A CONVENÇÃO 158 DA OIT
André Jobim de Azevedo
Advogado Prof. Universitário – PUC/RS
Muito tem se discutido acerca da Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho e sua aplicação nas relações trabalhistas nacionais.
A convenção como Instrumento Internacional que busca criar obrigação aos Estados -membro, mediante a ratificação de cada um desses Estados, decorrente das deliberações da Conferência Internacional do Trabalho busca estabelecer proteção contra a despedida imotivada do trabalhador.
De inicio é importante salientar que a sua aplicação tem sido proclamada pela classe trabalhadora, cujo entendimento não poderia ser outro, que não em seu interesse.
Sustentam a necessidade social da medida para atacar o desemprego, tal qual como em inúmeros países, ou segundo sustentam alguns, nas nações desenvolvidas como um todo.
Duas são as considerações que se deve fazer ao raciocínio.
A primeira é o fato de que realmente a questão do desemprego é uma questão assustadora, posta como desafio a ser vencido no milênio que se aproxima. Mas não se centra a questão apenas em países subdesenvolvidos ou cm desenvolvimcnto, mas é uma questão global que têm preocupado igualmente aos países desenvolvidos.
A segunda observação, a bem da verdade, se impõe. É que até a presente data somente ratificaram a Convenção 158 da OIT, 24 países, muitos deles inexpressivos salientando-se como paradigma apenas a Austrália, a Espanha, e a França, e em continente Sul Americano apenas a Venezuela (IN Proteccion Contra El Despido Injustificado – l1 Ed. 1995, Oficina Internacional del Trabajo – Genebra pg 166).
Afastado assim o falso discurso de que a ratificação se impõe como medida de modernidade, indispensável ao equacionamento do Desemprego que assola o planeta.
O que releva, no entanto, é a abordagem jurídica que se deve fazer, para se concluir pela aplicação ou não dessas regras nos contratos de trabalho pátrios.
Reza o artigo 42 da Convenção: “Não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou sua conduta ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço.”
Aprovada na 88a reunião da Conferência Internacional do Trabalho, em Genebra em 1982, tomou validade no âmbito Internacional em 23.11.85, conforme os critérios lá estabelecidos.
A Convenção foi aprovada pelo Congresso Nacional pelo Decreto-Legislativo nº68 de 1992, com publicação no DOU em 17.09.92.
Em 05.01.95 foi ratificada pelo Brasil, pelo que, vencido o período de carência de um ano, poderia se pensar que estaria vigente a partir de 06.01.96, o que não se admite, pois somente após a publicação no DOU do Decreto 1855/96, em 11.04.96 é que se poderia questionar da sua vigência.
É a partir da publicação do Decreto Presidencial que se pode perquirir acerca da integração dessas regras ao sistema jurídico interno, mais especialmente sua conformidade com as diretrizes e regras previstas na Carta Constitucional de 1988.
E de uma maneira direta, nessa perquirição há que se questionar a harmonia da Convenção com a Constituição Federal.
Para tanto impõe-se a análise do artigo 7º da Constituição que prevê como direito dos trabalhadores. Inciso I, “relação de emprego protegida contra a despedida arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos”.
De início salta aos olhos a dessintonia da “internação”da Convenção, posto que a pretendida nacionalização, se deu por forma distinta daquela expressamente prevista pelo comando constitucional.
A constituição impõe lei complementar, enquanto o que se têm é uma ratificação formalizada por primeiro através de decreto-legislativo o posteriormente através decreto-presidencial.
E essa distinção de ratificação é fundamental, na medida em que há exigência de “quorum distinto para ambos, sendo que a lei complementar necessita de maioria absoluta de votos, como dispõe o artigo 69 da mesma carta.
Não fosse esse intransponível argumento, outros impedem a aplicação da Convenção l58 da OIT.
É que até a edição da referida “lei complementar”, a carta Federal regrou a matéria transitoriamente através do artigo 10º, dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias. inciso I, limitando a proteção estabelecida no artigo 7º ao quádruplo da multa legal sobre os recolhimentos do FGTS.
Se de alguma forma pudesse ser vencida e que não pode, a inconstitucionalidade sustentada, outros óbices à aplicação buscada existem.
É que a Convenção não é, por seus próprios termos, auto-aplicável. Trata-se, como chama a doutrina especializada, de uma Convenção de princípios, ou seja, Convenção que traz em si princípios gerais que necessitam de lei nacional para a sua regulamentação.
É a própria Convenção que nos demonstra essa inaplicabilidade. Isso porque em inúmeras oportunidades o texto remete à necessária regulamentação, através da expressão “ou de qualquer outra forma conforme prática nacional” como é exemplar demonstrativo o final de seu primeiro artigo.
Ainda demonstrativo da impossibilidade de auto-aplicação outras referências do texto da Convenção expressas a “legislação e prática nacionais”, como se vê do artigo 8º, número 2.
E outras tantas são as referências da Convenção às expressões acima assinaladas (artigos 9º, número 2, letra b, 10º, 12º, número 1, 13º número 1, letra b, e número 3, bem como o artigo 14º, número 1).
Além dessas expressões outras constantes do texto bem indicam a necessidade de regulamentação da Convenção, quais sejam, “prazo razoável” (artigo 8º). “indenização adequada ou outra reparação”(artigo 10º), “outras compensações análogas” e “outras formas de previdência social” (artigo 12º).
Ante a clara remessa à legislação nacional, outro poderoso argumento surge na linha esposada.
É o fato de que como a Convenção é anterior à Publicação da Constituição Federal do Brasil, aquela data de 1982, a Constituição já teria dado efetividade aos princípios através de suas disposições constitucionais, “ex vi” artigo 7º, e mesmo de suas disposições transitórias, como o artigo 10º, além de todo o arcabouço legislativo infraconstitucional. Conclui-se assim que a norma internacional estaria. desde a promulgação da Carta Magna, devidamente atendida no ordenamento jurídico interno.
Entende-se assim que nenhum sobressalto pode gerar aos empregadores a polêmica em tela.
Raras liminares que foram concedidas no sentido de reintegrar empregados demitidos sem justa causa com fundamento na Convenção 158 da OIT, foram devidamente cassadas por mandados de segurança, instrumento capaz de repor a ordem jurídica, garantindo o direito líquido e certo de despedida imotivada, na forma da Constituição Federal.
Essa inclusive é a posição do Ministério do Trabalho e da Delegacia Regional do Trabalho em sumário publicado acerca da Convenção 158 da OIT.