabalhador. Assim é que deixando de ocorrer a sujeição do trabalhador às anteriores condições de trabalho insalubre, deixa “ipso jure” de receber o adicional, o qual só é devido na vigência da exposição à nefasta condição.

Essa possibilidade de retirada do pagamento é decorrência da finalidade maior de proteção à saúde do trabalhador, servindo também como um estímulo para que o empregador saneie o ambiente de trabalho e suspenda os pagamentos até então realizados.

Dessa forma não há que se falar em manutenção dos pagamentos em ambientes salubre os quais não se incorporam ao patrimônio salarial do empregado. Isto vale por igual a periculosidade e decorre da dicção expressa do art. 194 da CLT.

O art. 192 da CLT estabelece os três patamares de pagamentos dos adicionais de insalubridade, fixados em 40%, 20%, e 10% do salário mínimo da região segundo se classifiquem os graus máximos, médio e mínimo.

A natureza jurídica desses pagamentos de adicional não é pacífica. Há quem fale em taxa remuneratória compensatória, a quem refira a salário condicionado. Sendo, no entanto, um consenso a índole salarial dos mesmos, integrando o salário dos empregados para todos os fins. Os cálculos das parcelas salariais de horas extras férias, 13º salário etc. devem ser compostos pela verba da insalubridade.

Não é demais lembrar a proibição do sistema nacional de salário complessivo, assim tido por aquele que soma o total de vários direitos. O pagamento do adicional de insalubridade deve necessariamente ser destacado, específico, aludindo de maneira expressa ao direito pago, sob pena de sua desconsideração de sua realização.

O art. 193 da CLT considera como perigosa a atividades ou operações também na forma de regulamentação aprovada pelo Ministério do Trabalho aquelas que por sua natureza ou métodos de trabalho, impliquem em contato permanente com inflamáveis ou explosivos em condições de risco acentuado. Não é assim qualquer exposição que gera direito ao adicional correspondente, mas sim àquela acima adjetivada. A NR 16 regulamenta o tema. Tais requisitos, no entanto, registre-se, nem sempre tem sido observados pelo nossos Tribunais, que em atropelo às normas vigentes concedem o adicional sem a devida a avaliação de contato permanente em condições de risco acentuado.

Em havendo tais circunstancias determina o pagamento do adicional de 30% sobre o salário, sem os acréscimos resultantes de gratificações, prêmios, ou participação nos lucros da empresa.

A lei veda o percebimento dos adicionais de insalubridade e periculosidade concomitantemente, relativamente ao mesmo período de trabalho, devendo o trabalhador optar por aquele que lhe seja mais favorável.

Diferentemente da insalubridade, a periculosidade protege o trabalhador do risco contra a eventualidade de uma ocorrência danosa, podendo assim estar sujeito ao risco durante toda sua vida laboral, sem que, felizmente, haja qualquer ocorrência danosa. Já insalubridade de regra gera o malefício de forma lenta e gradual. Imagine-se a ação e efeitos de explosivos ou inflamáveis que pode acontecer de inopino.

Agregando à norma celetista, a Lei nº 7.369/85 passou a incluir igual direito a empregado que exerce atividade no setor de energia elétrica em condições de periculosidade idêntico adicional. Essa lei especial tem gerado polêmica na medida em que não é clara quanto aos destinatários. Compreendemos ser destinadas apenas aos empregados de empresas geradoras e distribuidoras de eletricidade, aos chamados eletricitários, e não a qualquer comum trabalhador que simplesmente lide com eletricidade .

Além disso, a Portaria GM/MTE nº 518/03 (publicada em 7/04/03 D.O.U.) determina a inclusão na NR 16 do Quadro de Atividades e Operações Perigosas, aprovado pela Comissão de Energia Nuclear, assegurando aos que exercem tais atividades o recebimento do adicional de periculosidade.

c) base de cálculo dos adicionais

Iniciando pelo adicional de periculosidade, o §1º do art. 193 determina a necessidade de seu pagamento sobre o salário recebido pelo empregado, excluindo gratificações, prêmios e participação nos lucros. O Enunciado 203 do TST determina a integração da gratificação sobre este pagamento, sem que se possa identificar um conflito com o Enunciado 191 igualmente do TST.

A grande discussão que se estabelece decorre da redação dada ao art. 7º, XXIII, da Constituição Federal, que fala em “adicional de remuneração” para as atividades insalubres.

Quanto à base de incidência do adicional de insalubridade, a carta de 1988, de forma alguma, disciplinou a matéria como está a entender parte minoritária da jurisprudência. Ao elevar o assunto à categoria de norma constitucional, o legislador constituinte assegurou ao trabalhador adicional “de” remuneração para trabalho em condições insalubres e não adicional de insalubridade a ser calculado “com base” na remuneração do obreiro. Destarte, em plena vigência está a regra do art. 192 da CLT.

A possibilidade de que o adicional em discussão fosse calculado sobre a remuneração, outra sorte não tem. Tal encontraria amparo no artigo 7º inciso XXIII, que trata de adicional de insalubridade como adicional “de” remuneração e não adicional “sobre” remuneração , distinção gramatical inconfundível.

Tratam-se de preposições com significados absolutamente diversos. Tivesse o legislador constitucional a vontade de alterar a base de incidência do adicional em questão, teria utilizado a preposição “sobre” e não a preposição “de”, expressa na norma constitucional.

Além disso, a norma do artigo é expressa no sentido de determinar o necessário caminho legislativo a seguir, para dar vazão ao comando constitucional. Trata-se evidentemente de norma programática, dependente de edição legislativa infraconstitucional, sem o que não tem pronta aplicação. Não tendo sido, até a presente data, editada a referida lei, não sofre o pagamento do adicional de insalubridade ou de periculosidade qualquer alteração na base de incidência legal devida, qual seja, o salário mínimo e respectivamente o salário.

Aliás, outro não tem sido o enfrentamento judicial, como estão a demonstrar os arestos abaixo, in Calheiros Bomfim, Dicionário de Decisões Trabalhistas, 25ª ed, , Edições Trabalhistas, Rio de Janeiro , 1995, , pg 31, 167 e pg 34, 186, respectivamente:

“A base de cálculo de incidência do adicional de insalubridade, mesmo após a Constituição de 1988, continua sendo o salário mínimo contido no artigo 76 da CLT. Revista parcialmente conhecida e desprovida. Ac. (Unânime) TST 5a T (RR 114161/94), el. Min. Armando de Brito, DJU 25/11/94, p 32493”.

“ O art.7º, inciso XXIII, da Constituição, ao referir-se a adicional de remuneração, e não a adicional sobre remuneração, não revogou o art. 192 da CLT na parte em que estabeleceu o salário mínimo como base para o cálculo do adicional de insalubridade. Ac. TRT 3ª Reg. 4ª T (RO 05875/93), Rel. Juiz F.Guimarães, DJ/MG 15/01/94, Jornal Trabalhista, ano XI, nº 504, p.420” –

A dicção do Enunciado 228 do TST vinha esclarecendo a questão, cuja redação era a seguinte:

ADICIONAL DE INSALUBRIDADE – BASE DE CÁLCUL0

O percentual do adicional de insalubridade incide sobre o salário mínimo de que cogita o art. 76 da Consolidação das Leis do Trabalho (Res. N 14/85, 12.9.85, DJ 19.9.85)

Aqueles que sustentavam a alteração base de calculo em razão da novel norma constitucional o faziam sustentando a impossibilidade da base de incidência sobre o salário mínimo na proibição existente no art. 4, IV da mesma Carta Magna, o qual, ao tratar no salário mínimo vedava “sua vinculação pra qualquer fim”. Essa proibição, no entanto sempre foi lida pelos tribunais trabalhistas como incapaz de atingir ao adicional de insalubridade e sua incidência sobre o salário mínimo, assim como preserva por igual o pagamento de benefícios previdenciários com a mesma base de incidência.

A acrescentar controvérsia ao tema é de referir recente decisão turmária do Supremo Tribunal Federal que julgou pela inconstitucionalidade da utilização do salário mínimo como base de incidência do pagamento do adicional de insalubridade. A questão é tormentosa e está ainda por ser conclusiva. Não se crê, no entanto, quer por desaconselhável por política judiciária, quer por acerto técnico do Enunciado nº 228 do TST, seja reaberta a discussão da matéria sumulada, ensenjando indesejável “tsunami” de ações trabalhistas na Especializada.

Registre-se finalmente que todas estas situações podem naturalmente ser submetidas ao crivo do Poder Judiciário, na medida em que o art. 5º, XXXV, assegura a possibilidade de apreciação por este Poder de ameaça ou lesão a direito. A disposição pode ser lida como capaz de atacar conclusões da autoridade administrativa ou ainda a reclamação do empregado contra o empregador.

No caso de ajuizamento de ação reclamatória trabalhista, o empregado que reclama tal direito, via de regra, tem extinto o seu contrato por, na compreensão dos empregadores, a situação de litigante não ser compatível com a confiança do contrato de trabalho. Assim, para a proteção dos empregados é dado também aos sindicatos representativos a categoria dos mesmos, o direito de ajuizar como substituto processual a postulação relativa aos adicionais de insalubridade e periculosidade.

 FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO

a) atribuições e poderes do agente fiscal

A CLT nos arts. 160 e 161 estatui acerca da inspeção prévia e embargo aos locais de trabalho. Impõe a necessidade de inspeção prévia pela Delegacia Regional do Trabalho, bem como de aprovação das instalações laborais.

Idêntica obrigação, gerando nova inspeção, quando houver modificações substanciais nas instalações ou equipamentos da empresa, devendo a mesma comunicar tal fato à autoridade administrativa.

Ante a dificuldade do órgão administrativo de realizar rapidamente tal fiscalização anterior ao início das atividades, faculta ainda a sujeição prévia dos projetos de construção e instalação buscando prévia aprovação dos mesmos.

Outro poder importantíssimo atribuído ao Delegado Regional do Trabalho, é o de interdição de estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento, bem como embargo de obra, sempre que, a partir de laudo técnico, concluir pela existência de grave e iminente risco aos trabalhadores. Nestas ocorrências deverá indicar as providências para prevenção de infortúnios.

b) livre acesso

Por óbvio tem a autoridade administrativa o direito de livre acesso aos ambientes de trabalho, a fim de fiscalizar e cumprir a legislação vigente.

Para o cumprimento de sua obrigações legais, dentre elas as antes referidas, pode a autoridade administrativa solicitar o auxilio de autoridades federais, estaduais e municipais.

c) exibição de documentos

De nada adiantaria o livre acesso se a autoridade administrativa não tivesse o poder de determinar também a exibição de documentos.

É parte da atividade administrativa fiscalizatória a conferência e exame de documentos cuja existência é determinada em lei e imposta a guarda ao empregador.

Do exame da documentação é que se extrairá a certeza do cumprimento das obrigações do empregador e a devida proteção aos empregados.

d) informação, esclarecimentos, autuações, multas e recursos

À autoridade administrativa é dado igualmente o direito de solicitar as informações que julgar cabíveis acerca do objeto de sua fiscalização, bem como, os esclarecimentos pertinentes.

Tal se constitui em importante passo preliminar prévio à tomada de qualquer das medidas mais rigorosas, também à sua disposição. É que a partir destas pode a autoridade administrativa se convencer da correção do procedimento do empregador, dispensando qualquer atitude posterior.

É também competência da fiscalização a autuação das incorreções identificadas, bem como, a possibilidade de aplicação de multa.

A fiscalização, reconhecidamente deficientemente, pode ser aleatória ou decorrente de denúncia de qualquer interessado, notadamente das entidades sindicais.

À este poder importante do Delegado Regional do Trabalho, especificamente de interdição ou embargo, genericamente referido, cabe a interposição de recurso no prazo de dez dias para o órgão nacional superior, podendo ainda ser pretendido e deferido efeito suspensivo.

Não se olvide jamais que todas essas considerações administrativas não estão imunes às providências judiciais devidas e capazes de sustentar entendimentos diversos.

O desatentendimento às suas mais severas providências de embargo ou interdição por aquele que ordenar ou permitir funcionamento/uso constitui-se em crime de desobediência. Curiosa referência traz, no entanto, a caracterização do crime, que somente se dá “se resultar danos à terceiros”.

Independentemente de interposição de recurso há a possibilidade do próprio Delegado levantar o embargo ou interdição à luz novo de laudo técnico do serviço competente, que dê conta da adequação às normas legais.

Estas possibilidades recursais, bem como, pedidos de reconsideração à própria autoridade autuante são sempre oportunos, desde que se elenquem fundamentos razoáveis e oportunos em contrário à providência administrativa e capazes de motivar a sua reavaliação.

Por fim, é de se registrar que estas eventuais paralisações no desenvolvimento da atividade, com conseqüente paralisação da atividade dos empregados, não lhes acarreta prejuízo salarial, na medida em que permanecem a disposição do empregador, não podendo ser aos mesmos ser atribuída da paralisação do trabalho.

 Bibliografia 

  •  CAMINO, Carmen. Direito Individual do trabalho. 2ª ed. Porto Alegre: Síntese, 1999. 360p.

     

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  • NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao direito do trabalho. 28ª ed. São Paulo: LTR, 2002. 702p.

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  • SÜSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999. 455p.

Princípio da Inafastabilidade do Controle Jurisdicional, outros, e Constituição Federal

 

* Artigo publicado na Revista de Derecho Procesal (Madrid), v. 22, p. 389-398,2006.

* In: Araken de Assis; Luiz Gustavo Andrade Madeira. (Org.). As Reformas e Questões Atuais do Direito Processual Civil. 1ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008, v.1, p. 57-66.

PRINCÍPIO DA INAFASTABILIDADE DO CONTROLE JURISDICIONAL, OUTROS E CONSTITUIÇÃO FEDERAL

André Jobim de Azevedo: Advogado sócio de Faraco de Azevedo Advogados, bacharel pela UFRGS, Professor da PUCRS nas disciplinas de Direito Processual Civil e Direito do Trabalho desde 1990, Especialista em Direito Processual Civil e Mestre em Direito pela PUCRS. Professor dos Cursos de Pós Graduação da PUCRS, PUCPR.

Guilherme Luiz Thofehrn Osório: Advogado associado de Faraco de Azevedo Advogados, bacharel pela PUCRS, Especialista em Direito Internacional Público e Privado pela UFRGS.

INTRODUÇÃO

Originariamente em tempos de auto composição dos conflitos entre os homens pela Lei de Talião, a aplicação do “olho por olho, dente por dente” era a solução. A supremacia do império da força, no entanto, foi incapaz de manter a paz social.

A Intervenção do Estado – substitutiva ao particular na solução conflitos – avançou na tentativa de melhor responder às necessidades de relacionamento e proteção dos cidadãos.

Proibida a reação privada imediata como regra, a jurisdição se apresentou como melhor forma de definir o direito (“juris et dictio”).

Monopólio do Estado na solução dos conflitos, essa evolui para além da simples atribuição do Direito a quem o tenha, para alcançar coercitividade de execução.

A jurisdição se afirma como necessidade de fazer valer na prática o regramento prévio e teórico instituído pelo direito em determinado sistema jurídico. É a aplicação “in concreto” das normas jurídicas. Dizer e fazer – julgar e realizar as controvérsias. Atuar no sentido do conhecimento das demandas e execução das decisões e julgamentos.

O caminho socialmente evoluído, civilizado e aceitável é o processo, já que por vias próprias não mais é possível a implementação de soluções.

O processo judicial tem missão nobre e assim deve ser adequadamente disposto e regrado como forma de proteção à cidadania, afastando a barbárie da convivência social.

Pois este instrumento de realização do direito material é a via própria para manter a convivência social harmonizada.

Não parece, no entanto que o mesmo tenha se perfectibilizado por completo à vista da ausência de efetividade escancarada e que não se limita ao ambiente pátrio.

É célebre a notável afirmação do processualistaitaliano Chiovenda de que o processo deve dar a quem tem um direito tudo aquilo e precisamente aquilo que ela tem o direito de obter.

Assim, deve ser direito de todos, a utilização do processo (instrumento da jurisdição) na busca, no dizer de Carnelutti, “da justa composição da lide”. A solução da controvérsia, na melhor condição possível.

O Direito Processual como ciência autônoma se fortalece e ao mesmo tempo necessita de proteção. Ação do Estado para que cumpra seu mister relativamente à todo aquele que dele necessitar e garanta essa possibilidade como um direito amplo que a todos beneficie.

Hoje cercado de complexos estudos científicos o Direito Processual Civil é servido por normatização positivada de toda a ordem, bem como de firme principiologia que o instrui e fundamenta.

Constituição Federal

Nesse sentido e finalizando estabilizar e bem orientar a solução das controvérsias a codificação é caminho importante, mas nem sempre estável o suficiente.

As regras atinentes à judicialização das quizílias são capazes de colocar em pé de igualdade aqueles que se apresentam para busca de definição.

Importante caminho o da legislação ordinária, o qual, entretanto por si só é incapaz de realizar tão majestosos objetivos, especialmente em sistemas e regimes jurídicos e políticos menos estáveis.

Nesse sentido a existência e aplicação de princípios, retaguarda a correta condução do processo e de alguma maneira dá ao sistema maior confiabilidade.

Ocorre que o procedimento de produção legislativa pela via ordinária é notoriamente instável, no sentido de que basta edição de outra norma ordinária, para que a matéria tenha seu rumo alterado, gerando insegurança, quer quanto ao próprio direito processual, quer quanto à proteção da qual se incumbe o Estado e à qual se obriga.

Por conta dessa inegável realidade, o sistema brasileiro acabou estendendo ao processo civil uma estratégica utilizada em outros ramos do direito, a constitucionalização.

Em nosso sentir não significando apenas, e quem sabe, um desvirtuamento da finalidade e formato constitucional, mas acima de tudo uma saída, um clamoremaltavoz à uma condição mais segura. Um apelo à uma sedimentação e estabilidade maior que é própria das Constituições Federais.

Em um país como o Brasil, onde por mais de 20 anos suportaram-se regime autoritários e ditatoriais, alguma compreensão deve ter-se dessa, por nós chamada, atecnia constitucional. A hesitação e mutação legislativa, ao sabor dos interesses, causou trauma, ensejando, na primeira oportunidade de redemocratização do país e formulação de Carta Constitucional, a construção quase ordinária desse diploma orientador maior que é a Constituição Federal.

E aqui se concentra a crítica ao excessivo detalhismo e particularização da Carta que a torna inaceitavelmente distante daqueles aos quais se destina, os cidadãos da nação. Uma carta constitucional que ainda adolescente (1988) já conta surpreendentemente com mais de 50 emendas. Compare-se a estruturação e organização trazida pelas centenárias Constituições Francesa e Norte Americana que com um rol restrito de orientações estruturais e definições políticas foram capazes de atravessar os anos e continuam a ser instrumento de orientação dos povos aos quais se destina. Em especial, a duocentenária norte-americana, contando ainda hoje com pouco mais de 20 emendas. São regências de conhecimento e convicção da população, diferentemente do que se passa em terra nacional, onde, nem mesmo sequer os profissionais do direito têm a devida intimidade com a mesma, o que se dirá da pobre e inculta população deste país, para dizer o menos.

No Brasil, desde a Constituição Federal de 1946 se pretende garantir o acesso amplo da cidadania ao Poder Judiciário. A vigente Carta Constitucional de 1988 é pródiga em detalhes em geral em seus 250 artigos e mais 83 artigos de atos de disposições constitucionais transitórias, o que a faz rapidamente desatualizada e enseja formulação de emendas…

Assim é de alguma ocorrência a existência de tensão constitucional entre normas que protegem interesses diversos e que podem ser postas em situação de antagonismo. Importante remédio é a compatibilização, para convivência simultânea dos princípios fundamentais envolvidos. O sistema jurídico deve ser compreendido como um todo aberto permeável, lacunoso, e antinômico (com contradições). É com o Princípio da Proporcionalidade que se dá o adequado manejo à estas ocorrências.

Especificamente no caso do processo, já se fala em “processo civil constitucional”, ante a evidente inclusão no Diploma Maior de normas dessa natureza, especialmente quanto aos princípios processuais, nela incluídos.

O acesso ao Poder Judiciário é GARANTIA CONSTITUCIONAL PÉTREA, conforme artigo 5º, XXXV da Carta Magna, sendo que as normas destas disposições não podem ser alteradas por emenda constitucional, senão por constituinte exclusiva com finalidade de formulação constitucional. Essa a previsão constitucional do artigo 60, parágrafo 4º, inciso IV.

Assim está constitucionalmente positivado que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito“.

PRINCÍPIOS

Norteadores da compreensão do fenômeno jurídico como instrumento de referência de um problema jurídico qualquer, os princípios são fundamentais para higidez do sistema. Não princípios físicos, inafastáveis a que os fenômenos da natureza se submetem inexoravelmente, como por exemplo a gravitação.

Como proposições básicas, fundamentais que embasam, servem de assento à estrutura de determinada ciência. Preparam a organização e desenvolvimento da mesma. Ponto de partida para o desenvolvimento de qualquer sistema de conhecimento e que a este conferem validade, tidos por verdades fundamentais.

Também no Processo Civil, onde são considerados como verdades ou juízos fundamentais. São pilares jurídicos de maior grandeza, “holofotes”, os quais iluminam com grande intensidade qualquer entendimento amparado na legislação positivada.

São norteadores para a edificação das normas jurídicas e para a aplicação do direito processual “in concreto”.

Alguns constitucionalizados, constituindo-se em normas jurídicas qualificadas, da mais alta hierarquia normativa.

Garantem a hegemonia e a unidade do sistema jurídico, determinando que as normas de hierarquia inferior guardem respeito e observância aos mesmos, em termos hierárquicos.

Orientam a criação do direito infraconstitucional, com sua previsão “in abstrato”, e que deve ser erigido em consonância com os mesmos.

Princípios Processuais não tem sentido absolutamente autônomos e limites rígidos. Se interpenetram em zona “gris” de relação entre os mesmos, e até eventualmente se confundem.

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS E PROCESSUAIS–

Não se poderia tratar dos princípios processuais sem algumas breves observações sobre aqueles GERAIS e FUNDAMENTAIS.

O artigo 5º da Constituição Federal brasileira, incluído no Título II – Dos Direitos e Garantias Fundamentais, e no capítulo I – Dos Deveres e Garantias Individuais e Coletivos – contém as consagradas Cláusula Pétreas (artigo 60, § 4º, inciso 4º da Constituição Federal), NÃO passíveis de alteração ou supressão, nem por emenda constitucional (tal como a Forma Federativa do Estado, o Voto Direto Secreto, Universal e Periódico, a Separação dos Poderes). Constitui-se em núcleo intangível da Constituição Federal.

Este artigo 5º da Constituição Federal, em seu caput assegura à todos os cidadãos igualdade de tratamento, inclusive, conseqüentemente, às partes no processo, o que vem reiterado no artigo 125, inciso I Código de Processo Civil.

O verdadeiro princípio da igualdade é o da igualdade substancial: a lei dá tratamento igual às partes iguais e desigual às partes desiguais, como única forma de atingir verdadeira igualdade, o que deve ser feito fundamentadamente.

Como exemplo de adequada vazão do mesmo, a previsão legal de prazo de defesa em dobro para a Defensoria Pública e prerrogativa de intimação pessoal (artigo 5º, §5º Lei 1060/50, 44 inciso I, 89 inciso I, 128 inciso I, Lei Complementar 80/94), como necessária proteção à defensoria pública alcançada a todo o cidadão, comparativamente aos Escritórios de advocacia, em face das distintas condições de infra estrutura, volume de atendimentos, etc, pelo que justificável a previsão legal da exceção. Verdadeira aplicação do princípio da igualdade.

Esse princípio deve ser examinado conjunta e harmonicamente com o Princípio da Legalidade, do inciso II, do mesmo artigo constitucional 5º, que reza que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude da lei”.

Legalidade esta de há muito consagrada pela Declaração Universal dos Direitos do Homem 1948, artigo XXIX , bem como no asseverar de que a “Liberdade é o direito de fazer tudo aquilo que as leis permitem” na indispensável clássica obra de Montesquieu, “De l’esprit des lois”, Livro XI capítulo III.

À lei é, pois, possível determinar proteções diversas buscando a real efetivação do princípio da igualdade, com regências particulares assim dirigidas. Pode e ampara proteção à mulher (100, I Código de Processo Civil instituindo foro privilegiado na ação de alimentos), ao consumidor (artigo 5º XXXII, Constituição Federal), praticando tratamento diverso devidamente FUNDADO, como compensação à certas desigualdades.

Desses princípios mais que fundamentais, que poderiam ser chamados de supra princípios, decorrem o Princípio do Devido Processo Legal, da Ampla Defesa, do Contraditório, os quais estão diretamente ligados ao processo.

Assim é que aos princípios fundamentais se coloca como pressuposto garantir o acesso ao Poder Judiciário, ao processo como meio de solução de controvérsia.

Lembre-se que não basta assegurar acesso, senão acesso eficiente. É condição inafastável da sociedade democrática o controle jurisdicional do acesso ao Poder Judiciário, da sua indeclinabilidade na solução das controvérsias, o que envolve a questão da efetividade. Esta não se constitui em problema nacional, mas mundial, no sentido de que vários países desenvolvidos do mundo o enfrentam, sendo certo que a demora da conclusão do processo a todos atormenta.

Vários são os princípios processuais informados pelo princípio do Acesso ao Poder Judiciário, ligados com a ação e a defesa, como o princípio Da Demanda, Da autonomia da Ação, Dispositivo, Ampla Defesa, Defesa Global, Contraditório, Eventualidade.

A Garantia de Acesso ao Poder Judiciário constitui-se em garantia prévia ao processo, supra constitucional, que informa outros tantos ligados aos direitos das partes no processo.

Já a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, ONU 1948, artigo 10º, a Convenção de Roma de 1950- Convenção Européia para Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais artigo 6º, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos de 1966, artigo 14,1 e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos da Costa Rica, 1969, artigo 8º,1, assim asseveraram.

Em sede de Código de Processo Civil, nem mesmo na hipótese de lacuna ou obscuridade da lei afasta a jurisdição (artigo 126), sendo nestas circunstâncias permitido ao julgador recorrer à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.

Lembrado na doutrina nacional, Mauro Capelletti se posicionou sobre o movimento de acesso à Justiça nos Estados contemporâneos, tendo constatado 3 ondas : 1)pobreza como obstáculo de acesso ao Judiciário e a Representação legal do pobre; 2) proteção aos interesses difusos, fenômenos da sociedade de massa; coletivização do Direito; 3) risco de burocratização do Judiciário.

Também referido como Direito à ação, direito de ação e direito de petição, com sutis diferenças de enfoques que aqui não merecem relevo, tem-se-o como o Direito de dirigir-se a juiz ou tribunal competente para que lhe aprecie lesão ou ameaça de direito. Direito de peticionar aos órgãos do Poder Judiciário.

No caso pátrio, após a Constituição Federal de 1988, restou esclarecida a desnecessidade de prévio esgotamento das vias administrativas, antes da busca do Poder Judiciário, afastada a “instância administrativa de curso forçado” e a “jurisdição condicionada”.

É o Direito de todo o homem de ser ouvido por Tribunal independente e imparcial, previamente instituído por lei. À este submeter todo e qualquer direito subjetivo, individual, coletivo, transindividual, difuso e individual homogêneo.

E a tanto não basta formalmente garantir acesso aos Tribunais, mas sim adequada tutela jurisdicional, efetiva e tempestiva, em prazo razoável, sem dilações indevidas, proporcional à complexidade da discussão. Nesse sentido deve por igual se observar e para tal contribuir, o comportamento de juízes e procuradores das partes, assim como todos aqueles que no processo intervém.

Muito se fala, e acertadamente, na crise do processo, questionando a sua não utilidade, morosidade, o que se constitui verdadeiramente em Justiça inacessível.

É o devido Direito AO processo e NO processo (Regularidade processual). A busca da prestação de jurisdição em breve espaço de tempo, o tempo justo para a consecução do escopo.

Não se pode, nesta ótica, deixar de observar a significância da diferença de capacidade econômica das partes, como definidores de capacidade de resistência e espera na demora na solução final da contenda.

Assim é que, parte disso tudo é garantir o acesso ao Poder Judiciário e ao processo aos jurisdicionados que não disponham de condições, o que se pode viabilizar pelo princípio da Assistência Judiciária Gratuita. Trata-se também de cláusula pétrea, prevista pelo artigo 5º, inciso LXXIV da Constituição Federal e que se rege basicamente pela Lei 1060/50. Além desse, o artigo constitucional 134 (que institui a Defensoria Pública).

 

Na seara do acesso à Justiça, no Brasil muito se resistiu à utilização da via da arbitragem como meio de solução de controvérsia, o que se sustentava infringente à norma constitucional. Recentemente a arbitragem se positiva e têm previsão na Lei 9307/96.

 

A despeito da formalização legal, demorou até que o Supremo Tribunal Federal definisse e decidisse pela constitucionalidade, no sentido de que a manifestação de vontade da parte na cláusula compromissória no momento da celebração do contrato e a permissão dada ao juiz para que substitua a vontade da parte recalcitrante em firmar o termo de compromisso não ofende ao artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal. Forçoso reconhecer, no entanto, que essa interessante e necessária via da arbitragem ainda se reveste de resistência cultural que sabe-se lá quando será vencida…

 

Kazuo Watanabe, ilustre processualista brasileiro é preciso ao se manifestar sobre o tema asseverando que “o direto de acesso à Justiça é, fundamentalmente, direito de acesso à ordem jurídica justa. A problemática do acesso à Justiça não pode ser estudada nos acanhados limites de acesso à Justiça enquanto instituição estatal, e sim, viabilizar o acesso à ordem jurídica justa”

Recentemente mais uma emenda constitucional foi editada, a de número 45, com fim expresso de reformar o Poder Judiciário, mas que veladamente buscava instituir controle externo ao Judiciário. Declarou-se a agilização e efetividade do processo como objetivo. Apenas para referir, pois se trata de outro tema, efetivamente foram criados vários órgão de controle externo como o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público, o Conselho Superior de Justiça do Trabalho.

Pois essa Emenda Constitucional inseriu mais um inciso no artigo 5º, da Constituição Federal , o inciso LXXVII (78º) que fala que – “a todos são assegurados razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.

Não se vê aí uma novidade, já tal leitura de efetividade já era feita antes desse inciso, quanto aos dispositivos existentes na própria Carta e artigo 5º, LIV – devido processo legal, LV – ampla defesa, XXX – acesso ao Poder Judiciário. “a lei não excluirá da apreciação…”.Estes já se interpretavam no sentido de que a prestação jurisdicional devesse ser efetiva proteção, célere, justa, com condição real de atuação no mundo dos fatos.

Ocorre que a novel norma constitucional, em verdade nada significa. O que é “razoável duração”? Quanto tempo significa efetividade na prestação jurisdicional aos efeitos da razoável duração? Quais os meios disponíveis para assegurar a celeridade de tramitação?

É importante perceber que se trata de norma programática, não auto-aplicável, que traz conceitos abertos e subjetivos. Obviamente dependem de formulação legislativa ordinária, e que até agora não sobreveio.

Algumas alterações no sentido da efetivação e qualificação da prestação jurisdicionalforam determinadas pela EC 45, como a do artigo 93, II –c) promoção dos juízes por critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição. Ainda, freqüência e aperfeiçoamento em cursos. Oficiais e reconhecidos de aperfeiçoamento, e) não promoção se houver injustificada retenção autos além do prazo. Determinou no inciso VI – Aperfeiçoamento por cursos, no inciso XII – Atividade Jurisdicional Ininterrupta. (vedado férias coletivas, dias sem expediente: plantão permanente.), inciso XIII – número de juízes proporcional à demanda, o inciso XV – Distribuição Imediata de processos e em várias situações a possibilidade de justiça itinerante e funcionamento descentralizado, câmaras regionais, assim como o artigo 126 prevendo a organização Varas especializadas – exemplificativamente para conflitos fundiários.

É de se referir ao final que nessa tentativa de Garantir o Acesso ao Poder Judiciário – um acesso amplo e qualificado – se instituíram, por igual, dois tipos de Súmulas a serem promulgadas pelos Tribunais Superiores, e de enorme controvérsia.  

A Emenda trouxe também a Súmula vinculante (artigo 103, A da Constituição Federal), que obriga ao julgador a sua aplicação, matéria essa relevante e que será objeto de texto diverso, antecipando-se, contudo, que tem o significado de cerceamento de liberdade no julgamento do magistrado, engessamento da Jurisprudência, mas que encontra em seu favor alguns outros importantes argumentos.

 

Assim, e para concluir, é que se reconhece firme utilidade da constitucionalização de princípios processuais, notadamente da garantia de acesso ao poder judiciário, sem o qual torna-se formal e ocioso o direito material que a todos rege e orienta.

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NOTAS AO PROCESSO DE REFORMA TRABALHISTA

* Artigo publicado na Revista Magister de Direito Trabalhista e Previdenciário, Porto Alegre, v. 3, 2004.

NOTAS AO PROCESSO DE REFORMA TRABALHISTA

As notas aqui manifestadas, buscam colaborar no debate que há e que se acentuará no ano vindouro acerca da Reforma Trabalhista, uma vez que nele está projetada a sua ocorrência.

Estamos em período de reformas. São elas a do Poder Judiciário, a Trabalhista, dentro dela a Sindical, a do Direito Civil , a Previdenciária e a Tributária – essas três últimas já praticamente concluídas – a Reforma Política do Estado, a Eleitoral.

O significativo momento histórico, de que somos testemunhas e ao mesmo tempo atores, é inegável, ainda que muitas vezes disso não nos apercebamos por estarmos nele diretamente envolvidos.

O país atravessa situações políticas, econômicas e institucionais delicadas, mais recentemente vistas e tratadas como verdadeira reorganização nacional, que seja capaz de rever a insuportável condição de pobreza em que vive a esmagadora maioria da nossa sociedade, buscando incorporar à sociedade um enorme contingente de marginalizados.

Com essas reformas se pretende colocar o país, nos trilhos da produção, no sentido da melhoria das condições de vida das classes pobres, do fortalecimento das instituições nacionais e da sua inserção em um ambiente mais condigno e conforme com as expectativas de ordem internacional.

O mundo mudou. Não é mais o mundo da época da Revolução Industrial, da “Questão Social”, que deu azo ao surgimento do Direito do Trabalho. Período este em que o mundo se rendeu à necessidade de uma especialização jurídica própria ao atendimento de questões relativas ao trabalho e que não mais se afeiçoavam ao Direito Civil e Comercial, fundamentalmente, exigindo uma nova visão jurídica capaz de compreender e regular essas relações nascentes. Não era mais possível no tema a visão liberal, consagrada pelos ideais defendidos pela Revolução Francesa, de liberdade plena para o ser humano, autonomia da vontade e dos contratos, o que para o mundo do trabalho significava um verdadeiro desastre.

Assim surgiu o Direito do Trabalho, buscando a regulamentação do trabalho à luz das necessidades e dificuldades da época, cujas condições e fatos se alteraram profundamente.

Hoje a vida mudou. Somos a Sociedade que assiste a guerras e atentados terroristas ao vivo na tela da televisão e dos computadores. As distâncias não mais separam os povos. Os meios de transporte cada vez mais eficientes redimensionam o Ir e o Vir. A informação tornou-se num dos mais preciosos bens e valores de nossa época.O encurtamento da distâncias é evidente. Tudo isso levou ao que se costuma chamar de Internacionalização ou Globalização.

A visão da humanidade se avantaja, passando a ter seus olhos voltados para a Comunidade Internacional.As relações entre os países soberanos, da chamada Comunidade Internacional, são cada vez mais intensas e na área econômica decisivas.

As formas de produzir se alteraram e seguem em mudança. São as autônomas linhas de produção, com volume de maquinário elevado e baixo capital humano, a robótica e a automação em geral a substituir a mão-de-obra humana.O Direito do Trabalho guarda íntima relação com todas essas atuais e inacabadas ocorrências, aqui apenas exemplificativamente enunciadas.

Procura-se o país onde se possa produzir a menor custo, de modo a fabricar em qualquer localidade do globo um produto para ser vendido em todos os cantos do mundo.Com isto busca-se mercados onde o custo de mão-de-obra, dentre outros aspectos, seja capaz de formar preço competitivo em nível internacional.

No caso pátrio, estamos, sim, inseridos nessa inegável realidade e é nela que precisamos atuar. No Brasil ainda se faz necessária a intervenção do Estado nas relações de trabalho, de vez que fortemente marcadas pelo histórico desequilíbrio de forças que fez surgir o Direito do Trabalho, ainda contemplando o hipossuficiente nesta relação que precisa contar com o apoio do Estado .

Nesse sentido, historicamente se desenvolveu a nossa especialização laboral, sendo marcada por forte intervenção Estatal, a ponto de ser considerada presentemente demasiada e insuportável.

A CLT como base representativa dessa indevida e condenada – por sua intensidade- intervenção no contrato privado de emprego, tem sido alvo desse descontentamento. Não estamos aqui a discutir a tormentosa questão teórica da taxinomia do Direito do Trabalho, para determinar se é ramo do Direito Público, Privado ou outros.Nosso Diploma básico, editado em 1943, vem sendo fortemente torpedeado. Segundo alguns, teve forte influência do Sistema Corporativista Italiano, forte acento facista.

Posta, ainda que brevemente, a cena atual em nosso Direito, e sociedade, ansiosa por mudanças, está o ponto central de nossa abordagem , que é a Reforma Trabalhista.

Para tratar do tema gostaria de trabalhar por duas linhas básicas de raciocínio, a saber, a Temporal e Estrutural.Na Temporal, lançar a análise para o passado recente, para atualidade e prospecção de futuro. Na linha Estrutural, tendo em vista a situação da Estrutura do Poder Judiciário e do arcabouço legislativo que envolve a questão.

Em primeiro lugar, é de se afastar a corrente afirmação de que a CLT é a responsável pelo mau resultado econômico do país, “instrumento antigo e autoritário, que rege as relações trabalhistas ”, o que evidencia um total desconhecimento da matéria.

Óbvia a data de nascimento da sexagenária Consolidação e o seu aspecto intervencionista exacerbado, que merece, sim , crítica, mas não na forma com vem sendo feita.Isso porque desconhece a existência de enorme volume de regulamentação fora de suas páginas e que se agregam ao ordenamento jurídico trabalhista, composto de leis complementares e ordinárias, decretos, regulamentos, portarias e todo o tipo possível de regramento que adere à mesma Lei e foi formulado ao longo desses últimos 60 anos. Essa “velha senhora”, como é referida, em verdade está irreconhecível, pelas inúmeras alterações sofridas em seu texto ao longo dos anos, e especialmente nos últimos tempos.

Podemos genericamente, e a título de exemplo, referir as alterações relativas às cooperativas, ao cargo de confiança, à alteração nos dispositivos relativos à jornada de trabalho e intervalos, dentre outras tantas já tratadas e absorvidas pelos especialistas e profissionais atuantes da disciplina.

Assim é que a voz corrente dessas críticas não pode ser tida por acertada.Também ao Direito do Trabalho, alguns, mais desavisados, imputam o engessamento econômico a que estamos submetidos, mas o fazem incorretamente.Outros dizem que está esclerosada a matéria, tendo parado no tempo. Mas estas observações não são senão fruto de desconhecimento.

Isso porque, sem prejuízo de necessitar alterações, que realmente devem ser feitas, a grande flexibilização ou Reforma Trabalhista já ocorreu com o advento da Constituição Federal de1988.

A Constituição vigente sofre crítica, segundo a qual inclui em seu texto normas tipicamente de caráter infraconstitucional, de legislação ordinária, de detalhismo impróprio ao regramento Constitucional .

As grandes constituições do Mundo são aquelas capazes de atravessar os anos e até os séculos, mantendo a sua capacidade de nortear a vida de uma Nação, dando as estruturas básicas de organização e regência, a partir das quais se constitui uma determinada ordem jurídica. São as linhas mestras de organização do Estado, cabendo à legislação infra-constitucional o papel da regência das questões corriqueiras e diuturnas

Tais características não são as de nossa Carta Maior, pois a mesma é rica em detalhes e mesmo de repetição de normas já existentes e vigentes no sistema. Puro desconhecimento do Legislador constitucional? Por certo que não.

A compreensão que temos dessa dúvida e das características da má técnica constitucional que elegemos explica-se politicamente. Tendo sido 1988 a primeira oportunidade de afirmação política depois de anos de Ditadura Militar, é compreensível que se tenha pretendido elevar uma séria de normas à condição de norma Constitucional. Com essa mudança de patamar, se qualifica a proteção desses mesmos direitos.

Em estando tratados por legislação infraconstitucional, os mesmos são de fácil alteração ou supressão, bastando a simples edição de norma ordinária posterior que regre o tema de forma diversa, para que se altere a regência do ordenamento. Basta, muitas vezes, até um acordo de lideranças, manejado no Congresso Nacional, para que se criem ou suprimam direitos. Já as normas constitucionais demandam amplo debate, envolvimento parlamentar mais profundo e quorum qualificado. O efeito dessa situação é que as alterações constitucionais são mais difíceis de acontecer e portanto exigem fundamentação, aprofundamento e esclarecimento popular.

Assim é que como primeira oportunidade de reorganização do sistema constitucional e verdadeiramente a reorganização de um país livre, se entende como coerente a formatação Constitucional com o momento político da promulgação da vigente Lei Maior. Detalhista, por receio do passado e buscando garantir as normas então em discussão.

Se já fomos mais ácidos na atecnia invocada, hoje devemos reconhecer a sua eficiência e resultado justamente no sentido de dar estabilidade A essas normas. Veja-se que dois moldes políticos tivemos no governo de nosso país, ambos falando em reforma do Direito do Trabalho, e que se tais normas não tivessem sido constitucionalizadas, já teríamos passado por duas reformas de vieses opostos, uma mais à esquerda, outra mais liberal.

Agora quando se fala no tema, o aprofundamento da discussão se impõe, de vez que haverá de se processar por meio de reforma constitucional, e, portanto, com discussão composição das mais variadas forças políticas do país.

Com isto não estamos a sustentar que a reforma, que há de vir, deva ser capaz de revelar a verdadeira vontade e necessidade da nação em rever e atualizar questões tão significativas que dizem respeito à vida dos cidadãos e das empresas que compõe o mundo da atividade econômica e que podem ser capazes de levar ao desenvolvimento econômico e social o país .

A Constituição vigente, como dissemos, alcançou aos Sindicatos poder incomensurável, na medida que os colocou em maior evidência nas relações de trabalho condicionando uma série de direitos à sua intervenção: por exemplo, redução salarial, jornada compensatória, regramento de turnos ininterruptos de revezamento…Na área coletiva, a liberdade sindical, a unicidade sindical, entre outras tantas.

Dir-se-á que os Sindicatos não são representativos e que se prestam aos interesses patronais. Situação que, se existente não pode retirar dos mesmos sua efetiva função social e capacidade de bem representar os trabalhadores. Cada um tem que assumir seu papel em um país que está sendo passado a limpo e os sindicatos também. Se fomos capazes de destronar em plena vigência do mandato até um Presidente da República que se portou mal, não podemos recear comportamento sindical indevido, pois pode sofrer reação de mesmo tipo. Lembremos o óbvio: os dirigentes sindicais são escolhidos pelas bases.

Em nosso sentir, no entanto, esse direcionamento para o reforço da representação coletiva em maior espaço é mais proveitoso do que efetivamente perigoso. Há grande vantagem na utilização de modelo diverso daquele que tem na lei a normatização da relação de trabalho. A rigidez da lei, no particular, desserve, uma vez que em país como o nosso, de dimensões continentais, a multiplicidade de características regionais cria situações de difícil solução. Exemplifica-se com o salário mínimo, que é impagável em dezenas de regiões do agreste nordestino e na cidade de São Paulo não tem significado maior, onde poucos são os que laboram em troca apenas do mínimo. A regência por norma coletiva permite adequação às capacidades e possibilidades setoriais, bem como à condição econômica de cada grupo de empregadores ou mesmo de um deles.

Bem aplicada a intervenção sindical cremos significar enorme avanço na proteção trabalhista, sem interferência direta do Estado. Então não se diga que o Direito do Trabalho não fez e não faz a sua parte afastando-se afirmações eleitoreiras e que bem ecoam em platéia leiga .

Mas se isto é uma verdade, outra é a de que não foi ainda suficiente e urge sejam feitas novas reformas.Compreendemos que deva se avançar, mas com pressupostos diversos.O Estado deve, sim, reduzir sua intervenção legislativa no Contrato de Trabalho. Mas a maior intervenção nociva que realiza é de outra natureza. É de caráter tributário (amplamente falando), e que sangra produção em nosso país.

Deve, sim, e é mais urgente, o Estado liberar a produção da carga tributária insustentável, que verdadeiramente pune a atividade laboral e impede a criação de novos postos de trabalho, bem como também dificulta o desenvolvimento da economia.

A outra vertente de raciocínio é a que chamei de Estrutural e tem enfoques que merecem ser tratados e que são genericamente as alterações havidas e em curso na área do Judiciário Trabalhista e que com ela se confunde, relativa às propostas de alteração legislativas em discussão.

Durante esse ano estivemos envolvidos com o Conselho Nacional de Desenvolvimento, Fórum Nacional do Trabalho, Conferência Estadual do Trabalho, já tendo sido entregue ao Poder executivo documento final em que os agentes sociais envolvidos, empregados e empregadores após ampla discussão apresentaram sugestões, e que se espera sejam transformadas em propostas legislativas.

Receamos, contudo que esse trabalho possa ter sido em vão, se mirarmos a questão Tributária. Nesta muito se falou. A sociedade civil apresentou inúmeras propostas de mudança do sistema como um todo, e o que se viu foi uma desconsideração total às mesmas. O Executivo apresentou projeto próprio e diverso daquele sugerido, mas o que é pior, de dimensões desprezíveis e incapaz de propiciar à produção qualquer desoneração…

Cremos que a Reforma deve ser vista e tratada como processo permanente, sem soluções mirabolantes . A manutenção de alguns direitos mínimos para os trabalhadores, sem o rigor de forma imposto pelas leis, pode ser um bom começo. Exemplifica-se: manter-se a obrigação de 13º salário facultando-se ao empregador a eleição da melhor forma de cumprí-lo, por exemplo em período do ano em que tem maiores vendas ou resultados. Ratificar o direito a férias de 30 dias, mas que possam ser fracionadas de forma diferente daquela prevista na CLT. E assim em outros tantos.

Resta-nos pois, a esperança de que as discussões havidas ao longo do ano possam nortear a reforma, já se identificando, no entanto, um primeiro equívoco, que é a separação desta da reforma sindical e sua anterioridade à reforma do Direito Material em geral, quando entendemos devessem se processar conjuntamente ou até primeiro a do Direito do Trabalho “lato sensu”.Resta-nos pois, a esperança de que as discussões havidas ao longo do ano possam nortear a reforma, já se identificando, no entanto, um primeiro equívoco, que é a separação desta da reforma sindical e sua anterioridade à reforma do Direito Material em geral, quando entendemos devessem se processar conjuntamente ou até primeiro a do Direito do Trabalho “lato sensu”.

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45 – DEZEMBRO DE 2004

* Artigo publicado na Revista Magister de Direito Trabalhista e Previdenciário, Porto Alegre, v. 3, 2004

 

EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45 – DEZEMBRO DE 2004

O presente artigo busca apreciar a Emenda Constitucional 45, de dezembro de 2004 sob dois enfoques básicos. O primeiro de análise ampla e geral da nova Emenda com exame de finalidade e instrumentos e o segundo, mais pontual, especificamente sobre o trato da matéria trabalhista ante a alteração do artigo 114 da Carta Constitucional.

À guisa de introdução é de se manifestar perplexidade acerca de mais uma nova Emenda Constitucional.

É que em termos técnica e socialmente ideais, a Constituição de um país deve se constituir em um instrumento normativo estrutural e de organização do Estado e da Sociedade capaz de nortear os cidadãos na formação e desenvolvimento de suas vidas, o mesmo valendo para as Instituições do país, através dos tempos.

Deve ter condições de conduzir os destinos de uma nação por um longo futuro, orientando a organização social e empresarial para bem alicerçar suas ações. Deve ensejar regramento amplo, para, a partir dele, adequadamente balizar o sistema jurídico infraconstitucional .

É próprio dessa missão, o caráter de estabilidade típico da magnitude de sua condição e propósito, para que o desenvolvimento nacional seja com ela conforme. Recomendável assim, formatação enxuta, que seus ditames não sejam daqueles que rapidamente se alterem ou superem, que sejam capazes de estar acima das ocorrentes e dinâmicas alterações diuturnas da vida. Só dessa maneira é que passam os tempos e a Carta Constitucional segue com sua observância e vigência reconhecida e preservada. Desse modo também pode ser acolhida e compreendida pelos cidadãos.

Pois já aí se pode produzir alguma crítica à chamada Constituinte cidadã de 1988, a qual prima pelo detalhismo e até casuísmo, neste enfoque impróprios para o instrumento em questão, a qual já se encontra, sob muitos aspectos superada e ultrapassada pelo tempo, a despeito de sua recém adolescência. Perde assim na necessária condição de proximidade com seus destinatários, pelos quais não tem o devido conhecimento.

Por óbvio que tal – sem se atribuir simples incorreção de formatação – tem pelo menos alguma justificativa de caráter político especial, que foi o momento da sua ocorrência. Primeiro espaço de reorganização institucional do país depois de anos de ditadura militar, de regime autoritário e opressivo, vê-se o país com um oportunidade de rever sua organização constitucional e, por conta de anos de autoritarismo estatal e até legal, tratar de buscar proteção na Carta Maior.

Na Carta de 1988 tratou-se de incluir um sem número de questões tipicamente de caráter infraconstitucional, como forma de tentar assegurar a manutenção dessas regências. Isso porque é sabida a necessária maior dificuldade de alteração dessas normas constitucionais, que não se dão por simples edição de outra regência em sentido contrário ou diversa, como se dá com a lei ordinária. A alteração constitucional exige quorum qualificado , envolvimento congressual, partidário e social muito mais sério e, portanto, gerando uma condição de maior perenidade quanto aos temas inscritos na Constituição Federal.

Mas essa é a Constituição que temos e sobre a mesma devemos deitar nossos estudos, sem que se deixe de fazer essa necessária crítica, em especial se fizermos rápida digressão comparativa.

Pois em moldes ideais a Constituição deve ser capaz de manter-se firme com o passar dos tempos, mantendo a orientação norteadora e atual, o que não é uma das grandes virtudes da nacional.

Veja-se, a título de exemplo, as saudadas Grandes Constituições do Mundo, as centenárias Francesa e Norte Americana, bastante concisas e genéricas Esta última, de formulação no longínquo 1789, com mais de 200 anos de vida, sofreu apenas 27 emendas ( isso sem distinção das 10 normas “Bill of Rights”, de mesma data). São normas de conhecimento e validação popular, tradicionais e verdadeiramente pilares sociais.

No caso pátrio, já estamos até na 46ª emenda para uma Constituição Federal de menos de 18 anos de vida. A velocidade e intensidade das alterações à Carta são prova cabal do que acima se sustenta, restando evidente o indesejado distanciamento da Carta relativamente àqueles que pretende atingir.

Visto isto, é de se iniciar a análise da Emenda Constitucional n° 45, propriamente dita, o que se faz pela manifestação de compreensão da sua origem, da sua motivação.

Formalmente tratada como a emenda que traz a Reforma do Poder Judiciário, buscando a perfectibilização do Poder e a agilização da prestação jurisdicional, agrega, contudo, um ingrediente velado, mas também importante, que é a tentativa de instituição de um controle externo ao próprio Poder Judiciário, de algum comando sobre o mesmo, o que efetivamente se realizou.

Com esses objetivos foram por igual encaminhadas ao Congresso Nacional no mesmo mês de dezembro de 2004 vários outros projetos de lei que buscam alterar o Código de Processo Civil, o Processo do Trabalho e o Processo Penal.

Na emenda sob análise, aos efeitos de maior controle social e político sobre os órgãos de jurisdição, foram criados o Conselho Nacional do Ministério Público, Conselho Superior da Justiça do Trabalho e o Conselho Nacional de Justiça, teoricamente sem o condão de intervir na aplicação do direito, mas apenas nas questões referentes à administração dos órgãos judiciais.

No que respeita à finalidade maior de agilização da prestação jurisdicional, a expressa inclusão de um 78º inciso (LXXVIII) ao artigo 5° da Constituição, é clara ao asseverar que “ são assegurados razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. É norma que pretende garantir efetividade ao procedimento da jurisdição.

Tal leitura de efetividade já era feita antes da inclusão desse inciso, quanto aos dispositivos existentes no mesmo artigo 5° que referiam no inciso XXXV o acesso ao Poder Judiciário para a apreciação de lesão ou ameaça do direito. Somente poderia se entender atendida a determinação constitucional se a jurisdição fosse prestada em tempo hábil e capaz de realmente atender ao jurisdicionado com condições de atuação no mundo real dos fatos.

Trata-se de antigo conflito entre efetividade e segurança jurídica, esta asseverada também em nível constitucional no mesmo artigo 5ª e revelada nos incisos LIV e LV que asseguram, respectivamente, o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa.

Mas qual o real efeito sobre a efetividade do processo com a edição da norma em análise? Praticamente nenhum, senão psicológico. Trata-se de norma que explicita discussão anterior sobre o tema, mas que é programática, não auto-aplicável. Traz conceitos abertos, amplos e subjetivos, incapazes de acelerar em 1 segundo sequer a prestação jurisdicional. Evidente a dependência de desdobramento legislativo ordinário capaz de alcançar-lhe algum sentido prático.

Mas a mesma Emenda 45 traz outras regências no sentido e que são capazes de efetivamente aprimorar a prestação jurisdicional. Vejamos algumas alterações no sentido, quer da efetividade, como também da qualidade da atuação:

ART 93 – II – c) promoção dos juízes por critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição. Ainda, freqüência e aperfeiçoamento em cursos oficiais e reconhecidos de aperfeiçoamento.

e) não promoção dos juízes, se incorrer em injustificada retenção autos em carga além do prazo legal. Não basta a simples devolução dos autos ao cartório, face à previsão de que o magistrado somente pode devolver os autos com o devido despacho e decisão.

VI – Aperfeiçoamento por cursos.

XII – Atividade Jurisdicional Ininterrupta. (vedados férias coletivas e dias sem expediente: plantão permanente.)

XIII – número de juízes proporcional à demanda

XV – Distribuição Imediata dos processos em grau de recurso. A título de ilustração e homenagem registre-se que o TRT 4ª Região, bem como da 10ª Região, especificamente Brasília, de há algum tempo atuam nestes moldes. Extremamente ágil de modo geral também o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (apenas para registrar o Tribunal local) e inaceitavelmente morosa a distribuição de apelações no Tribunal de Justiça de São Paulo onde os feitos aguardam em torno de 2 anos para serem distribuídos ao relator….

ART. 107 Tribunal Regional Federal – § 2º– instalação de justiça itinerante.§3º funcionamento descentralizado, câmaras regionais;

ART. 115 TribunaL Regional do Trabalho -§ 1º- instalação de justiça itinerante, § 2º funcionamento descentralizado, câmaras regionais;

ART. 125 Tribunal de Justiça – § 6º funcionamento descentralizado e §7º instalação de justiça itinerante.

ART. 126 Criação de Varas especializadas com competência exclusiva para conflitos fundiários ( questões agrárias).

Quanto à justiça itinerante, é de lembrar que há aproximadamente 20 anos, assim se fazia no Rio Grande do Sul, quando para audiências de ações realizadas na cidade interiorana do Alegrete, lá comparecia uma então Junta de Conciliação e Julgamento, em deslocamento, que vinha da cidade da fronteira de Uruguaiana em uma camionete Rural Willys com o Juiz Presidente, os juízes vogais, o assistente judiciário, máquina de escrever, papéis timbrados próprios, e assim se instruía o feito, com o que razoável associar à justiça itinerante…

Também possível de aqui se incluir as normas dos artigos 93, I, e 129 § 3º, que determinam a prática de três anos de atividade jurídica do bacharel em direito, regra essa, entretanto, de contornos não muito claros. Nesse sentido, a moralizadora imposição do artigo 95, V, de proibir aos juízes o exercício da advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração” , que algum limite impõe à essa inaceitável “concorrência desleal”.

É de realçar, no entanto, que quer na seara do controle social e jurisdicional, quer na seara da efetividade, a mais significativa alteração se deu através das Súmulas Vinculante e Impeditiva.

Quanto à esta última, ainda não vigente nos moldes propostos, uma vez que pende de reapreciação na Câmara dos Deputados e da própria aprovação, por força do processo de alteração constitucional por emenda.

Na prática, já existente quando o relator do Agravo de Instrumento Cível, pode negar seguimento ao mesmo, por decisão monocrática, quando manifestamente inadmissível ou contrário à Súmula (art. 557, parágrafo 1° A do CPC) . Da mesma forma, o artigo Celetista, 896, parágrafo 5° pode o relator do Recurso de Revista negar o seguimento ao mesmo se a decisão agravada estiver em consonância com enunciado da Súmula da Jurisprudência do TST.

No que respeita à Súmula Vinculante, críticas importantes quanto à sua implantação sofreu, na medida em que verdadeiramente se constitui em instrumento de limitação da atuação jurisdicional, tolhendo o poder criativo do juizado de primeira e segunda instâncias, que fica impossibilitado de manejar livremente o direito e sua interpretação, ficando vinculado ao entendimento manifesto em Súmula ditada por Tribunal Superior. Há um evidente engessamento da dinâmica jurisprudencial, com escassos caminhos de alteração do instrumento pelo jurisdicionado.

De outra parte, e para fazer contraponto, é importante que se diga injustificável a repetição mecânica de processos, petições, sentenças, manifestações recursais e julgamentos idênticos, a impor volume inaceitável de questões cujo resultado final desde o início se conhece e que contribuem decisivamente para a morosidade judicial, ferindo gravemente a efetividade da jurisdição. Exemplo disso são as milhares de ações que abarrotam a Justiça Federal e que tem o poder público federal como parte, onde se discutem por anos matérias absolutamente idênticas em insuportável e onerosa repetição formal de teses

Por óbvio essa rápida observação não tem o condão de esgotar matéria tão importante quanto profunda, mas apenas noticiar ao leitor sua ocorrência, sem se chegar a uma conclusão definitiva acerca do acerto do remédio proposto e ora insculpido na Carta Maior .

Incluída que foi na reforma pela edição do Art. 103A da CF, deve ser examinada. Trata-se de norma de aplicação imediata que autoriza o Supremo Tribunal Federal à edição das mesmas, quando se tratar reiteradas decisões sobre matéria constitucional, por deliberação de 2/3 dos membros da Corte. A referência final do artigo introduzido quanto à necessidade de estabelecimento em lei posterior, deve ser interpretada como aplicável à revisão ou cancelamento. Há diversa interpretação de que tal se aplique à própria aprovação.

Aspecto interessante é o fato de que a Súmula vincula o Poder Judiciário e a Administração Pública direta e indireta, pelo que pode significar o estancamento de procedimentos administrativos geradores desse repetitivo volume de proposições judiciais.

Os três parágrafos que seguem à norma detalham algumas questões, sendo de realçar a possibilidade de reclamação ao Supremo Tribunal Federal quando dúvida restar quanto à correta aplicação ou não aplicação da Súmula editada.

Outra alteração, artigo 102, parágrafo terceiro, é a previsão de que o Recurso Extraordinário possa ser manejado quando se configurar o que refere “repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei”. Tal traz à lembrança a antiga questão de relevância, ensejadora do processamento do apelo. Nesse sentido, também, veja-se norma celetista do artigo 896-A que previu, na alteração havida pela MP 2226 de 09/2001, situação comparável, que foi a da “transcendência” do Recurso de Revista, até hoje não regulamentada.. Haverá de contar com passo posterior por parte do legislador ordinário.

Neste ponto, crendo haver apresentado uma superficial visão dos temas acima, resta adentrar especificamente na análise da alteração havida no artigo 114 da Constituição Federal, essa de profunda significância para o Judiciário Trabalhista.

De início, convém registrar que a exclusão no Caput da norma, da expressão de competência para “conciliar”, não tem o significado por alguns exageradamente interpretado, de que não mais teria essa competência, de vez que resta pressuposta pela função jurisdicional como função do juiz, na forma prevista pelo artigo 125, inciso IV do CPC e do artigo 652 da CLT.

No inciso I, a alteração da competência centra-se na dicção anterior de competir o processamento e julgamento de controvérsias entre “trabalhadores e empregadores”, para ora processar e julgar as controvérsias decorrentes da “relação de trabalho”. Aí é que o exame se nos impõe maior atenção e resta de maior relevância. Antes relação de emprego, “entre trabalhadores e empregadores…e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como..” e ora “ações oriundas da relação de trabalho….

O objeto da proteção do Direito do Trabalho sempre se centrou na proteção do seu exercente, aquele que pessoalmente dispende energia em favor de outrem. O foco é a pessoa humana.

A competência anterior, no entanto, era restrita à ocorrência dessa situação nos moldes de subordinação e caracterizadora de relação de emprego, e alguma outra excepcional.

A comparação entre relação de emprego e de trabalho sempre foi a relação de espécie e gênero. O gênero é a relação de trabalho, maior e mais ampla e que inclui a forma especial de prestar trabalho que é a prestada nos moldes de contrato de trabalho, ao qual corresponde a relação de emprego, sua espécie. Lembre-se também que a própria CLT, no artigo 442, determina essa correspondência.

Sob este prisma, não resta qualquer dúvida de que a presente alteração constitucional promoveu uma significativa alteração da competência da Justiça do Trabalho, no sentido de sua ampliação e passar a seu encargo também outras formas de trabalho pessoal, além do contrato de trabalho.

Entende-se assim, que são ora da nova competência as relações de trabalho como prestação de serviços, o mandato, o contrato de transporte, a corretagem a representação comercial, o trabalho voluntário (Lei nº 9.608/98), o contrato de estágio, o trabalho do avulso (ora mais amplo do que a relação do artigo 643 e do inciso V do artigo 652 da CLT) e seus tomadores, os empreiteiros de qualquer porte, o labor em parceria, o trabalho cooperativado.

A figuração nas ações judiciais pode ser como Autor ou Réu, independentemente de capacidade econômica.

A questão da redação dada ao novo caput, saliente-se, é objeto de dúvida revelada por Ação direta de Inconstitucionalidade movida pela Associação dos Juízes Federais (AJUFE – nº 3995/2005), a qual sustenta a inconstitucionalidade formal da norma, e que tem em seu favor a concessão de liminar.

Sustenta–se que o Senado Federal incluiu acréscimo não apreciado pela Câmara, e que, portanto, como alteração constitucional, dependeria de nova manifestação da Câmara, ora com a alteração incluída.

Essa aprovação havida em turno único no Senado Federal ( aí o suporte da alegação de inconstitucionalidade formal) diz respeito à exceção por ele instituída, no sentido de que a competência lá determinada é da Justiça do Trabalho, “exceto os servidores ocupantes de cargos criados por lei, de provimento efetivo ou em comissão, incluídas as autarquias e fundações públicas dos referidos entes da Federação”.

A liminar deferida é no sentido de que foi dada interpretação conforme o inciso I, do artigo 114 da CF, na redação da EC 45/2004. “Suspendendo ‘ad referendum’, toda e qualquer interpretação dada … que inclua na competência da Justiça do Trabalho a apreciação … de causas que sejam instauradas entre o poder Público e seus servidores, a ele vinculados por típica relação de ordem estatutária ou de caráter jurídico-administrativo”.

Resta pois liminarmente excluída a apreciação de relação de trabalho decorrente de relação estatutária do funcionário público. Esteiou-se ainda a liminar em anterior entendimento do Supremo, no sentido dessa exclusão, a despeito da redação anterior não ser expressa. É referência a ADI 492, que decretou a inconstitucionalidade de dispositivo da Lei nº 8.112/90 que lá interpretava a “relação de trabalho”.

Essa ação autorizou inclusive alguns intérpretes a, mesmo sem a atual ADIN, sustentarem que já estariam excluídos os estatutários, e que continuaria alheia a Justiça do Trabalho a relação estatutária do servidor público. Outros sustentam que em não se tratando de decisão do Tribunal, mas de relator, nem mesmo de decisão de mérito e sim liminar, estaria imprópria para gerar efeitos vinculantes ou afastar novas ações. Certo, contudo, é que se trata de uma decisão do Tribunal, que tende a se manter, e portanto tem sim evitado interpretação diversa.

Outra dúvida que tem sido discutida, diz respeito à incidência do código do consumidor e sua regência nas relações de trabalho. Não nos parece razoável a hesitação, na medida em que mesmo se tratando de relação de consumo, a novel norma constitucional nada excepciona, pelo que o código correspondente não tem o poder de fazê-lo. É obrigação da norma infraconstitucional, no caso o Código de Defesa do Consumidor, adaptar-se à normativa constitucional, por hierarquia inafastável. Se a Emenda Constitucional não excluiu nem excepcionou, não pode a lei fazê-lo.

Algum receio tem por igual se manifestado quanto às normas que incidirão sobre as matérias ora objeto da apreciação no foro trabalhista, mas que não se justificam. É que a alteração havida é de caráter processual, de competência e não material, restando inalteradas as proteções legais de direito material. Dizendo de outra forma, essas relações que serão julgadas pela Justiça do Trabalho seguem com suas regras de Direito Material próprio (exemplo: representante comercial autônomo, lei nº 4.886/65) ora sob análise de outro juizado. Outro exemplo importante é relativo às normas prescricionais, que seguem mantidas, consideradas que são de direito material.

O inciso II, do artigo 114, determina que à Justiça do Trabalho compete a apreciação das ações que envolvam o exercício do direito de greve. Está a tratar aí, de todas as questões relativas ao movimento paredista e que antes estavam descoladas da Justiça do Trabalho, para a apreciação pela Justiça Comum. São situações como a responsabilidade civil da greve, prejuízo causados a terceiros e à coletividade por conta da paralisação, as ações possessórias, as ações movidas por e contra sindicalistas no exercício dessa resistência.

A essa leitura deve agregar os parágrafos que tratam especificamente sobre a greve. Mantido inalterado o parágrafo 1º, resta preservada a possibilidade de arbitragem, como forma de solução do conflito.

Quanto ao parágrafo 2º, trata-se de norma com diversas interpretações. A mais radical delas, no sentido de que esta redação teria acabado com o poder normativo da Justiça do Trabalho, de vez que não se tem a amplitude dada na redação original e que expressamente o autorizava. A redação é evidentemente mais restritiva.

A inclusão no parágrafo da expressão “de comum acordo” ao referir o ajuizamento de dissídio coletivo,é causadora de grande estranheza. Como será possível o ajuizamento de comum acordo? E se a parte, notadamente a empresarial, negar-se ao ajuizamento de comum acordo? Se não é próprio da propositura de uma ação justamente a resistência à pretensão, impondo atuação e iniciativa individual da parte autora contra a ré neste sentido?

Sem constituir o direito coletivo do trabalho em matéria própria destas observações, quer-se crer que a expressão se interpretada em sua literalidade geraria a inviabilização de qualquer propositura no sentido, pelo que não é razoável. Assim deve ser tida por superada a expressão se houver negativa na propositura, de vez que não se pode inviabilizar o acesso ao Poder Judiciário, ferindo o direito de ação.Há notícias de que Confederação Nacional de Trabalhadores já haja ajuizado ADIN, quanto à essa restrição do parágrafo 2º, sustentando sua inconstitucionalidade, mas sem deferimento de liminar. Também se tem notícia de que inúmeros dissídios têm sido ajuizados e seguem tramitando mesmo sem o cumprimento da determinação contida, por concordância presumidamente tácita. Tais, contudo, poderão ser tidos por inexistentes se não atendido o “comum acordo”, podendo ser considerado como pressuposto processual desatendido. Resta aguardar.

O inciso II da alteração do artigo 114 da Carta Constitucional, determina a competência da Justiça do Trabalhorelativamente às ações sobre representação sindical, entre sindicatos, entre sindicatos e trabalhadores, e entre sindicatos e empregadores. A regência ampla do inciso permite a inclusão de uma gama de situações de induvidosa competência. Antes restrita a competência quando resultasse de cumprimento de acordo ou convenção coletiva (Lei nº8984/95).

Exemplifica-se: cobrança ou recebimento da contribuição sindical, taxa assistencial ou negocial ou mesmo mensalidade dos sócios; a discussões que quaisquer temas relativos às eleições sindicais, validade de assembléias, capacidade de concorrer etc; a discussão sobre base de abrangência de determinada entidade sindical, a definição de representatividade, disputa entre sindicatos constituídos e novos, fusões entre sindicatos, novas categorias etc. Parece próprio que essas controvérsias sejam resolvidas pela Justiça do Trabalho, especializada, não se justificando processamento em foro diverso.

Conseqüência imediata é a o afastamento total da Orientação Jurisprudencial nº 04 da Seção de Dissídios Coletivos, do TST, que afastava a competência da Justiça do Trabalho na discussão intersindical sobre a representatividade de certa categoria.

Da mesma forma, a OJ nº 290 da SDI, que decretou a incompetência do foro trabalhista quando discutiam sindicato patronal e a respectiva categoria econômica, acerca de contribuição assistencial.

O inciso IV expressamente determina a competência trabalhista quanto aos mandados de segurança, habeas corpus e habeas data, quando o ato questionado envolver matéria sujeita à sua jurisdição.

De pronto, questiona-se se houve esquecimento do legislador ao não incluir o mandado de injunção. Certamente não, mas apenas rendeu-se à anterior interpretação do STF e que sepultou a medida, no sentido de que o remédio servia apenas para constatar a mora do poder legislativo, sem a amplitude que outrora se entendeu teria, com o condão de editar normas ante a inércia do Poder.

Todas as matérias da Justiça do Trabalho que ensejarem discussão quanto a direito líquido e certo e restrição de liberdade, são de sua competência. Exemplifica-se: tentativa de prisão de depositário infiel; qualquer declaração de prisão relacionada com atos do juiz, delegado do trabalho, fiscal do trabalho; o desacato e a desobediência à ordem judicial. Não se crê ter passado à competência da Justiça do Trabalho o julgamento de qualquer crime, de vez que não se promoveu qualquer alteração constitucional no sentido, mantendo-se com a Justiça Federal.

Evidencia-se nova ampliação quanto ao Mandado de Segurança, de vez que antes passível quando questionados apenas atos de administração ou propriamente jurisdição da Justiça do Trabalho. Comum era a sua utilização também quanto às determinações de realização ou negativa de procedimento de garantia do juízo pela chamada “penhora on line”, determinações de reintegração ao emprego ou sua negativa, abordagem sobre Antecipação de Tutela, liminares em processos cautelares, determinações de ações civis públicas, imposições administrativas de órgãos da fiscalização, imposição de depósitos de multas para interposição de recurso administrativo.

Quanto à competência de processamento, ora do juiz de 1ª instância, e com a recursal para o Tribunal é perfeitamente de acordo com a norma, sempre adstrito aos seus parâmetros de direito líquido e certo , preventivamente ou reativamente, contra ato de autoridade pública, e observado o rito próprio, ainda que processado na Especializada, como se verá adiante.

Prevê o inciso V que os conflitos de competência entre órgãos de jurisdição trabalhista sejam pela Justiça do Trabalho dirimidos, ressalvada a disposição do art. 102, I (competência do STF), o que, de algum modo, também tem tratamento próprio no artigo 808 da CLT. Lembre-se que o Juiz de Direito eventualmente investido da jurisdição trabalhista, titula jurisdição trabalhista, ainda que eventual, pelo que somente será considerado conflito entre Tribunais, quando no exercício da Jurisdição Civil.

A orientação é própria e busca a necessária unidade e alinhamento de decisões.

Nesse sentido, por igual, importante a regra do artigo constitucional 105, I, “d”, que trata da competência do Superior Tribunal de Justiça. Agregue-se à compreensão do tema a Súmula nº 236 do Superior Tribunal de Justiça que afasta a sua competência para “dirimir conflitos de competência entre juízes trabalhistas vinculados a Tribunais do Trabalho diversos”.

Grande ponto de discussão e preocupação diz respeito à norma do artigo 114, inciso VI que determina a competência para as ações “de indenização por dano moral ou material, decorrentes da relação de trabalho”. Estabelecido estava que, em face da dependência de definição previdenciária acerca de existência ou não de acidente do trabalho e de sua caracterização como tal pela Justiça Comum, à essa era atribuída a competência, a qual estava organizada inclusive internamente em Varas Especializadas de Acidente do Trabalho (VAT).

Tão logo editada a Emenda, a interpretação doutrinária que se revelou a mais corrente talvez tenha sido a de que, no particular, não havia sofrido alteração a competência da Justiça do Trabalho. O fundamento era de que o artigo 109, I da mesma Carta não sofrera qualquer alteração. A hesitação Jurisprudencial também causou bastante preocupação. As turmas, seções do TST e do STJ não eram uniformes em suas manifestações, e orientavamum senso de correção nesse entendimento, um paradigmático julgamento realizado pelo Supremo Tribunal Federal, no mês de março de 2005, que em sede de liminar, é verdade, mas que mantinha com a Justiça Comum essa competência, acenando com uma posição da Corte Suprema.

Transcorrido algum tempo, muito discutida a questão, amainadas as ansiedades, deu-se nova leitura ao referido artigo 109, no sentido de que ali se excepcionavam apenas ações em que a União, entidade autárquica, ou empresa pública federal fossem interessadas na condição de autoras, rés, assistentes ou oponentes, e não a quaisquer partes em geral.

Recente julgamento do STF, do final do mês de junho de 2005 acerca do Conflito de Competência nº 7.204, no entanto, apresenta interpretação diversa, no sentido de que ante a nova redação da matéria, não há como adequadamente manter os conflitos indenizatórios, quer morais quer patrimoniais, no âmbito da Justiça Comum quando decorrentes de acidente do trabalho. Trata-se de conflito negativo de competência entre Tribunal de Alçada (?) e TRT de Minas Gerais.Ao que se sabe também, ter-se-ia dado efeitos “ex nunc” à decisão, ressalvados os atos praticados.

Resta, pois aguardar a publicação do acórdão para certificação dessas referências, prometida pelo órgão jurisdicional para os primeiros dias de agosto, quando do retorno do recesso do Supremo. Parece que deve se ter a interpretação nestes moldes norteadores, seguindo a decisão do Supremo, entendo-se como transferida a competência para a Justiça do Trabalho.

A hipótese prevista pelo artigo 114, inciso VII refere às “ações relativas às penalidade administrativas impostas aos empregadores pelos órgãos de fiscalização das relações de trabalho”.

A disposição atrai para a Justiça do Trabalho a competência para o trato de todas as penalidades administrativas decorrentes de atos administrativos, notadamente a fiscalização do trabalho exercida pelas Delegacias Regionais do Trabalho.

Da mesma forma, essa nova competência atinge a atos dessas autoridades administrativas que deveriam ser tomados, melhor dizendo, ante sua inércia. Explica-se como exemplo da inércia do órgão em manifestar-se sobre requerimento de autorização administrativa para a prorrogação de jornada, ou para a redução intervalar, cuja exigência alguns entendem ainda persistir. São ações antes atinentes à Justiça Federal, com as ações envolvendo nulidades de tais atos, relativas à multas, ou mesmo simplesmente declaratórias. Algumas vozes discutem estar ou não incluída na alteração a competência para a execução dos julgados, matéria também polêmica, de vez que retornou à Câmara dos Deputados o tema de execução de multas administrativas por infração à legislação.

O inciso VIII, refere à “execução, de ofício, das contribuições sociais previstas no art.195, I, a, e II, e seus acréscimos legais, decorrentes das sentenças que proferir;” Tal não se constitui, em verdade, em novidade, à medida em que a Emenda Constitucional nº 20/1998, já tratara da execução na Justiça do Trabalho das contribuições sociais, constando a regra no anterior parágrafo 3º, do próprio artigo 114, sem qualquer significativa alteração. Elas incidem sobre a ocorrência de descontos previdenciários e fiscais em geral, sempre vinculados às decisões que proferir, sem a limitação literal constante do texto (sentenças), abrangendo julgamentos em geral (acórdãos).

Finalmente, o inciso IX prevê a competência para “outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, na forma da lei”. Tem-se a dúvida de que a manutenção desse inciso decorrade anterior opção de utilização no inciso I, da expressão “relação de emprego”, substituída pela ampla “relação de trabalho”, quando então se justificaria. A utilização ao final do gênero e não da espécie, amplia a incidência a ponto de não se enxergar necessidade, senão ociosidade, deste inciso. Mas como não se crê tenha a lei, quanto menos a Constituição Federal, palavras inúteis, em esforço de interpretação pode se buscar espaço para tutelar também questões relativas à previdência privada complementar.

Quanto à estrutura da Justiça do Trabalho, em especial do Tribunal Superior do Trabalho, artigo 111-A, em termos de número de Ministros não tem maior significado, quer porque sua atual atuação tem se dado com mais juízes convocados, quer porque significa recomposição em moldes anteriores existentes ao tempo dos juízes classistas .

Para concluir, faz-se necessário que se traga algumas observações relativas a aplicação da norma no tempo e especificamente sobre o processo.

Deve ser observado que a referida Emenda Constitucional nº 45 não ofereceu qualquer previsão de “vacatio legis” que ensejasse um maior tranqüilidade e interpretação acerca de sua abrangência, contribuindo para a ocorrência de uma certa instabilidade.

Em se tratando de norma definidora de competência material absoluta, não se afirma aqui o princípio da “perpetuatio jurisditionis”, tendo, ao contrário, aplicaçãoimediata também sobre os processos em curso. Execuções pendentes, da mesma forma hão de ser atendidas na Especializada.

Algumas dúvidas significativas tentou-se afastar pelo TST por meio d edição da Instrução Normativa nº 27, autorizada pela Resolução nº 126/2005.

Como consta do parágrafo 1º da IN 27/05, os procedimentos dos feitos que passam à nova competência da Justiça do Trabalho devem estar conformescom a regra do artigo 763, da CLT, independentemente do objeto em discussão. Tal não causa qualquer surpresa. Veja-se que antes da edição, um pequeno empreiteiro ou artífice discutia seu direito civil, na Justiça do Trabalho por meio de reclamatória trabalhista, quer pelo rito ordinário quer pelo rito sumaríssimo. Está assim posto: “as ações ajuizadas na Justiça do Trabalho tramitarão pelo rito ordinário ou sumaríssimo, conforme previsto na Consolidação das Leis do Trabalho, excepcionando-se apenas, as que, por disciplina legal expressa, estejam sujeitas a rito especial, tais como o Mandado de Segurança, Habeas Corpus, Habeas Data, Ação Rescisória, Ação Cautelar e Ação de Consignação em Pagamento.”

Ações especiais, as quais detém caminho próprio, o mesmo deve ser mantido como regência processual, afeiçoando-se ao novo foro.

Deixam de existir, por ausente no processo do trabalho, recursos, como do Agravo de Instrumento Retido, estranho ao foro especializado, de vez que irrecorríveis as decisões interlocutórias, não terminativas do feito, artigo 893, parágrafo 1º CLT.

O “jus postulandi” de novo feitio após a edição constitucional original, tem também trato na referida Normativa, que em seu artigo 5º, dispõe que “Exceto nas lides decorrentes da relação de emprego, os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência”. Um registro quanto aos escritórios de advocacia, cujo exercício de mandato se dá por meio do profissional do Direito e não por Sociedade ou Escritório, nos moldes do Estatuto da Advocacia.

Concluindo, é de se realçar a evidência de um risco “político institucional”. É que a Justiça Especializada do Trabalho, em passado recente, foi objeto de discussão acerca de sua competência, com transferência de feitos para a Justiça Federal, o que a tornaria desnecessária. Também teve sustentado por alguns a extinção não apenas do Tribunal Superior do Trabalho, mas da própria Justiça do Trabalho.

Ora, com tão abrangente ampliação não é absurdo o receio de movimento idêntico, mas desta feita, por fundamento diverso. É que sua abrangência teria sido tão ampliada que teria perdido a sua especialização, que justificava organização em moldes específicos. Além disso, sem querer intensificar a preocupação, que esse “volume” de novas competências poderia agravar essa tentativa, na medida em que restaria inviabilizada a Justiça do Trabalho. Isso porque, ainda que eficiente, hoje funciona verdadeiramente muito próximo de sua capacidade estrutural, a qual não sofreu qualquer alteração coma Emenda.

De qualquer sorte, há que se ter tranqüilidade, uma vez que a instabilidade, a dúvida e a ansiedade são sentimentos próprios das situações de mudança, e as definições somente com o tempo virão.

Registre-se ao final, ser sempre temerária a formulação de interpretação de temas polêmicos decorrentes de edições legislativas “lato sensu” que trazem modificações e novidades ao ordenamento jurídico. Trata-se, contudo, de risco necessário ao intérprete do direito que deve compreender como parte de seu papel social, na busca de melhor compreensão da dinâmica do direito, essa exposição de idéias, ensejadora de críticas construtivas ou não quanto às conclusões, mas nunca quanto ao fundamental papel investigativo e prospectivo do Direito.

A CONVENÇÃO 158 DA OIT

A CONVENÇÃO 158 DA OIT

André Jobim de Azevedo

Advogado Prof. Universitário – PUC/RS

Muito tem se discutido acerca da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho e sua aplicação nas relações trabalhistas nacionais.

A convenção como Instrumento Internacional que busca criar obrigação aos Estados -membro, mediante a ratificação de cada um desses Estados, decorrente das deliberações da Conferência Internacional do Trabalho busca estabelecer proteção contra a despedida imotivada do trabalhador.

De inicio é importante salientar que a sua aplicação tem sido proclamada pela classe trabalhadora, cujo entendimento não poderia ser outro, que não em seu interesse.

Sustentam a necessidade social da medida para atacar o desemprego, tal qual como em inúmeros países, ou segundo sustentam alguns, nas nações desenvolvidas como um todo.

Duas são as considerações que se deve fazer ao raciocínio.

A primeira é o fato de que realmente a questão do desemprego é uma questão assustadora, posta como desafio a ser vencido no milênio que se aproxima. Mas não se centra a questão apenas em países subdesenvolvidos ou cm desenvolvimcnto, mas é uma questão global que têm preocupado igualmente aos países desenvolvidos.

A segunda observação, a bem da verdade, se impõe. É que até a presente data somente ratificaram a Convenção 158 da OIT, 24 países, muitos deles inexpressivos salientando-se como paradigma apenas a Austrália, a Espanha, e a França, e em continente Sul Americano apenas a Venezuela (IN Proteccion Contra El Despido Injustificado – l1 Ed. 1995, Oficina Internacional del Trabajo – Genebra pg 166).

Afastado assim o falso discurso de que a ratificação se impõe como medida de modernidade, indispensável ao equacionamento do Desemprego que assola o planeta.

O que releva, no entanto, é a abordagem jurídica que se deve fazer, para se concluir pela aplicação ou não dessas regras nos contratos de trabalho pátrios.

Reza o artigo 42 da Convenção: “Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou sua conduta ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço.”

Aprovada na 88a reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra em 1982, tomou validade no âmbito Internacional em 23.11.85, conforme os critérios lá estabelecidos.

A Convenção foi aprovada pelo Congresso Nacional pelo Decreto-Legislativo nº68 de 1992, com publicação no DOU em 17.09.92.

Em 05.01.95 foi ratificada pelo Brasil, pelo que, vencido o período de carência de um ano, poderia se pensar que estaria vigente a partir de 06.01.96, o que não se admite, pois somente após a publicação no DOU do Decreto 1855/96, em 11.04.96 é que se poderia questionar da sua vigência.

É a partir da publicação do Decreto Presidencial que se pode perquirir acerca da integração dessas regras ao sistema jurídico interno, mais especialmente sua conformidade com as diretrizes e regras previstas na Carta Constitucional de 1988.

E de uma maneira direta, nessa perquirição há que se questionar a harmonia da Convenção com a Constituição Federal.

Para tanto impõe-se a análise do artigo 7º da Constituição que prevê como direito dos trabalhadores. Inciso I, “relação de emprego protegida contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”.

De início salta aos olhos a dessintonia da “internação”da Convenção, posto que a pretendida nacionalização, se deu por forma distinta daquela expressamente prevista pelo comando constitucional.

A constituição impõe lei complementar, enquanto o que se têm é uma ratificação formalizada por primeiro através de decreto-legislativo o posteriormente através decreto-presidencial.

E essa distinção de ratificação é fundamental, na medida em que há exigência de “quorum distinto para ambos, sendo que a lei complementar necessita de maioria absoluta de votos, como dispõe o artigo 69 da mesma carta.

Não fosse esse intransponível argumento, outros impedem a aplicação da Convenção l58 da OIT.

É que até a edição da referida “lei complementar”, a carta Federal regrou a matéria transitoriamente através do artigo 10º, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias. inciso I, limitando a proteção estabelecida no artigo 7º ao quádruplo da multa legal sobre os recolhimentos do FGTS.

Se de alguma forma pudesse ser vencida e que não pode, a inconstitucionalidade sustentada, outros óbices à aplicação buscada existem.

É que a Convenção não é, por seus próprios termos, auto-aplicável. Trata-se, como chama a doutrina especializada, de uma Convenção de princípios, ou seja, Convenção que traz em si princípios gerais que necessitam de lei nacional para a sua regulamentação.

É a própria Convenção que nos demonstra essa inaplicabilidade. Isso porque em inúmeras oportunidades o texto remete à necessária regulamentação, através da expressão “ou de qualquer outra forma conforme prática nacional” como é exemplar demonstrativo o final de seu primeiro artigo.

Ainda demonstrativo da impossibilidade de auto-aplicação outras referências do texto da Convenção expressas a “legislação e prática nacionais”, como se vê do artigo 8º, número 2.

E outras tantas são as referências da Convenção às expressões acima assinaladas (artigos 9º, número 2, letra b, 10º, 12º, número 1, 13º número 1, letra b, e número 3, bem como o artigo 14º, número 1).

Além dessas expressões outras constantes do texto bem indicam a necessidade de regulamentação da Convenção, quais sejam, “prazo razoável” (artigo 8º). “indenização adequada ou outra reparação”(artigo 10º), “outras compensações análogas” e “outras formas de previdência social” (artigo 12º).

Ante a clara remessa à legislação nacional, outro poderoso argumento surge na linha esposada.

É o fato de que como a Convenção é anterior à Publicação da Constituição Federal do Brasil, aquela data de 1982, a Constituição já teria dado efetividade aos princípios através de suas disposições constitucionais, “ex vi” artigo 7º, e mesmo de suas disposições transitórias, como o artigo 10º, além de todo o arcabouço legislativo infraconstitucional. Conclui-se assim que a norma internacional estaria. desde a promulgação da Carta Magna, devidamente atendida no ordenamento jurídico interno.

Entende-se assim que nenhum sobressalto pode gerar aos empregadores a polêmica em tela.

Raras liminares que foram concedidas no sentido de reintegrar empregados demitidos sem justa causa com fundamento na Convenção 158 da OIT, foram devidamente cassadas por mandados de segurança, instrumento capaz de repor a ordem jurídica, garantindo o direito líquido e certo de despedida imotivada, na forma da Constituição Federal.

Essa inclusive é a posição do Ministério do Trabalho e da Delegacia Regional do Trabalho em sumário publicado acerca da Convenção 158 da OIT.